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Fluminense: os bastidores dos dias sem gols de German Cano

Saída de Diniz, lesão no pé e problemas de saúde dos filhos adiaram volta por cima de ídolo argentino

O Fluminense venceu o Athletico pelo Campeonato Brasileiro e pegou o elevador na tabela. Mais do que a 11ª colocação na competição, entretanto, o Tricolor pode comemorar o fim do jejum de Germán Cano após 171 dias sem balançar as redes.

A Trivela conversou com fontes ligadas ao clube para produzir um especial e entender como foram os dias sem gols do atacante. Os bastidores mostram a importância de companheiros e os problemas dentro e fora de campo no período.

Desde maio, quando marcou no empate com o Atlético-MG até outubro, quando fez o gol da vitória sobre o Athletico, muita coisa aconteceu na vida do ídolo argentino de 36 anos.

Saída de Fernando Diniz foi o momento mais difícil para Cano

A Trivela revelou com exclusividade que Germán Cano foi de longe o jogador mais emocionado com a saída de Fernando Diniz. A demissão do treinador campeão da Libertadores pelo clube, em 2023, interrompeu uma relação entre o argentino e o comandante que ia muito além da bola.

No momento mais emocionante da despedida, Cano indagou o treinador com as seguintes palavras:

— Como eu conto ao Lorenzo que você não estará mais aqui amanhã? — perguntou, aos prantos.

Fernando Diniz e Germán Cano tinham ótima relação, e argentino foi o jogador mais emocionado em sua despedida - Foto: MARCELO GONÇALVES/FLUMINENSE F.C.
Diniz e Cano tinham ótima relação, e argentino foi o jogador mais emocionado em sua despedida – Foto: MARCELO GONÇALVES/FFC.

O choro de Cano durou por mais 40 minutos além das horas de despedida do técnico. O próprio Diniz o acudiu, e ambos conversaram de maneira privada, mas o abatimento era flagrante. Naquele dia, o ídolo nem sequer teve condições físicas de treinar.

A Trivela apurou com pessoas próximas ao jogador que este foi o momento mais difícil dos dias sem gols de Cano. Àquela altura, seu jejum durava nove jogos, ou pouco menos de dois meses. Nem o que viria pela frente seria tão duro.

Cano machuca o pé na estreia de Mano, e lesão faz ídolo parar

Embora já convivesse com problemas nos joelhos antes mesmo de chegar ao Fluminense, Cano não tinha perdido tempo com lesões no clube. Isso porque é um dos atletas mais dedicados do elenco — e porque costuma fazer um trabalho especial nas férias.

O problema é que, de 2023 para 2024, Germán Cano teve menos tempo para se recuperar. Até porque, no fim da temporada, as dores já o consumiam, e o atacante precisava de descanso.

Em novembro, a Trivela revelou com exclusividade que o argentino ficou quase dois dias sem conseguir sair da cama após a final da Libertadores. E ainda havia o Mundial de Clubes pela frente.

Por isso, Cano ficou 18 dias fora entre o jogo do título, contra o Boca Juniors, e a vitória simples sobre o São Paulo, conquistada com um gol seu. Foram mais seis partidas até o fim da temporada.

O ano de 2024 já começou mais difícil para Cano, que sentia dores no joelho e um desconforto no pé. A principal peça da máquina de gols ainda precisava de ajustes, mas o Fluminense precisava dele. E o argentino, convencido a superar psicologicamente a dor, quis entrar em campo por Recopa, Libertadores, clássicos e o Brasileirão.

Germán Cano conviveu com fortes dores no Fluminense em 2024 - Foto: Icon sport
Germán Cano conviveu com fortes dores no Fluminense em 2024 – Foto: Icon sport

Ele só parou na estreia de Mano Menezes, quando um chute despretensioso aumentou as dores em seu pé. Na verdade, era uma lesão. O atacante, então, descansou 14 dias, mas voltou a jogar com dores. O time precisava dele. Até que Kauã Elias passou a decidir jogos pelo Fluminense, e, enfim, Cano conseguiu se tratar.

As orações e o cuidado de Felipe Melo

A Trivela apurou que o abraço emocionado com Felipe Melo dizia muito mais do que as aspas tímidas de Germán Cano após a vitória do Fluminense sobre o Athletico. Nos bastidores, o veterano teve papel fundamental na recuperação do argentino.

— (Tenho que agradecer) Especialmente um cara que gosto muito, Felipe Melo, que no momento mais difícil me deu muitos conselhos — resumiu Cano.

Amigos desde que chegaram juntos ao clube, em 2022, Cano e Felipe Melo são pessoas muito diferentes. Mas isso pouco importa. A relação dos dois vai além dos campos.

Emocionado, Germán Cano abraça Felipe Melo, peça importante em sua recuperação no Fluminense - Foto: Marcelo Gonçalves/FFC
Emocionado, Germán Cano abraça Felipe Melo, peça importante em sua recuperação no Fluminense – Foto: Marcelo Gonçalves/FFC

Aqui, é importante contextualizar que internamente, Felipe Melo é adorado por grande parte dos jogadores. Mais de metade do elenco, nas palavras de fontes ouvidas pela Trivela, recebem cuidados especiais do jogador, seja com conversas ou até orações.

Além de ser apontado como o principal responsável pela mudança de mentalidade do vestiário desde a sua chegada, Felipe exerceu funções de psicólogo, amigo e até pai de seus companheiros.

