The New Firm: Quando Aberdeen e Dundee United desbancaram o duopólio na Escócia
Historicamente dominado pela dupla Rangers e Celtic, o futebol escocês assiste há mais de 30 anos ao simples revezamento de hegemonias entre os rivais de Glasgow. Houve um momento, porém, em que duas outras equipes despontaram como sérias ameaças ao quase perpétuo duopólio. No início dos anos 1980, Aberdeen e Dundee United chegaram, por diferentes vias, a não só fazer frente no cenário nacional como se destacarem nas copas europeias.
VEJA TAMBÉM: O primeiro Eldorado do Extremo Oriente: a incrível liga de Hong Kong nos anos 80
Além disso, a dupla revelou um punhado de bons jogadores, que chegaram à seleção escocesa e alguns a clubes ingleses e até da Europa Continental. E no caso do Aberdeen, projetou o nome de seu treinador, um certo Alex Ferguson. Por um período relativamente curto, “The New Firm” – como o confronto entre esses dois passou a ser chamado, desbancando a “Old Firm”, entre Celtic e Rangers – foi o clássico mais interessante do futebol escocês.
O contexto anterior
Antes do início da temporada 1979/80, Rangers e Celtic haviam conquistado 67 dos 82 títulos da liga escocesa na história (36 para os Gers e 31 para os Bhoys), bem acima dos oito repartidos igualmente entre a dupla de Edimburgo, Hibernian e Hearts. E o domínio vinha se acentuando nos últimos anos: os dois rivais de Glasgow haviam arrebatado todas as ligas desde 1966, ano em que o Celtic de Jock Stein iniciou um avassalador eneacampeonato.
VEJA TAMBÉM: Segundona luxuosa: os astros estrangeiros na Serie B italiana na Era de Ouro do Calcio
Além disso, se alguém apostasse que a resistência a esse duopólio viria dos dois da segunda principal cidade futebolística do país, perderia dinheiro. O Hearts enfrentava o pior momento de sua história: rebaixado pela primeira vez em 1977, voltaria apenas para cair de novo em 1979 e em 1981, recuperando sua estabilidade na elite só a partir de 1984. Já o Hibernian jogaria a segundona em 1980/81 e passaria o resto da década brigando contra nova queda.
Melhor seria prestar atenção em duas equipes do nordeste, que davam mostras de progressos naquele apagar das luzes da década de 1970. O Aberdeen, que então havia conquistado a liga apenas uma vez, num já longínquo 1955, aproveitou-se de um fraco desempenho do Celtic para brigar palmo a palmo pelo título com o Rangers em 1977/78 – a única temporada em que teve Billy McNeill, antigo capitão do Celtic, no comando do time.
McNeill retornou logo em seguida aos Bhoys, agora como técnico, abrindo caminho para um comandante que levaria os Dons a feitos inimagináveis até ali: Alex Ferguson, 36 anos, contratado do pequeno St. Mirren. Clube e treinador eram ambiciosos: em meados de 1978, o Aberdeen reformou seu estádio de Pittodrie a um custo de £ 1,5 milhão, colocando assentos em todas os setores e antecipando-se em uma década ao Relatório Taylor.
Ferguson, por sua vez, aproveitava a base deixada por McNeill, incluindo três nomes que foram à Copa do Mundo da Argentina com a seleção escocesa naquele ano: o goleiro Bobby Clark, o lateral-direito Stuart Kennedy e o atacante Joe Harper (maior artilheiro da história do clube, com 199 gols). Mas incutia um jogo mais competitivo, chegando a insuflar os jogadores para que tratassem como verdadeiras batalhas as partidas contra a dupla de Glasgow.
A outra equipe, o Dundee United, tinha histórico ainda mais modesto. Nunca havia sido sequer vice-campeão escocês. Seu único momento de destaque havia sido chegar à final da FA Cup do pais em 1974, perdendo a taça para o Celtic com derrota por 3 a 0. Era também um clube com menos poder econômico que o Aberdeen. Mas contava com a liderança de Jim McLean, técnico do time desde 1971 e tido como revelador de talentos.
