A temporada europeia terminou. Quer dizer, ainda há alguns jogos de acesso nas divisões inferiores, mas a final da Champions League marca o fim dos principais campeonatos. Agora, as atenções voltam para as seleções durante a próxima semana, antes de entrarmos de vez nas férias, sem uma grande competição masculina para este verão do velho continente. Enquanto isso, as movimentações serão principalmente nos bastidores, e este parece ser um mercado que será bastante aquecido: há clubes poderosos precisando de reformulações, novos ricos, estrelas aparentemente disponíveis e uma nova potência mundial pagando muito mais do que deveria para atrair nomes famosos.
A reformulação do Real Madrid
Não há nada mais perigoso no mercado de transferências do que um Real Madrid com desejo, recursos e necessidade de contratar. Então, crianças, tranquem as portas. Jude Bellingham foi o primeiro grande reforço, continuando a renovação do meio-campo. De Casemiro, Modric e Kroos para Camavinga, Tchouaméni e Bellingham, e ainda com Federico Valverde, confortável em mais de uma posição. A reformulação do ataque provavelmente será mais profunda do que Florentino Pérez esperava. Mariano Díaz foi dispensado e não fará muita falta. Ele conseguiu convencer Eden Hazard a rescindir contrato, a um ano do fim, o que já abriu um espaço enorme na folha salarial. Marco Asensio acabou não renovando, apesar de momentos na temporada em que parecia que permaneceria. E a proposta da Arábia Saudita foi grande demais para Karim Benzema resistir. As saídas desses quatro jogadores deixaram o Real Madrid com apenas dois atacantes adultos, Vinícius Júnior e Rodrygo. Brahim Díaz retornou de um bem sucedido empréstimo ao Milan para ajudar a compor o setor. Ainda há um buraco enorme no lugar que era ocupado por Benzema, a referência técnica desde a saída de Cristiano Ronaldo. Certamente pelo menos um grande investimento para o departamento de criação e conclusão de chances de gol será feito. E, bom, talvez a gente até já saiba quem será.
A novela Kylian Mbappé
Era uma segunda-feira tranquila, quieta, meio parada, fim da temporada europeia, até o L’Equipe publicar que Kylian Mbappé comunicou ao Paris Saint-Germain que não renovará contrato até 2025 e, desta vez, o clube está determinado a não correr o risco de perdê-lo de graça. Pode ser apenas uma tática de negociação para melhorar ainda mais os termos. Ele também deixou claro nesta terça-feira que quer passar o próximo ano na capital francesa. Os interesses não parecem estar alinhados, e estamos no começo de uma titânica queda de braço. O problema para o PSG é encontrar alguém disposto a pagar uma monumental taxa de transferência, na casa dos € 150 milhões, por um jogador que não a exigirá daqui a um ano. Poucos teriam a coragem de bancar um gasto desnecessário… e a sorte dos catarianos é que o Real Madrid é um deles. Eden Hazard também tinha apenas mais uma temporada em seu contrato quando foi vendido pelo Chelsea por mais de € 100 milhões. Florentino Pérez pode preferir aproveitar a oportunidade de ter um dos melhores jogadores do mundo para reforçar seu time e sua máquina midiática, sem correr o risco de entrar em um leilão, talvez contra clubes mais endinheirados, daqui a um ano. E quem mais pode entrar na briga? O Manchester United teria os recursos, precisa de jogadores e pode ser comprado por um banqueiro do Catar, o que talvez ajude a amenizar a ferida no orgulho do PSG. Nunca podemos descartar o Chelsea. Com Todd Boehly, o Chelsea é um potencial comprador de qualquer jogador do mundo. E, empolgados, os torcedores do Newcastle fizeram montagens de Mbappé vestindo preto e branco assim que a Arábia Saudita chegou.
E a novela Neymar?
