Réver foi de capitão a ídolo no Atlético-MG, e agora se aposenta como um símbolo do clube
Maior vencedor da história do Atlético, Réver se despediu dos gramados como um símbolo da reconstrução do clube
Dia 6 de dezembro de 2023, 23h37, o árbitro apita o fim de Bahia x Atlético-MG, encerrando também a carreira do maior vencedor da história do Galo, Réver Humberto Alves Araújo, ou simplesmente Réver, que acabou não entrando em campo. O zagueiro chegou ao Galo com muita moral, se tornou capitão, depois ídolo, o maior vencedor e, agora, no seu adeus, se martiriza como um símbolo da volta por cima do Clube Atlético Mineiro.
Réver chegou ao Atlético em 2010, época de “vacas magras” no clube, como ele mesmo definiu. Na época, o Galo lutava sempre na parte de baixo da tabela do Brasileirão e não frequentava a Libertadores. Ele foi anunciado por Alexandre Kalil, então presidente do Galo, com alusão ao preço do ingresso que o torcedor reclamava ser caro.
O ingresso é quarenta reais, mas o zagueiro Rever é do #Galo!
— Alexandre Kalil (@alexandrekalil) July 19, 2010
– Eu passei por momentos aqui totalmente oposto do que a gente se encontra hoje. Sou um dos jogadores que passou pela época das vacas magras. Não tinha Mineirão e nem Independência (jogava na Arena do Jacaré). Acabamos superando, dentro das limitações que tínhamos no elenco. Não reclamo disso, muito pelo contrário, sou grato, pois faz com que a gente valorize o que temos hoje. Tento colocar, principalmente aos mais jovens, que não passaram por um momento difícil, para que entendam que o Atlético não foi sempre essa maravilha que é hoje — disse o defensor.
Logo que chegou, Réver já se tornou uma peça importante para o Atlético, e passou a vestir a braçadeira de capitão já no seu quarto jogo pelo time. Era o indício de uma trajetória que daria muito certo, tanto para o defensor quanto para o Galo. Ao todo, foram 10 temporadas vestindo a camisa alvinegra, com incríveis 12 títulos, que tornaram o defensor o maior vencedor da história do clube. Mas esse conto de fadas não começou muito bem, mesmo com a bela história da capitania logo cedo e um espetacular gol de bicicleta que abriu a conta dele pelo Alvinegro.
O difícil início de Réver no Atlético
Como citado, Réver chegou ao Atlético na época das “vacas magras”. Em 2010, quando chegou já no meio da temporada, foi derrotado em seu primeiro jogo (2 a 0 para o Santos) e viu o time atleticano na zona de rebaixamento. No fim, depois de muita luta e um restante de campeonato melhor do time, o Galo saiu da degola e terminou em 13° lugar. No ano seguinte, um cenário ainda pior, com o Alvinegro escapando da degola só na penúltima rodada e, para pior, na última partida, a histórica derrota por 6 a 1 para o Cruzeiro, no jogo em que rebaixaria o rival caso vencesse.
O primeiro ano e meio de Réver no Atlético não foi nada fácil. O time vivia péssima fase e não dava muito indícios de que seria diferente. Mesmo com as atuações ruins da equipe, o zagueiro era sempre um dos poucos que tinha boa relação com a torcida e passava ileso diversas vezes no mar de críticas. Depois do vexame contra o Cruzeiro, ninguém foi aliviado, muito menos o capitão atleticano – que marcou o único gol do time naquele jogo. Mas a história, depois desse capítulo, iria mudar para sempre.
O Capitão América atleticano
A vida do Atlético mudou da água para o vinho em 2012. A começar com o título do Campeonato Mineiro, o primeiro de Réver pelo clube, que naquela época nem imaginava que muitas outras taças viriam. E a cereja do bolo chegou em junho, com ninguém menos que Ronaldinho Gaúcho desembarcando na Cidade do Galo. Com ele, o Galo lutou pelo título do Campeonato Brasileiro pela primeira vez desde o início do século. A taça não veio, mas o time se classificou novamente para a Libertadores após 13 anos.
Réver foi um dos destaques do Atlético naquele ano. Não à toa venceu todos os prêmios possíveis de melhor zagueiro. Nada mal para o zagueiro e para o Galo, que no ano anterior escaparam da degola no fim e terminaram o ano com um enorme baque na cabeça do maior rival. Apesar dessa volta por cima, ficou um gosto amargo para o atleticano, que queria o título brasileiro, mas, algo melhor ainda estava guardado para o clube.