Felipe Melo tem relação de "pai e filho" com John Kennedy no Fluminense - Foto: LUCAS MERÇON/FFC
Felipe Melo tem relação de “pai e filho” com John Kennedy no Fluminense – Foto: LUCAS MERÇON/FFC

O filho mais famoso é John Kennedy, herói da conquista da Libertadores. Foi o capitão quem auxiliou o jovem em seus momentos mais difíceis — por isso, também, um dos mais decepcionados com as atitudes do atacante em 2024. E o mais novo “irmão” é Cano.

Felipe Melo não sossegou enquanto não conseguiu fazer Germán Cano se reunir a ele e outros evangélicos do grupo em orações. Levou o atacante a uma célula. Orou, pediu, conversou e, por isso, recebeu um abraço caloroso do amigo na comemoração do gol. O zagueiro não se conteve e foi às lágrimas após o jogo.

Os problemas familiares de Germán Cano

Em entrevista após a partida, Cano citou brevemente que teve “problemas familiares”, mas não entrou em detalhes. De fato, como disse o atacante, coisas que acontecem em todas as famílias.

Isso porque o que afligiu Germán foi a saúde de sua família.

A esposa, Rocío, teve um princípio de pneumonia. Poucos dias depois, Lorenzo, de seis anos, bateu a cabeça e inspirou cuidados. A menina, que transformou a icônica comemoração em um duplo L, também sofreu com problemas respiratórios.

Nada que seja problema atualmente, mas coisas que ocuparam a cabeça do atacante no momento difícil.

Um gol com a cara de Germán Cano no Fluminense

O 90º gol de Germán Cano pelo Fluminense foi também o de número 300 em sua carreira. Muito aguardado, ele foi de cara e com a cara do atacante.

— Creio que bateu em toda cara. A bola veio muito rápida. Gol e golaço valem um (risos) — brincou Cano.

Não por ter sido meio sem jeito, de forma alguma. Mas por ter sido importante. Artilheiro das decisões, Cano nunca faltou ao Flu nos momentos mais difíceis. E foi ele, desta vez, o responsável por um gol que fez o clube subir quatro posições na tabela do Brasileirão.

Germán Cano foi o herói da vitória do Fluminense sobre o Athletico pelo Campeonato Brasileiro após 19 jogos sem marcar - Foto: MARCELO GONÇALVES/ FLUMINENSE F.C.
Germán Cano foi o herói da vitória do Fluminense sobre o Athletico pelo Campeonato Brasileiro após 19 jogos sem marcar – Foto: MARCELO GONÇALVES/ FLUMINENSE F.C.

Agora com o mesmo número de jogos de quase todos os concorrentes, o Fluminense é o 11º colocado do Campeonato Brasileiro, com 36 pontos. A distância para a zona de rebaixamento é de quatro pontos, restando mais 24 em disputa. O Tricolor ainda não está livre, mas deu passos importantes para o alívio.

Decisivo, eficiente e importante, Cano deixou o jejum para trás e é uma arma importante para o restante da temporada. Mano Menezes adiantou que o argentino está na briga para ser titular.

— Agora o Cano começa de novo a se colocar como um pretendente à vaga. Estabelece de novo uma concorrência mais alta. Isso que a gente que ter no elenco, jogadores que no dia a dia fazem o seu melhor e esse melhor faz com que os outros também tenham que se esforçar o máximo — disse Mano.

O carinho da torcida foi fundamental para Cano no Fluminense

Quantos atacantes são celebrados mesmo sem fazer gol por quase seis meses? E com o time na zona de rebaixamento? Impensável. Não para Cano. Sua relação com a torcida do Fluminense também foi fundamental para que o momento ruim ficasse para trás.

— A torcida é muito especial. No momento mais difícil, sempre apoiam. O carinho que recebo nas redes sociais, no Maracanã e nas ruas é incrível. Não sei como agradecer o carinho e a paciência que tiveram comigo para poder voltar a fazer gols — disse o atacante.

Quando Mano Menezes mandou chamar Cano e Marcelo, a torcida se levantou. E mesmo com o camisa 12, um ídolo histórico do clube ao seu lado, o argentino que foi festejado. As arquibancadas comemoraram como um gol e cantaram a plenos pulmões a música de Germán Cano. Funcionou.

Após muitas tentativas de prever o gol do ídolo que encerraria o jejum, a torcida, enfim, acertou. E não poderia ficar mais feliz com isso.

Ao fim do jogo, Cano agradeceu. Reverenciou o setor sul do Maracanã, beijou o escudo do Fluminense e apontou para o patch de campeão da Libertadores. Emocionado, não conteve as lágrimas de gratidão, e deixou para depois o cansaço. Feliz, como resumiu, estava de alma lavada.

Era o fim do jejum e de sua “sensação de impotência”, como descreveu. Agora, o Fluminense conta de novo com seu grande artilheiro, e espera que os dias tristes tenham ficado para trás.

Foto de Caio Blois

Caio BloisSetorista

Jornalista pela UFRJ, pós-graduado em Comunicação pela Universidad de Navarra-ESP e mestre em Gestão do Desporto pela Universidade de Lisboa-POR. Antes da Trivela, passou por O Globo, UOL, O Estado de S. Paulo, GE, ESPN Brasil e TNT Sports.
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