Brasil

Tite vai de esperança a decepção no Flamengo, mesmo que 2024 ainda não tenha terminado

Relação com a torcida está (muito) estremecida, e Adenor precisa encontrar soluções em meio ao clima hostil

O momento mais agudo de 2024 fez com que Tite recebesse muitas críticas. Em meio aos inúmeros problemas de lesões, o treinador chegou ao ápice da ruptura com a torcida do Flamengo na derrota para o Peñarol, pelas quartas de final da Copa Libertadores.

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Como o próprio comandante frisou, a confiança do torcedor só será conquistada com vitórias e títulos importantes. O Flamengo segue vivo nas três competições (Brasileirão, Libertadores e Copa do Brasil), mas a participação no torneio continental respira por aparelhos.

Pensando no contexto, a Trivela preparou uma espécie de raio-x do trabalho de Tite no Flamengo até aqui. Números, planejamento, o elenco em si e as lesões estarão em pauta.

Primeiros meses de esperança

Contratado depois da passagem conturbada de Sampaoli pelo Flamengo, Tite atuou como bombeiro no seu início no clube. Aos poucos, o treinador conseguiu retomar a confiança do elenco, algo que tinha se perdido ao longo dos últimos meses e foi importante para a arrancada da equipe no Brasileirão.

A campanha de recuperação fez com que o Flamengo cumprisse o objetivo de terminar a liga entre os quatro primeiros. Poderia até ter sido melhor, já que os rubro-negros chegaram a brigar pelo título com a derrocada para o Botafogo, mas pontos importantes foram deixados para trás, e a derrota no Maracanã para o Atlético-MG selou o destino.

Mesmo com as frustrações de um ano terrível, Tite retomava a esperança, tanto dentro quando fora, nos bastidores do clube. Ele acumulou sete vitórias nos seus primeiros 12 jogos, e as quatro derrotas vieram maisda  falta de assimilação de ideias do que de erros da comissão técnica. O cenário era de otimismo.

Carioca é o ápice do trabalho de Tite no Flamengo

Essa confiança só ganhou mais corpo com uma campanha praticamente perfeita no Campeonato Carioca. Quando teve Tite na área técnica, o Flamengo não perdeu nenhuma das 13 partidas que disputou. Para melhorar, a equipe também não sofreu nenhum gol.

A única vez que a meta rubro-negra foi vazada no Estadual, os profissionais estavam na Flórida em pré-temporada. Curiosamente, o atacante Carlinhos, que seria contratado pelo Flamengo dias depois, marcou o gol no empate por 1 a 1 em João Pessoa.

Sem dúvida, esse foi o grande momento de Tite no Flamengo. A equipe dominava totalmente os seus adversários com um futebol envolvente, sempre buscando o gol. Nem mesmo os rivais puderam escapar e nem conseguiram marcar um golzinho nos rubro-negros.

Tite conquistou seu primeiro título pelo Flamengo (Foto: André Durão)

O título só mostrou o tamanho das expectativas para o Flamengo em 2024. Apesar disso, ele também acabou cobrando o seu preço.

Erros no planejamento

Não é segredo para ninguém que a diretoria, alinhada com a comissão técnica, tratou o Carioca como prioridade em 2024. As derrotas para o Fluminense nas duas edições anteriores fizeram com que o título se tornasse questão de honra para os rubro-negros. Por isso, o clube optou por força máxima a longo de toda a competição.

Tal decisão acabou tendo consequências importantes no início do Brasileirão, Copa do Brasil e Libertadores. Abril já foi o primeiro mês no qual o ambiente do Flamengo ficou mais conturbado, diante dos primeiros tropeços e lesões de 2024. Ao todo, a equipe teve oito problemas físicos naqueles 30 dias.

Segundo Fábio Mahseredijan, preparador físico do clube, o planejamento não pesou para o acúmulo de lesões da equipe.

— O Carioca acabou em abril. Com certeza que esse não foi o fato de em alguns jogos a performance física pode ter influenciado. Isso aconteceu do final de janeiro, fevereiro, março e abril? Então com certeza não. O que posso afirmar é que a sequência agora, 13 jogos consecutivos, jogos decisivos contra equipes de altíssimo nível… Como foi o Palmeiras por exemplo, jogando três jogos seguidos contra eles e em condições adversas para nos, que é o gramado sintético. Tudo isso vem influenciar, mas eu não vejo tantos jogos assim de termos desequilíbrio físico no final das partidas — explicou, após a derrota para o Corinthians, no dia 01 de setembro.

