Fifa ameaça com punição esportiva, e seleções europeias desistem de usar braçadeira em apoio aos direitos LGBT+
A Fifa deixou para a última hora, como tem virado hábito, a resposta a sete seleções europeias que planejavam realizar o protesto no Catar, onde homossexualidade é crime

Sete seleções europeias anunciaram na manhã desta segunda-feira que seus capitães não poderão usar uma braçadeira de capitão com as cores do arco-íris e a mensagem One Love (“Um amor”) em apoio aos direitos LGBT porque a Fifa ameaçou com punições esportivas que incluem cartão amarelo aos jogadores. Três deles – Harry Kane, Virgil Van Dijk e Gareth Bale – planejavam começar o protesto nas estreias de seus times nesta segunda. A homossexualidade é crime no Catar.
Como parece ter virado hábito na organização da Copa do Mundo, a Fifa deixou para a última hora a confirmação de que o uso de braçadeiras não sancionadas por ela poderia gerar punições esportivas. As seleções estavam preparadas para pagar multas por violarem o código de uniformes do Mundial, mas a possibilidade de seus capitães começarem o jogo com um cartão amarelo fez com que recuassem. Eles correriam o risco de expulsão ou suspensão na fase de grupos se recebessem outra advertência.
“A Fifa deixou muito claro que aplicará sanções esportivas se nossos capitães usarem as braçadeiras de capitão em campo. Como federações nacionais, não podemos colocar nossos jogadores em uma posição na qual podem sofrer sanções esportivas, incluindo cartões amarelos, então pedimos que os capitães não tentem usar as braçadeiras nos jogos da Copa do Mundo”, disseram as sete seleções – Inglaterra, Bélgica, Dinamarca, Alemanha, Holanda, Suíça e Gales – em um comunicado conjunto.
“Estávamos preparados para pagar multas que normalmente se aplicam a violações de regulamentações de uniformes e tínhamos um forte comprometimento para usar a braçadeira. No entanto, não podemos colocar nossos jogadores na situação em que eles possam ser advertidos ou mesmo forçados a deixar o campo. Estamos muito frustrados pela decisão da Fifa que acreditamos ser sem precedentes. Escrevemos para a Fifa em setembro informando-a do nosso desejo de usar a braçadeira One Love para apoiar ativamente a inclusão no futebol e não tivemos resposta. Nossos jogadores e técnicos estão decepcionados. Eles são fortes defensores da inclusão e expressarão seu apoio de outras maneiras”, acrescentaram.
O presidente da Federação Alemã, Bernd Neuendorf, disse que este é “um fato inédito” na Copa do Mundo. “Não vamos colocar o conflito com a Fifa nas costas de Manuel Neuer”, completou, em referência ao capitão dos tetracampeões. Em seu comunicado, a Federação Holandesa diz que defende a mensagem One Love e continuará a difundi-la, mas “nossa prioridade número um na Copa do Mundo é vencer os jogos, e você não quer que o capitão comece a partida com um cartão amarelo”. Acrescentou que “junto com os outros países envolvidos, faremos uma análise crítica do nosso relacionamento com a Fifa no próximo período”.
Em um comunicado próprio, a Fifa disse que “o capitão de cada time precisa usar a braçadeira de capitão fornecida pela Fifa” e que as regras, “aprovadas por todos”, existem para preservar a integridade do campo para todos os participantes. “A Fifa é uma organização inclusiva que quer colocar o futebol em benefício da sociedade apoiando causas boas e legítimas, mas isso tem que ser feito dentro dos parâmetros das regras da competição, que são conhecidas por todos”, disse.
Com “dentro dos parâmetros das regras da competição”, a Fifa quer dizer: do jeito que eu quero. Ela havia tentado neutralizar os protestos que as seleções europeias pretendiam fazer lançando uma série de braçadeiras de capitão com mensagens genéricas como “Futebol une o mundo” e “Compartilhe a refeição” previstas para cada fase da Copa do Mundo. Uma delas seria “Sem discriminação”, mas sem especificar qual, que estava marcada para as quartas de final. O que a entidade provavelmente considerou como um meio-termo aceitável foi trazer essa braçadeira para a estreia da fase de grupos.
Em sua entrevista no sábado, Gianni Infantino, presidente da Fifa, foi questionado sobre por que a sua entidade ainda não havia apoiado as braçadeiras One Love e respondeu que “temos e fazemos campanhas com diferentes tópicos, campanhas que são universais. Precisamos encontrar tópicos aos quais todos podem aderir. Esse é um elemento importante para nós”. Aparentemente, os direitos LGBT não são um desses tópicos, na visão de Infantino, que, na nota desta segunda-feira disse que tem conversado sobre “este assunto” com a liderança do Catar, que reiterou que “todos são bem-vindos”. “Se alguém disser o oposto, bom, essa não é a opinião do país e certamente não é a opinião da Fifa”, completou.
Os organizadores do Catar – onde, vamos repetir, é crime ser homossexual – tem adotado o discurso de que todos são bem-vindos na Copa do Mundo, mas expressões de afeto em público são desaprovadas, independente da natureza. Fora de campo, segundo uma reportagem da Bloomberg no começo de novembro, sinalizaram que permitiram o porte de bandeiras do arco-íris e manifestações políticas pacíficas. A ex-jogadora do Arsenal, hoje comentarista da BBC, Alex Scott, usou a braçadeira One Love durante o pré-jogo da emissora no gramado do Estádio Internacional Khalifa, antes de Inglaterra x Irã.
— Daniel Storey (@danielstorey85) November 21, 2022