2013 começou com mais uma taça do Mineiro para Réver levantar pelo Atlético. Nesta edição da competição, inclusive, ele conseguiu um feito histórico, que foi marcar três gols em uma mesma partida, algo completamente fora do comum para um zagueiro. O jogo em questão foi contra o América-MG, e o Galo venceu por 5 a 2.
Mas Réver queria para ele (e para o clube) algo ainda mais fora do comum: conquistar a Libertadores. Com a melhor campanha da fase de grupos da competição, o Atlético foi construindo uma história incrível ao longo do mata-mata e se sagrou campeão, pela primeira vez, da competição naquele ano. O zagueiro, que foi o responsável por erguer a taça, foi peça fundamental para a campanha, marcando um importante gol no inesquecível jogo contra o Tijuana.
Para Réver, a conquista da Libertadores foi o auge dele no Atlético. O zagueiro também afirma que essa campanha foi peça fundamental para a virada de chave dele e do clube:
– É difícil escolher apenas um momento, foram tantos com tantas alegrias aqui no Atlético. Mas, eu acredito que o ápice da minha trajetória aqui foi em 2013, onde a gente foi campeão da Libertadores. Vínhamos de dois anos maçantes, brigando para não cair. Era um momento que o clube precisava virar a chave, se transformar em uma potência. E, com alguns jogadores que nenhum clube queria, o Atlético buscou eles e fomos campeões, colocando o clube em um patamar acima. Pra mim, foi algo que marcou muito a minha vida, que acabou concretizando a minha permanência na Seleção Brasileira. Ali foi a virada de chave do clube e da minha carreira.
Ano em baixa e despedida
Depois de chegar ao auge em 2013, Réver viveu seu pior momento em 2014. O zagueiro sofreu com muitas lesões e entrou em campo em apenas 12 jogos naquele ano. Um baque enorme para ele foi ter ficado fora da Copa do Mundo no Brasil, já que ele era nome quase certo, mas perdeu a chance justamente por uma lesão. Mesmo assim, embolsou mais dois troféus para a conta: a Copa do Brasil e a Recopa Sul-Americana.
Após essa temporada em baixa, Réver foi negociado pelo Atlético com o Internacional. Encerrava ali uma passagem muito vitoriosa, onde já havia marcado seu nome na história do clube, não só pelos títulos, mas pela identificação que teve com o Alvinegro. Mas alguns capítulos ainda seriam contados mais para frente.
Retorno, idolatria maior e feito histórico
Depois de alguns anos fora, passando por Inter e Flamengo, Réver recebeu o contato para voltar ao Atlético em 2019. Segundo ele, “não pensou duas vezes”, e só teve o trabalho de convencer uma pessoa, que ele não quis revelar quem era. O ano de volta não foi dos melhores, longe disso, mas as coisas foram se acertando a partir de 2020:
– (2019) Realmente foi um ano muito turbulento. Algumas escolhas equivocadas. Em 2020 mudou alguma coisa ou outra, onde batemos na trave. Mas sabemos que o futebol pune em suas escolhas, e nós fomos punidos pelo que foi feito alguns anos atrás. Mas você precisa passar por esse processo para colher. Nem sempre que você não vence está tudo errado.
Em 2020, Réver conquistou mais um Mineiro pelo Atlético e quase conseguiu terminar o ano como campeão Brasileiro, mas, novamente, o melhor estava guardado para o próximo ano. Em 2021, o capitão e o Galo viveram um ano mágico, conquistando o Brasileirão após 50 anos e ainda fechando com mais um título da Copa do Brasil, fora ter levantado mais um troféu do Mineiro.
Já 2022 e 2023 não foram anos tão espetaculares quanto 2021. Mesmo assim, Réver conseguiu aumentar sua prateleira de títulos, com mais dois Mineiros e a Supercopa do Brasil de 22. Com essas conquistas, o defensor se tornou o jogador com mais títulos na história do Atlético – empatado com João Leite. Além disso, alcançou a marca de 350 jogos e ganhou um belo especial sobre sua vitoriosa trajetória no Alvinegro.
Torres gêmeas com Léo Silva
Durante sua passagem pelo Atlético, Réver ficou marcado por fazer dupla com Leonardo Silva. Chamados de “Torres Gêmeas”, os zagueiros, com mais de 1,9m de altura, formaram uma das melhores duplas da história do clube, e não só na defesa, como também no ataque. Juntos, eles somam 67 gols, mais do que muito ataque por aí.
Réver tem 31 gols pelo Atlético, enquanto Léo Silva tem 36, sendo os zagueiros com mais gols na história do clube. No entanto, em Brasileiros, a ordem se inverte, pois Réver assume a liderança, com 34 gols (somando outros clubes), e Léo aparece com 33. Os dois foram históricos na conquista da Libertadores de 2013.
