O Barcelona que surgiu na pandemia, chegou à Copa do Brasil e quer ser potência no Nordeste
Com apenas cinco anos de fundação, a primeira SAF do sul da Bahia já conquistou seu espaço no futebol nordestino

Cerca de 7.500 quilômetros (e um Oceano Atlântico) separam a Catalunha, no nordeste da Espanha, de Ilhéus, cidade do litoral sul da Bahia. As duas regiões são consideradas paradisíacas, têm lindas praias e clubes de futebol chamados Barcelona. Sim, clubes — no plural.
Se o gigante europeu teve craques do nível de Cruyff, Maradona, Ronaldinho e Messi, o homônimo baiano pode dizer com orgulho que ostentou a presença de Magno Alves, maior artilheiro brasileiro em atividade, em seu plantel.
O Barcelona de Ilhéus — a locução adjetiva é necessária para diferenciá-lo do mais famoso — é um clube com apenas cinco anos de idade, mas que já conquistou seu espaço no cenário estadual e nacional.
E, se o catalão se prepara para jogar as oitavas da Champions League com Raphinha, Yamal e Lewandowski, o nordestino ocupa pela primeira vez as principais páginas do noticiário esportivo brasileiro.
Isso porque o Barcelona de Ilhéus disputará a Série D do Campeonato Brasileiro e a Copa do Brasil de forma inédita em 2025. O clube vive a expectativa do ano de maior visibilidade de sua história.
O clube inclusive estreia na principal competição nacional de mata-mata nesta terça-feira (25), às 19h30, em Ilhéus, diante do Athletic de São João Del Rei-MG. Mas, antes de pensar em voos maiores… de onde veio a ideia de criar um Barcelona no litoral da Bahia?

Por que Barcelona
Liderado pelo empresário Welinton Nascimento, o time baiano surgiu em 2019 com o objetivo de dar visibilidade para a cidade de Ilhéus e proporcionar a chegada de investimento e apoio social por meio de ações do clube.
A escolha do nome partiu de uma enquete na internet. Welinton conta com um conselho de um grupo de empresas de sua propriedade. Eles elencaram nomes de clubes que representariam a ambição da equipe baiana.
Entre Chelsea, Orlando City, Manchester City, Barcelona e Real Madrid, o escolhido em votação popular foi o Barcelona.
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A primeira SAF do sul da Bahia
A criação do clube em Ilhéus partiu de Welinton Nascimento, natural da cidade. Ele viu no futebol a oportunidade de retribuir tudo o que o município do interior da Bahia fez pelo empresário.
— Eu nunca fui do futebol e talvez eu nunca seja do futebol. Eu vivo dos meus negócios, das minhas empresas no Brasil e no exterior. O futebol é uma forma de eu devolver para a minha cidade algo que nunca pude fazer nesses anos todos. Eu não ganho nada com o futebol, eu só gasto dinheiro. É uma forma de devolver para a minha cidade o orgulho que ela deixou de ter com o tempo — diz Welinton.
O dono do Barcelona de Ilhéus saiu de Sapucaieira, distrito na cidade de Ilhéus, onde trabalhou na roça até aos 10 anos, para morar em São Paulo. Chegou em 1986 para trabalhar como operário de obra numa pequena indústria de pré-moldados. Hoje, o ex-servente de pedreiro é empresário da área de recursos humanos.
Em 2018, Welinton teve a primeira iniciativa relacionada ao futebol ao tentar apoiar o Colo-Colo, outro clube de Ilhéus. Entretanto, o empresário se deparou com um grande acúmulo de dívidas e um desempenho esportivo ruim, com a equipe sequer disputando a Segunda Divisão do Campeonato Baiano.
O empresário, então, desistiu do Colo-Colo e iniciou um estudo para ver a viabilidade de ter um clube de futebol de Ilhéus que não tivesse dívidas. A ideia era trabalhar já dentro da lei da SAF que estava se estabelecendo no Brasil. Foi decidido então a criação de um clube/empresa de futebol.
A ideia de Welinton era botar o clube para funcionar em 2020, mas ele não contava com a pandemia. Todo o projeto do clube precisou ser adiado num primeiro momento e, no lugar, iniciativas solidárias para ajudar nas condições sociais e médicas de Ilhéus foram feitas para atender as demandas da cidade em relação à Covid-19.
— Tudo que pudemos fazer de doação de medicamento, luva, máscara, alimentos e equipamentos para os hospitais a gente fez. Todo o investimento que fizemos no futebol acabamos devolvendo para essas atividades essenciais — afirma Welinton.
Hoje, o Barcelona de Ilhéus ainda conta com um trabalho social que atende diariamente 200 crianças com ações de formação de atletas, incluindo distribuição de uniformes, viagens e palestras. Também há um trabalho de capacitação de pessoas para trabalhar nos setores de marketing, fisioterapia e psicologia do clube.
— É um grande trabalho social. Aquela criança vai chegar em casa e falar “Mamãe, eu fiz um teste no Barcelona e um dia quero ser atleta”. O trabalho que fizemos com as meninas foi muito impressionante, tinha menina nunca havia nem pegado um ônibus na vida e entrou num ônibus “double deck” para Salvador para enfrentar o Bahia. Não cobramos um centavo das famílias — conta o dono do clube.
De Ilhéus para o Brasil

