Copa América 2024

Nada mais importa que o conforto folgado, indomesticável, de Vini Jr

Confortável diante do Paraguai, atacante do Real Madrid parece começar a encontrar a sua melhor versão na seleção de Dorival

Ser campeão importa. É inevitável olhar para a Copa América e pensar na diferença que pode fazer ao humor do trabalho de Dorival Junior terminar a sequência nos Estados Unidos levando a taça, para isso passando por algum rival local e dando uma volta olímpica de esperança para dias melhores. Mas a coisa mais importante para o momento é firmar essa turma como a de jogadores de seleção brasileira. É ter Vini Jr. confortável e folgado, tal qual diante do Paraguai.

Demorou pouco mais de 30 jogos, é verdade que muitos vindos do banco e algum ruído com o espaço na equipe de Tite, mas finalmente surgiu. Um Vinicius de excessos, como o que convence Carlo Ancelotti e a rotina do Real Madrid – muita qualidade, um terror para o lateral rival, a extrema facilidade para cortar para ambos os lados, a presença por dentro (finalmente!) para um tapa de gol e algum deboche, um chapéu para trás para desestabilizar os marcadores, babando para dar umas porradas. Esse é aquele que provavelmente foi o melhor jogador do mundo na temporada, solto para driblar, marcar e matar a tensão do jogo no peito a seu gosto.

São poucas partidas, são poucos anos de vida, aliás, mas Vinicius por muitas vezes se viu encaixotado com Tite, numa linha de frente que podia ter um lateral-esquerdo fazendo o quinto homem de ataque e que, acho que dá para dizer, tinha uma ideia de jogo que de início não morria de amores pela possibilidade de modular seu onze para caber a liberdade ao ex-flamenguista. A água passou por debaixo da ponte e o ponta do Real Madrid chegou titular à estreia da Copa, no Catar. Jogou menos do que pode.

O Brasil ganhou a Copa América de 2019 numa formação que tinha, depois de Casemiro, Arthur, Coutinho, Gabriel Jesus, Firmino e Cebolinha. Só um chegou à Copa do Mundo, Gabriel, coadjuvante de tudo. Ele foi um dos melhores em campo no jogo-chave diante da Argentina, quando o esquecível Daniel Alves comeu a bola. Foi legal, uma taça em casa, um encaixe sem Neymar, mas logo Tite estava tendo que buscar outro jogo, outra equipe. Deu mais troféu do que time (também faltavam três anos e meio para a Copa, claro).

A Argentina é o exemplo contrário. Messi virou o fio com Scaloni, e comprou briga nessa derrota para o Brasil no Mineirão. Estava nitidamente diferente e muito mais engajado que a trágica participação na Copa da Rússia ou as angustiadas derrotas continentais em 2015 e 2016. As edições de Copa América, diz o próprio treinador campeão do mundo, seja a queda nas semis em 2019 ou o título na pandemia em 2021, foram fundamentais para ele identificar as características de seus jogadores e a melhor forma de fazer o quadro funcionar em torno do camisa 10. Veio um totó contra a Itália em Wembley e a certeza de um esquema ajeitado para os maiores jogos mundialistas. Deu time.

Sorriso de Vini é mais importante que título da Copa América

Então diante desse debate, o que pergunta, afinal, para que serve a Copa América, nada mais importa que o sorriso de Vini, as pernas leves de Rodrygo, a afirmação de Endrick. Quando a seleção cruzar com uma Bélgica ou Croácia da vida nas quartas de final da Copa de 2026, não terá feito tanta diferença eles terem ganhado ou perdido da Colômbia em Santa Clara dois anos antes, mas sim terem o time aos seus pés, livres para tentar um drible, mesmo que na primeira vez acabem saindo de bola e tudo, que uma carretilha escape, que algum jornalista reclame de suas provocações, que um torcedor distante faça biquinho da arquibancada. Não se trata de minimizar uma taça, pelo contrário, reforço que ser campeão ajudaria muito! Mas de lembrar que o pôster na parede não forma, sozinho, uma força de primeira prateleira.

O Vinicius Júnior do Real Madrid, o que se fala em voz firmada que joga como melhor do mundo, é esse, o que faz carnaval na ponta e que às vezes dribla quando deveria chutar, penteia quando podia tocar, irrita o João à sua frente quando todos acreditam mesmo que haveria de fazer o mais objetivo, o mais simples. Bobagem. Só haverá o Vini total se for assim, e o melhor Brasil possível, a utilidade desse torneio de campos amadores e ambiente insosso, é vê-lo emulando o Santiago Bernabéu, com suas sobras e imperfeições. É o que pode ser plantado para 2026.

Foto de Paulo Junior

Paulo JuniorColaborador

Paulo Junior é jornalista e documentarista, nascido em São Bernardo do Campo (SP) em 1988. Tem trabalhos publicados em diversas redações brasileiras – ESPN, BBC, Central3, CNN, Goal, UOL –, e colabora com a Trivela, em texto ou no podcast, desde 2015. Nas redes sociais: @paulo__junior__.
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