Sul-Americana

Numa final muito equilibrada, os pênaltis fizeram a LDU campeã contra o Fortaleza

Foi um jogo igualado durante os 120 minutos, mas o goleiro Alexander Domínguez defendeu três penais contra o Fortaleza e levou a LDU de volta ao topo da Copa Sul-Americana

O Fortaleza sonhou. E tudo realmente parecia um sonho à torcida que enfrentou duros anos na terceira divisão nacional, mas viu seu clube pegar o elevador sem escalas rumo a uma final continental. A Copa Sul-Americana poderia representar o ápice do clube. Mas o troféu não veio, o que não diminui o trabalho dos tricolores, embora deixe a LDU Quito com os merecidos louros de campeã. Os Albos têm uma camisa que pesa no continente e, novamente nos pênaltis, levam mais um troféu internacional. Depois do empate por 1 a 1 que perdurou durante 120 minutos no Uruguai, a Liga venceu por 4 a 3 nos pênaltis. Foi gigante o goleiro Alexander Domínguez, sugestivamente apelidado de Dida, e que também honrou José Cevallos ao pegar três penais.

Os 120 minutos de bola rolando na final não encheram os olhos, é verdade. Foi uma partida tensa, com alternâncias em diferentes momentos e sem uma superioridade tão clara. O Fortaleza até começou pra cima no primeiro tempo, mas viu a LDU se acertar e igualar. A segunda etapa guardou os melhores minutos da tarde, sobretudo pelos gols de Lucero e Alzugaray. As alterações mudavam o equilíbrio de forças, mas sem que qualquer time prevalecesse tão claramente, mesmo que os goleiros realizassem intervenções importantes – sobretudo o equatoriano Alexander Domínguez. E num momento em que o cansaço pesava, a prorrogação apenas serviu de espera aos pênaltis, que finalmente coroariam o campeão.

A LDU fatura seu quinto troféu continental. Os Albos possuem a Libertadores de 2008 como prêmio mais reluzente e levam mais uma vez a Sul-Americana, depois da taça conquistada em 2009. Ainda contam com duas Recopas no museu. Foi uma campanha excepcional da Liga, que passou por Ñublense, São Paulo e Defensa y Justicia nos mata-matas. Já na decisão, o time de Luis Zubeldia não se abalou com o bom futebol do Fortaleza nas fases anteriores ou mesmo com a presença massiva da torcida tricolor. Os equatorianos tiveram seus recursos, causaram problemas em diferentes momentos e se valeram da bagagem de seu goleiro nos pênaltis. É mais um troféu para o Equador na Sula, o terceiro nas últimas cinco edições.

Do outro lado, o Fortaleza não deixou de se entregar, mas não exibiu seu melhor. Foi uma partida correta do Leão do Pici, embora não a mais exuberante. Alguns jogadores foram bem – Pochettino, Zé Welison, Tinga ou mesmo o sacrificado Titi, que aguentou até com lesão. João Ricardo ajudou ainda com dois pênaltis defendidos. Porém, há situações em que o adversário consegue ser mais competente por uma mínima diferença, exatamente o que aconteceu em Maldonado. Não é a derrota nos pênaltis que anula a grande ascensão do Tricolor, a boa gestão nos bastidores ou o trabalho excelente de Juan Pablo Vojvoda. A impressão é que, pela consolidação recente do Fortaleza, outras grandes histórias poderão ser escritas a partir das lições.

O clima no estádio

A Conmebol insiste em sua ideia de final única, um formato muito mais pensado nos consumidores do que exatamente nos torcedores – e que, assim, gera mais dinheiro à entidade. É uma pena que essa decisão não possa ocorrer em duas partidas, especialmente pela festa que se imaginaria no Castelão lotado. Ainda assim, com os custos e os sacrifícios exigidos, a torcida do Fortaleza fez bonito. A presença dos tricolores em Maldonado foi massiva, algo perceptível nas arquibancadas. Diferentemente do que aconteceu nas finais anteriores, o Estádio Domingo Burgueño estava lotado. Cabe lembrar, porém, que a própria Conmebol havia mudado o palco por temores de novos clarões nas tribunas.

O apoio da torcida do Fortaleza era audível antes mesmo que a bola rolasse. Foi bonita a maneira como a massa tricolor cantou o hino nacional. Além disso, os tradicionais mosaicos do Leão do Pici, que dão cor à ascensão vivida pelo clube nos últimos anos, também pintaram nas arquibancadas em Maldonado. O Fortaleza parecia jogar como mandante, com os gritos mais fortes a seu favor e também uma presença mais expressiva de sua torcida além de seu setor. Os torcedores da LDU ficavam mais restritos.

