Grêmio não conseguiu o milagre que o salvasse de um rebaixamento dos mais difíceis de explicar
Um rebaixamento que não se imaginava no começo do ano, mas que foi a realidade do Grêmio desde o começo do campeonato

Poucos poderiam imaginar que o Grêmio seria um candidato ao rebaixamento antes do início da atual temporada. Campeão da Libertadores em 2017, participante constante da Libertadores nos últimos anos, contas acertadas, salário em dia, bons jogadores no elenco. Não houve uma crise política, ao menos não grande a ponto de ser externada. Mesmo assim, o Grêmio foi rebaixado à Série B do Campeonato Brasileiro neste ano de 2021.
É um caso bastante peculiar entre todos os rebaixamentos de gigantes que vimos, especialmente nos últimos anos. Vimos clubes enormes, de massa, caírem em meio a crises financeiras, crises políticas e às vezes os dois juntos. Houve casos absurdos, que foram até a esfera criminal, como foi o Cruzeiro. O Grêmio não tem esses elementos. Além disso, tem em campo um time que está longe de ser tão ruim assim a ponto de cair.
Rebaixamentos raramente acontecem por um só motivo. É preciso que aconteça uma série de erros, que vários problemas se combinem. O Grêmio começou o ano com Renato Portaluppi, provavelmente o maior ídolo da sua história e que conduziu bem o time nos últimos anos. Só que desde 2020 o desgaste já existia, o futebol do time já não era mais tão bom, os resultados começaram a ser mais sofridos. A eliminação precoce na fase preliminar da Libertadores criou uma situação que só aumentou a pressão sobre o presidente de grupos descontentes com o técnico. Renato precisava sair. E saiu.
O problema é que o Grêmio deixou o clube nas mãos de Renato. Ele comandava o departamento de futebol e, ao que parece, sem ele o clube não sabia bem o que fazer, nem como trabalhar. A escolha de Tiago Nunes podia até ter questionamentos, mas fazia algum sentido. O bom início, contra adversários fracos, deu alguma esperança que as coisas andariam. Mas não andaram. Tão logo o estadual acabou, com título gremista, começou uma campanha que, em termos de bola e campo, de resultados, já começou do pior jeito possível.

Foram três derrotas seguidas logo de cara. Na sétima partida, depois de cinco derrotas e dois empates, Tiago Nunes foi demitido. A primeira vitória veio só na 10ª rodada, já com Luiz Felipe Scolari, um nome histórico do clube. Era um indício de como as coisas estavam complicadas para o time àquela altura. Com pouco mais de um quarto de campeonato, o Grêmio estava afundado na zona do rebaixamento.
O que acontece é que todo clube grande nessa situação, a essa altura, olha para a fartura de jogos que ainda resta e se encanta pelas possibilidades. Tem muito jogo, tem muitos pontos. Mas sempre com o olhar de quem há pouco tempo levantava taças e aproveitava a grande maioria dos seus pontos. Para quem briga para não cair, aproveitar pontos não é das coisas mais simples. O normal para um time lá de baixo é perder mais do que ganhar. Nenhum clube grande está acostumado a isso, mesmo aqueles em má fase há anos.
O tempo passa, os jogos passam, as vitórias vêm a conta-gotas e o sofrimento vem pulsante como o ponteiro dos segundos de um relógio. Aqueles ponteiros são traiçoeiros. Tal qual o calendário, oferece um mar de possibilidades. Quem está atrasado faz contas otimistas achando que vai chegar. Tal qual o estudante que vê o monstro do vestibular se aproximar e acha que dará conta de tudo que não conseguiu estudar até ali. Mas o tempo é implacável. O relógio não dá trégua, as rodadas continuam, os pontos seguem distantes, mas o pulso ainda pulsa.
Chega um momento que a história já tem elementos trágicos demais. O drama já está estabelecido, mas ainda há o sonho do milagre. Esses grandes feitos são absolutamente sedutores: ao mesmo tempo que a situação parece piorar, o sonho de um épico cresce. Há uma imensa tentação em acreditar em algo que foge ao lógico, ao cotidiano, ao normal. Porque o lógico, o esperado, o provável já não oferece mais do que a dor.
A queda de Felipão depois da 23ª rodada foi o último impulso de alguma esperança. Veio Vagner Mancini, mas a melhora não veio, não foi o bastante. A reta final tinha uma série de contas complicadas. O destino parecia selado. A luta agora era contra a lógica. Às vezes acontece, mas o que se viu foi que o Grêmio melhorou em campo, mostrou mais futebol, mas parecia tarde demais.
Nos últimos 10 jogos, três derrotas, dois empates e quatro vitórias. Uma melhora considerável em relação a outros trechos do campeonato. Não o bastante para ir contra a lógica de todas as rodadas anteriores. Não o bastante para inverter o curso do rio. O Grêmio, enfim, se encontrou com o destino que parece inevitável. A queda se consolidou na Arena. O destino é mesmo a Série B. O clube terá muito tempo para digerir como isso aconteceu. Será difícil. De todas as quedas de clubes grande à Série B, a do Grêmio é dos mais difíceis de explicar. Seja como for, o que o Grêmio sabe que pode contar é com a sua gente, que estará lá, para o que der e vier.