Versão da PM para vetar São Januário também poderia complicar situação do Maracanã
Dados apontam que Maracanã teve mais casos de violência do que São Januário e pesquisadora critica decisão da PM

O Vasco tentou, mas não conseguiu levar o clássico com o Flamengo, pelo Campeonato Brasileiro, para São Januário. O jogo, marcado para o dia 19 de abril, será no Maracanã, com o estádio dividido. O pedido da diretoria do Vasco foi negado pelo Batalhão Especializado em Policiamento em Estádios (BEPE).
De acordo com nota da Secretaria de Estado da Polícia Militar (SEPM), a decisão de vetar o clássico entre Vasco e Flamengo em São Januário “se deu com base nas análises estratégicas da unidade que apontam riscos à segurança no perímetro e no interior da praça esportiva em jogos desta natureza”.
A justificativa da PM, no entanto, também poderia colocar em dúvida a realização do clássico no Maracanã. Afinal, de acordo com dados do Observatório Social do Futebol, o estádio e os seus arredores também convivem com casos de violência, inclusive com óbitos registrados.
De acordo com o Mapa das violências no futebol do Rio de Janeiro, publicado pelo Observatório Social do Futebol, com dados de 2023, o Maracanã teve um maior número de registros de casos de violência do que São Januário (9 contra 7 episódios). Além disso, diferente do que acontece em São Januário, onde os casos registrados de violência são de brigas entre os próprios torcedores do Vasco ou entre torcedores e forças de segurança, os arredores do Maracanã foram palcos de brigas entre torcidas adversárias e, em duas delas, com óbitos.
— Nós temos percebido que o maior número de ocorrências entre torcidas não acontece mais dentro dos estádios. No caso do relatório de 2023, tivemos uma configuração um pouco diferente no sentido desse tipo de violência na região do Maracanã. Muitas ocorrências entre torcedores aconteceram no entorno do Maracanã — afirmou a pesquisadora Raquel Sousa à Trivela.
— Em um caso específico, no Flamengo x Vasco, quando inclusive teve uma morte, a Polícia Militar estava fazendo a escolta desses torcedores do Vasco (que iam para o Maracanã) — completou Raquel.

Maracanã já teve briga nos arredores em 2025
Dos 38 registros de violência no futebol do Rio de Janeiro em 2023, 30 casos aconteceram a mais de cinco quilômetros dos estádios. No entanto, os arredores do Maracanã costumam ser palco de brigas em dias de clássicos antes ou depois dos jogos.
Em 2025, por exemplo, torcedores de Flamengo e Fluminense já se envolveram em uma briga próximo ao Maracanã. Antes e depois do clássico, torcedores dos dois clubes protagonizaram cenas de violência na Rua São Francisco Xavier e na Praça Varnhagen.
— No ano de 2024 e também em 2025 a gente já percebeu alguns episódios de violência entre torcedores nos arredores do Maracanã. Fato distinto do que a gente conseguiu perceber dos atores envolvidos nas ocorrências em São Januário. No ano de 2023, como está no relatório, todos os atores envolvidos nas ocorrências no perímetro de São Januário foram entre torcedores e forças de segurança — disse a pesquisadora do Observatório Social do Futebol.
— Em nenhum momento, no entanto, mesmo com todos os episódios de violências, foi cogitado não ter jogos no Maracanã. Os dados não estão dialogando com a narrativa — completou Raquel.
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Preconceito com São Januário e a Barreira?
Pelo discurso da Polícia Militar e pelas ações tomadas por instituições públicas, como o Ministério Público e o Tribunal de Justiça, que chegaram a interditar São Januário por mais de 70 dias em 2023, Raquel Sousa acredita haver preconceito com o estádio do Vasco pela sua localização. A Colina Histórica fica ao lado da Barreira do Vasco, comunidade que cresceu junto com a construção do estádio.
— O que a gente pode compreender a partir das evidências dos dados e das diferentes narrativas é que o que há de diferente entre o Maracanã e São Januário é a região do entorno, basicamente. Compreende-se, a partir dessa somatória de fatores, de dados e observações, que o que acontece em São Januário se dá muito por uma questão de preconceito. Por vezes até uma aporofobia (rejeição ou aversão a pessoas pobres) por conta da região, por ser popular, por conta da Barreira do Vasco ser uma comunidade — disse Raquel Sousa.
Além do mapa do Observatório Social do Futebol, um estudo do Fogo Cruzado também mostrou, em 2023, que os arredores de São Januário tiveram o mesmo número de tiroteios da região do Maracanã. E os tiroteios na Barreira do Vasco representam uma parcela muito pequena do total das ocorrências no Rio de Janeiro.