As formações

Juan Pablo Vojvoda escalou o Fortaleza num 4-3-3 de qualidade sobretudo no ataque. João Ricardo protegia o gol. O capitão Tinga ocupava a lateral direita, com Bruno Pacheco na esquerda. Titi e Brítez eram os zagueiros. O meio tinha Zé Welison mais preso, com Caio Alexandre saindo e Tomás Pochettino na aproximação. Marinho entrava na ponta direita e Guilherme ocupava a esquerda. Na frente, Juan Martín Lucero era o homem de referência. Yago Pikachu, Lucas Crispim, Silvio Romero e Thiago Galhardo eram algumas das alternativas no banco de reservas.

Luis Zubeldía escalou a LDU Quito num 4-2-3-1, cheio de medalhões da seleção local. Alexander Domínguez ocupava o gol. José Quintero e Leonel Quiñónez eram figuras importantes nas laterais, com Ricardo Adé liderando a zaga ao lado de Facundo Rodríguez. Mauricio Martínez e o capitão Ezequiel Piovi fechavam o meio. A trinca de meias tinha Renato Ibarra e Jhojan Julio nas pontas, com Sebastián González centralizado. Paolo Guerrero era a estrela na frente.

Mais luta que bola no primeiro tempo

Pelas características de ambos os times, era de se imaginar que o Fortaleza desse um passo à frente desde os primeiros minutos. Foi o que aconteceu, com o Leão do Pici preenchendo o meio-campo e adiantando a marcação. Era uma postura bastante firme do Tricolor, que travava a LDU. Porém, os primeiros minutos também viram os equatorianos com boa dose de intensidade nos combates. A final era disputada ao máximo, sem que qualquer time aliviasse nas divididas. Ainda assim, o Fortaleza era melhor. Rondava mais a área e buscava a finalização. Diante do congestionamento, ainda não conseguiu grandes chances. Uma bola de Pochettino que Zé Welison desviou e ninguém completou foi a melhor tentativa.

A LDU tentava sair gradualmente mais ao campo ofensivo, até para diminuir o sufoco. Contudo, à medida em que os Albos tentavam se movimentar mais, também se expunham à qualidade ofensiva do Fortaleza. Aos 18, os equatorianos passaram grande sufoco quando, a partir de uma recuperação de Lucero, Marinho causou alvoroço. O ponta tentou anotar um golaço e começou a fazer fila, mas preferiu se jogar na área. Não ganhou o pênalti e atrasou o chute, com uma finalização travada de Guilherme na sequência. A resposta da LDU veio aos 22, numa bola parada. Quintero mergulhou de peixinho na sobra dentro da área e cabeceou por cima.

Com o passar dos minutos, o jogo seguia sem grandes emoções. A LDU se recompôs dos sustos iniciais e o Fortaleza não tinha penetração. O Tricolor rodava a bola, mas insistia demais pelo lado direito e não ia além das trocas de passes. A esta altura, o jogo ficava limitado a rebatidas e o Leão até queria forçar através de laterais longos. A final parava bastante, com as muitas faltas. Sobravam braços nas disputas e isso rendia frequentes cartões amarelos. A partida ainda ficou um tempo paralisada por volta dos 40, quando Renato Ibarra se lesionou e Lisandro Alzugaray entrou no lugar. Na reta final, o Fortaleza tinha a bola, mas não criava. O time estava bem postado, mas sem a incisividade que marcou grandes momentos com Vojvoda.

Gols rápidos e um segundo tempo agitado

Em menos de três minutos, o segundo tempo entregou muito mais do que o primeiro. A LDU Quito deu um baita susto logo no primeiro ataque. Jhojan Julio ficou de frente para o gol, mas não pegou em cheio na bola e facilitou a defesa de João Ricardo. A resposta do Fortaleza veio com tento, aos três minutos. A jogada foi construída a partir de Caio Alexandre no meio. Pochettino fez a ultrapassagem com Marinho pela direita. O cruzamento baixo chegou na medida para Lucero fuzilar, com uma pancada no canto. O Lion cravava o primeiro gol e chamava sua torcida.

O ritmo da partida seguiu mais alto neste início do segundo tempo. A LDU adotava uma postura mais aberta. O entendimento do Fortaleza também melhorou e quase o time puniu uma saída atabalhoada de Domínguez.  Entretanto, um descuido poderia custar caro. E isso rendeu o empate dos Albos sem demora, aos 11 minutos. Alzugaray construiu o tento sozinho. Numa bola longa, o ponta ganhou de Bruno Pacheco no corpo. Ficou com espaço na esquerda e deu duas fintas, antes de um caprichoso chute cruzado que saiu do alcance de João Ricardo. Uma pintura, com a canhota cirúrgica do substituto.

O Fortaleza tentou sair um pouco mais depois do empate, até para se chacoalhar. Voltou a ter um escanteio, mas sem concretizar em chance. Os dois times também mudaram a partir dos 15 minutos. A LDU botou Alexander Alvarado no lugar de Sebastián González, mudando seu desenho para um 4-4-2. Já o Leão trouxe Yago Pikachu para a vaga de Guilherme. O cartão de visitas do ponta direita veio rápido, num chute cruzado que o goleiro Domínguez se esticou para espalmar. O arqueiro ainda seria salvador depois de uma cobrança de falta. Caindo pela esquerda, Marinho cobrou a bola baixa e Bruno Pacheco desviou, para Domínguez pegar a bola quase em cima da linha. Um detalhe é que o goleiro passou a usar boné para se proteger do sol.

