O que é a Frente Atlético, ultras por trás dos casos de racismo contra Vinicius Jr
Frente Atlético tem origens no final dos anos 1960 e coleciona episódios de assassinatos e violência extrema no futebol espanhol
No último clássico entre Atlético de Madrid e Real Madrid, válido pela 8ª rodada de La Liga 2024/25, Vinícius Júnior foi, mais uma vez, alvo de ofensas racistas no Estádio Metropolitano.
Quase um mês após o episódio, a Polícia Nacional Espanhola, por meio de uma breve nota nas redes sociais, confirmou que quatro responsáveis pela campanha de ódio contra o brasileiro foram presos.
🚩Detenidos los 4 principales responsables de una campaña de odio contra un jugador de #fútbol
— Policía Nacional (@policia) October 24, 2024
La investigación se inició a raíz de 3 denuncias interpuestas por parte de @LaLiga
Incitaban a los aficionados a través de las #RRSS para que asistiesen al estadio a proferir… pic.twitter.com/ZhjHDApnyu
Antes do jogo, segundo apurou o Diário AS, da Espanha, os responsáveis promoveram, por meio das redes sociais, uma campanha para que outros atleticanos insultassem o atacante de forma racista nas arquibancadas.
Embora não haja informações oficiais confirmando quem está por trás do incidente, os episódios daquele jogo trouxeram à tona o debate sobre a ligação do Atlético de Madrid com seu grupo de ultras, a Frente Atlético.
Conhecidos pelo comportamento violento e extremista, os ultras do Atlético enfrentam críticas, punições e proibições há anos. Mesmo assim, eles continuam marcando presença nos jogos do clube da capital espanhola.
Neste artigo, a Trivela explica o que é a Frente Atlético e por que, mesmo após uma década de punições, o grupo segue sendo uma parte tão controversa da arquibancada colchonera.
Quem são os ultras do Atlético de Madrid?
Frente Atlético Ultras, em 2007, no Estádio Vicente Calderón. Foto: Imago
Intimamente ligada ao grupo de extrema-direita “Frente de la Juventud”, a Frete Atlético ganhou o apoio da diretoria do clube nos anos 1980, quando era então presidido por Vicente Calderón.
O clube chegou a financiar o grupo para a compra de materiais e outros artigos para as arquibancadas. Francis Magán foi o primeiro líder da organização, que rapidamente ganhou força.
Durante o polêmico mandato de Jesús Gil (1987-2003), o grupo viveu seu auge, chegando a contar com até 4 mil integrantes e recebendo carta-branca da direção colchonera, mesmo após episódios de violência extrema.
A relação da Frente Atlético com o clube colchonero
Koke conversa com torcedores encapuzados do Atlético de Madrid após incidente no clássico contra o Real Madrid, pela 8ª rodada de La Liga 2024/25. Foto: Imago
Após o episódio da morte de Francisco Javier Romero Taboada, o “Jimmy”, torcedor do Deportivo de La Coruña assassinado em 2014 pelos ultras, o Atlético de Madrid tentou romper com a Frente Atlético.
O crime, ocorrido em um confronto entre os ultras do Atlético e do La Coruña, gerou comoção na Espanha e uma forte pressão para que o clube colchonero agisse diante da violência que era associada aos torcedores.
Em resposta, o Atlético de Madrid baniu o grupo Frente Atlético e qualquer simbologia que promovesse violência, racismo ou xenofobia no então estádio Vicente Calderón.
Apesar dessas ações, o impacto foi limitado. A Frente Atlético continuou a marcar presença nos jogos do clube, e incidentes violentos envolvendo seus membros ainda ocorrem regularmente.
Casos recentes da Frente Atlético envolvem Vini Jr e Nico Williams
Em janeiro de 2023, a Polícia Nacional Espanhola, segundo informou o El Confidencial, atribuiu a três membros da Frente Atlético mais um episódio criminoso.
Naquela ocasião, Atlético e Real se enfrentariam pelas quartas de final da Copa do Rei e, horas antes do jogo, foi visto um boneco enforcado com a camisa de Vini Jr e, logo acima, um cartaz com a frase: “Madrid odeia o Real”.
Meses depois, eles foram condenados pela Justiça Espanhola e proibidos de se aproximar a menos de um quilômetro de qualquer estádio de futebol vinculado à La Liga.
