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Caso Negreira: dirigentes do Sevilla boicotam atos institucionais com o Barcelona

Diante dos novos desdobramentos do caso de corrupção pelo qual o Barcelona é investigado, os dirigentes do Sevilla decidiram não participar de atos em conjunto relativos ao jogo desta sexta

Barcelona e Sevilla abrem a rodada de La Liga com um duelo de peso nesta sexta-feira, entre dois clubes que disputam a Champions League. E a partida no Estádio Olímpico de Montjuïc terá protestos da direção sevillista contra os barcelonistas por conta do Caso Negreira. Em nota oficial emitida três horas antes do jogo, os andaluzes manifestaram sua oposição à relação dos catalães com a chefia de arbitragem. Por conta disso, os cartolas rojiblancos não participarão dos atos prévios com os dirigentes blaugranas e sequer aparecerão na tribuna de honra do estádio.

A postura do Sevilla é a mais contundente de um clube em relação ao Caso Negreira até este momento. Nesta quinta-feira, o Barcelona foi indiciado pela justiça espanhola por suborno ativo. Durante 17 anos, de 2001 a 2018, os blaugranas pagaram cerca de €7,3 milhões totais a José María Enríquez Negreira, ex-vice-presidente do Comitê Técnico Arbitral da federação espanhola. O juiz do caso, Joaquín Aguirre, aponta a gravidade da corrupção por Negreira ser uma figura pública e estar numa posição que exige imparcialidade com todas as equipes. Assim, mesmo que não existam provas concretas de benefícios ao Barça em campo, o clube fica suscetível à punição pela remuneração anual paga ao ex-vice-presidente do CTA. Os autos enfatizam que os pagamentos deixaram de ser feitos a partir do momento em que Negreira não ocupava mais o cargo.

Outro desdobramento do Caso Negreira ocorrido nesta quinta-feira foi um mandado de busca e apreensão na sede da RFEF, a federação espanhola. Membros da guarda civil procuravam documentos que apontassem a influência de Negreira sobre os árbitros, como as atas das reuniões do Comitê Técnico Arbitral. Foram cerca de 12 horas de buscas, com a colaboração dos atuais membros da federação. A comissão de arbitragem também é investigada por corrupção sistêmica.

Em fevereiro, os clubes da primeira e da segunda divisão do Campeonato Espanhol tinham assinado um manifesto em conjunto contra o Barcelona. As agremiações pediam uma ação contundente das autoridades sobre o Caso Negreira e orientavam os primeiros passos para recobrar a credibilidade do futebol espanhol. A carta assinada por 40 clubes foi publicada no próprio site oficial de La Liga, igualmente signatária. Além do próprio Barcelona, apenas o Real Madrid não tinha participado da ação. No entanto, semanas depois, com a formalização do processo na justiça espanhola, os merengues manifestaram seu apoio e declararam que compareceriam ao juizado como uma das partes prejudicadas.

O que o Sevilla diz no comunicado

“O Sevilla, diante das últimas notícias e avanços no Caso Negreira, e a nova imputação por suposto delito do Barcelona e de alguns de seus ex-dirigentes, quer comunicar, por respeito à competição e aos nossos torcedores, que: mostra sua total indignação e repulsa pelas práticas realizadas pelos ex-dirigentes do Barcelona imputados no Caso Negreira, práticas que supostamente constituem delito para o tribunal, segundo os autos publicados nos meios de comunicação; rechaça o comportamento do Barcelona durante os períodos em que supostamente se consumaram esses delitos. Por esta razão, o Sevilla suspendeu os atos protocolares correspondentes à partida de La Liga nesta sexta-feira, e anuncia a ausência de representantes na tribuna de honra do estádio”.

“O Sevilla quer mostrar seu mais profundo respeito pelos sócios e abonados barcelonistas, assim como por seus atuais empregados e dirigentes que trabalham diariamente no Barcelona e que se veem indiretamente implicados nesta causa; mostra seu respeito pela justiça espanhola, pela presunção de inocência e pelas decisões que possam ser tomadas em qualquer sentido nos tribunais competentes, bem como nos órgãos sancionadores correspondentes; espera que, por bem da competição, todas as responsabilidades do Caso Negreira sejam depuradas de acordo com as últimas considerações do juiz; confia que os acontecimentos, como os que supostamente ocorreram, não se repetirão e que os órgãos federativos pertinentes velarão, desde já e no futuro, pela limpeza de todas as competições, às quais o Sevilla disputou durante os períodos investigados contra o Barcelona”.

