Eliminatórias da EurocopaEurocopa 2024

Os duelos que afirmaram grandes equipes de Bélgica e Portugal nas Eliminatórias da Euro

Nas Eliminatórias da Eurocopa para 1972, 1980 e 2008, Portugal e Bélgica se enfrentaram com confrontos importantes

Adversários pelas oitavas da atual edição da Eurocopa neste domingo (veja a Programação de TV), Bélgica e Portugal medirão forças pela primeira vez numa fase final de grande torneio. Os dois, no entanto, já se enfrentaram pelas Eliminatórias da competição europeia, e sempre em momentos importantes para a seleção vencedora. Os belgas levaram a melhor nas fases classificatórias de 1972 e 1980, quando partiram para suas melhores campanhas na Euro, enquanto Portugal sobrou nos duelos da edição de 2008, que encerrou o ciclo de Felipão no comando dos lusos.

O histórico de confrontos entre belgas e portugueses teve início em 1930 com grande equilíbrio nos primeiros seis amistosos. Foram duas vitórias para cada lado e dois empates. A Bélgica venceu o primeiro jogo, em Antuérpia (2 a 1), mas Portugal deu o troco no ano seguinte em Lisboa (3 a 2). Então vieram as igualdades: 1 a 1 no Jamor em 1951 e 0 a 0 em Heysel, três anos depois. Por fim, as vitórias como visitantes: a Bélgica fez 2 a 1 no José Alvalade em 1962 e Portugal respondeu com o mesmo placar em Bruxelas dois anos depois.

Euro 1972

Já o primeiro jogo entre as duas seleções valendo por competição aconteceu nas Eliminatórias para a Eurocopa de 1972, sorteadas no mesmo equilibrado Grupo 5 que incluía ainda Escócia e Dinamarca. Naquele quarteto, a Bélgica levava ligeiro favoritismo: era a única que havia disputado a última Copa do Mundo, no México, embora com campanha discreta. Mas portugueses (ainda com Eusébio) e escoceses se colocavam como fortes concorrentes. Só os dinamarqueses, ainda amadores, eram vistos como azarões.

E os escandinavos, em campo nos três primeiros jogos do grupo em outubro e novembro de 1970, começaram desempenhando seu papel de fieis da balança, perdendo, ainda que por contagens apertadas, para Portugal em Copenhague (1 a 0), Escócia em Glasgow (1 a 0) e Bélgica em Bruges (2 a 0). Em seguida, já adentrando o ano de 1971, viriam os embates entre as três forças da chave. E na primeira delas, os belgas derrotariam os escoceses por um categórico 3 a 0 em Liège, duas semanas antes de receberem os portugueses.

O duelo do turno aconteceu em Parc Astrid, estádio do Anderlecht, na noite de 17 de fevereiro de 1971. Com o futebol do país vivendo ascensão no cenário europeu naquele início da década, a seleção belga se baseava nas três principais forças locais naquele momento: o Standard Liège, o Club Brugge e os próprios Mauves, que no ano anterior haviam chegado à decisão da Copa das Cidades com Feiras diante do Arsenal. E a classificação ao Mundial mexicano indicava que havia margem para o crescimento, logo experimentado.

Assim, o time escalado para enfrentar os portugueses mantinha a base da Copa, com os mesmos destaques: o goleiro Christian Piot, o lateral-direito Georges Heylens, o meia-armador Wilfried Van Moer, o ponta-direita Léon Semmeling e a dupla de goleadores formada pelo centroavante Raoul Lambert (do Brugge) e o ponta-de-lança Paul Van Himst (do Anderlecht), capitão do time e considerado por muito tempo como o maior craque surgido no país. Porém, do outro lado, os lusos também formavam uma boa equipe.

Belgica 3-0 Portugal – 1971 (Gazet van Antwerpen)

O destaque ainda era Eusébio, que aos 29 anos mantinha o alto nível cinco anos após as exibições históricas em gramados ingleses. Mas havia outros remanescentes da seleção terceira colocada no Mundial de 1966: o lateral-esquerdo Hilário, agora capitão do time, o ponta-esquerda Simões e o meia-armador Peres, reserva daquela equipe, mas que agora ganhava um lugar (e que dali a três anos viria a atuar no futebol brasileiro, sendo campeão nacional com o Vasco). Junto a eles, despontava uma boa safra de novatos.

