Eliminatórias da Copa

Profecia de Dorival constrange uma seleção sem graça nem vida

Resposta motivacional do técnico da seleção brasileira virou uma anedota embaraçosa após a derrota para o Paraguai

Na véspera, a resposta motivacional de Dorival Júnior colocou a seleção na final da Copa do Mundo que acontece em pouco menos de dois anos, direito dele, claro, interessante até, caso fosse um chacoalhão de grandeza, um sopro de autoestima, mas não.

Dormir imaginando que esse time do Brasil voltará a decidir um Mundial e acordar ouvindo olé do Paraguai acaba de se tornar uma anedota constrangedora da maior camisa do futebol, que perde sem grande irritação, à espera de um processo de melhora que parece esperar o dia que há de chegar, vai saber.

Porque atuar mal ou bem, ainda mais na disputa atual de seleções, é do jogo, ainda mais com três treinadores em um ano e meio, sendo dois interinos e um que não dá exatamente aquela pinta toda de que tem força para sobreviver às intempéries.

Mas o que assusta é a falta de senso de urgência, essa aceitação de que hoje, segundo semestre de 2024, a tendência é mais ou menos isso mesmo, a do melhor time brasileiro possível sofrer para criar chances (nem estamos pedindo muitos gols, só chances) contra o Paraguai.

A normalização da mediocridade é difícil de ser curada e já vem deixando sequelas, já que não há muita pressão de remediar logo. Com Ramon era um novo momento, e vai saber o que o Ramon fez para virar técnico da seleção por um jogo sequer.

Depois, com Fernando Diniz, era uma tentativa, e tudo bem, aí vai chegar um técnico de elite mundial, mas não rolou, acontece, e agora, vem Dorival, que também à sua maneira, vai levando ali na coisa do trabalho sendo feito, da longa caminhada rumo aos resultados, num futuro (distópico?) em que a seleção brasileira está dando passos firmes rumo ao último domingo mundialista em 2026.

Tudo isso com a grande cascata da evolução e da renovação, essa que tem Danilo jogando os 90 minutos nem de zagueiro, nem de lateral, mas ali compondo uma suposta liderança que não assina uma jogada, não levanta o time numa bola difícil, não oferece um suporte, seja técnico ou mental, para os jovens craques da frente.

Um devaneio de que deixar o melhor jogador da última temporada europeia recebendo bola lenta lá na ponta-esquerda vai fazê-lo ganhar jogos, sem que Vini, por sua vez, encontre maneiras de ao menos demonstrar incômodo com isso.

Uma referência oferecida a Bruno Guimarães que jamais se justificou, com toda a dificuldade de dar ritmo a partidas contra meio-campistas bastante acessíveis, se é que há essa diferença toda entre um titular da Premier League e gente de meio de tabela no Brasileirão.

Então vira um beco sem saída, porque o Brasil não precisa de resultados para ser um campeão incontestável das eliminatórias, um tanto traumatizado com os maravilhosos ciclos de Tite dando em nada quando se encontra uma Bélgica, uma Croácia; mas, ao mesmo tempo, já passou da hora de haver um treinador e um esboço de time que pelo menos ofereçam uma fagulha de esperança de que algo pode estar acontecendo, alguma combinação nova, alguém que seja possível dizer que por um lance parece estar jogando um pouco melhor, um fiapo mais à vontade. Nada, nada.

Muitos têm se lembrado da caminhada para o pentacampeonato de 2002, quando os quatro anos também passaram por um roteiro tortuoso, a última vez em que o país chegou na Copa aos trancos e barrancos.

Ao ser oferecido a Felipão, talvez o maior da história brasileira em termos de mobilização de vestiário e casca para zombar da pressão, o time seguiu mal, perdendo um monte de jogo, e depois deu num título pautado pelo senso coletivo, a família Scolari, e o talento individual.

É difícil olhar para Dorival Júnior, competente montador de equipes no futebol brasileiro recente, e encontrar qual a vazão que ele poderia dar para o elenco que tem em mãos, em tática, técnica e, principalmente, em cara.

É meio clichê, ainda mais para os que acreditam que o desempenho e o resultado se resolvem majoritariamente na bola de pé em pé, mas a visita ao Defensores del Chaco assustou por essa falta de brilho, essa total ausência de vitalidade e energia para transformar um ambiente adverso em gol.

Não é que os jogadores não demonstram vontade, é claro que eles querem vencer e construir uma carreira bonita no time nacional, mas o jogo termina tarde da noite e não é tarefa simples encontrar, no campo ou à beira dele, quem pode puxar um novo momento.

Os trintões não têm esse perfil e também não estão jogando aquela bola toda; os mais jovens ainda não ganham partidas só na marra, e restou um limbo, meio culpa de ninguém, à espera do próximo passo. Ele convoca, a gente vem e segue tentando, lembrando das culpas estruturais e vendo no que vai dar.

Por enquanto, só um borrão acontecendo enquanto equipe e, pior, raros nomes que você crava que se sentem à vontade com essa camisa, principalmente nos dias difíceis.

Daria para salvar a busca de Rodrygo, tirado sabe-se lá por que no segundo tempo se é quem mais dá sinal de poder marcar um gol salvador, e a insistência de Paquetá, que erra bastante, sim, mas tenta dar o tom, puxar o time e procurar as tabelas.

Alguma coisa de André, um futuro possível com Luiz Henrique, e não muito mais que isso. É muito pouco. Aí, quando a fase está ruim e os nossos meio sem graça, entra uma bicicleta da Venezuela, uma trivela do Paraguai… capaz do Chile baixar com Salas e Zamorano na frente daqui a um mês. Até outubro.

Foto de Paulo Junior

Paulo JuniorColaborador

Paulo Junior é jornalista e documentarista, nascido em São Bernardo do Campo (SP) em 1988. Tem trabalhos publicados em diversas redações brasileiras – ESPN, BBC, Central3, CNN, Goal, UOL –, e colabora com a Trivela, em texto ou no podcast, desde 2015. Nas redes sociais: @paulo__junior__.
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