E se estamos falando de estrelas do PSG que podem estar de saída, Neymar é o próximo da lista. Ou o primeiro na verdade. Os jornais franceses publicaram que o clube deseja se desfazer da contratação mais cara da história, mais um passo para mudar o perfil do elenco, do excesso de estrelas para um foco maior em desenvolvimento e encaixe – o caminho certo, por mais que a primeira execução tenha sido trágica. Neymar trocou o campo pelo departamento médico no final de fevereiro e, mais uma vez, disputou apenas metade do Campeonato Francês. Em seis temporadas na Ligue 1, ele nunca fez mais do que 22 rodadas. Não é exatamente o rei do custo-benefício, além de todas as distrações fora de campo. Esse pacote nos leva ao principal problema: quem banca? Neymar custaria caro e exigiria um salário alto. São poucos os clubes que conseguiriam pagá-lo e, dentro desse grupo, menos ainda o que achariam uma boa ideia. O Chelsea novamente pinta como a principal opção. Ele também foi especulado em Manchester United e Newcastle. Um retorno ao Barcelona parece impraticável pelas restrições financeiras que o impediram de trazer Lionel Messi de volta. A Arábia Saudita seria uma opção, mas, aos 31 anos, seria cedo demais para se afastar do mais alto nível. Então talvez ele só fique no PSG mesmo.
O meio-campo do Liverpool
O Liverpool nem sempre encara o mercado com agressividade. Jürgen Klopp acredita em continuidade e desenvolvimento. Não será o caso dessa vez. A última temporada foi complicada, para dizer o mínimo, e a ausência de Champions League pode atrapalhar os planos. O foco principal é o meio-campo, onde há uma clara racha entre gerações: jogadores importantes, mas na casa dos 30 anos, ou perto, que apresentaram sinais de desgaste, como Jordan Henderson, Fabinho e Thiago, e garotos que ainda precisam crescer, como Curtis Jones, Harvey Elliott e Stefan Bajcetic. Para competir no mais alto nível, precisa haver pontes entre eles. Alexis Mac Allister foi um ótimo começo, principalmente pelo preço (entre £ 35 milhões e £ 55 milhões) porque abre espaço para chegarem outros nomes. Pelo menos um, talvez mais dois. Os principais alvos parecem ser Khéphrem Thuram, do Nice, e Manu Koné, do Borussia Mönchengladbach, mas a indústria de especulações está a todo vapor, com nomes como James Ward-Prowse, do Southampton, o garoto Arda Güler, do Fenerbahçe, e até Federico Valverde, do Real Madrid. A defesa também pode receber um pouco de atenção. Virgil Van Dijk caiu de rendimento, Ibrahima Konaté sofreu com lesões, e as outras opções continuam sendo Joel Matip e Joe Gomez, que segue sem convencer. O Liverpool emprestou o lateral direito Calvin Ramsay, um jovem que teve poucas chances por causa de problemas físicos, e novamente se encontra sem um reserva para Trent Alexander-Arnold, além das improvisações. E uma delas, James Milner, estava na barca dos dispensados.
A caça por um centroavante
Pelo menos três clubes importantes (e ricos) estão atrás de um centroavante. Ou seria bom que encontrassem um porque a última temporada mostrou uma clara lacuna nessa posição. O Bayern de Munique sempre estaria nesse mercado. Na prática, trocou Robert Lewandowski por Eric Maxim Choupo-Mouting, e curiosamente não teve um ataque tão potente. Outras necessidades dos bávaros estão sendo preenchidas com oportunidades. O meia Konrad Laimer já foi confirmado, e Raphaël Guerreiro deve ser o próximo contratado sem taxa de transferência. A cúpula de futebol da Allianz Arena foi reformulada, após uma temporada muito complicada, e vale acompanhar qual impacto a mudança terá na estratégia. O Manchester United também quer um fazedor de gols. Contratou Wout Weghorst para quebrar o galho, revezando Anthony Martial, com problemas físicos, e Marcus Rashford, que gosta de ter mais liberdade pelos lados. O problema: falta oferta. O primeiro nome naturalmente acaba sendo Harry Kane, fora de competição europeias na próxima temporada, após mais um ano em que passou longe de conquistar o seu primeiro título. Mas o presidente do Tottenham, Daniel Levy, faz jogo duro nas negociações e, para desanimar os Red Devils, privilegiaria não negociá-lo com a Premier League. Dizem que o Real Madrid tentou e ficou assustado com os valores. Os merengues, aliás, são o terceiro integrante desse grupo, agora que perderam Karim Benzema. Além de Kane, outro nome forte seria Victor Osimhen. Aurelio de Laurentiis também costuma ser casca grossa nas conversas e já descartou negociar o nigeriano. Deve ter ainda mais resistência depois de perder um dos destaques do título, o zagueiro Kim Min-jae, próximo de acertar com o United. Depois desses dois, o mercado fica um pouco mais escasso. Lautaro Martínez vira e mexe entra nas listas, mas não seria fácil tirá-lo da Internazionale. A Juventus pode precisar fazer dinheiro com Dusan Vlahovic. Randal Kolo Muani, uma revelação pelo Eintracht Frankfurt, exigirá uma taxa de transferência bem alta. Em um mercado mais modesto, estão apostas, como Rasmus Hojlund, da Atalanta, ou Gonçalo Ramos, jovem do Benfica que deixou Cristiano Ronaldo no banco de reservas na Copa do Mundo.