Fato mesmo é que, depois da turbulência, o Flamengo viveu um período menos conturbado. Os protestos da torcida deram resultado, e a equipe começou a apresentar o bom futebol visto no Campeonato Carioca. Nem mesmo durante Copa América o time caiu de rendimento e conseguiu se manter na liderança do Brasileirão, ainda que com desfalques em boa parte do período.

O fim de julho se aproximava, e o Flamengo chegava ao seu período mais importante de 2024. Vivo nas três competições, o clube precisaria se desdobrar. Mas foi justamente aí que os rubro-negros não conseguiram suportar o ritmo.

Teimosia e lesões pesam

Os problemas físicos deram o tom de um agosto que mudou os rumos da temporada do Flamengo. Alinhado com a diretoria, Tite não poupou e manteve a força máxima durante todo o período. O resultado? Muitas lesões: foram 12 só naquele mês, sendo duas pelo resto da temporada, em Cebolinha e Matias Viña.

Nesse período, o Flamengo até conseguiu se classificar, tanto na Libertadores quanto na Copa do Brasil, mas não da maneira que a torcida imaginava. Contra o Palmeiras, a equipe amassou na ida e foi amassada na volta, passando com fortes emoções. Mesma coisa diante do Bolívar, na altitude de La Paz.

Os resultados vieram com um preço: o clube ficou mais distante do título brasileiro. Tentando conciliar as três competições, o Flamengo acabou perdendo fôlego na liga e não conseguiu se manter entre os líderes. Aos poucos, ficou claro que o planejamento não funcionaria.

O Flamengo precisa quebrar inúmeros tabus se quiser voltar de Montevidéu com a classificação (Foto: Celso Pupo/IMAGO)

As lesões ainda fizeram com que o departamento de futebol fosse ao mercado de maneira tardia e desesperada em busca de reforços que supririam as ausências de Cebolinha e Viña. As contratações de Alex Sandro, Gonzalo Plata e Charly Alcaraz foram boas, mas o tempo de adaptação é curto.

Setembro chegou com a pior notícia possível para o Flamengo: Pedro, centroavante artilheiro do Brasil e destaque do time em 2024, sofreu uma grave lesão no joelho, após o fechamento da janela. O departamento de futebol manteve a confiança em Gabigol e Carlinhos, mas, por enquanto, não deu resultado.

Ainda em setembro, o Flamengo se classificou para a semifinal da Copa do Brasil com atuações seguras diante do Bahia, além de amassar o Vasco em empate injusto no Maracanã. A derrota para o Peñarol, contudo, veio na pior hora possível para os rubro-negros.

Primeiro, a teimosia vista em outras partidas apareceu na escalação, quando Léo Ortiz, melhor volante do Flamengo em 2024, mesmo sendo zagueiro, foi para o banco. A tragédia parecia anunciada com Pulgar, que forçou passe desnecessário na origem do gol do Peñarol. Péssima atuação e a derrota em casa.

Pior ainda quando se observa como o Flamengo entrou em campo. Pouquíssimas foram as oportunidades que De La Cruz, Gerson e Arrascaeta jogaram juntos, formando uma espécie de quarteto no meio-campo. Fugiu do 4-3-3 clássico e deu errado.

Chegamos ao momento atual. Tite vive relação arranhada com o torcedor do Flamengo e está ciente de como pode recuperar a confiança. A Trivela entende que as chances de demissão caso seja eliminado da Libertadores são inexistentes. O comandante deve terminar o ano no clube, com ou sem títulos.

E mesmo que conquiste algum título de expressão, o trabalho de Tite já é uma decepção no Flamengo. Um clube bilionário, com a comissão técnica brasileira mais forte e um elenco entre os melhores da América não poderia estar nessa situação dentro de campo.

Os números de Tite pelo Flamengo

65 jogos (40 vitórias, 15 empates e 10 derrotas)
69% de aproveitamento
+58 de saldo (105 gols marcados e 47 sofridos)
1 título (Campeonato Carioca)

Sem contar com o Estadual
52 jogos (29 vitórias, 9 empates e 15 derrotas)
61% de aproveitamento
+30 de saldo (77 gols marcados e 47 sofridos)
Nenhum título

Foto de Guilherme Xavier

Guilherme XavierSetorista

Jornalista formado pela PUC-Rio. Da final da Libertadores a Série A2 do Carioca. Copa do Mundo e Olimpíada na bagagem. Passou por Coluna do Fla e Lance antes de chegar à Trivela, onde apura e escreve sobre o Flamengo desde 2023.
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