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Palmeiras e Santos vão mal? A culpa é toda do Ituano

O ano tinha começado bem. O estadual seria menor, embora a fórmula bizarra deixasse uma sensação um tanto estranha. Mas dois times despontaram na frente e deram boas impressões aos seus torcedores. O futebol é pródigo em dar esperanças de um futuro melhor, mesmo quando sabemos que os jogos de estaduais, assim como a pré-temporada na Europa, não costuma medir bem a força real dos times. Quem se importa com análise técnica, meu amigo? Eu quero é levantar taça e encher a cara para comemorar, diria o torcedor. O que não vale nada é não comemorar, ué. Os sonhos estavam na boca dos torcedores, tão doce quanto aqueles de padaria.

Ao final da fase de classificação do Campeonato Paulista, Santos e Palmeiras lideravam com folga, tinham bons jogos no retrospecto e lideravam as apostas para o título. Os dois times pintavam como favoritos e já se falava em uma disputa de título entre eles, os melhores times até ali. Fizeram um clássico movimentado na Vila Belmiro na rodada final, que decidiu quem ficaria com o posto de melhor time na primeira fase. O Santos venceu por 2 a 1 e terminou à frente na classificação geral com 36 pontos, um a mais que o Palmeiras, que ficou com 35. Parecia uma prévia, um jogo de aquecimento. Como se os dois estivessem se encarando como boxeadores antes de uma luta importante, trocando tapas na pesagem para esquentar o duelo.

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São Paulo e Corinthians, àquela altura, não empolgavam. Eu disse não empolgavam? Na verdade, seus torcedores estavam cuspindo marimbondos, atirando objetos na sala de estar, xingando os jogadores na arquibancada e berrando entre uma cerveja e outra. O São Paulo até se classificou, mas a campanha foi ridícula. Fez 27 pontos, suficiente para liderar o Grupo A, mesmo perdendo quatro jogos. Ficou atrás do Botafogo, tradicional time de Ribeirão Preto, na classificação geral, que fez 28. Isso já seria ruim, tanto quanto o futebolzinho sem vergonha que o time apresentava, mas ficaria pior.

O Corinthians conseguiu ir além e chegou ao nível de vexame: ficou atrás do Ituano no Grupo B, acusando o São Paulo de ter perdido de propósito do clube de Itu na penúltima rodada, 1 a 0 no Morumbi para os visitantes, na mesma rodada que o time de Mano Menezes ficou no empate por 0 a 0 com a Penapolense. Sim, a eliminação veio com uma rodada de antecedência. O campeão do mundo em 2012, o time com a maior arrecadação do Brasil, aquele que era tão apontado como um dos grandes exemplos de boa gestão (vimos depois que Andrés Sánchez fez isso às custas de omitir o pagamento de alguns impostos) e tudo isso para ficar atrás do Ituano.

Veja o cenário: São Paulo cambaleando, Corinthians eliminado, Santos e Palmeiras jogando bem e deixando os torcedores com água na boca. A expectativa, naturalmente, era que os dois últimos decidissem o título. E aí vieram as quartas de final. Depois de um empate por 0 a 0 com a Penapolense, o São Paulo foi eliminado nos pênaltis, em pleno Morumbi. Um vexame, que marcaria o fim medonho da campanha do time no estadual. Seria mais uma das eliminações vexatórias do time para equipes do interior. O tricolor completará dez anos desde que ganhou o Paulista pela última vez, em 2005. O caminho estava aberto para Santos e Palmeiras ficarem com a taça. Que início de ano seria para esses dois!

O Santos passou pela Ponte Preta como um trator, fez 4 a 0, sem choro nem vela, e avançou. O Palmeiras não foi tão massacrante, mas venceu o Bragantino por 2 a 0 com alguma folga. As expectativas aumentavam. Santos e Palmeiras, dois times de tradição e glórias do passado, que dominaram a década de 1960 do futebol paulista com alguns dos maiores times que o Brasil já viu. Era hora de reviver, com menos craques, com um futebol muito menos visto, mas ainda com muita tradição, com alegria de torcedores que ansiavam por glórias, ainda que fosse de um Paulista, esse mísero Paulista, esse massacrado e cada vez menos levado em conta Paulista. Vieram então as semifinais, mas os olhos já estavam ansiosos pela final. O Santos enfrentou a Penapolense na Vila e a expectativa era que Gabriel e os outros meninos do alvinegro praiano fizessem do time do interior mais uma vítima. Só que não foi bem assim.

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A Penapolense fez o Santos sofrer e chegou a estar ganhando o jogo. O Santos até abriu o placar, mas a Penapolense virou o jogo e deixou o Santos em desvantagem. O empate veio com Leandro Damião, já na época muito criticado pela falta de gols. O Santos teve 30 minutos para virar o jogo, mas a partida estava difícil. Foi só no final, com a entrada de Stefano Yuri, que o time fez o terceiro e decisivo gol, aos 41 minutos. Classificação assegurada, com muito suor. Ah, seria só uma forma de dar páginas épicas a uma conquista. Todo título tem que ter o seu momento de dificuldade, não é mesmo? Até séries ruins tem suas viradas.

