Europa

Ex-Cruzeiro, Thiago superou infância difícil e hoje brilha na Europa

Jogador, que não disputou a Série A pelo Cruzeiro, tem ótimo início no Brugge, segundo maior campeão belga

Ainda que desconhecido por parte considerável do público brasileiro — ele deixou o país muito jovem e sem disputar a Série A do Campeonato Brasileiro —, o atacante Thiago, de 22 anos, desponta como uma grande esperança em solo europeu. O jogador, que hoje defende o Club Brugge, segundo maior campeão belga, teve impacto imediato ao chegar no novo time, que desembolsou 7,8 milhões de euros (R$ 41,8 milhões na cotação atual) por seu passe.

Thiago — ou Igor Thiago, como também é conhecido no Velho Continente — marcou quatro gols e deu uma assistência em seus primeiros nove jogos pelo Brugge, divididos entre Liga Belga e UEFA Conference League. Seu clube, inclusive, perdeu apenas uma vez desde que o centroavante chegou, justamente numa das duas partidas em que ele começou no banco de reservas.

Atacante alto, forte e rápido, Thiago — que tem 1,91 m e pesa mais de 80 kg — é daqueles jogadores de muita imposição física, mas também de bom posicionamento e faro de gol. Ele se encaixa no perfil que hoje tem sido sensação na Europa, principalmente após o boom de Erling Haaland. Mas antes de brilhar nos gramados, o jovem gigante teve que superar muitas dificuldades.

Igor Thiago comemora gol pelo Club Brugge
Thiago teve rápida adaptação no futebol europeu, tanto na Bulgária quanto na Bélgica – Foto: Bruno Fahy/Icon Sport

Infância difícil e irmão como espelho

Thiago nasceu em uma região periférica da cidade-satélite de Gama, no Distrito Federal. Lá, o jovem precisou amadurecer rápido após perder o pai, quando tinha somente 13 anos de idade. Vendo sua mãe trabalhar como gari, o então adolescente percebeu que precisaria ajudar em casa desde cedo.

— Perdi meu pai aos 13 anos e desde cedo tive que ajudar minha família. Pois minha mãe era a única que trabalhava até então e não queria deixar todo o peso de nos criar e nos ajudar, em suas costas. Éramos três irmãos e a incerteza era grande. Mas a vontade de ajudar minha família era maior. Cheguei até a fazer alguns bicos, porque queria ajudar minha mãe de qualquer forma — conta o centroavante.

Diferentemente de muitos dos jovens brasileiros, Thiago não se enxergava como jogador e nem gostava muito do esporte, confessou. O que mudou em sua caminhada? Ver seu irmão mais velho ter na bola uma fonte de alegria. Mas o atacante foi além e enxergou a possibilidade de mudar de vida calçando um par de chuteiras.

— No começo, não gostava de futebol e não me imaginava sendo jogador. Mas tudo começou a mudar quando via meu irmão mais velho voltar dos jogos. Ele sempre voltava feliz e isso começou a despertar a minha curiosidade. Queria entender qual era esse sentimento que ele tinha, o motivo dessa paixão pelo esporte. Então comecei a praticar o futebol e entendi tudo que ele sentia. Então decidi que iria tirar minha família daquela situação através do esporte que eu aprendi a amar — contou.

Sonhos

Hoje, já com uma carreira consolidada e dando passos largos no futebol, Thiago comemora as mudanças que o esporte trouxe em sua vida e na de sua família. Mesmo jovem, Thiago já é pai e, assim como era há quase dez anos atrás, carrega consigo a responsabilidade de cuidar das pessoas que ama.

— (A mudança mais importante proporcionada pelo futebol em sua vida) foi ter conseguido ajudar minha família, que são as pessoas fundamentais para mim. Ter tirado minha mãe da vida que tínhamos e ter conseguido vencer pelos meus. Acho que isso vai além dos títulos que ganhei, dos gols que marquei. Eu me sinto um vencedor da vida, por ter mudado a vida de quem passou comigo pelas situações mais difíceis. Tenho dois filhos e sei que eles irão crescer sem as mesmas inseguranças que tive, isso é a maior realização pessoal que tive. Nós dar a vida que merecemos — celebra Thiago.

Mesmo já tendo conseguido alcançar seu maior objetivo, o jogador não deixa de sonhar com feitos ainda maiores.

— Espero conseguir títulos, fazer meu nome nos clubes que passar. Jogar campeonatos importantes. Acho que esse é o sonho de todo jogador e é o meu também. Ainda tenho muito tempo pela frente, então vou vivendo um jogo de cada vez e espero aproveitar o máximo que puder a minha carreira — conta o atacante.

A Seleção Brasileira também é um objetivo do jogador, que vem galgando passos mais largos no futebol europeu. Ainda jovem e atuando numa liga que costuma ceder jogadores para os principais campeonatos, Thiago está preparado para agarrar as oportunidades.

— Jogar pela seleção é algo que está nos meus objetivos. Trabalho muito todos os dias e espero que minha chance chegue, para poder representar meu país e vestir a camisa mais pesada do futebol mundial. Meu foco é no agora, trabalhar, mas não me impeço de sonhar — diz o jovem.

Oportunidade no Cruzeiro

Revelado pelo Verê FC, do Paraná, Thiago chegou ao Cruzeiro em 2019, para a base da equipe mineira. O jogador se destacou no sub-20 celeste e no ano seguinte, com o rebaixamento inédito da Raposa para a segunda divisão nacional, seguido de um desmonte do elenco, ganhou oportunidades no time principal, tendo impacto imediato. Ele falou sobre como foi receber a oportunidade de deixar um clube do interior paranaense, para defender uma das camisas mais pesadas da América do Sul.