Ainda no ano que começou a pandemia, o Barcelona de Ilhéus alugou o centro de treinamento do Fluminense de Feira e terminou a Segunda Divisão do Campeonato Baiano em quinto lugar. No ano seguinte, o time se sagrou campeão da competição.
Com um custo mensal de R$ 450 mil, o clube conta com 70 funcionários, sendo 30 atletas, além de atingir indiretamente outras 40 pessoas da cidade.
Hoje, os jogadores ficam numa pousada exclusiva para os jogadores em Ilhéus. Lá dispõem de fisioterapia, equipamentos modernos e cuidados da equipe médica.
— Graças ao empenho do nosso presidente em oferecer sempre as melhores condições possíveis, temos um ambiente de trabalho excelente, que melhora a cada dia. O clube também disponibiliza uma estrutura de alojamento para atletas que não são casados e optam por ficar nas dependências do clube, onde recebem alimentação e acompanhamento fisioterapêutico. Nossa área de fisioterapia, inclusive, é bem equipada e conta com grandes profissionais — relata Adriano Souza, técnico do Barcelona de Ilhéus.
O clube ainda firmou um termo de cooperação com a Universidade Estadual de Santa Cruz (ESC) para a melhoria do campo de treinamento, da academia e da comunidade de Salobrinho, bairro que hospeda o CT. Enquanto isso, o Barcelona de Ilhéus utiliza as dependências da instituição de ensino para treinar.
Apesar da boa gestão e dos resultados esportivos, o clube ainda não tem receita. Hoje, o grupo empresarial coloca cerca de R$ 4 milhões no clube tirados do próprio bolso. Em 2025, porém, o Barcelona de Ilhéus receberá uma quantia pelas participações na Copa do Brasil, Copa do Nordeste e no Campeonato Baiano.
— Nós já atingimos nossas metas, o nosso “target” já foi plenamente alcançado. Ainda temos muito a aprender este ano com as competições que vamos disputar. Somos ainda muito crianças nessas competições que vamos disputar. Chegamos em terceiro lugar no Baiano, vamos lutar pelo segundo lugar, que tem Bahia e Vitória. Daqui mais dois anos brigar por um título — projeta Welinton, que não esconde o sonho de ver seu clube virar uma potência na região.
Se passar pelo Athletic, que disputará a segunda divisão nacional em 2025, o Barcelona arrecadará R$ 830 mil. Mais um passo rumo ao protagonismo de um clube que, pelo nome, já nasceu grande.