Marta encerra seu show e deixa a pergunta: o que será da Seleção sem ela?
A Rainha do Futebol se despede, mas deixa um legado para as futuras gerações que vestirem a amarelinha
Ao entrar nos corredores da exposição “Rainhas de Copas”, no Museu do Futebol, um rosto se destaca. É o de Marta. O olhar sério, de completa concentração, estampa quase todas as paredes do evento, que conta a trajetória do Brasil na Copa do Mundo Feminina.
Uma trajetória que contou com a presença da Rainha do Futebol em seis das nove edições disputadas até agora. Por isso, o adeus da maior de todos os tempos, após 20 anos vestindo a camisa verde e amarela, marca o fim de uma era.
Marta: a maior de todos os tempos com a amarelinha
De 2006 a 2010, Marta conquistou cinco bolas de ouro da Fifa em sequência. Foi a única atleta (homem ou mulher) que conseguiu este feito em série. Já pela Canarinho, ela acumula 189 jogos e 122 gols. Em Copas do Mundo, tornou-se a maior artilheira de todas as edições, tanto feminina quanto masculina, com 17 gols em 23 jogos.
Além disso, possui um extenso currículo de títulos, incluindo a medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de 2003 e 2007, e a conquista da Copa América em 2003, 2010 e 2018. Ela também foi vice-campeã da Copa em 2007 e conquistou medalhas de prata nas Olimpíadas de 2004 e 2008.
Mesmo assim, a figura lendária de Marta não se restringiu às quatro linhas. O carisma inigualável e o tom inabalável também a projetaram para a mídia. Assim, ela se tornou a voz das mulheres no futebol. Prova disso foi o ato das Olimpíadas de Tóquio, quando escolheu jogar com chuteiras sem patrocínio em forma de protesto pela desigualdade nos valores oferecidos para homens e mulheres.
Marta também fez parte do grupo que protestou no pódio, em 2007, ao conquistar o segundo lugar na Copa do Mundo da China. Dezesseis anos depois, ao sair de campo, com a queda decretada ainda na fase de grupos, ela não se calou mais uma vez.
– A gente tem que continuar apoiando essas meninas, porque esse é só o começo para elas. E ano que vem já tem a Olimpíada. Então, da mesma maneira que a galera estava empolgada no começo da Copa, apoiando a gente, seleção feminina, futebol feminino do Brasil, que continue apoiando. Que não seja só no momento, mas que seja contínuo, porque o trabalho tem que continuar.
Marta precisou cortar cordão umbilical com a Seleção
Em 2019, após a eliminação do Brasil nas oitavas de final para a França, anfitriã daquela edição da Copa, Marta já havia preparado o terreno para a sua despedida no Mundial seguinte.
– Não vamos ter Formiga, Marta e Cristiane para sempre. O futebol feminino depende de vocês para sobreviver. Valorizem isso. Chorem no começo para sorrir no fim – disse a atacante enquanto chorava copiosamente em frente às câmeras.
Por mais triste que tenha sido, o desabafo após a queda continha um recado necessário – quase um despertar para o imaginário do futebol feminino, que a via como uma figura eterna.
De certa forma, o recado de quatro anos atrás permitiu que a Rainha tivesse um processo de desligamento gradativo. Afinal, a ideia dela sempre foi tornar esse momento o menos doloroso possível, como um corte cordão umbilical. A partir do nascimento, o bebê precisa respirar por conta própria.
Marta foi essa estrutura fundamental para que a embrionária seleção feminina se desenvolvesse. Vestindo a camisa 10, ela calou os críticos e provou que o futebol jogado por mulheres também é arte, com dribles, golaços e inteligência dentro de campo.
Ao mesmo tempo, a dona de seis bolas de ouro sabia que o futuro não lhe pertencia. Por isso, pediu renovação. Sob o comando da técnica sueca Pia Sundhage, ela pôde se desligar pouco a pouco e deixar que a nova geração criasse a sua própria identidade.
Mesmo com a eliminação precoce em 2023, a Seleção tem uma nova cara e uma perspectiva de futuro. Este é o legado de Marta. Ela inspirou meninas em todos os cantos do mundo e, generosamente, cedeu o seu palco ao encerrar o show.