Ásia/Oceania

Jogadores do Afeganistão boicotam seleção e fazem denúncias graves contra a federação

Em carta à Fifa, jogadores denunciam más condições de trabalho e suspeitas de corrupção na gestão da Federação de Futebol do Afeganistão e se recusam a jogar a próxima partida

A maior parte da seleção masculina do Afeganistão irá boicotar o jogo da próxima data Fifa, contra o Catar, que acontece na próxima semana. É parte de um protesto dos jogadores pelos que eles descrevem de um tratamento abaixo dos padrões por parte da federação de futebol do país. Vai além disso: eles fazem sérias acusações de corrupção à federação de futebol do país.

Uma carta assinada por três jogadores que atuam no exterior foi enviada para a Fifa e para a Confederação Asiática de Futebol (AFC) nesta semana falando sobre suas reclamações. Eles incluem más condições de trabalho e acusações de corrupção à Federação Afegã de Futebol. Algo que não seria novidade: a pioneira do futebol afegão feminino, Khalida Popal já falou sobre problemas no futebol do país em 2021.

“A última gota veio na última concentração, quando um grande grupo de nós decidiu que não dava mais e 18 jogadores se uniram e disseram: ‘Se nós vamos seguir, temos que colocar um fim nisso’”, disse Noor Husin, que joga pelo Southend United, da quinta divisão inglesa.

“Nós realmente queremos mudar. Queremos ajudar os jogadores que atuam no país porque o dinheiro que a federação recebe da Fifa não está sendo usado do jeito certo. Temos os piores voos possíveis e temos que ficar em hotéis abaixo do padrão”, continuou o jogador. “Nós nos unimos como grupo porque queremos que o futebol no Afeganistão avance e acreditamos que não irá avançar com as pessoas que estão no comando no momento”.

“O dinheiro está indo para os bolsos de uma gangue”

Além de Noor Husin, os outros signatários da carta enviada à Fifa e à AFC são do capitão do time, Farshad Noor, e Faysal Shayesteh, ex-capitão do time e outro dos líderes do elenco. O documento pede que a Fifa investigue as alegações que altos dirigentes da Federação Afegã de Futebol estão desviando fundos que deveriam ser investimentos no desenvolvimento do futebol do país.

“Todo ano a nossa federação recebe apoio financeiro da Fifa e da AFC. Queremos mostrar um Afeganistão positivo ao mundo e estamos pedindo à Fifa que pare de apoiar a nossa federação financeiramente porque o dinheiro está indo para os bolsos de uma gangue que está dominando o futebol do país”, denunciou Shayesteh, que joga pelo Screenidi Deccan, da Índia.

O secretário-geral da Federação Afegã de Futebol, Behram Siddiqui, negou as alegações e disse que “esse comportamento fica sob a jurisdição do time de compliance da Fifa. Se esse dinheiro foi tomado como patrocínio, é imperativo que a auditoria da federação revele essa informação. O secretário-geral anterior (Fazil Mohammad Shahab) finalizou a auditoria de 2021 e enviou à Fifa”, disse o dirigente.

“Desde a transição de regime em agosto de 2021, não houve movimentos de fundos da Fifa ou de fontes externas para a conta bancária da federação. Portanto, quaisquer ações anteriores relativas a esta questão não são do meu conhecimento”, continua Siddiqui.

Os jogadores ainda alegam que os membros do comitê executivo da AFF distribuíram metade do pagamento de US$ 30 mil que era ser distribuído entre os jogadores, após o time avançar à próxima fase das Eliminatórias da Copa do Mundo.

Siddiqui, porém, contesta essa alegação. Segundo ele, os jogadores receberam US$ 20 mil, com os outros US$ 10 mil sendo usados para “cobrir as despesas da seleção durante o período de treinamento, já que não temos nenhum dinheiro na nossa conta nos últimos 10 meses”. Segundo o secretário-geral, “o dinheiro foi usado para pagar pelos voos domésticos dos jogadores da seleção de várias províncias, já que a Fifa não cobre voos domésticos para todos os jogadores que tem que se apresentar à seleção”.

Os jogadores ainda alegaram que os dirigentes da federação se apropriaram de dinheiro de passagens aéreas dos jogadores para disputarem as partidas. Documentos vistos pelo Guardian mostram que voos que tinham custo estimado em US$ 45 mil dólares custaram US$ 65 mil, em uma viagem para a Liga das Nações da Associação de Futebol da Ásia Central, no Quirquistão.

Siddiqui negou as acusações e justificou que o aumento de custos foi porque a cotação feita com a agência de viagens expirou e isso fez com que eles fossem forçados a comprar os voos horas antes de deles acontecerem, o que implica em custos maiores.

“Alguns jogadores reclamaram sobre não receberem voos de case executiva, que são tipicamente usados por times profissionais. Contudo, a federação não foi capaz de fretar ou pagar por voos em classe executiva com seus fundos”, justificou ainda Siddiqui.

A carta dos jogadores ainda faz outra acusação contra a Federação Afegã: que as contas dos hotéis são superfaturadas. Uma acusação que Siddiqui também negou. “A verdade é que todos os hotéis mandam suas faturas para a Fifa, junto com seus dados bancários. Uma vez aprovado pelo time de compliance da Fifa, o dinheiro é transferido diretamente para a conta do hotel, o que pode levar um tempo considerável”, afirmou o secretário-geral da Federação Afegã.

Técnico inglês, ex-Sheffield Wednesday, irá comandar a seleção do Afeganistão

Em meio a todo esse caos, Ashley Westwood, de 47 anos, foi anunciado como novo técnico da seleção afegã. O inglês é ex-jogador, que atuou por Sheffield Wednesday e Portsmouth, entre outros clubes. Como técnico, começou como auxiliar no Blackburn, mas fez a sua carreira toda na Índia. A ligação entre Afeganistão e Inglaterra não é grande, mas já houve um soldado que foi para a guerra no país e depois foi jogar pelo Bristol Rovers

Ele foi apresentado nesta quarta-feira, oito dias antes do jogo contra o Catar. Ele assumirá o lugar de Abdulalah Al Mutairi, que foi demitido depois de se recusar a assinar a súmula do jogo contra a Mongólia. O contrato do treinador inglês é de um ano.

O elenco de convocados do Afeganistão será formado basicamente por jogadores locais. O jogo contra o Catar será disputado na Arábia Saudita, depois da Federação do Afeganistão ter fechado um contrato com o país para mandar seus jogos por lá.

“Nós estávamos jogando nossos jogos no Tajiquistão e esse é um país onde temos uma vantagem se você olhar nossos resultados – mesmo contra o Catar, perdemos apenas de 1 a 0 e perdemos um pênalti – , porque o seu clima é uma grande vantagem. Mas agora vendemos nossos jogos em casa para a Arábia Saudita, onde o clima é tão quente que não será uma vantagem”, disse Shayesteh.

A Fifa afirmou que está monitorando a situação e as alegações feitas pelos jogadores do Afeganistão. “A Fifa foi informada sobre essas alegações muito recentemente e está atualmente tratando da questão”, diz a assessoria da Fifa.

Foto de Felipe Lobo

Felipe Lobo

Formado em Comunicação e Multimeios na PUC-SP e Jornalismo pela USP, encontrou no jornalismo a melhor forma de unir duas paixões: futebol e escrever. Acha que é um grande técnico no Football Manager e se apaixonou por futebol italiano (Forza Inter!). Saiu da posição de leitor para trabalhar na Trivela em 2009, onde ficou até 2023.
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