Eurocopa 2024

Foi exatamente contra a Suíça que Benzema teve uma de suas melhores exibições pela França, nos 5×2 dentro da Fonte Nova

Num confronto com mais de um século de história, Benzema é um personagem importante pela Copa de 2014

França e Suíça possuem um amplo histórico de confrontos entre suas seleções. A proximidade no futebol é natural, diante dos laços geográficos e culturais entre os dois países no centro da Europa. Curiosamente, este passado se concentra muito mais em amistosos do que em partidas oficiais. Durante 98 anos, de 1905 a 2003, todos os embates entre as equipes nacionais foram de maneira amistosa. Porém, a partir de 2004, os times se pegaram seis vezes por competições oficiais. E a vitória mais contundente deste período pode servir como boa lembrança a Karim Benzema. Foi exatamente contra os suíços que o atacante teve uma de suas melhores atuações pelos Bleus, comandando a goleada por 5 a 2 na fase de grupos da Copa do Mundo de 2014.

A história da seleção da Suíça começa exatamente contra a França. Os Bleus já existiam desde 1904 e, no ano seguinte, seriam os adversários dos helvéticos na estreia do país no futebol internacional. O duelo no Parc des Princes teve apenas 500 espectadores nas arquibancadas, com a vitória francesa por 1 a 0, gol de Gaston Cyprès. Seria o início de uma longa amizade entre as seleções. A França venceu novamente um duelo em 1908, em Genebra, enquanto a Suíça teria sua primeira vitória em 1911. Goleou por 5 a 2, naquela que se tornava a maior goleada da recém-fundada equipe.

A hegemonia no duelo, de qualquer maneira, era da França. Os Bleus chegaram a aplicar duas goleadas por 4 a 1 em 1912 e 1913. Já na virada dos anos 1920 para os 1930, o amistoso primou pelo alto número de gols. A Suíça chegou a aplicar um 4 a 3 em 1928, antes de dois empates consecutivos por 3 a 3. Até o fim da década de 1930, as duas equipes se enfrentaram 16 vezes e tinham um cartel mais equilibrado. Foram sete vitórias francesas contra cinco suíças, além de quatro empates. Os dois times chegaram a se encarar em março de 1942, durante a Segunda Guerra, com triunfo da Suíça por 2 a 0 em Marselha. Já em abril de 1945, um duelo contra os vizinhos retomou as atividades da seleção francesa ao final dos conflitos. Os helvéticos também ganharam este jogo por 2 a 1 e igualaram o número de vitórias no histórico.

Durante a década de 1950, as diferenças entre os times se tornaram mais sensíveis. A França venceria quatro dos seis jogos disputados entre 1947 e 1958, com apenas um triunfo dos suíços. Nomes como Jean Baratte e Raymond Kopa aproveitaram aqueles amistosos para brilhar. O troco da Suíça em 1960 viria em grande estilo, com uma goleada por 6 a 2 na Basileia. Ídolo do Basel e vice-artilheiro da Copa de 1954, o atacante Josef Hügi aterrorizou os Bleus ao anotar cinco gols naquele encontro. E depois de um empate por 2 a 2 em 1963, os encontros das duas seleções se tornaram menos frequentes nas décadas seguintes.

Depois de 26 jogos até 1963, o França x Suíça aconteceu apenas mais seis vezes nos 40 anos seguintes, até 2003. Seriam três vitórias para cada lado neste intervalo. A França chegou a aplicar um 4 a 0 em 1977, com direito a gol de Michel Platini. Também ganhou por 2 a 1 em 1988 e por 2 a 0 em 2003. Já a Suíça teve seu grande momento em 1986, com uma equipe cheia de novatos que aplicou 2 a 0 nos Bleus logo após a campanha até as semifinais da Copa do Mundo. Também ganhariam jogos em 1970 e 1992 – este, referendando seu bom momento rumo ao Mundial dos Estados Unidos, que encerrou um hiato de 28 anos longe das grandes competições.

A história oficial

O primeiro jogo oficial de França x Suíça por uma competição internacional, enfim, aconteceu na fase de grupos da Euro 2004. As duas equipes integravam o Grupo B do torneio, no qual também figuravam Inglaterra e Croácia. O resultado não apenas confirmou os favoritos Bleus na liderança da chave, como também encerrou as esperanças de classificação dos suíços, relegados à lanterna. A vitória por 3 a 1 em Coimbra ratificava as expectativas ao redor dos franceses.

Dirigida por Jacques Santini, a França preservava diversos jogadores campeões continentais em 2000. A escalação reunia nomes do porte de Lilian Thuram, Claude Makélélé, Patrick Vieira, Robert Pirès e David Trezeguet. O protagonismo acabava dividido entre Zinédine Zidane e Thierry Henry. Já a Suíça de Köbi Kuhn tinha uma equipe bem mais modesta, ainda que tenha emendado participações internacionais. Hakan Yakin era o destaque num time de jogadores acostumados à camisa dos helvéticos, como Johann Vogel, Patrick Müller, Stéphane Henchoz, Raphael Wicky e Johan Vonlanthen. Pouco para intimidar os franceses.

