Inglaterra

Oito histórias sobre Alex Ferguson para comemorar os 80 anos de uma das maiores lendas do futebol

O maior técnico da história do Manchester United (e talvez de todos os tempos) faz aniversário no último dia do ano

Qual o maior técnico da história? As opiniões podem divergir, mas em nenhuma lista Alex Ferguson ficará muito longe da primeira posição. Basta pensar que, quando o escocês chegou a Old Trafford, o Manchester United tinha sete títulos ingleses. Quando ele saiu, tinha 20. Foram 1.498 jogos ao longo de 27 anos à frente dos Red Devils. Também conquistou um título europeu pelo Aberdeen e treinou a seleção escocesa em uma Copa do Mundo.

Um dos técnicos mais temidos pela ferocidade com que dava broncas, comparadas à potência de um secador de cabelo, hoje em dia Ferguson é um senhor aposentado que acompanha os jogos do Manchester United sempre que possível, como o fez na última quinta-feira, na vitória por 3 a 1 sobre o Burnley, um dia antes de completar 80 anos de muitas conquistas e muitas histórias. Separamos oito para comemorar essa data.

“Nenhuma habilidade administrativa”

Alex Ferguson (Foto: Getty Images)

Grande exemplo de longevidade no cargo de técnico de futebol, teve um dia em que Alex Ferguson foi demitido. A primeira revolução que ele conduziu foi à frente do St. Mirren, pelo qual conquistou a segunda divisão da Escócia em 1976/77. O sucesso havia chamado a atenção do Aberdeen e, em maio de 1978, ele decidiu que era a hora de ir. Mas não queria rescindir seu contrato unilateralmente. Ciente do que estava acontecendo, o presidente do St. Mirren, Willie Todd, com quem Ferguson nunca se bicou, o convocou para uma reunião e apresentou uma lista de 15 violações de contrato, incluindo coisas pesadas, como irregularidades fiscais e passar dicas de resultados para apostadores. “As razões para me demitir foram ridículas. Eu não consegui parar de dar risada. Todd estava muito incomodado e pediu para que eu parasse de rir”, contou, em 2003, ao Guardian. Em um texto ao mesmo jornal, o dirigente admitiu que o verdadeiro motivo por trás da demissão era que Ferguson já havia tomado a decisão de ir ao Aberdeen e havia até chamado um jogador para acompanhá-lo, o que seria uma “clara violação de contrato”. Ferguson foi quem acabou processando o clube por causa da demissão, defendendo-se da lista de acusações, mas os tribunais julgaram a favor do St. Mirren, com um parecer que entrou para a história como uma das coisas mais estúpidas que já foram colocadas no papel: disse que Ferguson não “possuía, nem por experiência e nem por talento, nenhuma habilidade administrativa”. Certo.

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O poeta Alex Ferguson

Se tem uma coisa que você não pensa quando olha para Alex Ferguson é em poesia. Ainda assim, foi com um bonito (?) verso que o então técnico do Aberdeen anunciou uma multa a Neale Cooper e John Hewitt, seus jogadores no Aberdeen que, entediados durante uma pré-temporada na Espanha, jogaram uma bola da varanda para descobrir o quão alto ela pularia. Duas coisas deram errado: a bola bateu na borda da piscina, passou por cima da cerca e nunca mais foi vista; e Ferguson estava tomando um solzinho e testemunhou toda a traquinagem. A sanção foi de £ 3 – um valor mais considerável naquela época do que hoje em dia.

Você notará pelo cheque do seu salário

que o multei em três libras

por ter jogado uma bola
do décimo
 andar para o térreo do Hotel.

Eu sei que você não vai gostar

e provavelmente está irritado

Mas, por favor, não me culpe

A culpa é de quem realizou esse truque

Você já deve ter percebido que estou muito alerta

sobre qualquer um estúpido o bastante para repetir essa história

Então, antes que você decida fazer mais pegadinhas

Na próxima vez, não haverá um cheque no banco para você

Alex Ferguson

Poeta laureado por Govan (distrito de Glasgow)

Em inglês pelo menos rima:

A morte de Jock Stein

Alex Ferguson faz parte de uma linhagem de técnicos escoceses da estirpe de Matt Busby e Bill Shankly. Um dos maiores foi Jock Stein, no comando do primeiro clube britânico a conquistar a Copa dos Campeões, em 1967 pelo Celtic. Quase duas décadas depois, a fase de Stein não era tão boa. Estava sendo criticado como técnico da Escócia e precisava de um empate em Cardiff contra País de Gales, à época com jogadores como Ian Rush e Mark Hughes, para se classificar à Copa do Mundo de 1986. Estava desfalcado de Kenny Dalglish e Graeme Souness. A missão era difícil. A tensão era tanta que, durante a preparação para o jogo, Stein decidiu parar de tomar remédios para tratar uma insuficiência cardíaca. Não queria que nada influenciasse o seu trabalho. E acabou pagando caro por isso. Aos 43 minutos do segundo tempo, o árbitro apitou uma falta. Confuso, Stein achou que o jogo havia terminado e se dirigiu para cumprimentar o banco galês. Desabou no gramado. Meia hora depois do apito final, morreu por um edema pulmonar causado pela insuficiência cardíaca.

Alex Ferguson era seu auxiliar. “Eu o segurei quando ele começou a cair”, afirmou, ao Daily Mail em 2012. “Os médicos saíram do túnel. Eu o segurei até o levarem para dentro. Quando eu sai para falar com a imprensa, eu vi Graeme Souness, e ele estava chorando. ‘Acho que ele se foi’, disse Graeme. Eu não conseguia acreditar. Quando fizemos fila para o ônibus, havia milhares de pessoas no lado de fora, e o silêncio triste do clima foi inesquecível. A memória é de um silêncio solene. Era como se o rei tivesse morrido. Em termos futebolísticos, o rei havia morrido”. A partida terminou 1 a 1. Ferguson comandou a Escócia no Mundial de 1986. Caiu na fase de grupos e seguiu para começar a sua história no Manchester United.

1/1.498

Toda grande jornada começa com o primeiro passo. E até mesmo quem comandou quase 1.500 jogos, um dia comandou apenas um. No caso de Ferguson, a primeira impressão não foi a que ficou. Com a moral de ter conquistado o Campeonato Escocês e a Recopa Europeia pelo Aberdeen, além da experiência com a seleção escocesa, Ferguson foi contratado pelo Manchester United para o lugar de Ron Atkinson, que não havia resgatado as glórias da era de Matt Busby, mas pelo menos conquistara duas vezes a Copa da Inglaterra, o que o tornava o técnico mais bem sucedido do clube em 15 anos. A ideia com Ferguson era apostar em um jovem treinador com mentalidade vencedora para tentar superar o quase que se tornou uma marca do trabalho do seu antecessor. Ferguson chegou em novembro e estreou contra o Oxford United, fora de casa. Àquela altura, os Red Devils tinham apenas três vitórias em 13 rodadas do Campeonato Inglês. A derrota por 2 a 0 os levou à 20ª posição, dentro da zona de rebaixamento. O Manchester United ainda empataria com o Norwich antes de Ferguson vencer pela primeira vez, contra o Queens Park Rangers, por 1 a 0, em 22 de novembro, e começar uma recuperação que terminaria em uma aceitável 11ª posição. E o resto, como dizem, é história.

Fergie Time

Quando o Manchester United de Alex Ferguson chegava ao fim de um jogo perdendo ou empatando, os árbitros tinham uma tendência a dar alguns minutinhos a mais de acréscimo. O famoso “até empatar”. Claro que há um componente de lenda nessa história, mas toda lenda tem uma origem. A do Fergie Time é creditada a um jogo contra o Sheffield Wednesday, em abril de 1993, na campanha da primeira Premier League – e do primeiro título inglês de Ferguson. O United perdia até os 41 minutos do segundo tempo quando Steve Bruce (esse mesmo) empatou. Foram dados sete minutos de acréscimo e, no sexto, Bruce marcou novamente para garantir a vitória. Foi a segunda de uma sequência de sete para terminar o campeonato em primeiro lugar com dez pontos de vantagem para o Aston Villa de Roy Atkinson. Talvez não tenha feito tanta diferença para o título, mas está na gênese de uma das marcas da passagem de Ferguson pelo clube.

