Brasileirão Série A

Maurício Noriega: Será que VP errou mesmo ao dizer que falta educação?

Cutucadas irônicas de Vítor Pereira esquentam debate sobre comportamento de jogadores, treinadores, torcedores e imprensa no futebol brasileiro

Causou polêmica a série de cutucadas irônicas do treinador português Vítor Pereira direcionadas ao futebol brasileiro. Pereira, de passagem irregular por Corinthians e Flamengo, é mais lembrado por fatos extracampo do que por algo de bom que tenha deixado em termos técnicos e táticos.

Suas cutucadas foram proferidas num evento sobre futebol em Portugal. Entre outras ironias, atacou a falta de educação que envolve o futebol brasileiro.

Como tudo que acontece no Brasil, prevaleceu aquela velha lógica na qual nós, brasileiros, permitimos que apenas nós falemos mal de nosso País e fiquemos sentidos quando algum estrangeiro faça alguma crítica.

Vitor Pereira não é formado no curso de etiqueta de Madame Poças Leitão, registre-se. Ele também faz parte do universo grosseiro do futebol que tanto critica. Embora tenha razão em alguns pontos de sua alfinetada. Falta educação esportiva ao futebol brasileiro. De cabo a rabo. Desde o comportamento dos jogadores, dos treinadores (portugueses inclusive), dirigentes, torcedores e jornalistas. Chamar alguém de burro no futebol brasileiro é mais fácil que dar bom dia. Existe no comportamento de quem pratica, produz, analisa e consome futebol em nossa terra uma grosseria enraizada que dá razão a Pereira. Xingamentos, agressividade, ameaças, violência implícita e explícita, terrorismo psicológico. Foi a isso que ele quis se referir.

Mas faltou ao treinador português uma boa dose de autocrítica. Algo pouco praticado no condomínio exclusivíssimo do futebol. Talvez os profissionais bem sucedidos neste negócio multimilionário entendam que o número de zeros em suas contas bancárias confira a eles autoridade moral e intelectual. Como Vítor Pereira disse explicitamente a um repórter brasileiro. Ou como aquele obscuro goleiro certa vez respondeu a um torcedor que com o salário dele (torcedor) comprava comida para o cachorro dele (jogador).

Fato é que para o futebol europeu o Brasil é apenas e tão somente exportador de matéria prima em estado bruto. Além de um território no qual é possível faturar alguns milhões por mês, sem precisar de um currículo extraordinário na Europa como cartão de visitas.

Algumas declarações de treinadores portugueses no Brasil, de todos eles, Abel Ferreira, Vitor Pereira, Luís Castro, Renato Paiva, denotam essa dose mal disfarçada de desprezo pelo nível do jogo aqui praticado e, consequentemente, de boa parte dos profissionais envolvidos no processo geral– exceto os jogadores, de quem eles dependem para obter sucesso e com quem podem contar futuramente em outras plagas.

O comportamento agressivo de torcedores e de alguns jornalistas que costumam misturar as coisas, além do amadorismo constrangedor da maioria dos dirigentes de futebol no Brasil. são elementos que alimentam declarações como a de Vítor Pereira. Em parte, fundamentadas nesse desprezo implícito pelas coisas do futebol brasileiro. Como no dia em que Pereira disse “também queria treinar o Liverpool, mas não posso”,
ao responder a uma pergunta sobre certo descontentamento de Roger Guedes no Corinthians.

Há muito que se aprender com todo mundo. Nunca sabemos o suficiente na vida. A presença de estrangeiros trabalhando no futebol brasileiro é enriquecedora em qualquer ramo de atividade. Há treinadores brasileiros que se incomodam com isso, mas que nunca se incomodaram quando os patrícios ou eles próprios foram trabalhar fora do País. Também é um traço da falta de educação. Traço esse que está escancarado, sem distinção por nacionalidade, no comportamento à beira do gramado de treinadores brasileiros, portugueses e argentinos por aqui. Assim como jogadores brasileiros que eram autênticos lordes em campo na Europa, quando voltam a jogar no Brasil transformam-se em chiliquentos contumazes.

Entre nós, jornalistas, reside uma mania irritante de cobrar demissão de treinador, usar todo tipo de sinônimo esnobe para dizer que o sujeito em questão é burro ou não sabe nada. Torcedores justificam pela paixão todo tipo de comportamento repulsivo, desde cuspir em alguém até agredir pessoas efetivamente.

Educação mandou lembranças a todos nós.

Foto de Mauricio Noriega

Mauricio Noriega

Colunista da Trivela
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