Cartão corporativo e acordos nebulosos levaram conselho do Corinthians a reforçar atuação contra Augusto
Reportagem da Trivela teve acesso ao parecer e apresenta os pontos deixados em aberto pela direção corintiana
Na última segunda-feira (25) os membros do Conselho de Orientação do Corinthians (Cori) se reuniram e votaram favoravelmente em unanimidade o parecer que indica o afastamento em definitivo do presidente Augusto Melo por atos temerários de gestão.
Como a Trivela já havia informado, a apuração do Cori apontava diversas inconsistências em documentos e contratos relativos às contas do clube alvinegro no primeiro semestre que foram reprovadas.
A reportagem teve acesso ao parecer e apresenta os pontos deixados em aberto pela direção corintiana que levaram o Conselho de Orientação a recomendar o afastamento de Augusto Melo.
O documento foi encaminhado ao presidente corintiano e também Romeu Tuma Júnior, que preside o Conselho Deliberativo.
Gastos através do cartão corporativo
De acordo os departamentos financeiro e administrativo do Corinthians, o clube possui apenas um cartão de crédito corporativo.
Somados, os gastos entre janeiro e junho de 2024 através dele são de R$ 2.483.727,15.
- 92.479,53, em janeiro;
- 390.197,84, em fevereiro;
- 371.015,95, em março;
- 356.224,46, em abril;
- 606.320,26, em maio;
- 988.089,11, em junho.
As faturas com o detalhamento das despesas, no entanto, não foram fornecidas pelo clube alvinegro.
O presidente Augusto Melo também possui um cartão corporativo. Este não foi solicitado. De acordo com o próprio dirigente, em entrevista ao jornalista André Henning, da TNT Sports, o limite é de mil reais e ele não está sendo utilizado.
— Não existe gestão temerária. Por exemplo, tenho um cartão corporativo de mil reais e não gastei um real. Eles (Cori) já pediram meu extrato bancário, sendo que não são nem o órgão responsável para isso — afirmou Augusto em entrevista ao jornalista André Henning, da TNT Sports.
Contrato com a Ernst & Young
O contrato de três anos do Corinthians com a empresa de consultoria foi rompido seis meses após a assinatura, por conta de divergências entre as partes.
No entanto, não ficou claro o valor pago pela equipe alvinegra durante o período de vigência do acordo com a EY.
Foi firmado inicialmente um contrato principal com outros feitos em complementação conforme novos acordos fossem realizados. Segundo o parecer do Cori, os valores envolvidos somados podem ultrapassar a quantia de R$ 13 milhões.
A conclusão do Conselho de Orientação corintiano é que alguns desses contratos se mostravam onerosos para o clube.
Também foi destacado o pagamento de R$ 6,5 milhões para a realização de uma Duo Diligence contábil e financeira, que constitui em um estudo comum no mundo corporativo quando se pretende precificar uma empresa estipulando valor para compra e venda.
Além disso, foi apurada uma cláusula existente no contrato com a Ernst & Young para investigação de diretores de gestões anteriores e seus familiares.
Conforme publicado com exclusividade pela Trivela no dia 15 de outubro, o assunto gerou indisposição entre o ex-presidente Andrés Sánchez e o presidente Augusto Melo, que negou a existência da cláusula.
No entanto, isso foi contradito por Romeu Tuma Júnior, presidente do Conselho Deliberativo na data em questão e reforçado através da análise do Cori no avaliação do contrato entre Corinthians e Ernst & Young.
Contrato com a Alvarez & Marsal
Após o encerramento do vínculo com a Ernst & Young, o Corinthians firmou contrato com Alvarez & Marsal, onde foi designado que Fred Luz seria o único consultor designado. Inclusive com previsão de rescisão unilateral no caso de impossibilidade de atendimento do profissional, que atualmente possui poderes de CEO no clube alvinegro.
O custo da parceria com a empresa de consultoria é de R$ 300 mil mensais mais duas parcelas de R$ 250 mil pagas em diferentes momentos – 10 dias após a assinatura do contrato, em junho, e novamente no dia 12 de agosto.
Atenta-se, no entanto, que a assinatura do contrato foi feita 23 dias após o início dos trabalhos da empresa no Corinthians, que ocorreu em 1° de julho.
Além disso, foi estabelecido o pagamento de um valor variável atrelado ao atingimento de metas estabelecidas em consenso. Esses objetivos, porém, não foram apresentados para análise do Cori. Também não foi entregue ao conselho o aditamento do contrato que o clube anunciou ter feito.