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As etapas anteriores do processo

O Barcelona foi formalmente denunciado pela justiça espanhola em março. A procuradoria afirmava que os valores pagos a Negreira serviam para “realizar atuações que tendiam a favorecer o Barcelona na tomada de decisões dos árbitros nas partidas do clube e, assim, nos resultados das competições”. A pessoa jurídica do Barcelona responderá pelo delito de corrupção. Também são citados Sandro Rosell e Josep Maria Bartomeu, ex-presidentes do clube, acusados ainda por administração desleal e falsificação de documentos. As penas para os responsáveis podem variar de seis meses a quatro anos de prisão, assim como eles podem ser condenados a pagar multas e ficar inabilitados de exercer cargos. Além disso, o Barcelona como pessoa jurídica pode ser implicado na esfera criminal. Corre o risco de pagar multas ou mesmo de perder sua licença profissional.

Também em março, o Barcelona passou a ser investigado pela Uefa. Os crimes cometidos pelo clube prescreveram dentro dos regulamentos de La Liga. A entidade, no entanto, prometeu colaboração máxima com a justiça, enquanto a federação espanhola e o ministério dos esportes preferiram aguardar a conclusão do processo legal para aplicar punições. Já a Uefa preferiu realizar um procedimento paralelo. Todos os clubes de La Liga, além da própria entidade que organiza o campeonato, entraram como partes interessadas. Apesar das investigações, o Comitê de Apelação da Uefa concedeu uma permissão provisória para que o time disputasse a Champions League na atual temporada.

O Barcelona justifica que Negreira prestava um serviço de “consultoria”, para orientar os jogadores sobre como se comportar em campo e também sobre estilos de condução de cada árbitro. É um tipo de apoio normal entre clubes, mas não quando se envolve um dirigente com alto poder de decisão na comissão de arbitragem. Já segundo seu depoimento, Negreira afirmou que o pagamento do Barcelona não era para favorecer o clube, mas para garantir arbitragens “neutras” que não prejudicassem o time. Tal declaração é um tiro no pé, por evidenciar a adulteração das competições e botar em xeque a situação de outros clubes.

As receitas das empresas que recebiam o dinheiro se resumiam ao montante pago pelo Barcelona. Negreira recebia através de cheques, com auxílio de pessoas próximas Outro envolvido indiretamente é Javier Enríquez, filho de Negreira, que seria o responsável por fazer relatórios técnicos das arbitragens destinados ao Barcelona. Dirigentes do Barça, entre eles Laporta, agiram para que Enríquez não fosse contratado diretamente pelo clube, para não indicar uma relação suspeita com Negreira.

Tais relatórios não chegavam ao departamento técnico do Barcelona. Diferentes treinadores declararam desconhecer os documentos. Além disso, os relatórios parciais divulgados pela imprensa espanhola mostram trabalhos questionáveis – para dizer o mínimo. Há erros de ortografia e informações rasas, o que reforça as suspeitas. O “assessoramento de vídeos técnicos” custava mais de €40 mil por mês. Já a “gravação de vídeos da Copa de 2014” chegava a €145 mil. Em média, Negreira recebia mais de €600 mil por ano.

Conforme o jornal El Español, Negreira tenta se esquivar das investigações. O ex-árbitro teria informado que sofre de Alzheimer, para não responder aos questionamentos da Justiça. O laudo foi assinado por um corpo de médicos. Conforme o jornal El País, Enríquez Negreira chegou a ameaçar “todos os presidentes do Barça” quando o clube rompeu o acordo entre os dois em 2018. Já o jornal El Mundo também apontou que o ex-vice-presidente do Comitê de Arbitragem realizou ameaças contra a federação espanhola quando foi demitido do cargo em 2018.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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