Diferentemente do Aberdeen, que mesclava em sua equipe a prata da casa com outros destaques pescados de equipes menores e até mesmo trazidos do futebol inglês, o time de McLean era quase todo formado no clube. A safra de garotos surgida em meados da década de 1970 incluía nomes como o defensor David Narey, o meia John Holt e o atacante Paul Sturrock, todos nomes históricos do clube, além do atacante Andy Gray, vendido ao Aston Villa em 1975.
Os primeiros títulos
Na temporada 1978/79, o time chamou a atenção pela primeira vez na liga, quando ponteou a classificação pela maior parte da campanha – ainda que com vários jogos a mais que Celtic, Rangers e Aberdeen, devido aos constantes adiamentos ocorridos no inverno. Porém, na reta final os Tangerines acabaram ultrapassados, terminando apenas quatro pontos atrás do Celtic, o mais perto que haviam ficado de um campeão em sua história.
VEJA TAMBÉM: Novo técnico do Nottingham Forest, Martin O’Neill é o elo com o timaço bicampeão europeu
Na campanha seguinte, o time de Jim McLean encerraria sua histórica seca de títulos faturando a Copa da Liga numa final diante do Aberdeen em dezembro de 1979. Foi a primeira decisão do torneio sem Celtic ou Rangers desde 1963. Após empate sem gols no Hampden Park de Glasgow, os Tangerines venceram por 3 a 0 no replay – por ironia disputado em Dens Park, casa de seu rival local, o Dundee FC – com dois gols de Willie Pettigrew e um de Paul Sturrock.
Embora derrotados naquela decisão, os Dons não tiveram do que se queixar naquela temporada. Em maio de 1980, o time concluiria uma arrancada impressionante para superar o Celtic na reta final e conquistar o segundo título escocês de sua história. Em seus últimos 14 jogos, a partir de meados de março, somou 10 vitórias e quatro empates. Nessa sequência, alguns triunfos como visitante foram vitais: o time bateu duas vezes o próprio Celtic em Glasgow (2 a 1 e 3 a 1), num espaço de menos de 20 dias em abril, e goleou o Hibernian por 5 a 0 em Edimburgo.
Na última partida, em 7 de maio, bastava não perder por improváveis dez gols de diferença para o Partick Thistle fora de casa que o título seria assegurado. E o empate em 1 a 1 consagrou uma nova fornada de talentos reunidos por Alex Ferguson. Eram muitos destaques: a sólida dupla de zaga formada por Willie Miller e Alex McLeish, a raça do lateral-esquerdo Doug Rougvie, o dinamismo do meia-direita Gordon Strachan e o poder de fogo da dupla de frente formada por Mark McGhee e Steve Archibald, que logo seria vendido ao Tottenham.
O Celtic, porém, daria o troco nas duas temporadas seguintes, levantando a liga tendo os Dons como vice-campeões em ambas. Mas a dupla ascendente também conquistaria taças no período: em dezembro de 1980, o Dundee United seria bi da Copa da Liga derrotando o rival local Dundee FC por 3 a 0 na decisão, e novamente no campo do inimigo. Davie Dodds abriu o placar e Paul Sturrock marcou duas vezes para assegurar a conquista do troféu.
Já o Aberdeen venceria a FA Cup na temporada 1981/82, batendo o Rangers no Hampden Park. Os Gers saíram na frente, mas Alex McLeish igualou no primeiro tempo. O empate nos 90 minutos levou a decisão para a prorrogação. E os Dons deslancharam, com Mark McGhee, Gordon Strachan e Neale Cooper decretando a goleada de 4 a 1. Aquele título seria o primeiro passo para a conquista que faria o nome do Aberdeen ultrapassar as fronteiras escocesas, tornando-o, naquele momento, uma equipe respeitável também no continente.
Brilhando também na Europa
Na verdade, já em 1981/82 tanto Dons quanto Tangerines tinham obtido resultados notáveis na Copa da Uefa: o Dundee United havia sapecado um 5 a 2 no Monaco em pleno principado e ainda eliminado com goleadas o Borussia Mönchengladbach e o Winterslag, da Bélgica, antes de cair nas quartas para os iugoslavos do Radnicki Ni. O Aberdeen, que caiu uma etapa antes, eliminara na primeira rodada o Ipswich, nada menos que o atual detentor do troféu.
