André Villas-Boas tem casa vandalizada e aponta intimidação por seu papel na oposição do Porto

O Porto passará por eleições presidenciais no próximo ano. À frente do Dragão desde 1982, Jorge Nuno Pinto da Costa deve tentar mais uma vitória nas urnas, em busca de seu 16° mandato consecutivo. Já uma das principais vozes da oposição é de um velho conhecido dos portistas: o ex-técnico André Villas-Boas, que teve seu ápice no clube com o título da Liga Europa em 2010/11. No entanto, o clima ao redor da política alviazul é de tensão, com ameaças sofridas por AVB. Nesta quarta-feira, a casa do pré-candidato foi vandalizada e um vigilante acabou agredido, em ataque aparentemente relacionado à corrida eleitoral.

Não é a primeira vez que a casa de André Villas-Boas se torna alvo, em meio às questões políticas do Porto. Em 31 de outubro, os muros do local amanheceram com uma pichação que dizia “AVB traidor”. Já na última madrugada, um grupo de indivíduos se juntou nos arredores da mansão para estourar fogos de artifício. A polícia foi chamada ao local. Horas depois, os homens voltaram e agrediram o vigilante da casa. O funcionário precisou ser hospitalizado e ainda teve seu carro roubado.

André Villas-Boas apontou que o episódio é uma tentativa de intimidação: “Lamentavelmente os atos de intimidação, vandalismo e violência continuam e peço às autoridades a empenhada cooperação na resolução destes incidentes”. Também nesta semana, o líder dos ultras do Porto postou em suas redes sociais uma imagem ao lado do presidente Pinto da Costa, em que declarava que “para derrubarem o rei, tem de passar por cima de nós”. Há a suspeita de que os ultras estão envolvidos nos ataques contra AVB. No entanto, a Super Dragões negou qualquer envolvimento e pediu ao Ministério Público para que identifique os responsáveis.

André Villas-Boas se tornou uma voz ativa na política do Porto especialmente nos últimos meses. Há uma semana, o ex-treinador criticou abertamente a administração pelos ocorridos na Assembleia Geral do clube. O evento foi bastante desorganizado e teve um clima tenso, inclusive com agressões a sócios que criticaram as propostas de alterações nos estatutos. Pessoas abandonaram o local, entre elas o próprio Villas-Boas, que apontava a existência de uma “guarda petroriana” para intimidar os demais sócios – numa mensagem aos ultras. Por conta da confusão, a Assembleia Geral precisou ser suspensa e remarcada, realizada na última segunda-feira.

A manifestação de AVB

Em suas redes sociais, Villas-Boas publicou uma nota para dar detalhes sobre a ocorrência desta quarta-feira: “Hoje, por volta das 00h48, a minha residência foi alvo de atos de violência e vandalismo. Foram lançados petardos, o que me alertou a mim, a um meu colaborador e a alguns vizinhos. A PSP foi chamada ao local e a devida participação da ocorrência efetuada”.

“Mais tarde, pelas 04h30, no mesmo local, o meu colaborador foi violentamente agredido por desconhecidos e viu-lhe serem furtados alguns bens, incluindo a sua viatura. Tendo recebido assistência medica no local, encontra-se ainda a ser observado numa unidade hospitalar e a receber os cuidados médicos necessários para tratar os seus ferimentos. A PSP foi chamada ao local e estiveram presentes também a Direção de Investigação Criminal (DIC) para tomar a devida conta da ocorrência”.

A nota da Super Dragões

Principal grupo de ultras do Porto, a Super Dragões se dissociou dos atos contra Villas-Boas: “Perante mais uma tentativa mal disfarçada de associar os Super Dragões a atos de vandalismo ocorridos na madrugada de hoje na cidade do Porto – que lamentamos e repudiamos -, apelamos a que o Ministério Público abra imediatamente um inquérito que apure as responsabilidades e as deixe claras e visíveis a todos”.

“Pedimos a todos os intervenientes nestes tristes episódios que parem de associar palavras como ‘guarda pretoriana' e ‘continuação da violência' de forma indireta ao nosso grupo, que há 37 anos apoia de forma incondicional o FC Porto nos quatro cantos do mundo. Continuaremos a apoiar o FC Porto no futebol e nas modalidades, faça chuva ou faça sol, na vitória e na (rara) derrota. Viva o FC Porto”, finalizou.

A ligação de AVB com o Porto

André Villas-Boas nasceu na cidade do Porto e ganhou as primeiras oportunidades no clube de seu coração ainda na adolescência, quando se aproximou do técnico Bobby Robson. O lendário treinador inglês auxiliou o garoto a realizar sua formação e o jovem passou a trabalhar nas categorias de base portistas. Villas-Boas chegou também a compor a comissão técnica de José Mourinho no Dragão, no departamento de observação e análise de desempenho. Depois seguiu o comandante rumo ao Chelsea e à Internazionale, antes de realizar seus primeiros trabalhos como treinador principal.

Depois de passar pela Acadêmica de Coimbra, André Villas-Boas assumiu o Porto em 2010/11. Trabalhou no clube por apenas uma temporada, mas com enorme sucesso. AVB conquistou o Campeonato Português, a Taça de Portugal, a Supertaça e a Liga Europa, com uma série de recordes embutidos. Faturou a Primeira Liga de maneira invicta. O impacto inegável logo levou Villas-Boas para o Chelsea, mas o jovem promissor não emplacou em seus outros times. Rodou também por Tottenham, Zenit, Shanghai SIPG e Olympique de Marseille.

Sem clube desde 2021, Villas-Boas passou a se dedicar de maneira mais ativa à formação para se tornar executivo de futebol. E nunca escondeu sua ambição de se eleger presidente do Porto. O episódio na Assembleia Geral fez com que AVB se posicionasse de maneira mais contundente contra os problemas do clube. Chegou a pedir que o Ministério Público investigasse o que classificou como “atos bárbaros”, apontando a inação dos órgãos competentes portistas diante das “agressões e intimidações”. Já nesta semana, o ex-treinador e seu funcionário se tornaram vítimas.

A visão de Pinto da Costa

Pinto da Costa é um dos dirigentes mais vitoriosos da história do futebol europeu. Conquistou mais de 60 troféus com o Porto, num período revolucionário para o clube. Foi sob as suas ordens que o Dragão se estabeleceu verdadeiramente como uma potência nacional: de sete títulos no Campeonato Português até 1982, os alviazuis saltaram a 30 canecos. Mais do que isso, os portistas também se estabeleceram como uma camisa respeitada além das fronteiras, com dois títulos na Champions League e outros dois na Liga Europa. Pinto da Costa ajudou a modernizar o Porto e transformou a equipe numa grande reveladora de talentos, com altos lucros no mercado de transferências. Todavia, existem críticas sobre a falta de abertura na gestão, a relação com os ultras e também aos balanços financeiros mais recentes.

Aos 85 anos, Pinto da Costa deve partir a mais uma reeleição. Por enquanto, não confirma a candidatura. O presidente diz que tem outras preocupações atualmente, inclusive que os tumultos ao redor do Porto não abalem o time de futebol. Apesar disso, o dirigente admite os problemas na Assembleia Geral. Sobre Villas-Boas, Pinto da Costa se disse “surpreso”, mas que “mágoa é só quando morre alguém”. Também apontou que se encontrou poucas vezes com o ex-treinador desde sua saída do clube em 2011, minimizando seu papel nos bastidores portistas. Resta saber se o barulho feito por AVB será suficiente para encerrar o reinado. As intimidações recentes indicam que ao menos alguns partidários estão acuados.