– O Léo eu tenho como irmão. Acredito que a sintonia que nós tínhamos, o estilo de jogo, acabou encaixando perfeitamente. Outro defensor que, além de defender muito bem, também fazia muito gol. A gente construiu uma história muito bacana, com conquistas importantes.
Léo Silva se aposentou em 2019 e assumiu o cargo de coordenador de transição no Atlético, que é quem ajuda na subida dos jovens para o time profissional. No entanto, o defensor mudou de função neste ano e passou a ser auxiliar no time sub-20. O cargo vago dele agora será de Réver, mostrando mais uma vez o entrosamento da dupla. O camisa 4 fará cursos na CBF e pretende seguir trabalhando no campo, como auxiliar ou até treinador, mas ainda há um processo a se cumprir.
A grande despedida de Réver
No último sábado (2), Réver entrou em campo pela última vez com a camisa do Atlético. O destino ainda entregou a ele a responsabilidade de ser titular, já que o Galo estava sem opções para a defesa. Antes da bola rolar, ele recebeu uma homenagem do clube, que finalmente passou a dar o devido valor a seus ídolos nos últimos anos. Primeiro, todos os jogadores atuaram com o nome do defensor nas costas. Além disso, as bandeirinhas de escanteio do Mineirão tinham a cara de Réver, que também estava estampada em um patch nos uniformes com a “#FoRever”.
Antes do aquecimentos dos jogadores, Réver foi ao gramado do Mineirão receber uma bela homenagem da diretoria atleticana, com direito a presença de toda a sua família, uma placa e uma camisa especial, além de um belo vídeo no telão do estádio, falando de sua trajetória pelo Alvinegro.
©️✅ Dever cumprido, Capitão! Você merece todas as homenagens possíveis!
Aqui é #Galo! 💪🏼🐔#GaloPaixãoNacional | #RéverFoREVER pic.twitter.com/N4QReHH82A
— Atlético (@Atletico) December 2, 2023
Mas algo ainda maior esperava pelo jogador, vindo da torcida atleticana que tanto o apoiou e o idolatra. Na entrada dos times em campo, um mosaico de led com a “#FoRever” tomou o Mineirão, que ainda teve uma bandeira 3D do defensor levantando a Libertadores pelo clube. Fora a ovação que tomou conta do estádio antes, durante e depois do jogo.
Espetacular a festa da torcida do Atlético e a homenagem para o zagueiro Réver!@trivela pic.twitter.com/G9zIiJSedy
— Alecsander Heinrick (@alecshms) December 2, 2023
Para fechar com chave de ouro, o Atlético venceu o São Paulo em um jogo épico, marcando o gol da vitória nos acréscimos. Nos bastidores do jogo, feito pela GaloTV, Réver se emocionou: “Nem nos meus melhores sonhos eu imaginava isso. Poder concluir a minha trajetória pelo Galo aqui no Mineirão com essa vitória. É um motivo de muita alegria e dever cumprido. Vou comemorar, curtir e agradecer a Massa, que me abraçou de certa que não tem como não ser grato a eles. Fico feliz por tudo que eu presenciei e conquistei. Aqui é Galo!”.
O Réver para o Atlético
Não são só os títulos que marcam a trajetória de Réver no Atlético. Como citado, ele chegou ao clube na época das “vacas magras”, mas foi um dos rostos da transformação do Galo, que voltou a conquistar títulos relevantes e a figurar no topo praticamente todos os anos desde 2012. São mais de 10 anos do Alvinegro de volta aos holofotes, e Réver é figura crucial para esse processo.
Réver chegou ao Atlético como grande contratação, logo virou capitão e, em pouco tempo, se tornou ídolo, levando o time a títulos importantes como um grande líder. Saiu, mas voltou para ser ainda mais vencedor e conquistar um troféu histórico para o clube. A história do Galo e do zagueiro se misturam nesse século, e por isso ele tem que ser tratado como um símbolo do clube. Quando se fala de Clube Atlético Mineiro, é preciso lembrar de Reinaldo, Éder, Tardelli, Ronaldinho Gaúcho, Hulk e, claro, de Réver.
Réver superou a esposa e o empresário, que não queriam ver ele parando de jogar, para encerrar seu ciclo no Atlético, clube que ele aprendeu a amar: “É de muita felicidade pra mim poder ter essa essa trajetória aqui no Atlético, um clube que eu aprendi a amar e respeitar. Esse carinho e esse sentimento vai ser pro resto da minha vida, independente estando aqui dentro ou fora daqui, esse carinho, essa paixão sempre vai permanecer”.