VEJA TAMBÉM: Cláudio Coutinho, 80 anos: O legado de um dos técnicos mais inovadores do futebol brasileiro
Na temporada seguinte, o Dundee United fez ótimo papel na mesma Copa da Uefa ao eliminar, entre outros, PSV e Werder Bremen, caindo nas quartas para os tchecos do Bohemians. Mas o Aberdeen simplesmente faria história. Jogando a Recopa, começou a caminhada ainda na fase preliminar, trucidando o Sion (7 a 0 e 4 a 1). Depois, com um pouco mais de trabalho, despachou o Dinamo Tirana e o Lech Poznan. Nas quartas, enfrentou seu primeiro gigante: o Bayern.
Na ida, no Estádio Olímpico de Munique, o time arrancou um ótimo 0 a 0, mas parecia ter colocado tudo a perder na volta e estava sendo derrotado por 2 a 1 em Pittodrie aos 31 minutos da etapa final. Mas uma reação incrível, com dois gols em dois minutos (primeiro McLeish de cabeça e depois o atacante John Hewitt aproveitando o rebote do goleiro), levou o Aberdeen à virada e a uma classificação heroica, chegando pela primeira vez a uma semifinal europeia.
O adversário, o Waterschei belga, foi varrido por 5 a 1 no jogo de ida em Pittodrie. Na volta, uma derrota magra por 1 a 0 – a única dos Dons na campanha – não foi o suficiente para impedir a classificação à final. Que seria contra outro gigante, o Real Madrid. Dirigidos pelo velho ídolo Alfredo Di Stefano, os merengues buscavam encerrar sua seca de títulos continentais que durava então 17 anos e, de quebra, levantar pela primeira vez a Recopa.
Mas, numa noite chuvosa em Gotemburgo, na Suécia, o Aberdeen teve outras ideias. Primeiro foi o atacante Eric Black que se aproveitou de furada da zaga merengue após um escanteio para desviar do goleiro e abrir o placar. O Real Madrid empatou num pênalti sofrido por Santillana e convertido pelo atacante Juanito. Os espanhóis dominaram o segundo tempo, mas esbarraram na boa atuação do goleiro Jim Leighton, sucessor de Bobby Clark na posição.
A oito minutos do fim da prorrogação, o meia Peter Weir entregou a McGhee, que desceu em contra-ataque pela esquerda e cruzou para a cabeçada fulminante de John Hewitt, que havia entrado no fim do tempo normal no lugar de Black. Era o gol que tornava os Dons o terceiro clube da Escócia a levantar uma taça europeia, e com um time inteiramente formado por escoceses, incluindo reservas. E Alex Ferguson faturava seu primeiro título continental.
Dez dias depois do caneco europeu, o Aberdeen voltaria a levantar uma taça, arrebatando o bi da FA Cup ao derrotar o Rangers por 1 a 0, depois de já ter despachado o Celtic nas semifinais. Foi uma decisão com semelhanças em relação ao jogo de Gotemburgo: Eric Black balançou as redes e a vitória também veio na prorrogação. Naquela temporada, a Copa da Liga foi o que sobrou para ser disputada entre os velhos rivais de Glasgow.
A vez dos Tangerines
Para o Dundee United, a boa campanha europeia foi um aperitivo. A comemoração maior veio ao fim da temporada, com a histórica conquista de seu primeiro – e até hoje único – título da liga escocesa. Até a metade de abril, o Celtic havia liderado por quase toda a temporada, exceto por um período entre fevereiro e maio, quando o Aberdeen foi o ponteiro. Os Tangerines, apesar de fazerem campanha muito consistente, seguiam no encalço.
VEJA TAMBÉM: Há 40 anos, o Deus da Raça provocava o big bang rubro-negro: Rondinelli e o gol que tudo mudou no Fla
Primeiro foram os Dons que começaram a ratear, caindo do primeiro para o terceiro lugar com uma derrota em casa para o St. Mirren. Mais tarde, foi a vez do Celtic, derrotado em seguida pelo próprio Dundee United, em casa, por 3 a 2 e pelo Aberdeen por 1 a 0. Enquanto isso, o time de Jim McLean enfileirava seis vitórias, culminando com um 2 a 1 no dérbi contra o Dundee FC e em mais uma comemoração no campo do rival, em Dens Park.