Zidane começou a ditar as cartas naquele jogo. O camisa 10 abriu o placar aos 20 minutos, numa cabeçada certeira após cobrança de escanteio. A Suíça, no entanto, fazia Fabien Barthez trabalhar e empatou com o novato Vonlanthen ainda na primeira etapa, punindo uma saída de bola errada dos oponentes. Já no segundo tempo, quem brilhou foi Henry. O camisa 12 definiu o placar já depois dos 30 minutos, com dois gols. O destaque ficou ao seu segundo, o terceiro da noite, em que deixou o marcador no chão e mandou no canto do goleiro. Os Bleus cairiam diante da Grécia na fase seguinte da Euro 2004.

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França e Suíça voltaram a se cruzar nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2006, sorteadas no mesmo grupo. Os dois empates nos confrontos não atrapalharam o favoritismo francês. As equipes não saíram do 0 a 0 no Stade de France e ficaram no 1 a 1 dentro do Wankdorf. Djibril Cissé abriu o placar ao time de Raymond Domenech, enquanto Ludovic Magnin buscou o empate para os helvéticos. No fim das contas, a França terminou a chave com 20 pontos e ficou com a vaga direta. A Suíça somou 18, à frente de Israel apenas no saldo de gols. Com isso, disputou a repescagem contra a Turquia para confirmar sua vaga no Mundial.

E mais uma partida entre as duas seleções aconteceu na Alemanha, adversárias no Grupo G da Copa, o mesmo de Togo e Coreia do Sul. O confronto marcou a estreia de França e Suíça no Mundial de 2006. O time de Raymond Domenech parecia perder embalo em relação aos anos anteriores, mas ainda trazia várias de suas estrelas – como Thuram, Barthez, Vieira, Zidane e Henry. Franck Ribéry surgia como grata novidade nos Bleus. Já a Suíça, ainda sob as ordens de Köbi Kuhn, via a ascensão de jogadores como Alexander Frei, Tranquillo Barnetta, Philippe Senderos e Pascal Zuberbühler – destaques que não estiveram em campo pela Euro 2004.

Todavia, França e Suíça não escaparam daquilo que tinha sido visto nas Eliminatórias. As duas equipes empataram por 0 a 0, num jogo de chances desperdiçadas pelos dois lados. Os suíços mandaram uma bola na trave logo no primeiro tempo, com Frei ainda isolando o rebote. Do outro lado, Henry não teve um pênalti assinalado a seu favor. Já na segunda etapa, Barthez acabaria sendo decisivo para os Bleus, com uma excelente defesa no mano a mano com Daniel Gygax. Mesmo se arrastando na fase de grupos, a França avançaria em segundo e se agigantaria nos mata-matas até a final, perdida contra a Itália. Já a Suíça foi exatamente a líder, caindo nos pênaltis para a Ucrânia nas oitavas, se despedindo sem sofrer um gol sequer naquele Mundial.

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O show de Benzema

Foram mais oito anos até que um novo sorteio guardasse o cruzamento de França e Suíça. As duas equipes compuseram o Grupo F da Copa do Mundo de 2014, no qual também apareciam Honduras e Equador. O duelo europeu ocorreu na segunda rodada. Nas estreias, a França bateu Honduras e a Suíça conquistou uma emocionante vitória nos minutos finais contra o Equador. Então, franceses e suíços trabalhariam duro para manter a alta média de gols na Fonte Nova durante aquele Mundial. Os Bleus ganharam por 5 a 2, numa das partidas mais inspiradas de Benzema pela seleção.

Didier Deschamps formava desde já uma equipe que ganharia potencial rumo ao título da Copa de 2018. Muitos nomes, ainda assim, eram diferentes no Brasil. Hugo Lloris usava a braçadeira de capitão no gol. A linha defensiva tem Raphaël Varane como remanescente, acompanhado por Mathieu Debuchy, Mamadou Sakho e Patrice Evra. No meio, uma trinca muito física com Yohan Cabaye, Moussa Sissoko e Blaise Matuidi. Já na frente, Karim Benzema atuava aberto na esquerda, com Mathieu Valbuena na direita e Olivier Giroud servindo como referência.

A Suíça dirigida pelo lendário Ottmar Hitzfeld, por sua vez, contava com diversos protagonistas da atual seleção. Xherdan Shaqiri, Granit Xhaka e Ricardo Rodríguez viviam sua afirmação pela equipe nacional naquele momento, representando uma passagem de bastão. Atuavam ao lado de figurinhas carimbadas de outros tempos, a exemplo de Diego Benaglio, Stephan Lichtsteiner, Valon Behrami e Gökhan Inler. Haris Seferovic era outro remanescente no time atual naquele ataque, assim como Admir Mehmedi.

