Concacaf

Cuba inicia campanha nas Eliminatórias com jogadores do exterior pela primeira vez – mas talvez pensando em 2026

Onel Hernández tem 28 anos. É um meia-atacante habilidoso formado no futebol alemão. Contratado pelo Norwich em 2018, foi um dos principais jogadores do título da segunda divisão, com oito gols e nove assistências. No ano seguinte, tornou-se o primeiro cubano da história da Premier League. É claramente qualificado para defender a seleção do seu país, a 180ª entre as 210 do ranking da Fifa. Mas isso nunca aconteceu. Pelo menos até esta quarta-feira, quando ele deve estrear contra a Guatemala, pela primeira rodada da fase inicial das Eliminatórias da Concacaf para a Copa do Mundo.

Quase aconteceu em 2018. O Norwich chegou a tuitar parabenizando o seu jogador pela primeira convocação, para jogos da Liga das Nações da Concacaf. Mas era apenas uma miragem. Dois dias antes de viajar, a mãe de Hernández, Yaneisy Mayea, residente de Cuba em Morón, onde o jogador nasceu, foi instruída a dizer a seu filho que ele não poderia viajar. “Eles nunca me deram uma resposta concreta. Onel tinha tudo pronto para vir e, no último instante, eles disseram que ele não podia. Quando eu lhe contei, ele falou: ‘Mãe, vá para Havana e diga que eu pago pelos meus voos, meu hotel, minha comida. Diga que eu só quero jogar!’. Eu fui, mas não adiantou. Não recebi respostas. Nunca me foi explicado”, disse, em entrevista à BBC.

Os motivos dessa confusão específica podem não ter sido explicados, mas o fato é que, apesar de ter criado um mecanismo em 2013 para que seus atletas de todas as modalidades pudessem atuar profissionalmente em ligas estrangeiras, a seleção cubana ainda não convocava jogadores do exterior. Apenas quem tinha contrato com o Instituto Nacional de Esportes, Educação Física e Recreação (INDER) eram elegíveis. Essa política parece que está mudando, embora ainda não se saiba exatamente por quê.

Para enfrentar Guatemala e Curaçao, o treinador Pablo Elier Sánchez recebeu permissão para incluir 11 atletas de clubes estrangeiros, para uma pré-lista de 26. Hernández é o mais famoso, mas também foram chamados Joel Apezteguía, atacante de 37 anos que defende o Tre Fiori, de San Marino, o defensor Jorge Corrales, do Tulsa, da USL, segunda liga dos Estados Unidos, e até uns caras que jogam no Brasil: Sandy Sánchez, Sander Fernández e Sandro Cutiño, do Navegantes, de Santa Catarina. Ainda há convocados da Guatemala, da Espanha, da República Dominicana, Honduras e Costa Rica.

“Estou contente pela chamada à seleção, o que eu esperava há muitos anos. Para mim, é algo único”, disse Apezteguía. Outros já haviam defendido o time nacional, como Jorge Corrales. Em 2015, ele recebeu permissão para visitar o pai em Miami, após a disputa da Copa Ouro, e decidiu ficar. Recebeu um visto de cinco anos e chegou a defender times da Major League Soccer antes de chegar ao Tulsa. As quartas de final daquela edição do torneio regional, contra os Estados Unidos, em 18 de julho daquele ano, é por enquanto seu último jogo por Cuba.

Essa é uma distinção importante. Segundo o New York Times, todos os jogadores convocados receberam permissão para sair da ilha ou o fizeram ainda crianças junto com os pais. Ainda há um outro contingente de desertores que, por enquanto, segue ignorado. É o caso de Osvaldo Alonso, volante de 35 anos do Minnesota United. Ele desertou em 2007, também durante uma Copa Ouro. Estava com colegas fazendo umas compras em um Wal-Mart de Houston. Saiu olhando as prateleiras e atravessou a porta em direção à rua. Precisou andar vários quarteirões até encontrar um homem que falava espanhol e pedir seu celular emprestado para ligar a um amigo em Miami.

De acordo com a reportagem do NY Times, Cuba não deu nenhuma explicação oficial para a mudança de política. Mensagens para o treinador Sánchez, autoridades da federação e do INDER não foram respondidas. Mas podemos tentar uma dedução: mesmo com os estrangeiros, é difícil imaginar que Cuba consiga uma das três vagas diretas à Copa do Mundo do Catar ou mesmo na repescagem. Provavelmente nem chegará à fase final, e olha que ela foi ampliada de seis para oito seleções.

Cuba nem passou da segunda fase das Eliminatórias para 2018, despachado por Curaçao. Para o Mundial do Brasil, estava mais bem ranqueado, entre duas campanhas de quartas de final na Copa Ouro, e entrou diretamente na terceira fase, mas foi sumariamente eliminado com um ponto em seis rodadas no grupo que tinha Honduras, Panamá e Canadá. Um jogador da segunda divisão inglesa e outro do campeonato de San Marino ajudam, mas ainda há 25 seleções da Concacaf à sua frente no ranking da Fifa – por mais que, como sabemos, ele esteja longe de ser um sistema perfeito.

Mas podemos pegar também os confrontos recentes. Cuba perdeu três dos quatro jogos que disputou contra a Guatemala desde 2014. Tem apenas duas vitórias em toda a história, segundo levantamento do site português oGol. Até possui um retrospecto positivo contra Curaçao: uma vitória e dois empates, os que o acabaram eliminando no qualificatório para o torneio da Rússia. E Curaçao é uma seleção em crescimento, em 76º no ranking da Fifa (à frente do Panamá). Chegou às quartas de final da última Copa Ouro e é treinado por Guus Hiddink, experiente e vitorioso treinador do futebol internacional.

O grupo ainda conta com as Ilhas Virgens Britânicas e com Granadinas, mas apenas um dos times passará à segunda fase, que consiste de três mata-matas entre os vencedores de cada chave para definir as equipes que se juntarão a EUA, México, Costa Rica, Honduras e Jamaica no octogonal final. Por outro lado, para 2026, a Copa do Mundo será ampliada para 48 seleções e, se Cuba começar a integrar seus jogadores estrangeiros desde agora, pode chegar mais forte para beliscar uma dessas vaguinhas extras.

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Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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