O triunfo seria o suficiente para superar por apenas um ponto os dois perseguidores – que também venceram na última rodada. Foi uma campanha praticamente impecável: o time somou 56 pontos em 36 jogos, igualando a pontuação recorde do Celtic de 1981 no formato de liga com 10 clubes e quatro turnos, estabelecido em 1975/76. Venceu 24 partidas, perdeu apenas quatro e marcou expressivos 90 gols, além de eternizar um time com bons valores.
Era uma equipe bem definida: nove dos 11 titulares atuaram pelo menos em 30 dos 36 jogos pela liga. Uma defesa sólida que começava com o experiente goleiro Hamish McAlpine, no clube desde 1966, e seguia com os laterais Richard Gough e Maurice Malpas e os zagueiros David Narey e Paul Hegarty. Havia ainda os bons pontas Eamonn Bannon e Ralph Milne, além dos atacantes Paul Sturrock (um dos maiores ídolos da história do clube) e Davie Dodds.
A coesão também foi importante na ótima campanha a qual o clube empreenderia em sua única participação na Copa dos Campeões, na temporada seguinte. De saída, os Tangerines bateram o Hamrun Spartans de Malta com um duplo 3 a 0 e despacharam o bom Standard de Liège de Michel Preud’Homme, Walter Meeuws e Simon Tahamata com uma goleada de 4 a 0 em seu estádio de Tannadice Park. Nas quartas, o Rapid Viena foi superado nos gols fora de casa.
Já nas semifinais, o adversário seria a Roma da dupla brasileira Falcão (ausente no primeiro jogo) e Toninho Cerezo e de italianos tarimbados como Bruno Conti, Roberto Pruzzo e Francesco Graziani. Na ida, em Tannadice, o Dundee United conseguiu ótima vantagem ao vencer por 2 a 0, gols de Davie Dodds e Derek Stark no segundo tempo. Mas na volta, num jogo envolto em suspeitas de suborno por parte dos italianos ao árbitro francês Michel Vautrot, os giallorossi venceram por 3 a 0, com dois gols de Pruzzo e um de Agostino Di Bartolomei, e passaram à final.
A breve hegemonia nacional dos Dons
O Aberdeen também fez bonito na Recopa e ficou muito perto de conquistar o bicampeonato do torneio. Após eliminar Akranes, Beveren e de bater o Ujpest por 3 a 0 após prorrogação com hat-trick de Mark McGhee, devolvendo derrota por 2 a 0 na ida, o time pegaria o Porto nas semifinais. A derrota pelo placar mínimo no Estádio das Antas era considerada reversível. Mas o time, um tanto apático, voltou a perder pelo mesmo placar em casa e deu adeus ao sonho.
VEJA TAMBÉM: O Campo Grande de 1982/83: Quando a Zona Oeste do Rio levantou um título nacional
Foi, porém, uma temporada quase perfeita para os comandados de Alex Ferguson. Ao vencer a liga e a FA Cup, o clube se tornou o único no país – fora Celtic e Rangers – a fazer a dobradinha nacional, feito que permanece até hoje. No campeonato, o time alcançou a liderança no fim de outubro e, graças a uma longa série invicta com 14 vitórias e dois empates até o início de março, não saiu mais de lá. O título foi selado no dia 2 de maio, ao derrotar o Hearts em Edimburgo por 1 a 0, ainda com quatro jogos por fazer. E ao final, com novo recorde de pontos.
Já o tri da FA Cup veio com vitória sobre o Celtic por 2 a 1 em 19 de maio, com gols de Mark McGhee e Eric Black. McGhee, porém, seria um dos três jogadores que deixariam o clube ao fim daquela temporada. Curiosamente, o atacante seria negociado com o Hamburgo, adversário derrotado pelos Dons na Supercopa Europeia em dezembro de 1983. Além dele, o meia Gordon Strachan seguiria para o Manchester United e o lateral Doug Rougvie para o Chelsea.
