O problema e as soluções do gramado do Maracanã interessam à dupla Fla-Flu
'Talvez o Maracanã seja o estádio que mais receba jogos no mundo', diz o presidente da empresa responsável pela manutenção do criticado gramado
De tempos em tempos, o gramado do Maracanã ganha o noticiário.
No mês passado, Gabigol atribuiu uma torção de tornozelo à má condição do campo e discutiu de maneira acalorada com o vice-presidente de futebol do Flamengo Marcos Braz, que foi o primeiro dirigente a entrar no vestiário e viu as reclamações direcionadas para si.
Por que o gramado do Maracanã dificilmente fica em bom estado para receber os jogos? De quem é a culpa? Instalação de gramado sintético pode ser uma solução?
Para responder a essa e outras perguntas, a Trivela aceitou um convite feito pela empresa Greenleaf, responsável pela manutenção do gramado, para passar uma manhã no Maracanã. Tire suas conclusões.
Comparação do Maracanã com outros estádios
A empresa que cuida do gramado do Maracanã argumenta que é muito importante considerar o alto número de jogos antes de qualquer conclusão. No ano passado foram mais de 80 partidas no estádio.
O San Siro, por exemplo, é dividido por duas equipes na cidade de Milão, Internazionale e Milan, e, mesmo assim, recebeu apenas 41 jogos na última temporada. Em apenas seis meses, o Maracanã já foi palco de 46 partidas. É muito, considerando que o gramado é visto como o pior entre os principais estádios da Europa.
Além do conflito com o alto número de jogos, a manutenção do gramado também precisa lidar com o aquecimento, que leva quase 60 atletas ao campo antes mesmo da bola rolar. O pisoteio é maior e, consequentemente, o desgaste também. A questão é uma das variáveis que não são negociáveis, já que o exercício anterior à partida é imprescindível.
À Trivela, o presidente da Greenleaf Paulo Antônio Azeredo Neto analisou a situação do gramado do Maracanã. Durante o papo, ele também comentou sobre as críticas ao estado do campo, além de apresentar algumas soluções para a questão.
– Na realidade, isso incomoda bastante a gente. As pessoas não conhecem a realidade do dia a dia, quantidade de jogos que tem. Talvez o Maracanã seja o estádio que mais receba jogos no mundo. A gente tem que lidar com isso, faz parte do cuidado do gramado natural. Tudo quando chega no seu limite, fica mais complicado. Estamos tentando minimizar os problemas, estamos na pior época do ano, dias frios e curtos. Em agosto tende a melhorar – disse.
Plantio e cuidados: como é a grama do Maraca?
Ao longo dos meses, a Greenleaf utiliza duas sementes diferentes para plantio da grama do Maracanã, uma para o verão e outra para o inverno. São sete máquinas utilizadas para a manutenção do gramado, um investimento que supera a marca de 1,5 milhão de dólares (R$ 7,1 milhões). Atuante no Maracanã desde 1990, a empresa participa de todos os processos relativos ao gramado.
Além das máquinas principais, o local também recebe aparelhos auxiliares, que controlam a maciez e resistência do gramado, para a melhor performance dos atletas. Só a pintura das linhas e da própria grama, em casos mais extremos, é feita de maneira 100% manual pela Greenleaf.
A empresa também conta com mais de 20 funcionários, que trabalham diariamente para manter o gramado do Maracanã em estado aceitável. Por muitas vezes, o trabalho é dobrado, especialmente em dias de jogos. Tudo para deixar a grama em boas condições para receber as partidas de Flamengo e Fluminense.
+ LEIA MAIS: Paciência do Flamengo pode custar caro em negociações por Claudinho e Wendel
Entender os processos é importante para fazer com que os torcedores analisem razões pelas quais a grama não consegue ficar em bom estado. Isso passa muito pelo alto número de jogos em período complicado para o plantio, além de questões do próprio estádio, como a baixa luminosidade nas estações mais frias.