A pressão do Fortaleza não cessava e o time sentia o momento positivo. Vojvoda tentou aproveitar com sangue novo no ataque, ao acionar Imanol Machuca e sacar Marinho. Porém, a LDU conseguiu mais respiro na sequência, com posse de bola ofensiva. De novo, o jogo voltou a ficar mais lento, também com o desgaste físico dos jogadores. Pochettino pediu para sair e Zé Welison também deixou o campo extenuado aos 38, após serem duas peças fundamentais do Leão até então. Thiago Galhardo e Pedro Augusto entraram. Aos 40, a LDU voltou a ter uma finalização numa cobrança de falta, mas a batida de Guerrero saiu ao lado sem tanto perigo.

O Fortaleza voltou a se acender depois dos 40. Thiago Galhardo animou a torcida com um chapéu sobre Piovi na intermediária que rendeu um contra-ataque. Na conclusão, porém, o próprio Galhardo furou o voleio após a devolução. Já aos 44, numa falta lateral, Machuca exagerou na força e mandou por cima. Não que o Leão estivesse a salvo. Depois dos 45, Martínez arriscou um míssil de longe e João Ricardo espalmou para escanteio. No cruzamento, o desvio de Rodríguez fez a torcida gelar, mas foi para fora. A definição seguiria mesmo para a prorrogação.

Alternâncias na prorrogação

O Fortaleza mandou uma bola na área logo de cara no primeiro tempo da prorrogação, mas o goleiro Domínguez abafou. O Leão tentava forçar algum erro, mas a partida seguia amarrada na faixa central. A LDU se acertava outra vez e botou Bryan Ramírez, no posto do lesionado Quiñónez na lateral. Já aos sete, o Tricolor conectou um escanteio e Tinga cabeceou, sem direção. Vojvoda ainda tentou renovar os ares do ataque, com o experiente Silvio Romero, saindo Lucero depois de um jogo de muita entrega. Porém, antes da pausa, a Liga de Quito foi para frente e botou o Tricolor em apuros. O Fortaleza precisou de concentração, diante da maneira como os Albos rondavam a área e eram melhores em suas tramas. Guerrero teve inclusive um chute travado.

Depois da agonia, o Fortaleza recuperou a força no início do segundo tempo extra. Foram oportunidades seguidas aos tricolores. Pikachu bateu cruzado e ninguém completou, antes de ser travado na sequência. Já num escanteio, Tinga cabeceou e Domínguez segurou no meio da meta. Num jogo de tantas alternâncias, a balança voltava a pender para o Leão. Só não dava para sorrir muito, porque Titi sentiu a parte posterior da coxa. Como o time já tinha realizado seis alterações, o beque foi para o sacrifício e acabou deslocado ao ataque. Pedro Augusto virava o novo zagueiro, improvisado. A decisão estava no limite durante os minutos finais, com a tentativa da LDU em se aproveitar da situação. Guerrero até viu um chute bloqueado no apagar das luzes. Já o Tricolor tentava cavar algum penal, sem sucesso. Os pênaltis definiriam a sorte do campeão.

Os pênaltis

A disputa por pênaltis aconteceu diante do setor onde se encontrava a torcida do Fortaleza. Paolo Guerrero assumiu a primeira cobrança e parou no goleiro João Ricardo, que acertou o canto para pegar a bola mal batida. Logo depois, Thiago Galhardo botou o Leão adiante, com muita categoria no chute no canto. Alzugaray empatou, mesmo com João Ricardo acertando o canto, e Pikachu voltou a vencer Domínguez. Já na terceira série, Martínez converteu e Domínguez defendeu o tiro ruim de Romero. Jhojan Julio colocou a LDU à frente na quarta batida e Tinga empatou na gaveta. Por fim, João Ricardo se agigantou de novo diante de Alvarado, mas Domínguez também parou Pedro Augusto quando o Tricolor poderia ser campeão. Viriam os tiros extras.

A conclusão, então, aconteceu na sexta série de batidas. Piovi mandou no cantinho, naquela que talvez tenha sido a execução mais perfeita. E o zagueiro Emanuel Brítez, campeão da Sul-Americana anteriormente pelo Defensa y Justicia, parou na terceira defesa de Domínguez. O Fortaleza sucumbia, a LDU se erigia campeã. Às lágrimas, o goleiro albo celebrou muito. O coração do Leão, por mais calejado que seja por tudo o que o clube já viveu, não merecia tanta crueldade. Contudo, também não se tiram os méritos de uma LDU que novamente se coroa como digníssima campeã continental. Numa final equilibrada, pesou a estrela do veterano arqueiro.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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