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Conte no Tottenham foi uma decepção e quase exatamente o que o seu histórico indicava que seria

O roteiro de atritos e problemas de relacionamento dos seus últimos trabalhos se repetiu, com uma exceção importante: dessa vez ele não ganhou nada

O Tottenham demorou uma semana para tomar a decisão que todos sabiam que tomaria. Depois de Antonio Conte critica com veemência os jogadores após empatar com o Southampton por 3 a 3 no último fim de semana, não havia mais clima para que continuasse. A imprensa inglesa dizia que ele sairia durante a Data Fifa de março, e a confirmação saiu na noite deste domingo. O interino Christian Stellini comandará os últimos 10 jogos dos Spurs, que tentarão uma arrancada para terminar a Premier League entre os quatro primeiros.

A passagem de Conte pelo Tottenham foi curiosamente uma decepção e exatamente o que se poderia esperar. Com uma exceção relevante: ele não ganhou nada. Mas a história apenas se repetiu e está virando um roteiro inescapável ao explosivo treinador italiano. Conte chega ao clube, consegue imediatamente bons resultados, porque é extremamente competente, e ganha moral para fazer demandas em público que nem sempre podem ser atendidas. O seu nível de exigência no dia a dia é altíssimo e, quando os resultados começam a desaparecer, o pacote acaba gerando mais atritos do que motivação.

Os resultados não desapareceram tanto quanto se esconderam. O Tottenham ainda está em quarto lugar, dentro da zona de classificação à próxima Champions League. O Newcastle, com dois jogos a menos, pode ultrapassá-lo, e o Liverpool, encostar, mas está vivo na briga. No entanto, não consegue emplacar uma sequência de mais de três vitórias desde abril, ainda na temporada anterior. E, principalmente, foi eliminado da Copa da Inglaterra e da Champions League. Ganhar um título, o que os Spurs não fazem desde 2008, era o principal objetivo de Conte.

Contratá-lo foi um grande momento para o Tottenham. Conte, mesmo com todos os problemas extracampo, está na primeira prateleira de treinadores do mundo, ou muito próximo delas, e foi garantia de troféu em todos os clubes em que passou. Após se reestruturar, aumentar as receitas, se estabelecer no grupo de elite da Premier League, chegar a uma final de Champions League e construir um novo estádio, o próximo passo é ser campeão de alguma coisa, e o italiano parecia a pessoa ideal para entregar esse objetivo.

O começo foi relativamente promissor. Com uma grande arrancada na reta final do Campeonato Inglês, o Tottenham passou à frente do rival Arsenal e conseguiu a vaga na Champions League. Mas as cobranças por reforços e críticas ao elenco começaram já em janeiro daquela temporada e nunca cessaram. Uma anedota foi a contratação do jovem lateral direito Djed Spence, que havia feito uma boa segunda divisão pelo Nottingham Forest. Claramente um reforço para o futuro que um clube como o Tottenham precisa trazer. Obcecado pelo presente, Conte disse com todas as letras que não pediu Spence e o colocou em campo por apenas 43 minutos, antes de emprestá-lo ao Rennes em janeiro.

No começo de março, ele até tentou colocar panos quentes em uma rixa pública com Richarlison, a compra mais cara para a temporada e que não está sendo muito utilizado, mas também afirmou, com aquela passivo-agressividade, que talvez o Tottenham estivesse decepcionado com seu trabalho e poderia demiti-lo antes do fim da temporada. O fim da linha foram as declarações após o empate contra o Southampton, quando Conte, não sem a sua dose de razão, chamou os jogadores de egoístas e disse que o Tottenham não ganha nada há tanto tempo mais por causa deles do que pelos técnicos.

O divórcio virou uma questão de tempo. Conte retornou à Itália no começo da semana e passou dias fechando a rescisão com o Tottenham, anunciada como uma saída em “comum acordo”. Curiosamente, o seu assistente, Stellini, continuará no clube, comandando a equipe até o fim da temporada ao lado de Ryan Mason, que o fez dois anos atrás quando José Mourinho foi demitido. “Faltam 10 jogos de Premier League e temos uma briga pela frente para nos classificarmos à Champions League. Todos nós temos que nos reagrupar, todos têm que comparecer para garantir o melhor lugar possível para nosso clube e nossos incríveis torcedores”, disse o presidente dos Spurs, Daniel Levy, em nota oficial.

Conte ainda deve ter mercado. A maioria dos clubes aceita aguentar os atritos que ele cria em troca de sucesso esportivo que mesmo no Tottenham, seu pior trabalho desde que se tornou treinador de elite, existiu por alguns meses. Mas é o quarto clube seguido do qual ele sai com problemas de relacionamento, o que não parece ser sustentável para uma carreira longa. Na Itália, a Internazionale e o Milan talvez não mantenham seus treinadores para a próxima temporada e podem se interessar pelo irascível e talentoso treinador italiano.

Assim que foi demitido do Bayern de Munique, Julian Nagelsmann passou a ser relacionado ao Tottenham. O casamento faz todo sentido: é um técnico jovem, muito promissor e inteligente, que teve sucesso em situações parecidas à que encontraria. Um dos motivos da sua saída do clube bávaro foi o excesso de instruções e mudanças táticas, o que não pega tão bem em um elenco estrelar que confiar na sua capacidade e pode funcionar melhor em um clube que precisa superar expectativas para ser campeão. Mauricio Pochettino, sem emprego desde que deixou o PSG, poderia ser outra opção.

O anúncio de que Stellini e Mason comandarão o restante da temporada indica que Nagelsmann ou quem quer que seja o técnico favorito de Daniel Levy não estão dispostos a assumir o Tottenham neste momento, o que faria sentido. O Tottenham tem apenas dez jogos para salvar a sua campanha e depois, mais uma vez, tentará um recomeço, tentando superar a decepção de não ter conseguido nem chegar perto de um título durante a passagem de um dos técnicos mais vitoriosos da última década.

Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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