Brasileirão Série A

Grama sintética causa discórdia, e alfinetada de Mário é prévia de briga de Fluminense e outros clubes do Brasileiro

Fluminense é um dos clubes abertamente contra gramados sintéticos no Brasil, e questão deve virar debate acirrado em arbitral do Brasileirão

Mário Bittencourt não poupou críticas aos gramados sintéticos do futebol brasileiro em coletiva de imprensa no CT Carlos Castilho. O presidente do Fluminense alfinetou o Botafogo, dono de um campo artificial no Estádio Nilton Santos, na prévia de uma discórdia que deve aumentar nos próximos meses.

— Dizem que sintético diminui o custo. Mas, se você tem um clube de futebol e não consegue manter um campo de grama, você não pode ter um clube. Se não vira casa de show. Tem gente que prefere fazer cinco shows. E tudo bem. Mas eu prefiro ganhar títulos — provocou Mário Bittencourt.

Após a direção do Palmeiras criticar a Real Arenas, operadora do Allianz Parque, por conta da grama sintética de seu estádio, mais vozes se ergueram contra os campos artificiais no país. O Alviverde não jogará em seu estádio até a situação ser resolvida, e ameaça até entrar na Justiça pela interdição de sua própria arena.

O fato está longe de ser isolado. Muitos clubes do país são contra gramados sintéticos por diversos motivos. Fato é que a discórdia está só começando.

Há nos bastidores uma crescente insatisfação com os gramados sintéticos, principalmente por conta dos jogadores. Muitos deles não querem saber de entrar em campo com piso artificial pela predisposição a lesões. O arbitral do Campeonato Brasileiro deve receber forte debate sobre o tema.

Fluminense de John Kennedy é contra o gramado sintético, e discórdia com piso artificial aumenta para o Campeonato Brasileiro – Foto: MARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE FC

Clubes entram em colisão por gramados sintéticos

Fatores ambientais, predisposição a lesões, vantagens desportivas aos donos do campo e o fato de nenhuma grande liga do mundo permitir a utilização do piso são os argumentos deste lado da bola.

— O sintético muda o jogo. O jogador fica mais lento, porque a chuteira prende mais. O quique da bola é diferente. “Ah, mas é aprovado pela Fifa”, mas não necessariamente é bom. Em 80% dos jogos, é gramado natural. Ele traz uma modificação. Vou discutir resultado esportivo. Todo clube que começa a jogar em gramado sintético, nos primeiros dois ou três anos, tem um resultado em casa muito diferente. Pode buscar aí. Porque existe uma dificuldade natural em jogar lá — opinou o presidente do Fluminense.

Jhon Arias sofreu lesão contra o Vasco no gramado artificial do Nilton Santos, onde o Fluminense não venceu desde a mudança de piso - Foto: MARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE FC
Jhon Arias sofreu lesão contra o Vasco no gramado artificial do Nilton Santos, onde o Fluminense não venceu desde a mudança de piso – Foto: MARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE FC

Do outro, estão os custos e a notória dificuldade de manter um gramado de qualidade no Brasil — o próprio Fluminense, de Mário Bittencourt, sofre com este problema no Maracanã.

Em 2023, diversos jogadores deixaram de entrar em campo nos três estádios da Série A que possuem grama artificial: Nilton Santos, Allianz Parque, Arena da Baixada — todos aprovados pela Fifa e cada um com uma tecnologia diferente.

O caso mais emblemático foi o de Luis Suárez, o craque do Campeonato Brasileiro no tradicional prêmio Bola de Prata e também em votação da Trivela. O uruguaio de 37 anos se recusou a jogar em gramados sintéticos por conta de lesões. Hoje no Inter Miami, da MLS, Luisito se reencontrou com Lionel Messi, que exigiu em seu contrato com o clube norte-americano uma cláusula que garanta que ele não jogue em campos de grama artificial

— Tem time que estava na liderança do campeonato, tirou do gramado sintético para receber show, colocou em gramado natural e perdeu o jogo. O próprio técnico do Grêmio disse que, se fosse em gramado sintético, o Suárez não jogaria — alfinetou Mário na coletiva.

No gramado natural de São Januário, Luis Suárez fez três gols e o Grêmio venceu o Botafogo em confronto direto pelo título do Brasileirão em 2023 - Foto: Alexandre Durão/Grêmio FBPA
No gramado natural de São Januário, Luis Suárez fez três gols e o Grêmio venceu o Botafogo em confronto direto pelo título do Brasileirão em 2023 – Foto: Alexandre Durão/Grêmio FBPA

- - Continua após o recado - -

Assine a newsletter da Trivela e junte-se à nossa comunidade. Receba conteúdo exclusivo toda semana e concorra a prêmios incríveis!

Já somos mais de 3.200 apaixonados por futebol!

Ao se inscrever, você concorda com a nossa Termos de Uso.

Jogadores do Fluminense são contrários à grama sintética

Um dos jogadores receosos com a grama sintética é Renato Augusto, reforço do Fluminense para 2024. O jogador de 35 anos recebeu oferta do rival Botafogo, mas a Trivela apurou que o fato de jogar no Estádio Nilton Santos, de grama artificial, foi um dos fatores que pesou para o meia não fechar com o Alvinegro.

Como já é público, assim que o Flu entrou na jogada, o negócio acabou fechado em poucas horas. Renato já até estreou pelo Tricolor — no bom gramado natural do Luso-Brasileiro, estádio da Portuguesa-RJ.

