Copa do Mundo

Cinco razões pelas quais a disputa de 3º lugar também pode ser importante

Até 1938, o Brasil não representava muito no cenário internacional do futebol. Se os europeus respeitavam seleções sul-americanas, estas eram Uruguai e Argentina. No Mundial da França, no entanto, essa percepção mudou. Porque a seleção liderada por Leônidas da Silva fez uma campanha marcante, com duas vitórias épicas sobre Polônia e Tchecoslováquia. Os brasileiros não conseguiram superar a Itália na semifinal, mas acabaram coroando a grande campanha com a conquista do terceiro lugar sobre a Suécia. Sim, conquista.

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Porque milhares de torcedores foram ao porto do Rio de Janeiro receber o navio Arlanza, que trazia os vencedores de volta para casa. Uma mobilização tão grande quanto no embarque, que contou com a presença do presidente Getúlio Vargas. O sucesso da Seleção já era usado como ferramenta pelas autoridades políticas da época, que exaltavam a forma como aqueles brasileiros honraram o nome do país. Era um feito histórico para o futebol nacional.

Depois de 76 anos, o Brasil disputa sua quarta decisão de terceiro lugar. Pentacampeão do mundo, sem se importar tanto com um jogo que, para muitos, só reitera a humilhação nas semifinais. O mesmo à Holanda do outro lado, onde Louis van Gaal diz que o jogo nem deveria existir. Pois ele está errado. Por mais que brasileiros e holandeses não estejam ligando para o jogo em Brasília, a decisão do terceiro lugar tem seu valor. E quem afirma isso é a história das Copas do Mundo. Confira cinco razões:

É a chance para muitas seleções se eternizarem

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Para quem sonhava com a taça, a decisão do terceiro lugar pode ser irrelevante. É o caso de Brasil e Holanda desta vez. Mas, para quem vai além da própria imaginação, pode ser mais um momento de escrever a história. Já pensou se a Costa Rica passasse pelos holandeses, mesmo caindo para a Argentina? O jogo no Mané Garrincha seria uma final, que os Ticos poderiam nunca mais viver. Para as seleções mais tarimbadas, o que importa é ter caído nas semifinais. Para aquelas com sede de história, dizer também que ficou com a medalha de bronze.

Não foram poucas as vezes que toda essa vontade foi vista em uma decisão do terceiro . Como o próprio Brasil de 1938 ou a França de 1958, grandes países que ainda buscavam um grande resultado em Mundiais. Também para Portugal de 1966 ou a Polônia de 1974, que levavam suas seleções a uma posição inédita e ainda hoje insuperável, assim como a Croácia de 1998, que ainda tinha um caráter de afirmação nacional ainda mais forte por causa da independência. O Chile terminou de se honrar como anfitrião em 1962 ao ficar em terceiro. Até Alemanha e Uruguai demonstraram gosto nas duas últimas decisões: os europeus, pela nova cara que mostraram ao mundo na Copa de 2006; os sul-americanos, pelo ressurgimento de suas glórias. Basta ter vontade.

Gols nunca faltaram

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É natural que os times não se importem tanto em defender na decisão do terceiro lugar. É uma espécie de “Jogo das Estrelas” em plena Copa do Mundo, em que todo mundo quer marcar gols. Por isso mesmo, a quantidade de tentos costuma ser alta. A média é de 3,67 jogos por partida e somente três vezes o jogo teve o placar de 1 a 0. Além disso, apenas quatro dos 36 times que já estiveram em campo por uma decisão do terceiro lugar passaram o jogo todo sem marcar gols. E 13 vezes a quantidade de gols superou a média da Copa em questão – com direito a 10 duelos com quatro bolas nas redes ou mais.

É uma ótima ocasião para os artilheiros

1974 World Cup

Leônidas, Fontaine, Eusébio, Lato, Schillaci, Suker, Thomas Müller e Forlán. Se a decisão do terceiro lugar vale mesmo muito para alguém, é para aqueles que estão brigando pela artilharia da Copa do Mundo. Os oito jogadores acima deixaram as suas marcas na partida extra e acabaram com a Chuteira de Ouro. Afinal, se é um jogo mais aberto, não há ocasião melhor para que eles se consagrem. Neste quesito, ninguém supera Just Fontaine: foram quatro tentos nos 6 a 3 sobre a Alemanha em 1958. Mais do que assegurarem a artilharia ao francês, também o tornaram o jogador com mais gols em uma edição do Mundial.

Muitos craques deram seu adeus em Copas nesse jogo

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Por mais que nem todos os times não se importem muito, a decisão do terceiro lugar conta geralmente com seleções de qualidade. Muitas compostas por grandes jogadores, que acabam encerrando as suas participações em Mundiais no jogo festivo. Nos últimos anos, o exemplo mais claro é o de Oliver Kahn. O goleiro foi reserva de Jens Lehmann na Copa de 2006, mas acabou escolhido por Jürgen Klinsmann e foi o capitão no duelo contra Portugal. Engrossa uma lista que tem outros tantos nomes célebres: Leônidas, Jairzinho, Rivelino, Schiaffino, Kopa, Eusébio, Seeler, Zenga e Bergkamp entre eles, embora muitos não estivessem conscientes de que aquele era o adeus definitivo.

A decisão do terceiro reúne momentos clássicos de Copas

Em 1958, Fontaine deve seu recorde histórico de gols a uma decisão do terceiro lugar, como dito acima. Em 2002 aconteceu o gol mais rápido da história dos Mundiais, de Hakan Sükür, com 10,89 segundos do jogo contra a Coreia do Sul. E, em 1934, o terceiro mais rápido também, pelos pés do alemão Ernst Lehner, após 24 segundos ante a Áustria. Em 1978, um chutaço de Nelinho quase encerrou a carreira de Dino Zoff quatro anos antes de o capitão erguer o tri com a Azzurra. Em 2010, Forlán também fez um lindo gol contra a Alemanha, que o ajudou a impressionar os votantes para lhe entregarem a Bola de Ouro. . Em 1962 e em 1966, os gols de Eladio e Torres nos instantes finais levaram Chile e Portugal aos seus melhores resultados na história das Copas. Em 1990, Roberto Baggio desmoralizou Peter Shilton, que fazia sua despedida da seleção inglesa. Em 1974, derrota para a Polônia de Lato deu uma sensação ainda maior de crise para o Brasil.

E, mesmo com tantos episódios marcantes em Copas, tem gente que diz que o terceiro lugar não vale nada. Vai entender…

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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