A propósito, em 2012, a BBC investigou o caso. Ao longo de 20 anos de Premier League, não houve muita consistência no tempo de acréscimo dado aos jogos do Manchester United. Em algumas temporadas, ele ganhava mais que os outros, em outras, menos. No entanto, em um recorte de três anos pouco antes da aposentadoria de Ferguson, o United costumava costumava ter cerca de um minuto a mais de tempo extra quando estava perdendo do que quando estava ganhando. Uma estatística entrevistada pela reportagem, porém, notou que essa diferença não era verdade apenas aos Red Devils, mas a todos os times “fortes”.

O último moicano

David Beckham tem Alex Ferguson como uma figura paterna. Foi o treinador que o promoveu no Manchester United e sob o qual se transformou em astro. Mas, em certo momento, o status de celebridade passou a pelo menos dividir a sua atenção com o futebol em si, o que incomodava o escocês. Em sua autobiografia, escreveu que Beckham nunca mais atingiu o nível de um jogador de altíssimo nível depois que passou a se preocupar mais com a fama do que com a bola. Uma das histórias mais famosas entre os dois é a de uma bronca pesada depois de uma derrota por 2 a 0 para o Arsenal pela Copa da Inglaterra em que Ferguson inadvertidamente deu um pontapé em uma chuteira que acertou Beckham na sobrancelha. Outra mais engraçada é quando Beckham tentou jogar a Supercopa de 2000 em Wembley usando um moicano:

“Antes do Charity Shield de 2000 em Wembley, contra o Chelsea, eu decidi mudar meu cabelo. Fiz um moicano, que eu sabia que não seria do gosto dele. No fim, eu estava com muito medo de deixar que ele o visse, então no dia anterior ao jogo eu fui ao treino usando um gorro, treinei de gorro, voltei ao hotel de gorro e o mantive durante o jantar e no café da manhã no dia seguinte. Eu ainda o estava usando quando pegamos o ônibus para Wembley. Claro que o momento estava chegando quando eu revelaria meu novo corte de cabelo no vestiário, o que eu sabia que o deixaria frenético. E é claro, segundos depois de eu revelar o corte de cabelo, ele gritou comigo: ‘Raspa isso daí’. Eu achei que ele estava brincando. ‘Não, estou falando sério, vai lá e raspa isso daí’. Então eu fui tentar achar um par de tesouras e, pouco antes de irmos ao aquecimento, eu estava no túnel de Wembley raspando meu moicano”.

Um escocês treinando a Inglaterra?

Nunca. Encontrar o treinador certo para a seleção inglesa é um desafio. Para qualquer um. Até Ethan Hunt provavelmente diria “é, essa acho que não dá”. Como melhor técnico do país, Ferguson seria um candidato natural. Mas, primeiro, ele teria que abrir mão do Manchester United. Segundo, ele nunca mais poderia voltar para a Escócia. “O cargo de treinador da Inglaterra me foi oferecido em duas ocasiões. Adam Crozier, diretor executivo da FA entre 2000 e 2002, veio me ver antes de Eriksson ser escolhido em 2001. A primeira vez foi antes disso, quando Martin Edwards era presidente, na época em que Kevin Keegan assumiu o comando, em 1999. De jeito algum eu poderia aceitar o cargo da Inglaterra. Você consegue me imaginar fazendo isso? Um escocês?”, escreveu Fergie em sua autobiografia.

Quando Ferguson deu autógrafos por 45 minutos

Alex Ferguson e Patrice Evra (Divulgação)

É Patrice Evra quem conta. O Manchester United estava em pré-temporada, aquele desânimo, cansado. Após uma partida, os jogadores foram ao ônibus e havia muitos torcedores esperando. Os atletas tentaram evitar o contato e foram direto para as poltronas. Mas aí olharam pela janela e… “Os jogadores estavam pensando: ‘Se ninguém der autógrafos, os outros não precisam dar’. Então fomos direto para o ônibus. Aí, olho pela janela, e vejo Sir Alex Ferguson dando autógrafos para cada um. Juro, ele deve ter dado autógrafo por uns 45 minutos, para todo mundo. Eu disse: ‘Pessoal, quando o chefe entrar no ônibus, estamos perdidos’”. Yeap. “Quem diabos vocês pensam que são? Essas pessoas estão pagando o seu salário. Essas pessoas estão vindo para ver vocês. Agora vão lá e deem autógrafos, porra”, esbravejou Ferguson, segundo Evra. “E então nós tivemos que dar autógrafo para cada um dos torcedores. Mas essa é a mentalidade (certa)”.

 

Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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