Analisamos o crescimento do futebol africano neste século
Quarto lugar do Marrocos na Copa de 2022 é marco histórico para o continente e prova de evolução do esporte na região

A primeira participação africana em uma Copa do Mundo aconteceu em 1970, quando o Marrocos conseguiu se classificar para o Mundial do México. Na ocasião, os marroquinos caíram no Grupo 4 ao lado da Alemanha, Peru e Bulgária. Naturalmente, a falta de experiência no cenário internacional impediu que a seleção debutante conseguisse uma posição melhor dentro da competição e acabou eliminada ainda na primeira fase. Após 52 anos, o mesmo Marrocos, com uma estrutura muito diferente de outrora, conquistou a 4ª colocação na última copa, disputada em 2022, um marco para o futebol africano
Neste período, a Nigéria se consolidou como força no futebol de base, sendo a maior campeã mundial da categoria sub-17, ao lado do Brasil com quatro conquistas, além de ser medalha de ouro na modalidade em 1996, nas Olimpíadas de Atlanta. Senegal e Camarões, que também faturou a medalha de ouro nas Olimpíadas de 2000 e foi o principal centro do esporte no continente entre os anos 90 e o início do século XXI também são outros exemplos de evolução do futebol africano.
A Trivela analisou a evolução do esporte bretão na África e traz para você neste artigo os motivos pelos quais o futebol africano saiu do ostracismo a uma prateleira de destaque dentro do cenário internacional. Atualmente, jogadores africanos estão nas cinco principais ligas do mundo e a tendência é que este número só aumente tendo em vista a capacidade de revelar jogadores e os investimentos importantes que a região tem recebido nos últimos anos. Não foi por acaso que o Marrocos é o atual 4º colocado de uma Copa do Mundo e se essa evolução permanecer, não será nenhuma surpresa que um time africano possa chegar a conquistar um Mundial em um futuro próximo.
Primeira década de 2000 foi um marco para o futebol africano
A participação de Camarões na Copa do Mundo de 1990 foi o prenúncio de que o futebol africano seria um dos centros importantes do esporte bretão no cenário internacional. A eliminação nas quartas de final para a Inglaterra de Lineker foi um detalhe que impediu o sonho do continente, mas que mostrou ao planeta a ginga, a alegria e a competitividade de um povo, que deixou o planeta estarrecido na abertura daquele mundial, quando venceu a Argentina de Maradona, atual campeã naquela época.
De lá para cá, outras seleções conseguiram um destaque igual ou até maior, seja na Copa do Mundo, ou em competições de base, como na Nigéria, da geração de ouro do fim dos anos 90, liderados por Kanu, Amokachi, Babangida, Okocha entre outros grandes craques que depois foram brilhar em grandes times na Europa, o time nigeriano foi medalha de ouro nas Olimpíadas de 1996 e chegaram nas oitavas de final da Copa do Mundo de 1998.
Nas últimas seis Copas do Mundo, a Nigéria deixou de participar em apenas duas edições (2006 e 2022), mostrando a sua força dentro do cenário local. Assim como Camarões, que dominou o continente no início dos anos 2000, sendo medalha de ouro nas Olimpíadas de Sydney e chegando na decisão da Copa das Confederações de 2003, com uma geração muito talentosa, que tinha em Samuel Eto'o o seu nome mais técnico.
Ainda no início dos anos 2000, Senegal chocou o mundo com uma equipe consciente na fase defensiva e muito organizada ofensivamente. Os comandados do já falecido técnico Bruno Metz venceram a França na abertura do Mundial da Coreia/Japão e provaram que o futebol africano poderia ser alegre, mas ciente de suas responsabilidades sem a bola. Acabaram eliminados nas quartas de final daquela Copa do Mundo para a outra grande surpresa daquela Copa, a Turquia.
Na Copa de 2010, Gana, quer já havia vencido o Mundial sub-17 em 1991 e 1995, igualou a campanha de Senegal na Copa da África do Sul, parando nas quartas de final para o Uruguai de Suárez e Forlán em um dos jogos mais espetaculares de todos os mundiais. Faltava algo a mais para que as seleções do continente africano conseguissem uma posição de maior destaque, posição esta alcançada na última copa, com a seleção de Marrocos, a mesma que representou o continente pela primeira vez em 1970, encantar o mundo e chegar até a semifinal da competição mais importante.