Entre os principais nomes mais jovens estavam o goleiro Vitor Damas (do Sporting), o lateral-direito Malta da Silva e o sólido zagueiro Humberto Coelho (ambos do Benfica) e o irreverente atacante Vitor Baptista (então no Vitória de Setúbal). Porém, no campo enlameado de Parc Astrid os belgas saíram ao ataque logo de início e marcaram o primeiro gol aos 15 minutos de partida, quando, após muitas rebatidas na área portuguesa, a bola sobrou para o chute de primeira de um desmarcado Lambert.

Os lusos tentaram reagir e chegaram até a assumir o comando das ações após o primeiro gol. Mas, com Eusébio apagado e a equipe demonstrando muita lentidão e pouco poder de definição das jogadas, não conseguiram levar perigo de fato à meta belga. E os anfitriões ampliariam aos 18 minutos da etapa final, num pênalti cobrado por Lambert após muita disputa entre jogadores dos dois times sobre a marca da cal, que havia simplesmente desaparecido em meio à lama. Foi o gol que abateu definitivamente os portugueses.

A Bélgica ainda anotaria mais um aos 30 minutos, num contra-ataque que desencadeou uma bela troca de passes até a bola chegar ao ponta-esquerda André De Nul, que driblou Damas e chutou forte e sem ângulo para fazer 3 a 0. O resultado colocou os belgas em posição bastante favorável no grupo, mas agora a seleção teria de fazer seus três jogos como visitante. E Portugal se colocaria como o maior perseguidor, após bater a Escócia (2 a 0) no Estádio da Luz e golear a Dinamarca (5 a 0) no Estádio das Antas, no Porto.

O primeiro compromisso dos belgas fora de casa seria contra os dinamarqueses, que venderiam caro a derrota por 2 a 1 em Copenhague. Duas semanas depois, a Dinamarca acabaria com as chances da Escócia vencendo por 1 a 0 também no estádio Idraetspark. A evolução nos resultados era fruto da derrubada pelos escandinavos do veto à convocação de atletas profissionais que jogavam no exterior. A medida, porém, chegara tarde para aquela eliminatória, já que a equipe se despedia da disputa naquela partida.

Também já eliminada, a Escócia salvou sua honra em grande estilo derrotando Portugal (2 a 1) e Bélgica (1 a 0) em casa, deixando a definição da chave para a última partida, o confronto da volta entre lusos e belgas no Estádio da Luz lotado em 21 de novembro de 1971. Alinhando nada menos que sete jogadores do Benfica, chamando de volta outros nomes experientes como o meia Jaime Graça e o centroavante Torres, além de lançar o promissor atacante Nenê, Portugal precisava de uma vitória por três gols de diferença.

Já os belgas, dirigidos pelo tarimbado Raymond Goethals, trocavam apenas quatro jogadores em relação ao primeiro confronto, promovendo a volta do experiente meia Jean Dockx, enquanto o ponta André De Nul, autor do terceiro gol em Bruxelas, cedia o lugar ao jovem Maurice Martens que atuaria por quase uma década na seleção. Assim, a equipe não se intimidou com a pressão da torcida local e conseguiu arrancar o resultado que precisava – um empate em 1 a 1 – para avançar na competição continental.

Depois de cozinhar o jogo no primeiro tempo, o time da Bélgica chegou ao gol aos 15 minutos da etapa final quando Semmeling lançou Lambert nas costas da defesa, e o atacante do Club Brugge arrancou até a área e tocou rasteiro, na saída de Vitor Damas. O empate luso só veio no último minuto, em pênalti batido por Peres. Nas quartas de final, em ida e volta, a Bélgica surpreenderia ao eliminar a Itália. E na fase final, jogando como país-sede, ela ficaria em terceiro após perder para a Alemanha Ocidental e vencer a Hungria.

- - Continua após o recado - -

Assine a newsletter da Trivela e junte-se à nossa comunidade. Receba conteúdo exclusivo toda semana e concorra a prêmios incríveis!

Já somos mais de 3.200 apaixonados por futebol!

Ao se inscrever, você concorda com a nossa Termos de Uso.

Euro 1980

O reencontro entre as duas seleções só aconteceu quase sete anos depois e de novo pela fase de classificação da Eurocopa, agora na edição de 1980, a primeira com oito equipes e com país-sede já definido antes das Eliminatórias (no caso, a Itália). Curiosamente, Bélgica e Portugal também reencontrariam a Escócia naquele Grupo 2, além de uma seleção escandinava tida como fiel da balança, a Noruega. Além delas, a chave comportava mais uma equipe, a Áustria, que revelara uma boa geração na Copa do Mundo de 1978.

