Brilliant Orange

O leitor pode achar que o título desta resenha é de uma obviedade incômoda. Ele está certo. Mas a idéia é essa mesma. Afinal de contas, o Brasil é pródigo em não enxergar o óbvio, situação genialmente captada por Nelson Rodrigues.

´´Brilliant Orange´´, do inglês David Winner, faz exatamente o que o título desta resenha diz. Explica as razões pelas quais a Holanda desenvolveu um futebol ´sui generis´, amplamente conhecido no mundo todo pelo refinamento técnico, taticismo e ofensividade quase suicida.

Winner é muito feliz ao dedicar algum espaço para falar da cultura, mentalidade, história e evolução da Holanda. Se aparentemente está fugindo do assunto, na verdade o escritor concreta os alicerces de sua argumentação, que clareia incrivelmente aquilo que parece impossível de ser observado no Brasil: que a Itália não é ´retranqueira´, que a Inglaterra não é ´chuveirinho´ e que a Alemanha não é ´correria´.

Ao longo das suas mais de 200 páginas, a rapidez mental dos craques holandeses como Rep, Cruyff, Krol, Resembrink e Neeskens é apresentada como uma conseqüência direta do entorno cultural dos Países Baixos, da mentalidade da contracultura e do jeito de pensar de todos os holandeses – e não somente os daquela geração.

Segundo ´´Brilliant Orange´´, o grande feito da geração de Cruyff não foi o de ser uma geração assombrosamente técnica, mas sim de criar um estilo para o futebol do país, até então um mero coadjuvante do cenário internacional, com virtudes e defeitos inclusos. Enxergando pela ótica do autor, os estereótipos aceitos no Brasil como verdadeiros, o da Itália retrancada ou da Alemanha ´correria´ caem por terra.

Aí está o maior mérito de Winner. Não se trata de saber quem é melhor ou não, mas saber que os países têm culturas diversas e precisam respeitá-las. Um exemplo? Em 1979, o iugoslavo Ivic foi campeão com o Ajax e foi demitido assim mesmo. Motivo: não respeitou a tradição ofensiva do clube e do futebol do país.

Para quem quer entender o futebol como um reflexo puro da cultura, mais do que um esporte, ´´Orange´´ é indispensável, mesmo perdendo o ritmo em sua segunda metade. A magia do ´Carrossel holandês´ fica um pouco mais nítida, bem como seus defeitos. Vendo assim, mesmo acompanhar uma partida de Itália x Alemanha (teoricamente maçante, para um brasileiro), fica espetacular.

Seria ótimo que nossos ex-craques e jornalistas esportivos perdessem um tempinho para ler ´´Orange´´ (que infelizmente só está disponível em inglês). Talvez poupassem nossos ouvidos de pelo menos alguns de seus costumeiros espetáculos de ignorância, frases feitas e clichês inventados na época dos dinossauros.

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Equipe Trivela

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