A eliminação para a França e a derrota para a Croácia na disputa do 3º lugar na Copa do Mundo do Catar deixou uma mensagem clara aos amantes do futebol e seus profissionais de análise e comunicação. O futebol africano não pode mais ser considerado como prateleira inferior do cenário e a tendência é de que em breve, resultados como o visto no Catar poderão atingir outros patamares, talvez algo parecido com o que é feito nas categorias de base.
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Variedade nos campeões da Copa Africana de Nações aumenta competitividade
Outro ponto que demonstra o equilíbrio das forças no continente africano e o consequente avanço futebolístico na região é a quantidade de seleções diferentes que já levantaram o caneco da Copa Africana de Nações. Ao todo, 15 países diferentes já foram campeões continentais, sendo o Egito, com sete conquistas, o país que mais vezes venceu a competição. Camarões (5), Gana (4), Nigéria (3), Costa do Marfim (2), RD Congo (2), Argélia (2), Zâmbia (1), Tunísia (1), Sudão (1), Senegal (1), Etiópia (1), Marrocos (1) e África do Sul (1) e Congo (1) são as demais seleções que levantaram o caneco continental ao menos uma vez.
Isso mostra que o nível de competitividade dentro do continente africano é alto, o que aumenta o nível das equipes, elevando o nível do esporte praticado nos países da região, fazendo com que ao nível internacional, os países africanos consigam competir de igual para igual com outros grandes centros, tais como a América do Sul e até a Europa.
Desenvolvimento e revelação de novos talentos
A presença de jogadores africanos em ligas europeias cresceu muito nos últimos anos. Com isso, os jogadores do continente africano tem a chance de se desenvolverem em um ambiente mais competitivo, no mais alto nível técnico do futebol mundial e quando são convocados para suas seleções, conseguem executar bem suas funções em campo, sem perder a leveza e ofensividade, tão caraterística de todas as equipes que formam o grande eixo do esporte bretão no continente.
Desde Milla em Camarões, passando pela geração de ouro da Nigéria, pelos incríveis leões senegaleses de Diouf, Henry Camara, o próprio Alliou Cissé que treina a seleção de Senegal e foi um dos grandes nomes de 2002 e atualmente com Mané, Salah, Hakimi, Mahrez entre outros, a globalização do futebol e a chance de revelar novos atletas ao esporte, dando a oportunidade de desenvolver sua técnica em outros centros fez o futebol africano crescer muito e se tornar cada vez mais atrativo e competitivo.
O investimento de alguns países africanos em academias de futebol e infraestrutura esportiva para o desenvolvimento de jovens talentos tem oferecido muito ao cenário do esporte bretão no continente africano e o resultado é o protagonismo de jogadores e seleções da região em competições locais e internacionais.
Desafios permanentes do futebol africano
A questão da desigualdade ainda é muito presente no continente africano e um dos principais desafios dos países que formam a região na luta por maior protagonismo no futebol. Se países como Gana, Camarões, Nigéria, Egito, Costa do Marfim e Marrocos conseguiram seu “lugar ao sol” e conseguem com certa frequência participar de uma Copa do Mundo, ou mesmo vencer a Copa Africana de Nações, o mesmo não pode se dizer de países como a Mauritânia, Tanzânia, Líbia, Níger, Serra Leoa, entre outros, que lidam com problemas internos como a fome e as guerras civis.
Outras federações africanas de futebol ainda enfrentam alguns desafios de governança, gestão, o que pode aumentar ainda mais esta diferença dentro do continente e impedir uma evolução mais significativa do cenário. Porém, em resumo, o futebol africano cresceu significativamente nos últimos 23 anos, o que é refletido tanto no desempenho das seleções do continente como na formação de novos talentos ao esporte. Ainda existem questões administrativas e estruturais que devem ser trabalhados com paciência e muito profissionalismo para garantir um crescimento ainda maior e sustentável do esporte bretão no continente.