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Condução do Flamengo em renovação de Gabigol pode repetir erro fatal de 40 anos atrás

Ao segurar o processo de renovação de Gabigol, o Flamengo repete condução da situação de Zico, ídolo supremo que deixou o clube após não chegar a acordo

A negociação pela renovação de contrato de Gabigol com o Flamengo ganhou contornos que pouquíssimos esperavam. Se antes tudo estava bem encaminhado, o cenário atual é de maior nebulosidade e dependerá daquilo que o atacante apresentar dentro das quatro linhas em 2024. É um grande risco a ser corrido pela diretoria rubro-negra, especialmente se tratando de um ídolo.

A situação pode repetir um erro cometido há 40 anos, envolvendo o maior ídolo da história do clube: Zico, o Galinho de Quintino. O intuito não é trazer comparações entre os atletas, e sim enriquecer o debate com relação à escolha da diretoria do Flamengo de, novamente, segurar a renovação de um símbolo rubro-negro por conta de incertezas. Pode custar muito caro, ainda mais em ano de eleição.

O que fez a situação da renovação de Gabigol mudar?

Para uma situação antes bem encaminhada mudar assim, de maneira abrupta, deve existir pressão. Por mais que o departamento de futebol mantenha a postura favorável à renovação, nem mesmo ele esteve mais tão otimista depois da temporada ruim de Gabriel Barbosa pelo Flamengo. Foi a pior em números, sem dúvida, já que o atacante marcou 20 gols e distribuiu 4 assistências. Nem mesmo o ano pandêmico havia sido tão abaixo.

Dessa forma, ganhou força o discurso vindo da Gávea, em especial do departamento financeiro do clube, que vê o alto salário de Gabigol, atrelado com o tempo de contrato estabelecido, como um empecilho para as contas do clube. O atacante receberia uma valorização salarial nos moldes inicialmente acordados, ainda que já seja um dos maiores vencimentos do clube.

Landim vê apoio da Gávea pesar em congelamento da renovação de Gabigol (Foto: Marcelo Cortes/Flamengo)

Antes inegociável, Gabi vive seu momento de maior incerteza no Flamengo. A renovação não está descartada, pelo contrário, ainda é considerada provável por fontes ligadas ao dia a dia do clube, mas, nesse momento, aquele acordo encaminhado está longe de um final feliz. Vai depender de uma série de fatores que podem, ou não, justificar o longo vínculo, com valorização salarial.

Performance de 2024 vai pautar renovação

A principal situação a ser analisada para confirmar a renovação de Gabigol é dentro das quatro linhas. Se a performance em campo foi muito ruim em 2023, o Flamengo espera uma volta por cima na próxima temporada para, aí sim, fecharem o acordo com os moldes originais. Do jeito que está, fica difícil de justificar mais quatro anos de contrato, além da valorização salarial.

Gabi terá o desafio de superar a reserva momentânea com Tite, algo que está incomodando, como revelou em entrevista ao podcast “Podpah”.

— Praticamente todos os jogadores saíram jogando com ele, e eu não, tá ligado? Claro que eu fico p*, quero jogar. Eu não estou suave, falei isso para ele. Óbvio que não estou feliz, quero jogar. Fui para a Inter (de Milão), Benfica, e saí porque não estava jogando. Não é pensamento individualista, todos já foram titulares com ele, eu ainda não fui. Sei que não tenho que ficar aqui falando, é mostrar o meu máximo, quando ele precisar vou estar lá — disse.

Apesar disso, a confiança interna na volta por cima de Gabigol é maior do que se espera. O entendimento é que o centroavante jogou boa parte da temporada com um problema muscular e, por isso, não conseguiu manter a melhor forma física. O trabalho de recuperação começou antes mesmo do fim da temporada, no intuito de recuperar o atleta o mais rápido possível.

