Nnadozie, goleira expulsa de casa por causa do futebol, hoje é heroína da Copa
Aos 22 anos, Chiamaka Nnadozie pegou um pênalti de Christine Sinclair e sublinhou sua fama como grande goleira

Encarar Christine Sinclair a 11 metros de distância certamente não é a missão mais fácil do futebol mundial. Nenhum outro futebolista da história, homem ou mulher, possui mais gols no futebol de seleções – 190 no total. A canadense, além do mais, poderia balançar as redes na sexta Copa do Mundo diferente. Poderia, mas não marcou, porque sob as traves se agigantou a goleira do outro lado: a nigeriana Chiamaka Nnadozie, que pegou o pênalti batido pela veterana de 40 anos.
“Christine Sinclair never mis…”
Well, I’ll be damned. What a save.#FIFAWWC #CAN #NGA pic.twitter.com/0u7cPgJj65
— Sebastian Hassett (@sebth) July 21, 2023
Aos 22 anos, a camisa 16 das Super Águias ainda escreve os primeiros capítulos de sua trajetória nas grandes competições. No entanto, se mostra capaz de virar lenda.
O pênalti defendido por Nnadozie garantiu o empate por 0 a 0 entre Canadá e Nigéria, na primeira rodada da Copa do Mundo. Seleção mais tradicional da África, as Super Águias pararam as atuais campeões olímpicas e indicam ter forças para sonhar com a classificação para os mata-matas. A goleira, que usou a braçadeira de capitã, foi crucial pelas grandes defesas. O pênalti de Sinclair não foi muito forte, um tanto quanto telegrafado, mas os méritos da arqueira são totais por uma bola também difícil por ser rente à grama. Saiu com o prêmio de melhor em campo e mais uma boa história para contar.
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Esta sequer é a primeira Copa do Mundo de Nnadozie. Aos 18 anos, a nigeriana já era titular de sua seleção no Mundial da França, em 2019. Tornou-se a mais jovem arqueira da história das Copas a terminar um jogo sem sofrer gols. Desde então, seus voos se tornaram mais altos, com o prêmio de melhor goleira em atividade na África, a indicação ao Fifa the Best entre as jogadoras de sua posição e o título nos Jogos Africanos. É uma das melhores da posição em atividade na França, pelo Paris FC, e também consolida sua imagem como candidata desde cedo a se firmar entre as melhores futebolistas africanas da história.
Expulsa de casa por causa do futebol
Nnadozie ganhou o incentivo para praticar esportes desde cedo. Mesmo com uma realidade pobre, sua família possui uma formação esportiva ampla. Contudo, o futebol era visto com maus olhos dentro de sua própria casa. Seu pai não entendia a fixação da garota por chutar uma bola e tentou dissuadi-la da ideia. Pior, chegou a expulsá-la de casa. A contrariedade, no fim das contas, foi transformada em estímulo pela nigeriana, que insistiu em correr atrás de seu sonho.
— Continuei por causa do meu pai. Em certo momento, ele jurou que eu nunca seria alguém na vida. Ele concluiu que eu seria apenas uma inútil. Meu pai me expulsou de casa porque eu me recusei a aprender um ofício. Então, eu me dei um tempo para que, se não tivesse sucesso no futebol até os 20 anos, voltaria a meu pai e pediria perdão. Antes mesmo de completar 15 anos, fui convocada pela seleção sub-17, o que foi um trampolim. Quando ele me viu na televisão, ficou feliz e disse que eu era sua filha. Foi ele quem realmente me motivou — declarou a jogadora, em entrevista ao jornal nigeriano Independent.
As desculpas do pai deram um impulso maior à filha. E a curiosidade é que Nnadozie atuou em diferentes posições antes de se encontrar como goleira. Começou na lateral e depois jogou também como atacante. Porém, quando assumiu as luvas, sua progressão se tornou muito rápida. Tinha boas inspirações, especialmente por seus ídolos na posição. Em entrevista à Fifa, a nigeriana afirmou que Manuel Neuer é seu grande ídolo. Entre as mulheres, exaltou Sarah Bouhaddi e Alyssa Naeher.
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Nnadozie já foi elogiada na Copa de 2019
Chiamaka Nnadozie começou sua carreira pelo Rivers Angels, no Campeonato Nigeriano. Conquistou seus primeiros títulos com o clube a partir de 2016, quando tinha 15 anos. E a precocidade a acompanhou na afirmação com a seleção da Nigéria. Esteve presente no Mundial Sub-20 de 2018, aos 17 anos, e apareceu no banco da equipe principal durante a conquista da Copa Africana de Nações no mesmo ano. Logo depois, já tinha assumido a titularidade no Mundial da França.
Nnadozie ainda não disputou a estreia contra a Noruega, mas fechou o gol contra a Coreia do Sul na rodada seguinte e perdeu para a França no fechamento da fase de grupos. A Nigéria terminou na terceira colocação da chave, mas ainda assim avançou para as oitavas de final. E se a arqueira não evitou a eliminação para a Alemanha, a partir de então ela passou a constar nas listas de melhores da África. Aos 18 anos, indicava como tinha uma enorme capacidade de se desenvolver. Desde então, tornou-se uma goleira mais segura e completa.
Nnadozie deixou o River Angels em 2020, quando se transferiu para o Paris FC. Não está numa potência do futebol feminino, mas ganha visibilidade e se destaca na terceira força do Campeonato Francês. Já a seleção nigeriana confere oportunidades especiais. Se não deu para se classificar para as Olimpíadas de Tóquio, a Copa do Mundo de 2023 recoloca a jovem nos maiores palcos, como capitã. E vai poder dizer pelo resto da vida que defendeu um pênalti de Sinclair. Um pênalti que pode inclusive pavimentar o caminho das Super Águias de novo às oitavas de final do Mundial. Se a Nigéria avançar, certamente será com influência de Nnadozie.