Mais tarde, no mesmo dia, foi a vez do Palmeiras entrar em campo. Se o Ituano já tinha deixado o Corinthians de fora, indiretamente, porque ficou com o segundo lugar do grupo do Timão, contra o Palmeiras o duelo seria direto e a interferência seria ainda mais dramática. Contra o Ituano, o alviverde fez uma partida muito fraca, não conseguia vencer a forte defesa da equipe do técnico Doriva. Vale lembrar que o Ituano derrotou o Botafogo na fase anterior com uma vitória nos pênaltis e na casa do adversário, Ribeirão Preto. A retranca de novo funcionou, Marcelinho entrou no fim do jogo e cravou uma estaca no coração dos torcedores presentes no Pacaembu com um gol de fora da área, aos 38 minutos do segundo tempo. O temor da eliminação se materializou, o desespero não ajudou e o Palmeiras foi derrotado. A chance de título escapou. O Ituano foi para a final e começou o ano de tristezas do alviverde, que até ali vinha tão cheio de sorrisos no rosto. O choro e ranger de dentes do ano verde estava iniciado. Pelo Ituano.

Bom, na final, a bola cantada era o Santos vencer com tranquilidade, adicionar mais um troféu na sua história, e ir para o Campeonato Brasileiro empolgado. É, só que se as semifinais já tinham mostrado que o sufoco seria grande, a final não mudou esse panorama. A retranca do Ituano foi mais uma vez precisa, o time do interior fez uma incrível partida, não deu espaços ao Peixe, foi perigoso e ameaçou ganhar o jogo todo. E ganhou, com um gol de Cristian, aquele que recebeu o carinhoso apelido de “Mendigo” dos torcedores na época que defendia o Palmeiras, pela vasta cabeleira e a barba por fazer. Foi ele, vestindo a camisa 10, que disparou um chutaço para marcar o gol da vitória por 1 a 0. Céus, seria possível um título do Ituano?

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Mas era o primeiro jogo. No segundo, tudo será diferente. Seria, sim, mas não foi. O segundo jogo foi dramático. O gol de Cícero, de pênalti, deu ao Santos o empate no duelo, mas o jogo teve chances para o Ituano empatar e, por pouco, não aconteceu. A decisão nos pênaltis já seria uma vitória para o Ituano, mas o time foi além. A vitória por 7 a 6 deu o título ao time que é dirigido por Juninho Paulista, aquele mesmo ex-São Paulo, Flamengo e Palmeiras, além da seleção.

Ituano, campeão paulista. O time do goleiro Vagner, dos zagueiros de Alemão e Anderson Salles, dos meia Marcinho e Cristian venceram o Paulistão. Deixaram o Corinthians de Mano Menezes, o São Paulo de Muricy Ramalho, o Palmeiras de Gílson Kleina e o Santos de Oswaldo de Oliveira para trás. Os times paulistas, que tinham feito um Campeonato Brasileiro ridículo em 2013, tinham péssimas perspectivas para a edição de 2014.

O Palmeiras viu o seu sonho de começar o ano do centenário com um título derreter diante do Ituano. Só o primeiro de uma série de capítulos tristes que os torcedores palmeirenses viveriam neste 2014. Caiu Kleina, as vitórias rarearam. Viria Ricardo Gareca, mas as vitórias não. E o bilhete azul caiu nas mãos do argentino, que foi despachado de volta para casa. O time, à beira da zona do rebaixamento, continua perdido e correndo riscos de ser rebaixado. Bem no ano do seu centenário. Aquele ano de festa, que começou com a perspectiva – real, àquela altura – de um título estadual. De um título. De uma alegria.

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O Santos, que tinha o início de trabalho de Oswaldo de Oliveira parecendo promissor, viu o time de meninos de Gabriel, o chamado Gabigol, Geovânio e o experiente Cícero sucumbiu na final para um time de orçamento e possibilidades muito inferiores. É sempre um vexame perder uma final como o time da Vila perdeu, para um time como Ituano. Dali em diante, o Santos virou um time de meio de tabela. O Brasileiro do time da Vila é só razoável. Não vai brigar para não cair, mas claramente está longe de brigar pelo título, e longe até da zona de classificação para a Libertadores, que é um prêmio de consolação. Nem Robinho tem ajudado. Como se não bastasse, a diretoria do Santos demitiu Oswaldo de Oliveira logo no início de setembro. E o Santos não parece ter boas perspectivas.

Os sonhos e os sorrisos de Santos e Palmeiras firam pelo caminho. Ficaram no Ituano. Foi ali, no Ituano, que esses dois times começaram a ver seus anos desabarem. Corinthians e São Paulo, que fizeram um papelão no Paulista, brigam lá em cima na tabela do Brasileirão. Deixaram para trás a lembrança do Ituano para brigarem contra seus fantasmas, mas longe do time de Itu. Os dois superaram os fracassos, apesar de tudo, mas lutam contra os próprios demônios no Brasileiro. Palmeiras e Santos não. Os dois ficaram marcados pelo Ituano, pela glória que escapou dos dedos. Era a chance de botar um título na conta, porque se Corinthians e São Paulo foram tão bem-sucedidos nos últimos anos com títulos, ao menos no Paulistão Palmeiras e Santos poderiam tirar uma onda, conseguir um pouco daquela glória tão saborosa do passado. Talvez tenha faltando a Santos e Palmeiras verem um vídeo como esse para se motivar. O problema não é a incompetência das diretorias do Santos e do Palmeiras, que contrataram e demitiram um técnico sem saber bem a razão. Não é dos elencos com deficiências… No fim, deve ser isso. Deve ser tudo culpa do Ituano…

Foto de Felipe Lobo

Felipe Lobo

Formado em Comunicação e Multimeios na PUC-SP e Jornalismo pela USP, encontrou no jornalismo a melhor forma de unir duas paixões: futebol e escrever. Acha que é um grande técnico no Football Manager e se apaixonou por futebol italiano (Forza Inter!). Saiu da posição de leitor para trabalhar na Trivela em 2009, onde ficou até 2023.
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