León: Leão ferido
Final de junho. Os jogadores do León deixam o campo desolados, após perder a chance de voltar à primeira divisão do futebol mexicano. Quem via a cena nunca imaginaria que esse mesmo León já foi uma das forças dominantes de seu país. A derrota na briga pela promoção aconteceu frente ao Irapuato, justamente o time de uma cidade que teve grande influência no começo da história do León. Vejamos então como os 'alfaceiros' chegaram ao cume do futebol mexicano.
O começo de tudo
O futebol já é um esporte antigo no estado de Guanajuato, no México. Em 1911, nascia o primeiro clube local, na cidade de Irapuato e, apesar do momento conturbado vivido pelo país devido a inúmeras revoluções, o clube rapidamente cai no gosto do povo, acompanhando o sucesso do esporte em alguns pontos do país e no resto do mundo.
Em 1920, um homem chamado Diego Mosqueda chega à cidade de León, vindo de Irapuato em busca de um local mais tranqüilo para viver, trazendo consigo a paixão pelo esporte que começava a fazer sucesso em sua cidade natal, onde havia sido organizador da equipe do CMI (Clube Mutualista Irapuatense). Partindo dessa paixão e contando com a ajuda de pessoas influentes da cidade de León, Diego cria o León Atlético, dando mais um passo para o sucesso do futebol no país.
Com o surgimento de novos clubes locais, foi possível a realização de um campeonato municipal, o primeiro do país, no ano de 1924. O Leão Mexicano sagra-se campeão facilmente, de tal maneira que a população local exige que o clube alce vôos maiores. O objetivo é enfrentar as equipes do estado rival, uma espécie de 'Rio-São Paulo' mexicano, entre os clubes de Guanajuato e os de Jalisco, tidos como mais fortes e mais bem preparados. Os torneios seguintes serviram apenas para confirmar o que todos já sabiam. A participação do Leon e dos outros clubes de Guanajuato foi um fracasso, mas curiosamente houve um crescimento do interesse da população, e cada vez mais a torcida se tornava fanática e apaixonada, acirrando ainda mais a rivalidade.
Em 1928 é fundado o Unión de Curtidores, um time formado por jogadores dos diversos clubes amadores de Guanajuato. O repentino sucesso contra os clubes do Jalisco foi tal que houve um interesse geral na inscrição de um clube do estado na primeira divisão nacional. A motivação era geral, mas, apesar de todos os esforços, era um processo demorado, e apenas em 1943 conseguiu-se uma autorização formal por parte da federação para inscrever um clube local. Como a maioria dos jogadores era proveniente da cidade de León, houve um consenso na homenagem, e os próprios jogadores se autoentitularam “Unión León”.
A diretoria sabia que o primeiro campeonato seria um marco na breve história do time de León e para não fazer feio contratou uma comissão técnica de renome no país e trouxe a base do time argentino do Vélez Sarsfield, Antonio Battaglia, Miguel Rugilo e Angel Fernández, que se juntaram a uma base já bem entrosada. Nessa mesma época veio a contratação de um jogador que futuramente seria conhecido como o melhor de todos os tempos da história do clube: o argentino Marcos Aurelio.
Com todos esses reforços, com as cores do uniforme definidas (verde e branco) e com um nome, agora oficial, de León FC, a equipe estava preparada para sua grande estréia na primeira divisão mexicana.
Sucesso na primeirona mexicana
A estréia não poderia ter sido melhor. O León derrotou o Atlante por 5 a 3, um resultado histórico, comemorado à exaustão. No jogo seguinte, nova vitória e a certeza de que o time podia realmente fazer frente às grandes equipes da primeira divisão. A vitória de 3 a 1 sobre o América, na casa do adversário, em plena capital da república, mostra que a torcida tinha razão ao exigir a presença de seu time no campeonato mais importante do país. No fim do campeonato, o Leon acabou ocupando a quarta colocação, um feito importante para um time estreante.
Na temporada 1947/8, mantendo a mesma base de jogadores dos campeonatos anteriores mais os reforços do argentino 'Pajarito' Manzotti e do goleiro peruano Eugenio 'Macaco' Arenaza, o León começou arrasador, e de cara pôde se vingar do titulo perdido no campeonato anterior, vencendo o Atlante, atual campeão, por incríveis 10 a 1. Era apenas o inicio da primeira jornada vitoriosa do León. Embora os finalistas da temporada estivessem também em suas fases áureas, foi o Leon quem deu as cartas. Na final contra a equipe do Oro, foram necessários dois jogos extras, e, rompendo uma série de dois empates, o Leon venceu por 2 a 0. Era o primeiro campeonato do time alviverde, dando inicio de vez a uma época de glórias.
Na temporada seguinte, o León fez ainda melhor, sendo campeão do campeonato nacional e da copa do México, o que o tornou o primeiro time da história mexicana a realizar tal feito. O time foi chamado de 'o primeiro campeoníssimo' e dessa forma se consolidava cada vez mais como um dos grandes do futebol mexicano. Adalberto 'Dumbo' López continuou com sua rotina de gols, sendo pela terceira vez consecutiva o artilheiro do país.
Nas temporadas seguintes ocorreram algumas mudanças na diretoria e na comissão técnica da equipe, além da contratação de novos jogadores, dentre eles o grande goleiro Antonio 'La Tota' Carbajal, que até pouco tempo atrás era o único jogador da história a ter disputado cinco Copas do Mundo. As mudanças quebraram um pouco o entrosamento do time, que precisou esperar até 1951 para obter seu terceiro título. Na final, o adversário de sempre: o Atlante.
