Nantes: Canários do Atlântico
Nantes 2×2 Sedan. Um resultado normal, que, à primeira vista, pode parecer sem qualquer significado no campeonato francês. Porém, essa partida disputada em 31 de agosto de 1963 é motivo de orgulho para os Canários. Foi a estréia do Nantes na primeira divisão, de onde nunca mais sairia. São 41 anos consecutivos na elite francesa, com mais de 1,5 mil jogos realizados; um recorde absoluto.
A história do Football Club de Nantes começou no dia 21 de abril de 1943, em um típico café francês. Reuniram-se representantes de seis clubes da região do Loire-Atlântico: La Mellinet, St. Pierre, AC Batiment-Loire, Les Batignolles, ASO Nantes e Stade Nantais UC. Sob a coordenação do presidente – e goleiro – do La Mellinet, Marcel Saupin, decidiu-se pela fusão daquelas equipes. O novo time teria as cores verde e amarela, sugestão de Jean le Guillou, um dos fundadores. Eram as cores da casaca vestida por seu cavalo puro-sangue. Marcel Braud foi escolhido como presidente, mas Saupin era quem dava as cartas.
O Nantes estreou no campeonato amador do oeste na temporada 1943/4. Ficou com o vice e subiu para a segunda divisão, tornando-se profissional. Saupin tinha planos ambiciosos e deixava claro seu sonho de ver o clube logo na elite.
Após uma boa estréia (quinto), o time enfrentou uma crise financeira. A prefeitura recusou-se a dar dinheiro ao Nantes. Para piorar, problemas internos provocaram constantes trocas de técnicos. Tudo isso refletiu no desempenho da equipe, bastante irregular. Saupin se afastou do clube na temporada 1954/5, por estar doente. Em seu lugar, ficou Le Guillou. Apesar da descoberta de talentos, como o goleiro Claude Simonet (hoje presidente da FFF), a situação permaneceu inalterada.
A virada começa com Arribas
Guillou pediu demissão em 1958, e o prefeito impôs Charles Stéphan para a presidência do clube. Ele não resistiu por muito tempo e cedeu seu posto para Jean Clerfeuille, em 1959. O novo homem-forte trouxe um técnico desconhecido. José Arribas, um imigrante espanhol, pregava um estilo de jogo rápido, técnico e baseado na movimentação constante dos jogadores. Ele deu chances a jovens como Jean-Claude Suaudeau e Phillipe Gondet. Como resultado, terminou a temporada 1962/3 em segundo, alcançando enfim o acesso à primeira divisão. Porém, Saupin não pôde ver a realização de seu sonho, pois faleceu em 10 de junho de 1963. Para homenageá-lo, o clube rebatizou o estádio Malakoff com seu nome.
O Nantes sagrou-se bicampeão nacional em 1964/5 e 1965/6. Em 1968/9, Clerfeuille pediu demissão, e Louis Fonteneau o substituiu. O clube revelou atletas como Denoueix (atual treinador da Real Sociedad) e Rampillon. Em 1972/3, ganhou novamente o título, tendo no elenco promessas como Maxime Bossis e Loïc Amisse (atual técnico do próprio Nantes).
Fonteneau deixou o clube no fim de 1976, indo para o Olympique de Marselha, com Jean Vincent assumindo o cargo. Com ele, o time levantou a taça em 1976/7 e 1979/80, além de conquistar a Copa da França em 1979, após vencer o Auxerre na final por 4 a 1. O Nantes já havia chegado perto dessa conquista, mas havia sido derrotado em três finais. Poderia ter ido ainda mais longe do que foi na Copa dos Campeões de 1980, mas uma fatalidade tirou as chances da equipe. Antes do jogo de volta contra o Valencia, pelas semifinais, o jogador Omar Sahnoun faleceu em pleno treinamento, devido a uma crise cardíaca. Ainda abalados, os Canários perderam para os espanhóis por 4 a 0.
Novo estádio e formador de talentos
Com a queda de rendimento nas temporadas seguintes, Vincent foi demitido em 1982, partindo para Camarões, e Suaudeau assumiu. Vahid Halilhodzic (atual técnico do PSG) mostrou sua habilidade e marcou 27 gols, ajudando o time a conquistar seu sexto título em 1982/3.
Outra tragédia abalou o clube, dessa vez em 1983/4. Em um acidente de carro, Jean-Michel Labejof e Seith Adonkor morreram, enquanto Sidi Kaba ficou gravemente ferido. Os três eram promessas do clube.
Em virtude da Euro-84, o Nantes construiu seu novo estádio, antiga obsessão de Fonteneau: o La Beaujoire. Nessa época, o time enfrentava grave crise financeira, com déficit estimado entre 7 e 8 milhões de francos. Mesmo assim, contratou Burruchaga e Bracigliano, além de revelar Didier Deschamps e Marcel Desailly. Fonteneau deixou o Nantes em 1986, e Max Bouyer, industrial da cidade, assumiu em seu lugar. Contratações equivocadas levaram o time a cair de produção. O técnico Suaudeau foi trocado pelo iugoslavo Miroslav Blazevic em 1988.
Em 30 de janeiro de 1989, morreu Fonteneau. O clube o homenageou, colocando seu nome no seu estádio, rebatizado La Beaujoire Louis Fonteneau. Blazevic enfrentou diversos problemas e caiu em 1991 para o retorno de Suaudeau. O clube vendeu Deschamps para fazer caixa. Mesmo assim, o Nantes teve seu rebaixamento imposto pela Direção Nacional de Controle de Gestão (DNCG) por sua má situação financeira.
Biscoitos e títulos
Porém, em 1992 uma sociedade salvou o clube da queda, com alguns empresários da região investindo no time. Guy Scherrer, dono de uma fábrica de biscoitos, pasou a comandar o Nantes, que acrescentou o termo Atlantique a seu nome oficial (no escudo, há uma onda estilizada, referência ao oceano). Em 1992/3, despontaram Makélélé, Pedros, Loko, Karembeu, Ouédec e Capron.
A temporada 1994/5 ficou na história pelos recordes. O Nantes sagrou-se campeão com 10 pontos de vantagem sobre o vice Lyon. Ficou 32 jogos sem perder e terminou com o melhor ataque (71 gols marcados) e defesa (34 sofridos), além de fazer o artilheiro (Loko, 22 gols). Pela Liga dos Campeões, chegou às semifinais, mas foi batido pela Juventus.
Scherrer caiu no fim de 1996. Seu sucessor, Jean-René Toumelin, ficou no cargo pouco tempo (até 1998/9) e deixou o lugar para Kléber Bobin. Suaudeau deixou o clube em 1997, insatisfeito com a venda dos principais atletas do elenco. Denoueix foi chamado para treinar a equipe e conquistou duas Copas da França (1999 e 2000). Em 2000/1, o Nantes chegou ao oitavo título francês.
A temporada 2003/4 pode reservar ao clube a conquista inédita da Copa da Liga. Seria mais um vôo alto destes Canários.