
O Getafe condenou os cantos “depreciativo e intolerante” direcionados ao time pelos torcedores adversários, incluindo alguns relacionados ao atacante Mason Greenwood, emprestado pelo Manchester United. O clube diz que os jogadores são “pessoas com sentimentos, que têm família e amigos”. É uma situação que tem sido constante e já é pauta de La Liga, que precisa levar o caso a sério. E este talvez seja o problema.
La Liga formalmente denunciou os gritos de “Greenwood, morra” dos torcedores adversários nos jogos do Getafe, como contra Osasuna e Real Sociedad. É esperado que a liga faça o mesmo após o empate por 2 a 2 com o Athletic Bilbao, nesta quarta-feira (27).
O jogo contra o Athletic Bilbao teve diversos incidentes, que levaram a um bate-boca entre o atacante Iñaki Williams e o técnico do Getafe, José Bordalás. A discussão sobre a alegação de Williams que o Getafe estava fazendo cera, gastando tempo à toa na partida.
“Tudo isso prejudica gravemente a imagem do nosso clube, da competição e dos profissionais”
“O Getafe CF quer manifestar a sua total desaprovação pelos cantos depreciativos e intolerantes, insultos de particular gravidade, que têm ocorrido com recorrência, durante as disputadas jornadas do Campeonato Nacional da LaLiga EASports e que prejudicam a imagem e também a moral dos nossos jogadores e treinadores”, disse o Getafe, em um comunicado de imprensa nesta quinta (28).
“Cantos insultuosos, fora de qualquer contexto cívico, agravados com críticas que respeitamos como liberdade de expressão, do ponto de vista desportivo, mas que NÃO partilhamos quando a essa corrente crítica são atribuídos epítetos depreciativos, insultos e desrespeito aos membros da equipe e comissão técnica do Getafe CF”, diz ainda a nota do clube.
“Os jogadores e treinadores do Getafe CF, como profissionais do mais alto nível, participam neste espetáculo e estão atentos ao porta-voz mediático que representa jogar na melhor liga do mundo. Têm familiares e amigos que sofrem com eles e merecem o respeito que pedimos sem fissuras neste comunicado. Tudo isto prejudica gravemente a imagem do nosso clube, da competição e dos profissionais que dela fazem parte”.
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Do que Mason Greenwood foi acusado?
Greenwood foi afastado do Manchester United acusado de estupro, agressão e comportamento coercitivo. Tudo isso contra uma mulher, a sua ex-namorada. Considerado uma grande promessa, Mason Greenwood foi revelado pelo Manchester United e era visto como um jogador não só para ser destaque do Manchester United, mas também da seleção inglesa.
Greenwood recebeu a camisa 11 na temporada 2020/21, a camisa que um dia foi do ídolo Ryan Giggs — ironicamente, ele também foi acusado de agressão contra a ex-companheira. Greenwood foi afastado do elenco do Manchester United em janeiro de 2022, uma época que surgiram relatos, com áudios, do relacionamento violento entre o atacante e a namorada.
Giggs acabaria absolvido na justiça, depois que a testemunha-chave do processo, desistiu de depor. Isso acabou sendo crucial para que o Giggs, denunciado em 2021, tenha sido absolvido das acusações. O caso de Greenwood foi similar. Em fevereiro de 2023, as acusações contra Greenwood foram retiradas depois da retirada da testemunha-chave, que desistiu de depor.
O jogador foi absolvido, portanto, e seguia sem nenhuma pendência com a Justiça. Só que entre não dever nada à Justiça e voltar a jogar futebol profissionalmente havia uma grande distância. O Manchester United avaliava reintegrar o jogador ao elenco principal e o técnico Erik Ten Hag já pensava em como usaria o jogador.
Só que a informação vazou. The Athletic mostrou o plano dos diretores do United e isso despertou uma reação muito forte dos torcedores. A reação foi majoritariamente negativa e o clube ficou sob fortes críticas. Como uma inevitável consequência disso, a reintegração do jogador foi um plano abandonado.
A solução, então, foi a saída de Greenwood do Manchester United. Só que a imagem de Greenwood estava manchada e a sua contratação foi avaliada como um risco e nenhum clube da Premier League quis assumir esse risco. Clubes como Lazio e Atalanta sondaram Greenwood, mas faltou dar o passo adiante. No último dia da janela de transferências, foi o Getafe que efetivamente fez proposta para levar Greenwood, por empréstimo. O negócio foi fechado.
Presunção de inocência é assunto sério
Bordalás, técnico do Getafe, defendeu a contratação do jogador e justificou dizendo que o clube queria “ajudá-lo a recuperar seu status profissional”. Até aqui, Greenwood atuou em três partidas. Entrou no segundo tempo nos jogos contra o Osasuna e a Real Sociedad e jogou a partida inteira contra o Athletic Bilbao. Em todos, foram proferidas ofensas contra Greenwood.
La Liga promete agir e denunciou o caso contra o Osasuna. A consequência lógica seria a punição aos clubes, mas isso ainda não foi definido. E a entidade parece estar pisando em ovos para seguir adiante com o caso.
Greenwood não tem pendências com a justiça. O caso contra ele é grave e a sua imagem foi manchada pelo comportamento claramente abusivo que as gravações mostraram que ele tinha contra a namorada. As agressões, porém, não se sabe com certeza se aconteceram. Isso nunca foi provado. E o fato aqui é que ele foi inocentado depois que não houve provas suficientes para condená-lo. Por isso, não dá para impedi-lo de exercer a sua profissão. Seria diferente se ele fosse um condenado. O caso, porém, é o inverso.
A presunção de inocência é um princípio fundamental do direito. Por mais que a Justiça tenha seus problemas, e não são poucos, em lugar algum do mundo, um jogador não pode ser tratado como condenado sem que a Justiça tenha definido assim. E isso nada tem a ver com não levar a sério denúncias de violência contra a mulher. É preciso que toda denúncia seja levada a sério, apurada, investigada devidamente e os acusados passem pelo devido processo legal. Se após o processo o acusado for considerado inocente, então assim ele tem que ser tratado e não pode sofrer abusos por isso.
Até por isso, seria importante que La Liga agisse de forma exemplar. Não é aceitável que torcida alguma peça a morte de um jogador. Isso vai além da provocação. Mas isso seria esperar demais de uma entidade que nunca conseguiu se manifestar firmemente contra atos racistas constantes contra diversos jogadores, como Vinícius Júnior, mas não só ele.
La Liga não consegue proteger os jogadores dos diversos abusos que eles sofrem e que nada têm a ver com provocação, como por vezes é argumentado. La Liga precisa agir. Mas dizemos tanto isso e tantas vezes que só reforça como é difícil esperar algo de uma entidade que é constantemente omissa. Então, continuaremos cobrando para que a entidade saia do berço esplêndido e tome uma atitude.