Brasileirão Série A

Maurício Noriega: Endrick e Suárez no túnel do tempo

Garoto e veterano protagonizaram autênticas orações ao futebol no espaço de uma semana.

Foi uma semana mágica para quem ama o futebol. Dois jogadores de gerações diferentes se encontraram num túnel do tempo de exibições de gala, gols espetaculares e, curiosamente, embaladas por viradas épicas com o mesmo placar, diante de adversário comum.

Separados por nove dias e 17 anos no tempo, o jovem Endrick e o experiente Suárez encantaram o Brasil com atuações que rodaram o mundo. Coube ao Botafogo atuar como coadjuvante dessas duas exibições de gala, cuja semelhança provocará arrepios nos alvinegros cariocas ainda por muitos anos.

Suárez dispensa apresentações. Desde Ronaldo Fenômeno, é o maior nome a jogar no Brasil. Não há nos 20 times da Série A um jogador que passe perto de Suárez em termos de carreira e representatividade internacional. O uruguaio soma 508 gols em uma carreira consolidada na Europa, atuando na Holanda, Inglaterra e Espanha, antes de desembarcar em Porto Alegre. Registre-se que com menos repercussão do que deveria, dada sua importância. Nessa dou razão aos gaúchos que reclamam de que o que eles chamam de “Eixo”, basicamente Rio e São Paulo, fica com toda a atenção. Haveria muito mais barulho se Suárez chegasse a Flamengo ou Corinthians, por exemplo.

Para ficarmos no campo da artilharia, Suárez foi goleador do Campeonato Holandês, do Espanhol, da Premier League, das Eliminatórias Sul-americanas e das Copas do Rei da Espanha e da Holanda. Em seus anos de Barcelona participou, como protagonista, de um dos maiores times da história do futebol. Suárez é a grande atração do Campeonato Brasileiro e provou isso em algumas oportunidades. Mas o recital que apresentou em São Januário, ao liderar o Grêmio numa virada de 1 a 3 para 4 a 3, foi um portfólio de sua brilhante carreira. Um artista em frente ao gol, um finalizador nato e com repertório vasto que soma 14 gols no Brasileiro.

Endrick nasceu quando Suárez começava a carreira no Nacional uruguaio. Quando o Pistoleiro venceu a Copa da Liga da Inglaterra com o Liverpool, Endrick tinha cinco anos de vida. A promessa palmeirense comprada pelo Real Madrid protagonizou uma noite de Suárez na abertura de novembro. Amadureceu uma década em 45 minutos, liderando uma virada improvável e histórica, levantando um 0-3 para um 4-3, com dois gols mágicos e uma participação fundamental. Mais que isso, sua imagem buscando uma bola que estava posicionada para reposição após um dos gols refletiu a liderança que emana de alguém que ainda não pode dirigir um automóvel. Mesmo tendo ficado boa parte do campeonato no banco e até sem jogar algumas partidas, Endrick tem 8 gols no Brasileirão. Gols que rendem 500 mil euros ao Palmeiras cada vez que o garoto estufa as redes.

De quebra, o veterano e o noviço ainda fizeram os gols das vitórias de seus times na rodada de final de semana.
É um privilégio para o torcedor brasileiro testemunhar esse encontro de gerações em plena disputa de um campeonato que está aberto e promete ser o mais emocionante desde a adoção dos pontos corridos. Uma oração ao futebol e ao tempo.

Suárez deixou o Uruguai com 19 anos para jogar na Europa. Endrick deixará o Brasil com 18 com o mesmo destino. Provavelmente retornará após uma carreira brilhante. Como fez Suárez com seu Nacional do coração, antes de chegar ao Grêmio. É uma tristeza saber que o Brasil esteja sempre nos extremos para as estrelas do futebol atual. Um jovem talentoso precocemente vendido e um craque consagrado que rapidamente passa por aqui. Nossas mazelas são econômicas e estruturais. País pobre, economia sempre na corda-bamba, moeda desvalorizada. Impossível concorrer com euro e dólar.

Quando conseguimos seduzir um talento consagrado, a insanidade do calendário faz com que a felicidade seja efêmera. Endrick deveria ser preservado em uma redoma para brilhar muito por aqui antes de partir. Suárez deveria ser preservado em uma redoma para se exibir muito por aqui antes de se aposentar. No caso de Endrick, a força da grana que ergue e destrói cosias belas venceu. No de Suárez, a ganância dos dirigentes brasileiros e seus calendários que jogam contra o espetáculo farão com que ele pegue seus gols e vá desfrutar a vida ao lado de Messi, em Miami.

Foto de Mauricio Noriega

Mauricio Noriega

Colunista da Trivela
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