A goleada da França começou aos 17 minutos, numa cobrança de escanteio de Valbuena que Giroud completou de cabeça. Era o centésimo gol dos Bleus na história das Copas. Um minuto depois, Benzema roubou a saída de bola da Suíça e passou para Matuidi ampliar a contagem em Salvador. Xhaka teria um gol anulado na sequência e Shaqiri obrigou uma defesaça de Lloris, mas a maior parte das chances eram francesas. Benzema estava inspirado e puxava a maior parte dos avanços de sua equipe.

Benzema poderia já ter guardado o seu numa cobrança de pênalti, que ele mesmo sofreu. Benaglio defendeu o chute sem tanta colocação e Cabaye perdeu o rebote de maneira incrível, carimbando a trave com a meta escancarada à sua frente. Antes do intervalo, de qualquer maneira, deu tempo para a França assinalar o terceiro num contra-ataque fulminante. Giroud foi lançado em velocidade pela esquerda e cruzou para Valbuena escorar. Os Bleus não tinham dó de martelar a meta helvética.

A superioridade da França se tornou ainda mais expressa no segundo tempo. Foi quando Benzema conseguiu o seu primeiro gol. A fome de bola do camisa 10 era expressa, arriscando muitas vezes e criando oportunidades aos companheiros. Seu tento veio aos 22, com participação de Paul Pogba, que havia entrado no lugar de Giroud. A então promessa do meio-campo deu uma enfiada de bola sublime, encobrindo a marcação, e Benzema definiu por baixo de Benaglio. Já o quinto seria cortesia de Benzema para Moussa Sissoko. O atacante abriu o passe na direita e encontrou o companheiro completamente livre, batendo no contrapé do goleiro Benaglio.

Somente depois dos 35 do segundo tempo que a Suíça conseguiu diminuir um pouco o estrago causado pela França. Isso não sem antes de Benaglio realizar três defesas salvadoras, a mais difícil exatamente contra Benzema. O primeiro gol veio numa falta cobrada batida por Blerim Dzemaili, que arriscou do meio da rua e mandou no cantinho de Lloris. Os suíços tinham mais interesse no jogo e marcaram o segundo com Xhaka, aproveitando um lindo lançamento de Inler para superar Lloris. E o segundo gol de Benzema só não saiu porque, exatamente no momento em que o atacante chutava de fora da área para balançar as redes, o árbitro Björn Kuipers resolveu apitar o fim da partida. Uma pena, mas que não diminuía a apresentação avassaladora do atacante.

A França faria um bom papel na Copa de 2014. Líder do Grupo E, acabou eliminada pela Alemanha nas quartas de final. Já a Suíça também sairia de cabeça erguida. Com a segunda colocação, sucumbiu apenas à Argentina, dando trabalho aos futuros vice-campeões rumo à prorrogação.

Dois anos depois, França e Suíça ainda se encararam na fase de grupos da Euro 2016. As equipes estavam no Grupo A, o mesmo de Romênia e Albânia. Com duas vitórias, os Bleus chegaram à última rodada classificados. Já os helvéticos dependiam pelo menos de um empate para evitar qualquer risco de uma eliminação precoce. Foi o que aconteceu em Lille, com o 0 a 0 no placar beneficiando os suíços, que passaram na primeira posição. Os franceses ficaram com a liderança da chave.

Mais personagens daquela ocasião se repetem cinco anos depois. Didier Deschamps seguia no comando da França. Hugo Lloris, Paul Pogba e Antoine Griezmann foram titulares naquele jogo, assim como o hoje reserva Kingsley Coman. Já a Suíça contava com as ordens de Vladimir Petkovic. Yann Sommer, Fabian Schär, Ricardo Rodríguez, Granit Xhaka, Xherdan Shaqiri, Admir Mehmedi e Breel Embolo formavam uma espinha dorsal bem parecida com a atual. Haris Seferovic ainda saiu do banco na ocasião.

O primeiro tempo no Estádio Pierre Mauroy teria um duelo particular entre Pogba e Sommer. O meio-campista pararia em duas excelentes defesas do goleiro, além de mandar um chute venenoso para fora. Já na segunda etapa, Sommer seguiu fazendo por merecer o prêmio de melhor em campo, com outra ótima intervenção diante de Griezmann. Além do mais, deu sorte quando Dimitri Payet estalou o travessão. A França só pararia na decisão daquela Euro, contra Portugal, enquanto a Suíça sucumbiria nos pênaltis diante da Polônia nas oitavas. Cinco anos depois, mais um reencontro. E, dentro de mais de um século de história na rivalidade, será exatamente a ocasião mais importante. Um mata-mata que tanto faltava neste passado.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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