Football Leaks aponta que Uefa acobertou fraudes financeiras de PSG e Manchester City
Em esquema com a participação de Gianni Infantino, os dois clubes doparam suas finanças e inflaram contratos para burlar o Fair Play Financeiro

Uma série de denúncias impactantes sobre o futebol europeu foi publicada nesta sexta-feira pelo Football Leaks. Em trabalho investigativo liderado pela revista alemã Der Spiegel, ao lado de outros 14 veículos de imprensa que compõem a European Investigation Collaborations (EIC), as acusações foram apresentadas em diferentes mídias. Conforme as reportagens, há uma série de indícios que apontam irregularidades na Uefa. As provas asseguram que a entidade forjou a aceitação de Manchester City e Paris Saint-Germain pelo Fair Play Financeiro, quando os patrocínios recebidos pelos clubes ultrapassaram os limites propostos. Assim, o doping financeiro foi acobertado pela confederação, que deveria ter banido ambos os times na Liga dos Campeões.
Os dois clubes chegaram a sofrer punições mais brandas da Uefa, enquanto o PSG elaborou mecanismos para burlar as regras do Fair Play Financeiro. Ainda assim, sempre foi possível notar certa benevolência da entidade continental com os clubes inflados por magnatas do Catar e dos Emirados Árabes Unidos. Os documentos revelados pelo Football Leaks servem justamente para comprovar teorias e demandar uma investigação mais profunda, diante das sérias acusações. Ambos teriam violado sistematicamente as determinações do FPF, ao longo de anos, e foram acobertados.
Ao longo de cinco anos, a Qatar Tourism Authority teria injetado de €700 milhões a €1,125 bilhão no PSG, em ação encoberta pelo então presidente da Uefa, Michel Platini, e pelo secretário-geral da entidade, Gianni Infantino. Contratos exorbitantemente inflados permitiram a manobra. O mesmo teria ocorrido com o Manchester City, em montantes menores. O atual mandatário da Fifa, aliás, seria o principal responsável pelas negociações com os clubes. Infantino era o intermediário para que conseguissem acordos favoráveis, chegando a se reunir secretamente com representantes das diretorias. Na época, a Uefa chegou a afirmar que o seu organismo de controle financeiro funcionava como “uma entidade independente da interferência do secretário-geral”.
Infantino, por exemplo, permitiu o doping de €100 milhões anuais ao PSG. Em troca, o clube pagaria uma multa condicional, enquanto aceitava reduzir os gastos e o déficit por temporada. No caso do Manchester City, a reunião ocorreu com o chefe-executivo Ferran Soriano. Apesar do FPF apontar que os contratos com os Emirados Árabes burlavam as regras, houve um acordo acobertado que concedeu ao clube manter um patrocínio acima do nível legal. Haveria um acerto para limitar o doping financeiro em €26 milhões acima do preço real dos contratos.
A receita ampliada ilegalmente por City e PSG ajudava a cobrir os gastos, bem como evitava os entraves com o Fair Play Financeiro, fugindo de sanções mais pesadas. O FPF determina que os acréscimos financeiros podem ser feitos somente através de meios legítimos. O patrocínio superfaturado, obviamente, não está entre estes meios. Com isso, os déficits exorbitantes de ambos os clubes terminavam maquiados. A permissividade da Uefa não se via em outros casos. A confederação agia de maneira bem mais agressiva nos tribunais contra clubes de outras ligas, sobretudo romenos e turcos.
Após a divulgação das denúncias, City e PSG rechaçaram as fraudes, através de notas oficiais. O Paris Saint-Germain negou as afirmações e assegura que nunca rompeu o Fair Play Financeiro. Aponta que é um dos clubes “mais auditados do mundo”. Já o Manchester City garantiu que não irá comentar o assunto, declarando que o material pode ter sido roubado do City Football Group, e que esta é uma tentativa de prejudicar a agremiação. Em contrapartida, a Der Spiegel afirma que o mar de lama descoberto pelo Football Leaks não para por aí. No domingo, a televisão alemã irá veicular um documentário de 60 minutos sobre o assunto.
Superliga Europeia e Fifa também na mira
Há ainda outras acusações feitas pelo Football Leaks. Uma das maiores se concentra sobre Karl-Heinz Rummenigge, atual diretor executivo do Bayern de Munique. Segundo os documentos, o veterano arquitetou um “golpe” enquanto era presidente da Associação Europeia de Clubes. Ele encabeçou o projeto da Superliga Europeia, que contaria apenas com os times mais poderosos do continente e deixaria de lado as ligas nacionais.
Os bávaros chegaram mesmo a consultar como poderiam deixar a Bundesliga, para ingressar na nova Superliga. Segundo os documentos, em novembro de 2018, 16 clubes deverão assinar uma carta de intenções que põe a existência da Champions em xeque a partir de 2021. Parte destas equipes estaria disposta a romper com a Uefa. Também existiria um teste legal feito pelo dirigente, para que o Bayern não cedesse mais seus jogadores durante a Data Fifa.
O Football Leaks também prova outras irregularidades envolvendo Gianni Infantino, já em sua gestão como presidente da Fifa. Conforme os dados, ele interferiu no Código de Ética da entidade, atrapalhando o seu funcionamento, enquanto perseguiu funcionários críticos às suas posturas. Também exerceu pressão interna para que as federações recebessem dinheiro de maneira ilegal. E interferiu de forma indevida no projeto do novo Mundial de Clubes, estimado em US$25 bilhões.
Nas próximas semanas, o Football Leaks promete revelar o tratamento duvidoso sobre o doping positivo de “uma estrela internacional” e o modelo de evasão fiscal de grandes nomes da Premier League. O arquivo acessado pelos veículos de imprensa consiste em 70 milhões de documentos, que demandaram o trabalho de 80 jornalistas e outros profissionais ao longo dos últimos oito meses.