Mesmo um tanto reformulado, o Aberdeen teria muito fôlego para levantar novamente o título escocês – seu terceiro em seis temporadas – em 1984/85. Cumprindo uma campanha ainda mais impressionante que a do ano anterior, o time venceu 27 de seus 36 jogos (incluindo uma goleada de 5 a 1 sobre o Rangers) e estabeleceu outro novo recorde de pontos (59). Substituto de Mark McGhee, Frank MacDougall sagrou-se o artilheiro da liga com 22 gols.
Seria, porém, a última glória do clube na liga. Na temporada seguinte, com Ferguson tendo de se dividir entre o comando do Aberdeen e da seleção escocesa em caráter de emergência devido ao falecimento de Jock Stein, o tri ficou distante, com os Dons ficando em quarto. A compensação veio nas copas, com o time levantando a Copa da Liga em outubro batendo o Hibernian e a FA Cup em maio em cima do Hearts, ambas com vitórias por 3 a 0.
Representatividade forte na seleção
O Dundee United sofreu um duplo baque na temporada 1984/85 ao ser derrotado na final em ambas as copas: para o Celtic na FA Cup e para o Rangers na Copa da Liga. Na campanha seguinte, nem mesmo chegou perto dos títulos: ficou em terceiro na liga, apesar de uma ótima sequência de 16 jogos sem perder entre outubro de 1985 e fevereiro de 1986, e foi eliminado nas semifinais das copas (para o Hearts na FA Cup e para Aberdeen na Copa da Liga).
VEJA TAMBÉM: De volta à Série A, relembre as participações anteriores do CSA na elite do Brasileirão
Mesmo assim, seus jogadores seguiram prestigiados, bem como os do Aberdeen. Na lista de 22 convocados por Alex Ferguson para a Copa do Mundo do México, em 1986, a dupla da New Firm foi quem mais cedeu jogadores para a seleção escocesa, na primeira vez desde 1958 em que o Tartan Army contou com mais atletas locais do que atuando na vizinha Inglaterra num Mundial. Dos 13 que jogavam no país, cinco eram dos Tangerines e quatro dos Dons.
Depois de ter cedido jogadores à Escócia pela primeira vez numa Copa quatro anos antes, na Espanha, o Dundee United formou parte da defesa titular no México: o lateral-direito Richard Gough atuou em todos os jogos, enquanto o zagueiro David Narey e o lateral-esquerdo Maurice Malpas jogaram em dois dos três. O ponta Eamonn Bannon foi titular em um jogo e entrou em outro. No ataque, Paul Sturrock começou jogando na primeira e na última partida.
Dos quatro do Aberdeen, apenas o meia Jim Bett não chegou a entrar em campo. Jim Leighton esteve absoluto no gol. Na zaga, Willie Miller foi titular nos três jogos, enquanto Alex McLeish esteve ao seu lado no setor na estreia diante da Dinamarca. Além deles, dois ex-jogadores dos Dons também fizeram parte daquele elenco: o meia Gordon Strachan, então no Manchester United, e o atacante Steve Archibald, que defendia o Barcelona.
A Escócia fez campanha fraca no México, novamente eliminada na primeira fase somando apenas um ponto, embora tenha sido incluída no “Grupo da Morte” daquele Mundial e vendido caro as derrotas para a Dinamarca (1 a 0) e a Alemanha Ocidental (2 a 1). Esse desfecho, juntamente com as saídas de Richard Gough para o Tottenham em agosto e de Alex Ferguson para o Manchester United em novembro, poderia sugerir o último capítulo da era de ouro da New Firm.
O último grande momento
Mas os Tangerines ainda seriam capazes de tirar uma surpreendente campanha europeia da cartola. A equipe apresentava a conclusão do processo de renovação iniciado após a histórica campanha semifinalista na Copa dos Campeões em 1984 e trazia, entre contratados e pratas da casa, novos e bons nomes como o goleiro Billy Thomson, o zagueiro John Clark, os meias Jim McInally e Ian Redford e o atacante Kevin Gallacher.