A liquidação do Chelsea
Uma das anedotas da demissão de Graham Potter contava que tão grande ficou o elenco do Chelsea que não havia lugar para todo mundo sentar nos vestiários durante preleções. Eles tinham um time, mas aí o novo dono, Todd Boehly, descobriu as maravilhas da amortização (quando o valor da transferência, para fins contábeis, é dividido pela duração do contrato) e comprou mais um time. É até difícil imaginar quem pode ficar ou quem pode sair porque não é que o campo deu muitas respostas para o 12º colocado da Premier League. Reforços importantes do começo da temporada, como Kalidou Koulibaly, Marc Cucurella, Aubameyang e Raheem Sterling já parecem sem espaço. Mason Mount quase com certeza será vendido, com o Manchester United na dianteira, e Mateo Kovacic deve acertar com o Manchester City. N’Golo Kanté está prestes a se tornar um homem muito, muito rico graças a uma proposta da Arábia Saudita, e Hakim Ziyech entraria com um requerimento na Câmara dos Lordes se for obrigado a encarar mais um ano no banco de reservas de Stamford Bridge. O incrível é que isso ainda deixaria o Chelsea com uns 30 jogadores, e alguns, como Andrey Santos e Malo Gusto, nem chegaram. É impossível citar todos que estão com um pé para fora da porta, mas vale a pena esperar para ver quem Mauricio Pochettino deseja manter porque certamente pintarão muitas oportunidades. O mesmo vale para o Leicester, aliás. Dos clubes rebaixados da Premier League, é o mais interessante porque boa parte da espinha dorsal continua por lá. Aston Villa e Atlético de Madrid já aproveitaram para levar Youri Tielemans e Caglar Söyüncü. Há jogadores em fim de contrato ou a um ano de estar nessa situação que podem ser contratados sem taxa de transferência ou por valores mais módicos – entre os mais interessantes, Ayoze Pérez, Wilfred Ndidi e James Maddison. Mas praticamente todo mundo está na mesa porque as Raposas precisam baixar a folha salarial para disputar a segunda divisão.
Como vender e melhorar ao mesmo tempo?
A Juventus está em uma situação difícil. Não terá receitas da Champions League na próxima temporada e, como não pode mais cometer fraudes financeiras, provavelmente terá que vender jogadores para equilibrar as contas. Há estimativas de até € 130 milhões na imprensa italiana. E, ao mesmo tempo, precisa melhorar. Mesmo sem a dedução de dez pontos, não teria sido nem vice-campeão da Serie A, e a eliminação na fase de grupos da Champions League não envolveu nenhuma sanção disciplinar. A segunda temporada de Massimiliano Allegri foi melhor do que a primeira. A Velha Senhora foi mais competitiva e teve algumas ótimas sequências, mas ainda está longe do patamar de outros tempos. Ángel Di María e seu enorme salário foram embora após um ano em Turim. Nomes importantes que podem atrair um bom valor são Dusan Vlahovic e Federico Chiesa. Adrien Rabiot e Juan Cuadrado estão no fim dos seus contratos e seria um passo atrás perder dois jogadores experientes que costumam ajudar. No outro lado da brincadeira, a Juventus está ligada a negócios pro Christian Pulisic e Nicolò Zaniolo – que forçou a sua saída da Roma e passou os últimos meses sendo campeão turco pelo Galatasaray.