— Quando surgiu a oportunidade de ir para o Cruzeiro foi muito emocionante. Eu sabia que iria vencer pelo futebol, era meu foco e quando um gigante do Brasil me ofereceu essa oportunidade, abracei e fiz por merecer. Sabia que seria o primeiro passo para mim, então agarrei essa chance com tudo que tinha — revelou Thiago.

Momento difícil da equipe celeste

Thiago estreou pelo Cruzeiro na primeira rodada do Campeonato Mineiro de 2020, em 22 de janeiro, contra o Boa Esporte, no Mineirão. O jogador precisou apenas de 19 minutos em campo para fazer seu primeiro gol. Cinco minutos depois o atacante deixou o campo sentindo um incômodo muscular.

A lesão o afastou dos gramados por pouco mais de um mês. Ele voltou contra o mesmo Boa Esporte da estreia, mas dessa vez pela Copa do Brasil, passando em branco. No jogo seguinte, clássico contra o maior rival, o Atlético-MG. Quatro minutos em campo foram suficientes para Thiago marcar novamente, empatando o jogo em 1 a 1. O alvinegro ainda faria o gol da vitória no apagar das luzes. O centroavante afirmou que estrear num momento tão difícil da história do Cruzeiro o moldou.

— Foi um desafio (estrear em 2020), o clube vivia seu momento mais difícil na história. Eu era muito novo, mas vi essa fase como uma oportunidade de evoluir, amadurecer. O que vivi ali me moldou como profissional, como homem, até hoje. Mas sou muito grato pela oportunidade de ter vestido a camisa do Cruzeiro — disse Thiago.

Gol salvador contra o Londrina

Com o Cruzeiro vivendo um momento difícil dentro e fora de campo em 2020 e 2021 — muitas trocas de treinadores, rotatividade alta de jogadores e problemas financeiros — Thiago jamais teve o ambiente propício para se desenvolver. Ainda assim, o centroavante vira e mexe anotava seus gols, a maior parte deles importantes e que conferiram pontos ao time celeste.

Entre as bolas na rede de Thiago, talvez a mais importante delas tenha saído no dia 5 de novembro de 2021, quando o Cruzeiro enfrentava o Londrina, fora de casa, pela 34ª rodada da Série B daquele ano. Eram decorridos 38 minutos do segundo tempo daquela partida quando o atacante aproveitou cruzamento de Felipe Augusto e marcou o gol da vitória celeste por 1 a 0. Caso o time celeste tropeçasse naquela partida, era possível que a equipe entrasse no Z4 faltando três rodada para o fim da competição, o que poderia significar um desastroso rebaixamento para a terceira divisão nacional. O centroavante comentou o feito.

— Recebo muito carinho dos torcedores (do Cruzeiro). Como disse, espero que eles nunca precisem sentir essa apreensão da segunda divisão novamente, pois o Cruzeiro é um gigante do futebol. Mas, sobre este gol, com certeza é muito especial para mim. Quem não deseja gravar o nome na história de um clube como esse? Fico feliz só de lembrar desse dia e de ter ajudado em um momento delicado do time — comemorou o jogador.

Adaptação ao futebol europeu e futuro

Thiago deixou o Cruzeiro no início de 2022, vendido ao Ludogorets, da Bulgária, que comprou 45% dos seus direitos econômicos por R$ 3,3 milhões. O Verê FC detinha outros 30%. O time celeste manteve 25% do jogador. Em 2023, com a iminente negociação do atacante com Club Brugge, os búlgaros se valeram de uma cláusula contratual para comprar o restante do passe do jogador por mais 700 mil euros (cerca de R$ 3,6 milhões pela cotação da época). A Raposa havia gasto R$ 600 mil para comprar o centroavante junto ao Verê.

O centroavante deixou a Bulgária com bons números. Foram 55 jogos disputados, com 21 gols marcados e sete assistências dadas em um ano e meio de clube. Uma média de uma participação em gol a cada duas partidas. E de quebra o jovem atacante conquistou seu primeiro título nacional na carreira. Nos dois anos em que defendeu o profissional do Cruzeiro, Thiago guardou 10 bolas na rede e deu três passes para gol em 64 encontros.

Thiago falou sobre sua chegada na Europa, revelando que obteve passaporte búlgaro, o que facilita sua entrada noutros países do continente, já que não mais ocupa vaga de estrangeiro. Ele disse ainda que os mais de R$ 40 milhões pagos pelo Brugge por seu passe não o pressionam.

— Me adaptei bem ao futebol europeu. Foi uma experiência muito boa no Ludogorets, fui campeão, joguei muito bem, estava feliz. Tanto que consegui minha nacionalidade Búlgara e me tornei cidadão europeu. Quando surgiu a oportunidade de ir para o Brugge foi bom para os dois, clube e para mim, então decidi sair. Os valores são altos, mas não me afeta, quero só poder fazer o que eu amo e ir para um lugar onde tenham a mesma vontade de vencer do que eu — falou o jogador.

Apesar de focado em sua carreira europeia, Thiago disse que deseja voltar ao futebol brasileiro e atuar em um grande clube do país.

— Tenho vontade sim de voltar ao Brasil, jogar novamente por algum grande clube. Como disse, entendo que o Cruzeiro estava passando por um momento difícil, mas foi uma oportunidade de muito crescimento pessoal pra mim. Aprendi muito, principalmente a ser persistente e espero algum dia poder voltar a jogar no país em que nasci — finalizou o centroavante.

Foto de Maic Costa

Maic CostaSetorista

Maic Costa é mineiro, formado em Jornalismo na UFOP, em 2019. Passou por Estado de Minas, No Ataque, Superesportes, Esporte News Mundo, Food Service News e Mais Minas, antes de se tornar setorista do Cruzeiro na Trivela.
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