Eurocopa Feminina

“It’s Coming Home!”: A Inglaterra vence uma memorável final contra a Alemanha e é campeã da Euro Feminina

Diante de 87 mil em Wembley, a Inglaterra prevaleceu na prorrogação e levou seu maior título no futebol feminino

“It's Coming Home”: o refrão seria entoado várias e várias vezes nos últimos anos, para celebrar a empolgação dos torcedores da Inglaterra com a sua seleção. As frustrações, porém, se repetiram com a sina de quem permanecia no jejum. A Euro 2020 havia sido a decepção mais recente, com a derrota para a Itália em Wembley. Um ano depois, no mesmíssimo estádio, as inglesas puderam cantar a plenos pulmões que, de fato, “it's coming home”. As mulheres foram capazes de superar os traumas e garantir um troféu de elite ao berço do futebol, depois de 56 anos, com a conquista da Euro Feminina. O clima no templo londrino seria fantástico, diante de 87 mil torcedores, um recorde na competição. E as Lionesses não deixariam por menos, com uma vitória épica sobre a Alemanha, rival e maior vencedora do certame continental. O triunfo inglês por 2 a 1 na prorrogação se torna, desde já, um clássico do esporte.

A decisão em Wembley teve todos os elementos de uma partida histórica. A começar pelo ambiente ao redor do gramado, com arquibancadas abarrotadas e uma torcida barulhenta. Dentro de campo, os times fizeram jus a esse clima. A Alemanha teve que se virar sem a sua principal jogadora, Alexandra Popp, lesionada pouco antes de entrar em campo, e de novo se queixaria da arbitragem em Wembley, tal qual em 1966. Mas não se negam os méritos da Inglaterra, pelo futebol altamente competitivo e agressivo aplicado pela equipe de Sarina Wiegman. Depois de um primeiro tempo em que as Lionesses já eram melhores, a equipe esfriou a tentativa de reação das alemãs no início da segunda etapa, com um golaço por cobertura de Ella Toone. O Frauenteam reagiu, pressionou e empatou para forçar a prorrogação. No tempo extra, todavia, a Inglaterra cumpriu sua façanha. Marcou o gol a dez minutos do fim e comemorou o maior momento da história de seu futebol feminino.

(Naomi Baker/Getty Images/One Football)

Uma grande surpresa aconteceu na entrada dos times em campo. Alexandra Popp, craque da Alemanha, estava escalada e acabou sacada após se lesionar durante o aquecimento. Lea Schüller foi a opção no ataque. Quando a bola rolou, a Inglaterra se mostrava mais confiante e começou a partida no ataque. A equipe atacava com velocidade e logo a goleira Merle Frohms precisou intervir em cabeçada de Ellen White. O nível de intensidade das inglesas também chamava atenção, até pela vitalidade nas disputas. As Lionesses não pareciam dispostas a decepcionar a torcida em Wembley desta vez.

Apesar da força apresentada pela Inglaterra, a Alemanha conseguiu conter as adversárias. As primeiras respostas no campo de ataque também não demorariam, com a participação de Sara Däbritz. Mas não se negava que Popp fazia falta para dar mais presença ofensiva ao Frauenteam. As inglesas atacavam com mais frequência e apostavam nos cruzamentos, que davam trabalho às alemãs. A goleira Frohms precisava aparecer pelo alto. Além do mais, a final ficava mais pegada, com seus cartões.

A Alemanha poderia ter saído em vantagem aos 26, num escanteio perigosíssimo. A goleira Mary Earps fez milagre para salvar o desvio e, depois de algumas rebatidas, conseguiu segurar a pelota. O lance geraria ainda uma revisão do VAR, por um toque de mão dentro da área, mas a arbitragem não marcou o que parecia um pênalti claro. De novo, a polêmica voltava a Wembley num Alemanha x Inglaterra. Apesar do susto, as Lionesses permaneceram melhores na reta final da primeira etapa. Aos 38, a melhor chance veio numa tabela entre Ellen White e Beth Mead. A camisa 9 deu um toque por cima, mas a bola saiu lambendo o travessão. As alemãs precisaram se concentrar novamente no trabalho ofensivo.

Diante das dificuldades, a Alemanha voltou para o segundo tempo com Tabea Wassmuth no ataque. A substituta logo teria a primeira boa chance da etapa final, num tiro rasteiro defendido por Earps. O Frauenteam ganhava velocidade nas ações e daria outro susto com Lina Magull. A Inglaterra sentia o baque e mexeu duplamente aos 11, com as incursões de Alessia Russo e Ella Toone, nos lugares de Ellen White e Fran Kirby. E num momento em que a partida parecia se abrir um pouco mais, as Lionesses abriram o placar aos 17 minutos.

A brecha para a Inglaterra surgiu num contra-ataque, só possível graças ao lançamento primoroso de Keira Walsh. Toone estava posicionada perfeitamente na última linha e partiu em velocidade, com o caminho livre. Domou a bola e finalizou com maestria, com um leve toque por cima da goleira Frohms. Wembley rugia para as Lionesses. Os minutos seguintes seguiram favoráveis às inglesas, mas não que a Alemanha demorasse a recobrar suas forças e a pressionar.