Grama sintética? Nem pensar
Mesmo que seja uma solução a curto prazo, a implementação de gramado sintético no Maracanã está totalmente descartada pelas partes envolvidas na manutenção. Flamengo e Fluminense já mostraram que não curtem a grama artificial, como as dos estádios de Palmeiras, Athletico Paranaense e Botafogo. Agora, foi a vez da Greenleaf se posicionar.
De acordo com Paulo Antônio, a empresa não tem qualquer tipo de problemas com o gramado sintético. A Greenleaf, inclusive, já fez implementação da grama artificial em diversos locais. Contudo, não serve para a alta performance dos jogos mais importantes do Brasil e da América. Firme na opinião, o presidente confirma que os problemas do Maracanã são outros.
+ LEIA MAIS: Flamengo não escapou de vaias após empate com América-MG no Maracanã
– O nosso posicionamento com relação ao gramado sintético é de andar para trás. Lá fora, todos os times, tanto da Europa, quanto dos Estados Unidos, já tiveram e baniram do futebol profissional. Não estou dizendo que o sintético não tenha o seu lugar, tem lugar em campos de alguel, treinos. Agora para alta performance, não cabe. É provado que existem uma série de problemas com jogadores, lesões, é algo artificial. Não tem porque mudar, o que precisa mudar é o calendário no Brasil, é muito jogo. Se o Maracanã, por exemplo, tivesse 40 jogos no ano, teríamos um gramado perfeito – analisou, antes de concluir:
– Não existe também o argumento de que ‘o Botafogo está em primeiro só por conta do gramado sintético'. Não existe isso, não tem relação nenhuma. É lógico que vai chegar um momento que não está bem, mas futebol é momento. O Palmeiras tem gramado sintético e não está bem. Para os jogadores é um risco a mais, tanto que lá fora os profissionais se recusam. Os jogadores preferem o natural. Acho que isso é fase, depois deve reverter de volta para o natural – finalizou.
Nem areia dá jeito. Qual a solução?
É possível afirmar que o gramado do Maracanã jamais terá o nível que os da Europa apresentam. O alto número de jogos realmente pesa, especialmente quando atrelado à questão de que o calendário fica enxuto no pior momento do ano para as sementes germinarem, diz a empresa.
Em algumas partidas, o local está abaixo da expectativa mesmo, isso é claro. Por isso o tal top-dressing, que tenta esconder os buracos com areia, no intuito de preservar as sementes que ainda não germinaram. No entanto, entendendo os processos, não há investimento que possa preparar os envolvidos para mais de 80 jogos em uma temporada.
Com o tempo mínimo de 20 dias para que o gramado atinja o seu ápice, uma solução seria que Flamengo e Fluminense mandassem partidas fora do Rio de Janeiro. No entanto, ambos os clubes entendem que a força de suas respectivas torcidas no Maracanã fazem a diferença e ganham partidas. Dessa forma, a outra questão que vem à cabeça é a construção de um novo estádio.
O Tricolor já fala em revitalização das Laranjeiras há alguns anos, mas o projeto não saiu do papel. O Rubro-Negro flertou com a ideia no ano passado, mas o terreno escolhido traz questões burocráticas que envolvem a Caixa Econômica e o Governo Federal. Além disso, a questão financeira pesa, e nem o poderoso Flamengo tem aporte para iniciar a construção sem parcerias.
Do jeito que está, o gramado do Maracanã só vai sofrer, tanto com os mais de 80 jogos por ano, quanto com as críticas de torcedores, imprensa, jogadores, comissões técnicas e dirigentes. A conclusão é que não há muito o que possa ser feito. Por mais que o esforço seja grande, como justifica a empresa, apenas uma mudança no calendário das equipes poderia fazer com que a grama, em seu estado natural, consiga prosperar no terreno localizado no bairro que tem o nome do estádio.