Guy Thys, o novo técnico belga, assumira o cargo em maio de 1976 depois que uma goleada de 5 a 0 para a arquirrival Holanda nas quartas de final das Eliminatórias para Eurocopa daquele ano derrubaram o veterano Raymond Goethals. Seu início de trabalho, entretanto, não foi dos mais convincentes. A seleção passou longe de conquistar a vaga no Mundial de 1978 (de novo ficando atrás dos neerlandeses) e ainda estreou na fase de classificação da Euro 1980 empatando em casa com a fraca Noruega em 1 a 1.

Bélgica 2-0 Portugal – 1979

Três semanas depois, em 11 de outubro de 1978, seria a vez de enfrentar Portugal em Lisboa, no José Alvalade. Naquela partida, a seleção belga já reunia em seu time titular muitos dos jogadores que participariam das expressivas campanhas cumpridas pelos Diabos Vermelhos nos grandes torneios de seleções durante os anos 1980, como o goleiro Jean-Marie Pfaff, os defensores Eric Gerets, Hugo Broos, Walter Meeuws e Michel Renquin e os meias René Vandereycken, Frankie Vercauteren, Julien Cools e Ludo Coeck.

No ataque, porém, é que Guy Thys optou por dois novatos, Guy Dardenne e Eddy Voordeckers, deixando no banco o astro François Van Der Elst e o ascendente Jan Ceulemans. Os lusos, agora dirigidos por Mário Wilson, levavam a campo por sua vez praticamente um combinado Benfica-Porto, com cinco titulares de cada um, incluindo os encarnados Bento, Humberto Coelho e Alves e os tripeiros António Oliveira e Fernando Gomes. Manuel Fernandes, ídolo do Sporting, fechava o onze titular dos donos da casa.

Portugal, que fazia sua estreia naquelas Eliminatórias, saiu na frente com um gol de oportunismo de Fernando Gomes aos 32 minutos, aproveitando na pequena área um bate-rebate na defesa belga. Mas, sete minutos depois, Vercauteren deixaria tudo igual. Na etapa final, mesmo com Guy Thys fazendo entrar Van Der Elst e Ceulemans e Mário Wilson recorrendo ao atacante benfiquista Nenê, o placar ficaria em 1 a 1. Portugal venceria seus três jogos seguintes e dispararia na ponta, com a Áustria em segundo lugar.

O bom início dos portugueses contrastava com o travado começo dos belgas, que acumularam apenas empates em seus quatro primeiros jogos – diante dos austríacos houve o 1 a 1 em Parc Astrid e o 0 a 0 no Praterstadion. Até antes do jogo da volta entre Bélgica e Portugal em Heysel, no dia 17 de outubro de 1979, Guy Thys somava apenas cinco vitórias em seus 18 primeiros jogos no cargo – o quinto triunfo, um 2 a 1 de virada arrancado contra a Noruega no Ullevaal de Oslo, o primeiro naquelas Eliminatórias.

Mas o panorama mudaria completamente na segunda metade da disputa. E o responsável pela reviravolta da Bélgica seria um meia veterano, remanescente da campanha europeia de 1972: Wilfried Van Moer, 34 anos, então há quatro anos e meio afastado da seleção e que defendia o pequeno Beringen. Reconvocado para o jogo contra Portugal, ele marcaria o primeiro gol numa cabeçada logo no primeiro minuto da etapa final. E faria a assistência para François Van Der Elst selar um contra-ataque mortal e fechar em 2 a 0.

Embalada, a Bélgica derrotou a Escócia em Heysel (2 a 0) em 21 de novembro e contou com um tropeço de Portugal em Lisboa diante da Áustria (2 a 1) para chegar a seu último jogo dependendo apenas de si para suplantar os austríacos na liderança e carimbar a vaga. E assim aconteceu: com um categórico 3 a 1 diante dos escoceses em pleno Hampden Park, a equipe de Guy Thys garantiu a classificação e transformou o último duelo do grupo – uma vitória dos britânicos sobre os lusos por 4 a 1 – num mero amistoso.

Uma vez classificada, a Bélgica faria campanha até melhor que a de 1972. Depois de empatar com a Inglaterra (1 a 1) e derrotar a Espanha (2 a 1), segurou um 0 a 0 com a anfitriã Itália em Roma na última rodada e avançou à final, frustrando a torcida da casa. Na decisão, porém, outra vez a Alemanha Ocidental apareceria para pôr fim ao sonho belga. Um gol do tanque Horst Hrubesch no último minuto decidiu a vitória por 2 a 1 e deu o bi europeu à Nationalelf. O vice-campeonato naquela edição segue sendo o ponto alto da Bélgica.