O vínculo entre Corinthians e Alvarez & Marsal transitou no compliance do clube onde foram apontadas diversas bandeiras vermelhas por conta de conflitos classificados.
O Cori, por sua vez, não foi informado se as mudanças solicitadas foram efetivamente feitas.
Empréstimos com bancos privados
Foram apresentados pela diretoria corintiana quatro contratos de empréstimos com instituições bancárias: dois com o Banco Daycoval, um com a Volter Investiments e outro com a Brucker Investimentos.
Porém, não foram mostradas as composições e movimentações da conta, o que deixou em aberto se todos esses acordos financeiros foram fornecidos.
Na segunda operação com o Daycoval, no valor R$ 10.193.866,69, o contrato não possui assinatura do banco e de testemunhas.
Confira abaixo todas os empréstimos bancários feitos pelo Corinthians no primeiro semestre:
- Banco Daycoval, primeira operação: R$ 7.136.386,06, com pagamento em 10 parcelas entre junho de 2024 e março de 2025. Taxa de juros de 2,2% ao mês. Com 70% do Fiel Torcedor e 50% das rendas das partidas apresentadas como garantias. O presidente Augusto Melo e o diretor financeiro Pedro Silveira assinaram o contrato;
- Banco Daycoval, segunda operação: R$ 10.193.866,69, com pagamento em 10 parcelas entre junho de 2024 e março de 2025. Taxa de juros de 2.2% ao mês. Sem garantias apresentadas e sem assinaturas do banco e de testemunhas.
- Volter Investiments: R$ 7.700.000,00. Contrato com prestação única com 73 dias de prazo. Juros de R$ 188.711,40. No total, pagamento de R$ 7.888.711,40 + CDI.
- Brucker Investimentos (empresa do Rio Grande do Sul): operação com o valor de R$ 5.000.000,00 com taxas de juros de 1% ao mês mais IPCA. Não foram apresentados detalhes sobre o tempo de parcelamento e os valores das prestações, somente da existência de uma multa de 2% no caso de ausência de pagamento durante o período de seis meses.
Ausência de auditoria externa
Foi apontado pelo Conselho de Orientação que o Corinthians não possui empresa de auditoria externa contratada, dificultando assim os órgãos fiscalizadores a avaliarem balanços e prestações de contas.
De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, a ausência desse tipo de serviço em instituições com as responsabilidades e regulamentações a serem cumpridas como é no clube alvinegro é algo incomum.
Também segundo apuração da Trivela, foi informado posteriormente pela direção do Corinthians que há um contrato com a Alvarez & Marsal para a realização de auditoria entre janeiro de 2024 e abril de 2025.
Estatuto Social, Profut e Lei Geral do Esporte embasaram pedido de afastamento de Augusto Melo em parecer do Cori
A recomendação de abertura de processo que pode culiminar no afastamento definitvo de Augusto Melo pelo Conselho de Orientação é embasado nos artigos 59 da Lei Geral do Esporte e 106 do Estatuto Social do Corinthians.
Ambos falam justamente sobre os princípios de gestão no âmbito esportivo.
Por conta do aumento do endividamento e da folha salarial, o Cori classifica que houve ausência de responsabilidade corporativa, além da falta de transparência em relação às questões levantadas na matéria, o que levou, como consequência, à reprovação das contas.
Com isso, classificou-se que o primeiro semestre da gestão administrativa do Timão, liderada pelo presidente Augusto Melo, configura-se como temerária.
Diretoria do Corinthians trabalha nos bastidores para apresentar defesa em pedido de afastamento contra Augusto Melo
Os atos de gestão temerária apontados pelo Cori não fazem parte do pedido de afastamento definitivo contra Augusto Melo que será votado nesta segunda-feira (2) no Conselho Deliberativo.
No entanto, as alegações podem gerar um novo processo de destituição do presidente corintiano.
Antes, Augusto terá o direito de apresentação da defesa através da Comissão de Ética e Disciplina.
Inclusive, Roberson de Medeiros, presidente do órgão, participou da reunião do Cori e dará encaminhamento.
A direção corintiana recebeu os documentos no fim da tarde desta quinta-feira (28) e desde então os departamentos financeiro e jurídico passaram a analisar.
Em contato feito pela reportagem, foi informado que qualquer posicionamento será feito somente após essa análise dos setores responsáveis.