(Naomi Baker/Getty Images/One Football)

Um lance fundamental aconteceu aos 21 minutos. Magull acertou uma pancada na trave, com um leve desvio salvador da goleira Earps. O rebote ainda sobrou para Schüller, que bateu mal e mandou de volta à arqueira, mesmo com a meta aberta. Mas aquele lance despertaria a Alemanha. A pressão dos minutos seguintes seria enorme, empurrando a Inglaterra para trás e rendendo muitas bolas na área. As ameaças se repetiam, com a defesa inglesa se defendendo no limite. Até que o empate saísse aos 34. Sydney Lohmann, que tinha acabado de sair do banco, acelerou o ataque brilhantemente. Fintou duas marcadoras e tocou para Wassmuth, que acionaria Magull. A camisa 20 finalizou com qualidade e deixava tudo igual.

A reta final do segundo tempo seria dramática. A Alemanha tinha mais embalo e seguiu melhor na partida. A Inglaterra, porém, acionou o seu banco com as entradas de Jill Scott e Alex Greenwood. A equipe da casa voltou a atacar com vigor nos últimos minutos e até parecia disposta a evitar a prorrogação. Alguns cruzamentos perigosos aconteceram, mas nada suficiente para escapar dos 30 minutos extras.

A prorrogação começou tensa. O primeiro tempo extra não teve grandes aberturas. A Alemanha manteve mais posse de bola, mas a Inglaterra parecia mais inteira nas divididas e evitou chances claras às rivais. A expectativa permeava o confronto, até que a explosão acontecesse no segundo tempo extra. As Lionesses acordaram e foram tudo para cima. O gol do título aconteceu aos seis minutos, depois de uma cobrança de escanteio. A bola ficou viva na área e Chloe Kelly finalizou duas vezes, para marcar na pequena área. A comemoração seria vibrante, com a atacante tirando a camisa, lembrando a icônica celebração de Brandi Chastain na Copa do Mundo de 1999 pelos Estados Unidos.

Restavam mais dez minutos no relógio e a partida não baixaria de ritmo neste final. A Alemanha se mandou para o ataque e tentou o abafa. Teve finalização bloqueada, escanteio sem resultado, chute defendido. E ainda quase deu tempo para a Inglaterra fazer o terceiro, para sacramentar a conquista. Já aos 12, Russo arrematou e Frohms salvou as alemãs. O tempo no ataque auxiliou as inglesas a encurtarem o caminho nos ponteiros até a festa definitiva. E ela veio, merecidíssima, com o apito final.

(JUSTIN TALLIS/AFP via Getty Images/One Football)

A conquista da Inglaterra eterniza Sarina Wiegman como uma lenda do futebol feminino. A treinadora é bicampeã da Eurocopa. Já tinha levado a Holanda ao troféu inédito e faz o mesmo com a Inglaterra, com pouco mais de um ano de trabalho. O futebol inglês investiu nas mulheres, com muita força nos clubes, e isso se reflete agora na seleção. O elenco reúne gigantes como Lucy Bronze, Jill Scott, Fran Kirby e Ellen White. No entanto, Chloe Kelly tem o gosto de ser a responsável pela explosão e Ella Toone ainda deixa uma imagem eterna de seu golaço, com apenas 22 anos. Beth Mead recebeu o prêmio de melhor da competição, como protagonista da glória. Por fim, a capitã Leah Williamson se tornou a responsável por receber a taça.

A campanha da Inglaterra é irrepreensível, assim como o desempenho no ano, ainda invicta em 2022. A campanha deu motivos para empolgação na fase de grupos especialmente pelos 8 a 0 sobre a Noruega, ainda com o 1 a 0 diante da Áustria e os 5 a 0 contra a Irlanda do Norte. Nas quartas de final, as Lionesses passaram com mais aperto pela Espanha na prorrogação, por 2 a 1. Depois, derrotaram a Suécia por 4 a 0, numa semifinal categórica. Até que a decisão contra a Alemanha terminasse de coroar esse time. Contra o rival oito vezes campeão continental, surge um troféu que não deixa pedra sobre pedra para as inglesas.

A Inglaterra conquista o título inédito da Eurocopa, depois dos vices em 1984 contra a Suécia e em 2009 diante da Alemanha. Junta-se à lista de campeãs ao lado de Alemanha (oito taças), Noruega (duas), Suécia (uma) e Holanda (uma). E os ecos de Wembley não deverão parar por aí. Será interessante acompanhar, nos próximos meses, como esse troféu irá reverberar no futebol inglês. Se o futebol feminino no país já recebia mais investimento e atraía mais público, uma conquista diante de 87 mil pessoas (além de milhões na televisão) tem tudo para transformar essa realidade de forma mais intensa. De incentivar mais mulheres a tomarem os gramados e as arquibancadas.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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