Bélgica e Portugal em 1979

Euro 2008

Uma década depois, belgas e portugueses voltariam a medir forças numa etapa prévia de grande torneio ao se encontrarem no Grupo 7 europeu das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1990, na Itália. E os Diabos Vermelhos, ainda dirigidos por Guy Thys, levaram a melhor sobre os lusos do técnico Juca com um empate em 1 a 1 em Lisboa (garantido pelo gol de Marc Van Der Linden a oito minutos do fim) e uma folgada vitória por 3 a 0 em Heysel com um gol de Ceulemans e outros dois de Van Der Linden.

Naquela ocasião, a Bélgica conquistaria com tranquilidade o primeiro lugar do grupo, enquanto Portugal, em terceiro, assistiria à Tchecoslováquia ficar com a segunda vaga na chave que ainda incluía Suíça e Luxemburgo. Um novo reencontro, enfim com desfecho feliz aos portugueses, só aconteceria dali a quase duas décadas, no mastodôntico Grupo A das Eliminatórias da Eurocopa de 2008, que contava com oito equipes, totalizando cansativos 14 jogos para cada seleção entre agosto de 2006 e novembro de 2007.

Aquele seria o último ciclo qualificatório de um grande torneio em que o brasileiro Luiz Felipe Scolari estaria à frente de Portugal, depois de levar a seleção das Quinas à final da Eurocopa de 2004 (perdida em casa para a Grécia) e às semifinais da Copa do Mundo de 2006. Por outro lado, a Bélgica vivia seu pior momento desde a profissionalização total do futebol do país, chegando a descer até o 71º posto no ranking da Fifa – sua pior posição – em junho de 2007, o que forçaria uma profunda reformulação na equipe.

Nesse contexto, Portugal entrou como favorito no confronto e correspondeu às expectativas. Vindo de uma vitória sobre o Brasil num amistoso em Londres, o time de Felipão passou fácil por uma Bélgica que incluía poucos nomes de real destaque, como o zagueiro Daniel Van Buyten, o atacante Mbo Mpenza e um jovem Marouane Fellaini, que fazia sua segunda partida na seleção. Na goleada de 4 a 0 em Lisboa, Nuno Gomes abriu o placar, Cristiano Ronaldo fez dois e Ricardo Quaresma – de trivela, é claro – anotou o outro.

Portugueses comemoram o primeiro gol no jogo contra a Bélgica no dia 2 de junho de 2007 (Imago / OneFootball)

A partida de volta aconteceria três meses depois, em junho de 2007, justo no momento em que os belgas alcançavam o fundo do poço. O processo de renovação iniciado, embora timidamente, pelo técnico René Vandereycken (que enfrentara os lusos como jogador nas Eliminatórias da Euro 1980) trazia à equipe jovens como Thomas Vermaelen e o estreante Jan Vertonghen. Mas outra vez Portugal – sem Cristiano Ronaldo e Nuno Gomes, mas com Deco e Nani – chegaria à vitória, mesmo atuando em Bruxelas.

E o próprio Nani abriria o placar perto do fim do primeiro tempo. Na etapa final, a Bélgica ainda ensaiou a reação quando Fellaini – ainda sem a cabeleira com a qual ficaria conhecido mais tarde – escorou de cabeça um cruzamento da direita para vencer Ricardo. Mas nove minutos depois um canhão de longa distância de Hélder Postiga decretaria o triunfo português por 2 a 1. A equipe de Felipão se classificaria como segunda do grupo, atrás da Polônia. Já os belgas amargariam um discreto quinto lugar, atrás de Sérvia e Finlândia.

Na fase final, disputada na Suíça e na Áustria, Portugal terminaria na primeira colocação do Grupo A, vencendo a Turquia (2 a 0) e a República Tcheca (3 a 1) e perdendo na última rodada para os anfitriões suíços (2 a 0). A campanha terminaria nas quartas de final, quando a equipe de Felipão cruzou na Basiléia com a Alemanha, vinda do segundo lugar no Grupo B. Após sair na frente com Bastian Schweinsteiger, a Nationalelf esteve sempre à frente no placar. Nem os tentos de Nuno Gomes e Postiga evitaram a derrota por 3 a 2.

Foto de Emmanuel do Valle

Emmanuel do Valle

Além de colaborações periódicas, quinzenalmente o jornalista Emmanuel do Valle publica na Trivela a coluna ‘Azarões Eternos’, rememorando times fora dos holofotes que protagonizaram campanhas históricas.
Botão Voltar ao topo