O quarto título nacional veio na temporada de 1955/6, dessa vez enfrentando a equipe do Oro, a qual já havia derrotado no primeiro titulo de sua história. A torcida estava em festa, o time parecia imbatível, e as comemorações não paravam em todo o país. O time ganhava reconhecimento nacional e internacional e começava a receber propostas de amistosos de grandes times do resto do mundo. Um dos primeiros encontros foi contra o Independiente da Argentina, e o León venceu por incontestáveis 4 a 0. O León mostrava sua força para o mundo do futebol.
O princípio do fim
Tantos títulos, tantas glórias. Parecia tudo bom demais para ser verdade. E assim como o sucesso, a decadência veio rapidamente sobre o time leonino. Nas décadas de 60 e 70, o León conquistou apenas três copas. Pouco para o time mexicano mais vitorioso da década de 50. Mesmo com a chegada de importantes jogadores como os argentinos Jorge Davino e Roberto Salomone, a equipe não conseguia deslanchar, e o título do campeonato nacional parecia cada vez mais apenas uma lembrança distante. Na temporada de 1972/3, o time até que chegou perto, mas a final contra o Cruz Azul, em três partidas, resultou apenas em um vice-campeonato.
Aliás, em toda a década de 70, o León se caracterizou por sempre chegar quase lá, mas perder na hora H. Uma espécie de síndrome de vice-campeonato. Mesmo contado com jogadores consagrados, tudo que o León alcançou foram três vice-campeonatos e uma enorme frustração para seus torcedores, mal acostumados com a fase áurea que teimava em ficar cada vez mais distante.
80, a década perdida
A pior fase da história do León ainda estava por vir. Problemas econômicos, venda dos principais jogadores e contratações que não deram resultados fizeram com que a torcida tivesse que se acostumar com uma equipe medíocre e que sequer aspirava à conquista de algum título. O máximo que conseguiu em 10 anos foi uma semifinal de campeonato contra o inexpressivo UNAM.
Na temporada 1986/7, o inevitável aconteceu. O fantasma do rebaixamento, que pairava há alguns campeonatos, dessa vez se abateu sobre a equipe alviverde. O descenso para a Segundona mexicana se deu após uma péssima temporada, e mesmo que um estranho empate na ultima rodada entre o líder do campeonato e o adversário direto na luta contra o rebaixamento tenha contribuído para o fatídico final, é impossível ignorar que o próprio León fora o responsável por sua queda.
Assim, somente o próprio León poderia trazer de volta os áureos tempos de conquistas. Logo em sua primeira temporada na segundona, em 1987/8, parecia que tudo seria recolocado em seu devido lugar. O León quebrou todos os recordes da história da segunda divisão mexicana, com maior número de vitórias e de gols marcados e com a defesa menos vazada. Mas, de maneira inacreditável, o León perdeu justamente o jogo mais importante, o terceiro da final contra a equipe do Las Cobras, deixando escapar a primeira chance de voltar a elite do futebol.
O vice-campeonato pareceu ter afetado a moral da equipe, que na temporada seguinte fez um papelão e quase foi rebaixada para a terceira divisão. Seria, talvez, o golpe final para destruir um passado de tantas glórias. Mas o León era forte e, na temporada 1989/90, o time derrotou com raça e valentia o favorito Gallos Blancos na semifinal, candidatando-se à final contra o Inter de Tijuana. Dessa vez, o León não deixou a oportunidade escapar. Os 'alfaceiros' ganhavam a grande chance de voltar e mostrar que a Primeirona era seu lugar.
O quinto título e as incertezas do futuro
Contando com o talento do brasileiro Milton Queiroz, o Tita, a temporada de 1991/2 foi a redenção de um time que se recusou a acostumar-se com o fracasso. Após 36 anos, um longo jejum tinha fim. O León ressurgiu como uma grande equipe ao obter seu quinto título de campeão nacional, derrotando o Puebla por 2 a 0 na grande final do campeonato mexicano.
Em 1997, nova oportunidade de título. O conjunto alviverde terminou a primeira fase do campeonato como líder, mas acabou surpreendido na grande final pelo Cruz Azul, sendo derrotado por 2 a 1 com direito a 'gol de ouro' no tempo extra. Mais um vice-campeonato, e novamente para o Cruz Azul. De qualquer maneira, o importante era voltar às manchetes dos jornais, dar um novo ânimo a seus torcedores, e o León parecia pronto para retomar a rotina de glórias.
Mas de 1997 pra cá, a má fase voltou, e o clube se viu novamente de frente com o fantasma do rebaixamento. O descenso veio na temporada de 2001, e o time permanece na Segundona até hoje. Na atual temporada, parecia que novamente o León teria forças para dar a volta por cima. O time sagrou-se o grande campeão do torneio de verão, o equivalente à segunda metade do campeonato nacional, e assim ganhou o direito de disputar a final contra o Irapuato, vencedor do torneio de inverno. Um confronto entre dois times cujas histórias se misturam, que daria a oportunidade a um dos dois de voltar à elite do futebol. Na semana passada, após a segunda partida das finais, o Irapuato adiou os sonhos do León, numa vitória por 2 a 1, para alegria do povo de Irapuato.
As manchetes de jornais e as atenções se voltaram para o time vencedor, novo representante da primeirona mexicana, enquanto o León permanece a espreita, buscando forças para manter vivo na memória os tempos de glória e a motivação de voltar a vencer. Portanto, nada mais justo do que lhe prestar uma homenagem. A vitória dessa vez não veio, mas o passado justifica o valor que deve-se dar ao grande Club León.