Boneco de Vini Jr enforcado foi colocado por três membros da Frente Atlético em janeiro de 2023; em maio do mesmo ano, a Justiça Espanhola concedeu a eles liberdade condicional. Foto: Reprodução/COPE
Na última temporada, torcedores colchoneros foram flagrados entoando um canto racista contra Vinícius Júnior antes do duelo pelas oitavas de final da Champions League, contra a Inter de Milão, no Estádio Metropoliano.
Em outro caso mais recente, torcedores incitaram ódio a Vinicius antes do clássico pela 8ª rodada de La Liga 2024/25, incentivando o uso de máscaras para cobrir o rosto e cometer insultos racistas contra o brasileiro, o que dificultaria a identificação e as eventuais punições.
Mas os episódios de racismo não se limitam a Vini. Em março de 2024, quatro membros da Frente Atlético agrediram torcedores do Real Betis em um bar próximo ao Estádio Metropoliano, antes do jogo pela 27ª rodada de La Liga 2023/24.
Em outro episódio daquela temporada, em abril, um ultra da Frente Atlético foi expulso permanentemente de jogos de La Liga após liderar cânticos racistas contra o jogador Nico Williams, do Athletic Bilbao.
A relação de Diego Simeone com a Frente Atlético
Simeone e os jogadores evitam falam sobre o assunto. Ao final de toda partida no Estádio Metropoliano, o time colchonero vai em direção ao setor sul do estádio, onde ficam os ultras, agradecer ao apoio.
A Trivela conversou com Gustavo Hofman, correspondente internacional da ESPN em Madrid. Para ele, a influência de Diego Simeone é o primeiro passo para entender melhor a relação do Atlético com os ultras.
— O Diego Simeone hoje é maior que o Atlético. Tudo no Atlético de Madrid gira ao redor de Simeone, a personalidade do clube é a personalidade de Diego Simeone. A partir daí, você começa a entender melhor a relação que existe com a Frente Atlético. O Simeone gosta do apoio desses torcedores, incentiva e tem relacionamento com alguns deles.
Embora o Atlético não mencione a Frente Atlético em seus comunicados oficiais, Hofman aponta que torcedores e dirigentes sabem que são eles os responsáveis pelos problemas recentes do clube.
— Real Madrid e Barcelona baniram esse tipo de torcedor das arquibancadas, mas o Atlético não faz esforço nenhum para isso, acima de tudo, por causa do Simeone. Ele não quer nenhum tipo de rompimento com essa torcida, porque é a que mais canta. Então essa relação não é oficial, mas é prática. O Atlético em momento algum cita a Frente Atlético em seus comunicados, mas todo mundo sabe que são eles os causadores dos problemas.
Como os torcedores do Atlético de Madrid enxergam a situação?
O jornalista da ESPN ainda destaca que muitos colchoneros são contrários aos ultras que ocupam o setor sul do Estádio Metropoliano, e um episódio recente deixou isso evidente.
— De maneira geral, a torcida do Atlético não apoia a Frente há muito tempo. Tanto é que, no final do jogo [Atlético x Real pela 8ª rodada de La Liga 2024/25], os jogadores vão até a Frente e aplaudem ele, e boa parte do estádio vaiou.
Em entrevista ao Relevo após o clássico de Madrid pela 8ª rodada de La Liga 2024/25, um torcedor do Atlético disse.
— O que você quer que eu diga? Que somos contra a Frente Atlético? A resposta é sim e não. Estaríamos de acordo que os 200 delinquentes desaparecessem? Sim, claro que sim. Mas, quem vai te dizer que não? Estamos falando de 200 delinquentes. Olha, vamos lá, quem não tem medo de 200 delinquentes? Eles são delinquentes. Não é questão de futebol. Ontem tinha um ali com uma máscara. Mas isso é culpa de quem? Do clube que deixou ele entrar com a máscara.
Ao Relevo, uma fonte policial com experiência no combate à violência no futebol espanhol também aponta que:
— As pessoas dizem que são 3 mil, mas, na verdade, os perigosos de verdade não passam de 200. E os verdadeiros chefes normalmente nem vão aos jogos de futebol. Há quatro que lideram um pouco a situação, pegam o microfone e essas coisas… Mas os que nos preocupam não costumam aparecer. Os verdadeiros chefes nem entram no estádio.