Empresário de Gabigol mantém confiança no acordo

Júnior Pedroso, representante de Gabigol, vê a negociação com o Flamengo de outra maneira. O empresário confirma acordo pré-estabelecido com o Rubro-Negro e diz que confia na seriedade de Marcos Braz e Bruno Spindel para não melar a negociação. Segundo ele, não existe outro cenário que não seja a renovação do atacante com o clube.

Estafe de Gabigol vê situação muito bem encaminhada com o Flamengo (Foto: Icon Sport)

— Existe um acordo econômico que foi muito bem conduzido pelo Bruno Spindel e Marcos Braz durante uma negociação de um pouco mais de um ano. Começamos em setembro de 2022 e finalizamos em meados de outubro de 2023 com uma ligação dos representantes do Flamengo nos parabenizando pela negociação. Também ligaram para os pais do Gabriel (Valdemir e Lindalva) e abordaram o Gabi pessoalmente no CT. Desde então estamos aguardando cautelosamente pelas minutas de contrato para avançarmos para os próximos passos: a assinatura e o anúncio oficial — revelou, antes de concluir:

— Não existe outro cenário. Nós negociamos com pessoas sérias. Passamos mais de um ano negociando com Braz e Spindel, com diversas reuniões no Rio e por telefone. Em outubro selamos o acordo verbalmente. Se isso mudou, aguardamos uma comunicação por parte do Flamengo. Negociamos com pessoas sérias, que cumprem acordos — finalizou, em entrevista ao ge.

Fantasma da renovação de Zico assombra

A condução da negociação, no entanto, assusta os rubro-negros mais antigos, cascudos, pois lembram do processo de outro grande ídolo do Flamengo. 40 anos antes, Zico viveu processo semelhante, em que o clube colocou a incerteza na renovação do maior ídolo. O resultado foi a venda milionária do Galinho de Quintino à Udinese, da Itália, mesmo contra a vontade do próprio jogador.

Zico revelou que não desejava sair do Flamengo e que se sentiu magoado pela postura da diretoria. A proposta mudou, a renovação não aconteceu, e o craque deixou o Rio de Janeiro.

Imagem dos jornais da época, que anunciavam a complicada renovação de Zico com o Flamengo (Foto: Acervo/OGlobo)

— Quem tentou e conseguiu o patrocínio fui eu. Consegui um patrocínio da Adidas que me pagasse o que ia ganhar lá (na Itália). A Adidas iria pagar o valor (da transferência) e o dividiria em 24 meses. O Flamengo veio me dizer que essa proposta da Adidas já fazia parte da oferta que o Flamengo tinha feito (recusada por Zico). Aí eu vi que o Flamengo não queria renovar. Vou dar um exemplo: vamos dizer que o Flamengo me ofereceu 20, e eu consegui 40 com a Adidas. Aí eles disseram que esses 40 já estavam incluídos na proposta que na verdade era de 20. Mas não estavam, queriam mesmo era me vender — analisou, em 2014.

A curiosidade nessa história parte de personagens da diretoria. À época, o Flamengo era presidido por Antônio Augusto Dunshee de Abranches, pai do vice-presidente jurídico, Rodrigo Dunshee de Abranches. O atual dirigente, inclusive, é um dos mais cotados para liderar a chapa de situação do presidente Rodolfo Landim na eleição desta temporada.

Por isso a condução das negociações da renovação de Gabigol serão tão importantes. Esse raio, tão forte e impactante, não pode cair duas vezes no mesmo lugar. Ainda que algumas partes do contrato possam — e devam — voltar a serem discutidas, o Flamengo não pode sonhar em perder o ídolo. Seria mais um erro, talvez a última pá de cal, da atual diretoria do clube.

Foto de Guilherme Xavier

Guilherme XavierSetorista

Jornalista formado pela PUC-Rio. Da final da Libertadores a Série A2 do Carioca. Copa do Mundo e Olimpíada na bagagem. Passou por Coluna do Fla e Lance antes de chegar à Trivela, onde apura e escreve sobre o Flamengo desde 2023.
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