VEJA TAMBÉM: Há 30 anos, IFK Gotemburgo conquistava a Copa da Uefa em final alternativa contra Dundee United
Sem fazer alarde, o time de Jim McLean eliminou Lens, Universitatea Craiova e Hajduk Split nas três primeiras fases da Copa da Uefa. Após a virada do ano, em março chegariam as quartas de final. O adversário seria o Barcelona, vice-campeão da Copa dos Campeões no ano anterior e agora reforçado de Gary Lineker, artilheiro da Copa do Mundo do México. Desnecessário lembrar que os azulgranas eram cotados como favoritos destacados.
Na partida de ida em Tannadice Park, o Dundee United obteria um bom resultado ao vencer por 1 a 0 graças a um gol incrível de longa distância de Kevin Gallacher. Na volta, os catalães abriram o placar com Ramón Calderé perto do fim do primeiro tempo e pressionariam pelo segundo, que lhes daria a classificação. Mas a cinco minutos do fim, quando o jogo parecia se encaminhar para a prorrogação, Redford levantou falta na área e Clark cabeceou para empatar.
No desespero, já que precisariam marcar dois gols em pouco mais de cinco minutos, o Barça se abriu e levou o segundo gol: Sturrock puxou o contra-ataque e fez jogada de ponta pela esquerda antes de cruzar para a cabeçada inapelável de Iain Ferguson. Os Tangerines repetiam seu grande resultado da Copa das Feiras em 1966/67, quando também haviam despachado os catalães vencendo em casa e no Camp Nou. Mas outra batalha épica viria.
Nas semifinais, o adversário seria o Borussia Mönchengladbach – que, cinco anos antes, já havia sido eliminado pelo Dundee United com uma goleada de 5 a 0 pela mesma competição. Mas desta vez, o confronto seria bem mais dramático, ainda mais após o empate sem gols no jogo de ida em Tannadice Park. Na volta, no estádio Bökelberg lotado, Iain Ferguson abriu o placar no fim do primeiro tempo. E na etapa final, já nos acréscimos, Kevin Gallacher puxou ótimo contra-ataque e serviu a Ian Redford, que driblou o goleiro e selou a passagem à final.
A decisão seria contra o IFK Gotemburgo, que embora tivesse levantado a taça cinco anos antes, havia surpreendido ao eliminar a Internazionale nas quartas de final. O favoritismo não pendia para nenhum dos lados, mas os suecos saíram em vantagem ao vencerem o primeiro jogo, em casa, com um gol de cabeça de Stefan Petterson. O Dundee United, por sua vez, precisaria jogar tudo na volta. Mas novamente sairia atrás no marcador.
O gol sueco, de Lennart Larsson aos 22 minutos, é uma ducha de água fria para a torcida da casa. Na etapa final, John Clark ainda empataria, mas, presos na marcação do IFK, os Tangerines não conseguiriam marcar os dois gols que precisariam para levantar a taça, e a campanha histórica acabaria em frustração. Assim como a da FA Cup escocesa daquela temporada, encerrada com derrota na final para o pequeno St. Mirren, entre os dois jogos decisivos da Copa da Uefa.
O ocaso da New Firm
Nos últimos anos daquela década, Celtic e Rangers foram aos poucos recuperando a hegemonia do futebol escocês. Especialmente os Gers, que a partir de 1988/89 iniciariam seu próprio eneacampeonato, tendo o Aberdeen como vice por nada menos que cinco vezes. O sucesso para a dupla da New Firm se resumiria a títulos esporádicos nas copas: os Dons fariam uma dobradinha copeira em 1989/90 e levariam a Copa da Liga em 1995/96 e 2013/14.
O Dundee United, por seu turno, faturaria pela primeira vez a FA Cup em 1994, um ano depois de Jim McLean encerrar sua era de 22 anos no comando do time. Voltaria a vencer o torneio em 2010, mas desde meados dos anos 90, começaria a sofrer com rebaixamentos para a segunda divisão escocesa, categoria a qual disputa atualmente, bem distante de seu período de glórias, ao lado do Aberdeen, na primeira metade dos anos 1980.
Quinzenalmente, o jornalista Emmanuel do Valle publica na Trivela a coluna ‘Azarões Eternos’, rememorando times fora dos holofotes que protagonizaram campanhas históricas. Para visualizar o arquivo, clique aqui.
Confira o trabalho de Emmanuel do Valle também no Flamengo Alternativo e no It’s A Goal.