O Newcastle vai com tudo?
O Newcastle chegou à Champions League na primeira temporada completa desde a aquisição do Fundo Soberano da Arábia Saudita, mas os méritos são mais do ótimo trabalho de Eddie Howe do que de um gasto exagerado de fundos petrolíferos. Mas não é à toa que está aparecendo em todas as listas de especulações de grandes nomes porque agora, além do cartão de crédito do xeique, conta com as receitas da principal competição europeia para investir, o que é bom até para o Fair Play Financeiro. Por isso também, mais de uma dúzia de jogadores podem sair. Alguns jogadores ficaram para trás diante das novas pretensões dos Magpies, como Isaac Hayden, Jeff Hendrick, Ryan Fraser, Karl Darlow, Matt Ritchie e Loris Karius. Outros podem ser vendidos para reforçar o orçamento de transferências. O Newcastle pensa em quatro ou cinco reforços. Um meia central, como James Ward Prowse ou Scott McTominay. Mais à frente, o interesse sempre foi alto em James Maddison, e o rebaixamento do Leicester pode ajudar. Outro nome especulado no St. James Park é o de Dominik Szoboszlai, do RB Leipzig, que deve ser bem caro. Além de dois jogadores de meio-campo, um lateral esquerdo interessa, apesar do bom rendimento de Dan Burn improvisado na posição. Um zagueiro para competir com Fabiän Schar e outro jogador de lado de campo também estão na lista.
Como o Dortmund reinvestirá o dinheiro de Bellingham?
O Borussia Dortmund está em uma posição familiar: fez uma grande venda e agora precisa reinvestir. Ano passado, o dinheiro de Erling Haaland foi espalhado em Sébastien Haller, Karim Adeyemi e Nico Schlotterbeck. Anos atrás, Christian Pulisic, negociado em janeiro com o Chelsea, ajudou a financiar um pacote com Mats Hummels, Nico Schulz, Thorgan Hazard, Julian Brandt e Paco Alcácer, que chegaram alguns meses depois. Agora, entraram mais de € 100 milhões por Jude Bellingham. Embora o Dortmund prefira investir em jovens talentos para desenvolver e fazer a roda girar, quando perde um jogador tão importante quanto Bellingham, às vezes traz um reforço mais veterano para continuar competitivo – como Haller para o lugar de Haaland. Quem com certeza se encaixaria nesse perfil é Ilkay Gündogan, prestes a deixar o Manchester City. O retorno ao Signal Iduna Park foi especulado, mas seu destino mais provável ainda é o Barcelona, e o jovem meia Felix Nmecha, do Wolfsburg, aparece no topo da lista de concorrentes. Para outro setor, um nome forte é Edson Álvarez, zagueiro do Ajax. O Dortmund também perdeu Raphaël Guerreiro, que deve acertar com o Bayern de Munique sem taxa de transferência. Foi esperto, porém, e já garantiu Ramy Bensebaini, um dos melhores laterais esquerdos da Bundesliga, também sem precisar compensar o Borussia Mönchengladbach.
Quem mais irá para a Arábia Saudita?
Às vezes isso acontece, e algum país de repente vira quase um mercado paralelo que paga valores acima da média para atrair nomes fortes. A Superliga Chinesa teve o seu momento recentemente, embora não tenha chegado nem perto do tamanho dos jogadores que a Arábia Saudita está levando. Depois de Cristiano Ronaldo, arrebatou Karim Benzema. Está próxima de anunciar N’Golo Kanté, um multicampeão da Premier League, e estamos usando o país como sujeito porque o projeto oficialmente se tornou nacional após o governo assumir o controle dos quatro principais clubes. As aproximações mais recentes incluem Riyad Mahrez, Romelu Lukaku, Roberto Firmino, Aubameyang e Sergio Ramos. Os técnicos também estão cobiçados, com Massimiliano Allegri ponderando proposta do Al Hilal e Steven Gerrard na mira do Al Ettifaq. A equação é simples: abrir mão do alto nível do futebol europeu em troca de um valor pornográfico de dinheiro? Quanto mais próximos os alvos estiverem do fim das suas carreiras, mais propensos estarão a aceitar a aventura.