Inglaterra

Harry Kane fez o gol que nem precisava para marcar a sua excelente Copa do Mundo

Atuando muito mais como armador do que como finalizador, Kane provavelmente faz um Mundial melhor do que o anterior, do qual foi artilheiro

Harry Kane é considerado um centroavante. Afinal, usa a camisa 9 na seleção inglesa. Parece um centroavante. Joga de centroavante e faz gol como centroavante, então provavelmente é mesmo um centroavante. Mas consegue ser muito mais do que isso. A qualidade para se movimentar, ler os espaços, recuar e armar sempre foi visível nos jogos pelo Tottenham, nos quais adotou o costume de potencializar Son Heung-min. E raras vezes esteve tão afiada quanto nesta Copa do Mundo, da qual está sendo um dos melhores jogadores, mesmo que tenha marcado seu primeiro gol neste domingo contra Senegal.

Como centroavante, Kane é muito julgado pelos gols. Atual artilheiro da Copa do Mundo, a expectativa apenas aumenta para colocar as bolas na rede. Desde a primeira rodada, porém, parece mais interessado em armar para os companheiros. Passou em branco em um jogo muito tranquilo e aberto contra o Irã. A Inglaterra fez seis gols, nenhum dele. Kane não passou nem perto. Não deu uma finalização. Por outro lado, juntou duas assistências. Nas partidas seguintes, tentou buscar mais espaço para chutar, mas ainda foi muito mais um armador.

Em toda a fase de grupos, ele tocou na bola 79 vezes e apenas sete delas foram dentro da área adversária. Duas foram finalizações contra os EUA, outra a assistência para o gol de Foden contra Gales, sua terceira no Mundial. O número baixo de toques totais também indica como está preocupado em fazer o jogo ofensivo fluir sempre se livrando rapidamente da bola e tentando acionar os companheiros. Foi o que vez novamente no momento chave da vitória sobre Senegal nas oitavas de final. Recebeu o passe de calcanhar de Foden quase no meio-campo, quase colocado na linha lateral, e acelerou na hora para a infiltração de Bellingham, que cruzou para Henderson marcar.

O ciclo de Kane foi de altos e baixos. Logo depois de terminar a Copa do Mundo de 2018 valorizado pelos seis gols que lhe renderam a chuteira de ouro, teve a chance inesperada de disputar uma final de Champions League pelo Tottenham. Infelizmente, chegou ao fim daquela temporada machucado e retornou apenas para a partida decisiva contra o Liverpool. O vice-campeonato europeu foi o auge do time de Mauricio Pochettino, e Kane teve que lidar com três grandes frustrações.

A primeira foi ver o seu clube dar um passo atrás, com duas temporadas fora da Champions, até se reencontrar com Antonio Conte. Em julho do ano passado, veio a derrota para a Itália na final da Eurocopa, em Wembley, diante da torcida inglesa. Um torneio em que também começou a colocar a bola na rede apenas no mata-mata, aliás. Pouco depois, começou a novela do interesse do Manchester City, que acabou não se concretizando. Kane chegou a não se apresentar à pré-temporada para tentar forçar a saída, o Tottenham não recuou e exigiu um valor enorme, que o City decidiu não bancar. Um ano depois, foi atrás de Erling Haaland para ser seu centroavante.

Nesse intervalo, seguiu marcando gols como se fosse um centroavante mesmo. Sempre mais de 20 por temporada, com uma de 33 em 2020/21. Antes da paralisação para a Copa do Mundo, marcou 13 em 15 partidas pelo Tottenham. Foi extremamente prolífico pela seleção também: marcou em todas as oito partidas das Eliminatórias para a Eurocopa, com direito a hat-tricks contra Bulgária e Montenegro. Não à toa, com o gol deste domingo, chegou a 52 com a camisa inglesa e está a um de igualar Wayne Rooney como o maior artilheiro do time masculino na história.

Era sempre claro que o sucesso da Inglaterra dependeria bastante do que fizesse no Catar. Como na Rússia, quando teve um papel diferente. A questão é que, mesmo sem os números de gol para acompanhar, está provavelmente fazendo uma Copa do Mundo melhor do que aquela. Marcou duas vezes na pequena área, com senso de oportunismo, contra a Tunísia. Converteu dois pênaltis e marcou outro sem querer, em um chute de Loftus-Cheek que desviou em seu calcanhar. Marcou novamente da cal contra a Colômbia nas oitavas de final e passou em branco nos últimos três jogos.

Ainda mais em um time historicamente traumatizado como a Inglaterra, converter pênaltis é importante, mas ele não colecionou exibições tão completas quanto as desta Copa do Mundo. Se jogará de camisa 10, dependerá também do poder de finalização dos seus pontas. Phil Foden, Bukayo Saka e Marcus Rashford parecem estar afiados. A criação ofensiva contra equipes fechadas é o principal gargalo do time inglês, e ter Kane como armador está sendo muito mais importante do que como finalizador.

Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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