A reação raivosa de Luxemburgo e cia com a onda de técnicos estrangeiros faz sentido?
Nem todos os treinadores antigos brasileiros receberam Carlo Ancelotti na Seleção com bons olhos

Semana passada, a CBF fez questão de demonstrar apoio para o seu novo técnico. Na apresentação de Carlo Ancelotti, Felipão estava no palco e Parreira apareceu em um vídeo fraternal exibido em um telão.
Mas a gente sabe que nem todos os técnicos brasileiros pensam igual. O Vanderlei Luxemburgo está liderando a reação raivosa da velha guarda. Não tem nada contra o Ancelotti, frisou na televisão. Mas “os técnicos no Brasil passaram a não prestar? Aqui, nós somos cachorros vira-latas. E a grande verdade. Nós aqui não prestamos, e o de fora vem aqui e presta muito mais.”
Concordo com o Luxa que, historicamente, os técnicos brasileiros têm sido subvalorizados. Com o Brasil, o crédito sempre vai para a genialidade dos jogadores e a culpa para a burrice de quem os comanda. É injusto.
Mas o desempenho dos últimos anos — especialmente da Seleção nas mãos de Diniz e Dorival — é um argumento bem forte para a necessidade de importar um comandante.
O que aconteceu, então, com os locais?
O próprio Luxemburgo detesta ser chamado de ultrapassado. Pode ter razão. Por outro lado, lembro bem o auge de Luxemburguismo, aquele período por volta de 1998, quando foi nomeado técnico da seleção brasileira.
Admita: você não esperava receber o Luxa quebrando tudo na Sapucaí 😂😮 Mais uma relíquia do @_andreyray com a Trivela 🤝
— Trivela (@trivela) February 28, 2025
Imagens: TV Globo e TV Manchete e Jornal do Brasil
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Falava muito nos seus coletivos do aspecto tático do jogo. Argumentava que não ia ter nada de novo, nunca. Que tudo já tinha sido feito. E daí em diante, só dava para melhorar o desempenho individual do jogador, e não o coletivo.
Na época, ficava em dúvida. Será?
Hoje em dia, dá para ver quanto ele errou.
Deveria ter sido óbvio. Porque, melhorando os onze jogadores, é lógico que aparecem novas possibilidades coletivas. Um goleiro proficiente com os pés, por exemplo, vira um jogador a mais, permitindo uma saída da bola com a linha da defesa mais alta. O time inteiro com um condicionamento físico melhor, por exemplo, abre as chances de pressionar o adversário de uma maneira que não seria possível nos anos 90.
Pouco disso vingou no Brasil — por motivos claros. As condições de trabalho dos técnicos aqui são deploráveis. Não tem tempo para treinar, com tantos jogos e viagens. Não tem tolerância para novidades, pois três derrotas seguidas normalmente são suficientes para pôr um fim em qualquer trabalho. A consequência é que o futebol brasileiro desenvolveu técnicos sobreviventes, tachados para manter um emprego dentro de um sistema deficiente.
A estrada até um técnico estrangeiro na Seleção começou a ser pavimentada a partir da chegada de Jorge Jesus em 2019. O português armou o Flamengo de uma maneira que dificilmente um local faria na época, e o resultado foi um período mágico. E desde então, quase todos os melhores técnicos no futebol brasileiro tem sido estrangeiros.

Isso é fase. O fator mais importante é a reação dos locais. Podem tratar isso como uma inspiração, uma oportunidade de aprender e se superar — como aconteceu no passado, quando tantos técnicos brasileiros foram melhorados competindo com e contra nomes como Ondino Viera, Fleitas Solich e Bela Guttman.
Alternativamente, podem mergulhar num poço de pena de si, brigando com os fatos e reclamando que estão enfrentando uma concorrência desleal de favorecidos de fora.
Parece que a gente está vendo um excesso do último e uma insuficiência do primeiro. Isso é futebol. Ninguém ganha nada de graça. Se os técnicos brasileiros estão a fim de recuperar a sua grandeza, mãos à obra — e pode usar as mesmas mãos para jogar fora essa capa deprimente de autopiedade.