Grêmio e Fluminense: mediar urgências e mirar a Copa, por que não?
Ainda buscando fugir do perigo do rebaixamento no Brasileirão, tricolores se enfrentam na Libertadores
Existem alguns falsos dilemas no futebol brasileiro, aquelas perguntas dos programas de almoço que pegam as pessoas andando apressadas ali em frente ao vão do Masp ou seus equivalentes regionais, e o microfone já chegando no susto para perguntar se você prefere ser rebaixado e ganhar a Libertadores ou se salvar da segunda divisão e ser eliminado na Copa, tipo aquele jogo da televisão, as pessoas no escuro sem ouvir as propostas, e de repente: você quer trocar uma bicicleta por uma bala de goma? Sim!
Porque para além da válida brincadeira para apimentar o debate existe aí um subtexto um tanto resultadista, o que faz com que torcedores e analistas acreditem que campeonatos demais geram distração, e que um time em crise na tabela nacional fica melhor se dedicado única e exclusivamente a ela. É fato que o calendário é insano, mas nem tudo é físico ou logístico, e continuo achando que ganhar é sempre melhor que perder, e que abrir janelas de descanso não compensam uma eliminação.
Time grande precisa e gosta é de vencer, avançar, estar nos grandes palcos, ter um duelo a mais para sonhar, e a confiança das grandes jornadas chacoalha um vestiário, libera o sorriso do massagista, do porteiro. Seguir adiante numa quarta eliminatória levanta qualquer desânimo, reacende a esperança, mesmo que efêmera, de dias melhores ali na frente. Pode consolidar o que o clichê chama de viés de alta.
Grêmio e Fluminense chegam ao confronto em momentos bem melhores do que no sorteio
As coisas melhoraram para o Grêmio no último mês, à parte a dura reconstrução aos clubes e às vidas gaúchas após as trágicas enchentes. O time vem de só uma derrota em nove jogos, com a eliminação na Copa do Brasil em dois empates, mas com consistência de quem pode ficar no meio da classificação da Série A, não lá embaixo.
Braithwaite chegou fazendo gol, em tempo de substituir o machucado Diego Costa; e vieram bons sinais de Monsalve, outra opção na criação e definição de jogadas. Renato Gaúcho e sua fixação copeira chegam animados à retomada continental e todo mundo aqui já viu o Grêmio ressurgir numa noite fria de mata-mata em situações talvez até mais difíceis do que essa. Tem jogo, e tem uma camisa que gosta disso.
Acontece que quando a bola rolar nesta terça-feira, no Couto Pereira, o rival do lado de lá, Fluminense, também em nada se parece o time dos tempos do sorteio dos confrontos, no início de julho. Chegou Mano Menezes, estreou Thiago Silva, se recuperou André e retornou Arias, aí sim reforços, sem o desgaste da palavra. Um time mais inteiro fisicamente e, ainda que não seja brilhante, mais competitivo, com cara de que pode encarar jogos grandes depois de algum tempo.
Esse Tricolor, tal qual o outro, também ficou pelo caminho na Copa do Brasil, mas a sequência de quatro vitórias magras seguidas – Cuiabá, Palmeiras, Bragantino e Bahia – foi um alento de boas perspectivas, ainda em tempo de agonia da zona do rebaixamento. É interessante pensar isso porque parece que já houve um mundo desde então, mas o Fluminense é o atual campeão da América, o Fluminense de Felipe Melo, Marcelo e Cano, mesmo que Mano tenha tentado deixar o campo mais leve, valorizando o gás de seu elenco.
É paradoxal como a Libertadores reserva os melhores dias do futebol de clubes para nós brasileiros, com as partidas que os torcedores priorizam (justo, o volume de jogos e o preço dos ingressos não cabem em todos os bolsos) e os técnicos mais planejam, ao mesmo tempo que por tabela acaba por esvaziar um pouco os nossos finais de semana, porque no Brasileirão sempre dá tempo de ver depois.
Acontece que a coisa muda quando se tem o risco iminente da queda. Pode não haver outra chance para buscar aqueles pontos de time reserva, cansado ou mal preparado. É vida, é uma terça de Copa rasgando a semana, para o bem e para o mal.
Acontece que no lado de azul de Porto Alegre (provisoriamente firmado em Curitiba) ou ali por Laranjeiras não se encontrará um tricolor, gaúcho ou carioca, que tope subestimar o brilho de uma sequência de Libertadores, nem que o quadro do Brasileirão seja de desesperar as fórmulas do Tristão Garcia. É tempo de mediar as urgências e mirar a Copa, possível, sim, por quê não?
O que não dá é para pensar que quem já sentiu o gostinho não acorda maluco só de imaginar um passinho a mais… Tão longe, tão perto, mas por ali, circulando o maior troféu. O sábado só vem depois, afinal.