Atlético-MG e Felipão foi uma relação que não agregou em nada na história de ambos — pelo contrário
Por mais que sejam dois grandes da história do futebol brasileiro, Felipão e Atlético não se entenderam – e isso já era esperado
O Atlético-MG decidiu demitir nesta quarta-feira (20) o técnico Luiz Felipe Scolari após uma série de problemas, em campo e fora dele. Galo e Felipão tiveram nove meses de uma relação que não fez sentido no início, e seguiu assim até o final. Para piorar, foi um vínculo que não agregou em nada (pelo contrário) na vida de ambos.
Que Felipão é um dos maiores treinadores da história, não só do futebol brasileiro, mas mundial, é chover no molhado. Dessa forma, então, qualquer um gostaria de tê-lo no comando do seu time, certo? Errado. No caso do Atlético, o estilo adotado pelo treinador em toda a sua carreira nunca foi o mesmo da identidade do clube.
Felipão sempre teve com ele times mais reativos, que não ficam tanto com a bola, são mais verticais e menos encantadores. Dessa forma, ele multicampeão em diversos lugares – inclusive na Seleção Brasileira. Mas, no Atlético, o estilo sempre foi o contrário, de um time mais ativo, que tem a bola, propõe jogo, quer vencer a todo custo e, quando tem peças de qualidade, como agora, precisa encantar.
Os dois opostos então se encontraram no meio do ano passado. Quem contratou Felipão não olhou para isso – ou sequer sabia qual é “a cara” do Atlético no campo.
Por mais que o futebol não seja lógico e óbvio, muitas vezes acontece o que já era esperado, e não foi diferente com Felipão e Atlético. O treinador teve um péssimo início no clube e, mesmo depois que conseguiu ajeitar as coisas e o time desempenhou bem, ainda não passou confiança. Três jogos em alto nível em todo um segundo turno de Campeonato Brasileiro não podem ser o suficiente para o Galo, principalmente para esse elenco, de tanta qualidade.
No fim, está saindo após acontecer o óbvio: o time não passa perto de desempenhar o futebol que se esperava. É claro que Felipão tem culpa, a final, é ele quem treina e escala. Mas, alguém realmente esperava algo de diferente nas atuações?
A culpa (também) da diretoria
Felipão não carrega sozinho o fardo de fracassar em campo no Atlético. A diretoria atleticana também tem muita responsabilidade nessa história. Foi ela que achou que o treinador, já aposentado na época, era a melhor opção para substituir Eduardo Coudet, que tem estilo (assim como Scolari e Galo) completamente diferente.
A opção de sair de Coudet e ir para Felipão é como se o Atlético só servisse carne para os jogadores e, do nada, oferecesse apenas frutas. É possível viver só comendo frutas mesmo após um tempo só comendo carnes? É claro, mas isso leva (muito) tempo, e o Galo não tinha isso.
Além disso, Felipão recebeu um time montado por e para Eduardo Coudet. Com o estilo completamente diferente, ele teve que se adaptar ao elenco. Não à toa, o time começou a jogar melhor em 2023 quando ele mesclou as ideias do argentino com as suas. Só que, como foi mantido para 2024, era esperado então que jogadores no estilo Scolari fossem contratados. Mas, não. O Galo pouco se mexeu no mercado, manteve exatamente a mesma base e, assim, Felipão seguiu tendo que comandar o “time de Coudet”.
Felipão tem muita culpa no desempenho do time do Atlético. Na média, foi um dos piores nos últimos anos. O torcedor chegou até a dizer que ele é um “motorista de carro popular com uma Ferrari nas mãos”, mas, não é bem assim. Scolari estava mais para um motorista de moto com um carro na mão: ele sabe dirigir, mas não aquilo que deram para ele. Talvez, se o elenco tivesse mais a cara do treinador, as coisas não tivessem sido tão ruins em campo.
Fora de campo, relação de Felipão com a torcida foi a pior possível
Se em campo Felipão tem com quem dividir a culpa, fora das quatro linhas, ela cai totalmente sobre ele. O treinador não cultivou boa relação com a torcida (e com a imprensa) desde que chegou ao Galo, e esse vínculo, que nunca se formou, foi ficando cada vez mais distante de acordo com que ele se expressava nas coletivas pós-jogo.
Na maioria das coletivas que deu no Atlético, Felipão não fez questão de explicar suas ideias ou dar alguma satisfação ao torcedor. Para piorar, sempre quando questionado sobre o comportamento da torcida, seja ele de pedidos, descontentamentos ou vaias, ele optou por atacar o que é o maior patrimônio do clube.
No fim de 2023, Felipão já era mal visto por metade da torcida do Atlético, que sempre citava suas respostas na coletiva para afirmar que “ele parece achar que está fazendo um favor” ao treinar o clube. Mesmo assim, foi mantido no cargo, mas as coisas foram de mal a pior em 2024.
Ainda mais ríspido e sem paciência nas respostas das coletivas, Felipão perdeu o resto do prestígio que tinha com parte da torcida há cerca de um mês, quando foi filmado xingando um torcedor (que não o xingou) no desembarque do time. No jogo seguinte, foi, aí sim, xingado por todo o estádio, e, ao invés de colocar panos quentes e pedir desculpas, atacou mais uma vez a torcida.
Não adiantou o empate no fim, torcida do Atlético xinga em coro o Felipão. pic.twitter.com/XHEnfg1X8I
— Alecsander Heinrick (@alecshms) February 24, 2024
No ataque a torcida após xingar o torcedor, Felipão afirmou que só aceitava críticas de “quem paga ingresso”, ou seja, quem estava no estádio. Isso enfurece ainda mais os torcedores, mesmo os que ainda estavam em defesa do treinador. Para piorar, no jogo seguinte ele se contradisse ao … xingar um torcedor que fazia cobranças dentro da Arena MRV.
Relação que não agregou na vida de Felipão e na do Atlético
Com todos esses casos, sejam eles dentro ou fora de campo, fica claro que a relação Felipão e Atlético não foi benéfica para nenhum dos lados, pelo contrário, trouxe prejuízos para ambos. Enquanto o Galo agora terá que recuperar a confiança do seu torcedor, machucado pelo treinador que a ofendeu, Scolari “ganhou” raiva de uma torcida inteira, que antes era neutra a ele.
No fim das contas, nem Atlético e nem Felipão saem satisfeitos dessa relação, que já indicava que o caminho não seria dos melhores desde a contratação sem sentido olhando apenas para o campo.