Copa do Mundo

Cinco anos depois do trauma de não ir à Copa, Pulisic apareceu para colocar os EUA nas oitavas

Pulisic chama bastante a responsabilidade na equipe dos Estados Unidos nesta Copa e fez a diferença para a classificação contra o Irã

A imagem de Christian Pulisic desolado marcou o fracasso dos Estados Unidos em 2017. O ponta era a grande esperança do US Team nas Eliminatórias e os americanos sucumbiram, com a derrota contra Trinidad & Tobago que custou a ausência do país na Copa do Mundo. O camisa 10 precisou esperar mais quatro anos para celebrar a classificação para seu primeiro Mundial. Ganhou boas companhias, especialmente pelos demais talentos que surgiram do meio para frente. E honra a oportunidade no Catar, para garantir a passagem dos EUA rumo às oitavas de final. Pulisic conseguiu atuar por apenas 45 minutos diante do Irã. Chamou a responsabilidade e marcou o gol da vitória por 1 a 0, antes de sair lesionado por uma pancada no abdômen no lance do tento. De fora, comemorou o triunfo também graças ao esforço dos demais companheiros.

Pulisic era um mero torcedor quando os Estados Unidos participaram da Copa do Mundo de 2014, com uma boa campanha, em que passaram numa chave difícil e venderam caro a eliminação nas oitavas contra a Bélgica. Foi somente no ano seguinte que o ponta se mudou para a Alemanha e passou a integrar as categorias de base do Borussia Dortmund. A ascensão foi meteórica. Em 2017, o prodígio estava entre os principais destaques dos aurinegros. E o fardo sobre seus ombros seria grande na seleção, com uma expectativa irreal àquele que começava a ser visto como o “próximo grande craque americano”.

Durante aquelas malfadadas Eliminatórias para a Copa de 2018, Pulisic bem que tentou salvar a pátria. O garoto teve algumas atuações espetaculares e sustentou as chances de um time que já vinha cambaleante. Chegou a liderar uma goleada vital sobre o Panamá na penúltima rodada. Porém, no último compromisso contra Trinidad & Tobago, a classificação ainda poderia escapar. E o US Team conseguiu perder a vaga para os panamenhos. Não bastou o gol do camisa 10, numa derrota para os trinitinos que deixou os americanos de fora de um Mundial após sete participações consecutivas.

Pulisic lidou com críticas naquele momento. Em jogos nos quais não foi bem, seu status como “wonder boy” foi questionado. Semanas depois do vexame, ele assinou uma carta no Players' Tribune para se defender. Definiu-se como um “jogador decente em crescimento”, que nasceu com uma certa habilidade natural, mas também trabalhou bastante, não um “wonder boy”. Também defendeu a ligação dos Estados Unidos com o futebol e a capacidade de dar a volta por cima. Inclusive, faria uma promessa:

“Eu apenas quero que todo torcedor americano lendo isso entenda que não importam quais decisões serão feitas nos próximos anos. Que não importam quais mudanças serão implementadas. Que não importa qual técnico será ou quais serão os jogadores. Eu continuarei obcecado por vencer. E eu ficarei obcecado em fazer minha parte para o futebol nos Estados Unidos dar sua volta por cima. Porque, sim, ok… Não iremos à Copa do Mundo. Mas haverá outra Copa do Mundo depois disso. E outra depois. E outra. E eu acho – espero – que nós podemos construir algo com o futebol nos Estados Unidos, onde não se trata apenas de uma partida perdida, ou de um ciclo perdido, ou de um time perdido. Será sobre um país inteiro, se reunindo em torno de um esporte, em um caminho que perdurará. Então, vamos nos planejar para 2022”.

Desde então, Pulisic ficou mais próximo do conceito de “jogador decente em crescimento” do que de um “wonder boy”. O ponta teve ótimos momentos no Borussia Dortmund e saiu como grande aposta para o Chelsea, mas não atingiu o potencial que muitos imaginavam. Teve fases importantes especialmente em seu início pelos Blues e participou decisivamente na conquista da Champions League em 2020/21, sobretudo nas semifinais contra o Real Madrid. Ainda assim, aos 24 anos, não justifica o rótulo de craque. Mas carrega uma bagagem no futebol que o transforma numa referência para a jovem seleção americana.

Os últimos quatro anos fizeram bem para os Estados Unidos. O time ganhou muito mais opções e apresenta um dos elencos mais jovens da Copa. A tarimba de Pulisic no futebol europeu garante uma posição de destaque ao lado de tantos companheiros que começam a estourar. E isso fez a diferença em momentos importantes do atual ciclo do US Team. Pulisic cobrou o pênalti que lavou a alma dos americanos e garantiu o título da Liga das Nações contra o México na prorrogação. Já nas Eliminatórias, lesionado em parte dos compromissos, ele nem foi titular absoluto. Mas desequilibrou para levar a equipe oscilante dos EUA à Copa do Mundo, saindo do banco para abrir a vitória sobre o México e anotando três diante do Panamá na penúltima rodada.

Pulisic era uma face natural dos Estados Unidos para a Copa de 2022. E corresponde, inegavelmente entre os melhores do time na competição. O empate contra Gales teve influência direta do camisa 10, com a assistência para o gol de Timothy Weah. Já diante da Inglaterra, o ponta esteve entre os que mais ameaçaram a meta adversária e mandaria uma bola no travessão, no que seria um golaço. Diante do Irã, seria a sua vez de brilhar e possibilitar a vitória dos EUA.

Se o ataque dos Estados Unidos não produz tanto na Copa do Mundo, apesar de toda a intensidade do meio-campo, Pulisic virou praticamente um atacante de área diante do Irã. O ponta apareceu bem mais no segundo pau e representou a principal ameaça aos iranianos no primeiro tempo. Já tinha dado um aviso em cabeçada que o goleiro Alireza Beiranvand pegou. O gol sairia num lance de oportunismo do camisa 10, também de raça, para se meter no meio de dois defensores e definir a bola na pequena área. Levou a pior ao se chocar com Beiranvand e tomar uma joelhada involuntária na barriga. Tentou permanecer em campo, mas seria substituído no intervalo. E o time sentiria falta do atacante no segundo tempo, com drama para segurar o placar de 1 a 0. Poderia não apenas ajudar a matar o duelo, como também a prender a bola nos momentos de provação.

Os Estados Unidos não dependem apenas de Pulisic, como alguns imaginavam que seria em 2018. O setor mais forte do time é o meio-campo, com uma excelente participação de Tyler Adams, Yunus Musah e Weston McKennie. Timothy Weah foi outro que teve seus lampejos. Não é uma equipe que enche os olhos, mas tem nomes promissores e ganhou consistência para disputar a Copa do Mundo, em relação ao que se projetava anteriormente. E, se precisar, tem um cara para chamar a responsabilidade. Não é o “wonder boy” de outros tempos, mas não foge da raia para ser o cara do ataque. É graças a ele que o US Team alcança os mata-matas.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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