Renato Augusto mostrou a conhecida elegância em estreia pelo Fluminense, e combinou com a camisa 20 - Foto: Mailson Santana/Fluminense FC
Renato Augusto mostrou a conhecida elegância em estreia pelo Fluminense, e combinou com a camisa 20 – Foto: Mailson Santana/Fluminense FC

Assim como Renato, diversos outros jogadores evitam a grama sintética. A reportagem também confirmou que Jhon Arias, que sofreu grave torção no tornozelo no Nilton Santos em derrota para o Vasco no Campeonato Brasileiro, tampouco gosta de jogar em grama artificial. Após o título da Libertadores, ele foi um dos poupados pelo Fluminense do confronto com o Palmeiras, no Allianz Parque, na reta final da competição.

— Vai para a questão das lesões, aí é um debate ainda maior. Tem estudo em times de beisebol até em relação à incidência do sol na grama sintética em câncer no cérebro. Tem a questão do material que mexe na saúde dos atletas. É um estudo mais profundo, que tem que ser estudado por médicos e cientistas. Não tenho capacidade para falar sobre — disse Mário.

Grandes ligas não tem grama sintética, Brasileirão terá debate acirrado

De acordo com Mário Bittencourt, pelo menos oito clubes da Série A são veementemente contra a grama sintética. O presidente do Fluminense deixou em aberto que a questão será discutida no arbitral do Campeonato Brasileiro.

A Trivela apurou que a maioria dos clubes que é contra a grama artificial deve se pronunciar no arbitral. A ideia é estipular um prazo para a mudança para gramados naturais sem prejudicar Palmeiras, Athletico-PR e Botafogo, clubes que detém o piso em seus estádios. Provavelmente, a transição se daria até 2025.

— Me atenho aos critérios esportivos: beneficia quem tem e causa desequilíbrio na competição. Não é possível que você gaste milhões em jogadores e não tenha dinheiro para manter um campo de grama. A maioria dos clubes da Série A é contra. Quando saiu a matéria da gosma, recebi de oito presidentes que não dava para manter isso. Isso é algo de conselho arbitral, que será decidido na CBF, e obviamente, se decidirem que não pode ter, tem que ter um tempo de adequação para os times que têm. Ninguém aqui é covarde para fazer isso — afirmou Mário.

Gramados sintéticos como o da Arena da Baixada viraram motivo de discórdia no Brasileirão - Foto: Mauro Fanha/Icon sport
Gramados sintéticos como o da Arena da Baixada viraram motivo de discórdia no Brasileirão – Foto: Mauro Fanha/Icon sport

A preocupação, além da saúde dos jogadores, é também com uma suposta vantagem esportiva das equipes que mandam seus jogos em campos de grama artificial.

— Há uma conversa natural, entre os clubes que são contra o gramado sintético, que não é só o Fluminense, mas eu falo abertamente, é que os times que jogam em gramado sintético jogam contra times mesclados, porque poupam para jogar lá.

Grama sintética recebeu elogios no Brasileirão, e grama natural também causou lesões

Embora o Allianz Parque esteja no foco das polêmicas recentes, o “tapetinho” do Nilton Santos foi elogiado por muitos jogadores do Brasileirão em 2023. A Arena da Baixada também não costuma levantar reclamações públicas dos atletas.

'Tapetinho' do Estádio Nilton Santos recebeu elogios de atletas no Brasileirão em 2023 - Foto: Icon sport
‘Tapetinho' do Estádio Nilton Santos recebeu elogios de atletas no Brasileirão em 2023 – Foto: Icon sport

Já os gramados naturais tiveram pontos baixos na temporada passada. Maracanã, Castelão, Mineirão, Arena do Grêmio e até a neófita Arena MRV protagonizaram cenas de descuido com a relva.

A questão médica também, claro, foi afetada por gramados ruins. Tiquinho Soares, à época destaque do Botafogo que liderava o Brasileiro, por exemplo, sofreu torção no joelho em um sofrível campo do Mineirão.

Gramado da Arena MRV já estava ruim no primeiro jogo da história do estádio do Atlético-MG - Foto: Icon sport
Gramado da Arena MRV já estava ruim no primeiro jogo da história do estádio do Atlético-MG – Foto: Icon sport

Fora do Brasil, movimento é crescente contra a grama sintética

Fora do Brasil, o debate é crescente. A Holanda acaba de proibir campos de grama sintética na primeira divisão. Considerando as sete principais Ligas europeias (Espanha, Inglaterra, Itália, Alemanha, França, Portugal e Holanda), não existem gramados totalmente sintéticos.

Nos esportes americanos, também há rusgas. Em setembro do ano passado, o sindicato dos jogadores pediu o fim da grama sintética na NFL, liga de futebol americano do país, após a lesão do astro Aaron Rodgers, em sua estreia pelo New York Jets. Ele sofreu uma ruptura total do tendão de Aquiles e ficou de fora de toda a temporada.

Foto de Caio Blois

Caio BloisSetorista

Jornalista pela UFRJ, pós-graduado em Comunicação pela Universidad de Navarra-ESP e mestre em Gestão do Desporto pela Universidade de Lisboa-POR. Antes da Trivela, passou por O Globo, UOL, O Estado de S. Paulo, GE, ESPN Brasil e TNT Sports.
Botão Voltar ao topo