Brasil

Tite encerra passagem frustrante pelo Flamengo como ex-melhor técnico do país

Treinador demitido nesta segunda-feira (30) sem conseguir dar ordem nem brilho à utopia flamenguista

Pensava que Tite, mesmo sem ser o técnico que vende promessas de encanto, poderia fazer vibrar o Maracanã pelo Flamengo com sua capacidade de entendimento do jogo praticado no Brasil somada à riqueza de seu elenco, mas não.

Em algum momento, principalmente no impacto inicial de De La Cruz, na maturidade de Gerson e nos gols de Pedro, esse Flamengo parecia consistente para, no mínimo, ainda que não virasse um onze cantado e decorado por todo o Rio de Janeiro, empilhar chances de gol, amassar os rivais e se mostrar difícil de ser batido. Nada.

A frustrante passagem do treinador gaúcho, nem o tempo de uma temporada do início ao fim, suspende uma rara unanimidade recente na função. Quando assumiu a seleção brasileira há oito anos, não havia nenhuma dúvida de que era o nome certo e sem concorrência para o cargo, e num primeiro jogo já transformou a insossa equipe de Dunga numa máquina de moer os vizinhos.

Faltou um pouco para superar os jogos decisivos das Copas, todos sabemos, mas é inegável que Tite deu corpo para o time nacional. Da expectativa de ver seu primeiro trabalho depois dos Mundiais, restou quase nada.

Agora, 70 jogos pelo Flamengo depois e até segunda ordem, é o ex-melhor técnico do país.

 
Publicado por @trivelafutebol
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Utopia flamenguista foi inalcançável até para Tite

De um lado, é preciso considerar a inalcançável utopia flamenguista e pensar se há algum técnico capaz de atendê-la. Um clube cuja grandeza tem pressionado o campo a ganhar tudo e, mais do que isso, praticando um futebol de dar inveja aos rivais.

Dorival Júnior que o diga – levantou a Copa Libertadores assobiando e foi trocado por um português sem graça. Está no subtexto da decepção com Tite essa sensação de que nada bastará, a não ser goleadas dando totó todo domingo, com um time tinindo e trincando em estado de graça, como nos meses mágicos e efêmeros de 2019.

Mas, de outro, é um tanto inacreditável que um elenco tão cascudo, com essa quantidade de jogadores selecionáveis e que não para de receber gente de grande nível, venha se mostrando tão vulnerável, logo sob comando de alguém que convenceu Corinthians e seleção brasileira de que o jogo precisa de e-qui-lí-bri-o.

Tite nunca se deixou empolgar, mas também jamais abriu mão de garantir uma equipe confiável. Fazia uma década que ele não nos mostrava uma defesa tão ruim. Então não conseguiu dar ordem, tampouco brilho, às pretensões rubro-negras.

E não é novidade a essa altura dos fatos, mais de quatro anos depois de Jorge Jesus, a falta de firmeza na ideia de futebol e de cuidado com o clube por parte da cartolagem. É pitoresco, antiquado e até constrangedor que o vice-presidente de futebol da camisa mais popular do país seja um vereador e candidato às eleições de domingo.

É uma competição sobre o que é mais bizarro: um parlamentar que passa o mandato viajando atrás da bola ou um gestor boleiro que deveria estar em função da cidade. Um perde-perde, para Flamengo e Rio de Janeiro. A política da Gávea e o uso particular da camisa são convenientes só para quem o faz. Mais ninguém.

Marcos Braz, vice-presidente de futebol do Flamengo (Foto: Icon Sport)
Marcos Braz, vice-presidente de futebol do Flamengo (Foto: Icon Sport)

Filipe Luís é a solução do Flamengo

Filipe Luís é o bombeiro da vez, sob a impressão de que, querido por jogadores e pelo meio do futebol, não sairá queimado caso o campo siga nessa mesmice.

E assim, sejamos francos, as chances do futebol são meio que dessa forma mesmo, e não adianta muito dizer que ele deveria esperar uma oportunidade mais coesa, uma pré-temporada, um momento menos turbulento – é matar no peito e tentar cortar caminho, faz parte da profissão, e muitos são os exemplos de promissores técnicos de base que, à espera da transição ideal, nunca vingaram em cima.

Ainda mais porque ele pega uma equipe em que piorar é difícil, diante desse últimos jogos que foram qualquer coisa.

Apesar de tudo, caos e desordem, incompetência e expectativas projetadas, finais de ciclos e chegadas tortas, técnico ideal versus campo real em calendário brasileiro, enfim, apesar do pacote megalomaníaco flamenguista que parece uma bomba no colo de qualquer treinador, tem jogo quarta-feira, sempre tem.

As coisas não vão bem, mas é melhor ter uma semifinal de Copa do Brasil do que não ter, e quatro jogos apenas de bom nível competitivo podem ser o bastante para o ano terminar campeão, vai saber.

O Flamengo tem coisas maiores a arrumar, claro que sim, óbvio que um ano aquém não é culpa só do treinador, mas também precisa calhar com um técnico que dê conta de mediar e entender um pouco melhor essa demanda maluca que é estar ali, à beira do campo, nesse contexto único.

Tite parecia alguém em boas condições e costas para tal, mas não rolou de forma até surpreendente para sua experiência até então. Agora vai começar tudo de novo, meio dia da marmota meio adiamento de uma discussão mais profunda sobre o porquê dessa agonia, numa segunda-feira de manhã com mata-mata em dois dias. Veremos. 

Foto de Paulo Junior

Paulo JuniorColaborador

Paulo Junior é jornalista e documentarista, nascido em São Bernardo do Campo (SP) em 1988. Tem trabalhos publicados em diversas redações brasileiras – ESPN, BBC, Central3, CNN, Goal, UOL –, e colabora com a Trivela, em texto ou no podcast, desde 2015. Nas redes sociais: @paulo__junior__.
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