Morre Silvio Berlusconi: presidente histórico do Milan e político cercado de escândalos
Aos 86 anos, ex-presidente do Milan, dono do Monza e ex-Primeiro-Ministro italiano por três gestões, morreu nesta segunda-feira em Milão
Bunga-bunga. Talvez essa expressão seja a que mais descreve Silvio Berlusconi, que morreu nesta segunda-feira, aos 86 anos. A expressão trata sobre as festas que o político, dirigente de futebol e empresário bilionário fazia. A sua vida era envolta em tudo isso: dinheiro, poder, festas e algo que parecia uma comédia assustadora em alguns momentos.
Berlusconi estava internado há 44 dias no Hospital San Raffaele por uma leucemia mielomonolítica crônica. Ele já tinha ficado na UTI entre abril e maio por um problema respiratório. A sua morte nesta segunda-feira, às 9h30, fez com que o governo italiano decretasse luto oficial na próxima quarta-feira (14), data que será realizado o seu funeral na Catedral de Milão, que é a cidade natal e onde atuou o ex-premiê.
Impetuoso é uma palavra que consegue descrever bem Berlusconi. O seu jeito de ser teve beneficiários. O Milan, sob o seu comando, se tornou uma máquina de títulos, formou alguns dos melhores times da história do futebol e conquistou mais do que poderia imaginar. Tudo isso, porém, o proporcionou ainda mais prestígio, permitindo que a sua vaidade fosse quase plenamente atendida. Foi três vezes Primeiro-Ministro na Itália e levou o seu bunga-bunga à política – no pior dos sentidos.
Presidente histórico do Milan
No futebol, a sua ligação foi sempre com o Milan. Em 1986, o então dono da Mediaset e da Fininvest, grupos de mídia, comprou o Milan. Ele salvou o clube da falência, já que o clube estava em uma situação financeira precária. Mais do que isso: passou a investir grandes quantias e transformou o Milan em uma potência rapidamente.
O Milan conquistou oito títulos da Serie A na gestão de Berlusconi, cinco Champions League, incluindo um dos times mais espetaculares da Europa, o Milan dos holandeses, dirigidos por Arrigo Sacchi e que foi bicampeão europeu em 1989 e 1990. Conquistou ainda uma Copa da Itália, seis Supercopas da Itália, cinco Supercopas da Uefa, e três Mundiais de Clubes.
Foi responsável por tirar o Milan de uma fase ruim, que vinha até de passagens pela segunda divisão, para se tornar uma potência italiana e europeia. Foi graças a ele que o Milan se tornou o segundo maior campeão da Champions League, com sete (com sete títulos, contando inclusive antes da era Champions League), atrás apenas depois do Real Madrid (que tem incríveis 14).
Berlusconi era alguém que já falava sobre uma Superliga nos anos 1980, pensando como um empresário de mídia, um dos negócios que o enriqueceu. Depois de vender o Milan, em situação complicada e em meio a crises, em 2012, ele decidiu se tornar dono de um novo clube: o Monza, a partir de 2018. Também colocou bastante dinheiro no clube da Serie B, para os padrões de um clube de segunda divisão, e levou a equipe à Serie A. Ele esteve ao lado de Adriano Galliani, seu braço direito desde os tempos do Milan.
Cantor de navios, garotas de top less e game shows
Nascido em 1936 e começou a carreira profissional como cantor de navios, curiosamente. Sua fortuna foi construída no ramo imobiliário nos anos 1960 e 1970. Ele foi acusado de ser financiado pela máfia para seus investimentos iniciais, algo que ele sempre negou.
Depois de construir apartamentos, Besluconi atrelou esse negócio a outro que tinha: o de emissora de TV. Ele providenciava o serviço da sua emissora a quem ocupava os apartamentos construídos por ele. A sua rede de televisão rapidamente cresceu e se tornou uma potência nacional. Seus programas eram acusados de serem sensacionalistas, com mulheres de topless na TV – algo que vimos por aqui também nos anos 1980 e 1990. Levou ao mercado programas populares, como novelas americanas importadas e game shows.
A imagem de empresário de sucesso o ajudou a se eleger em 1994, com o discurso que nos acostumamos a ver em grande parte do mundo de que ele era alguém que sabia como resolver as coisas, com uma visão de negócios. A sua primeira tentativa durou poucos meses no poder, mas ele voltaria mais duas vezes, em governos bem mais longos e com coalizões bem mais firmes.
A sua carreira política ficou marcada por condenações em ao menos sete casos por acusações graves, que passaram por subornar senadores e até subornar juízes. Só que as condenações acabaram anuladas em recursos ou varridas dos tribunais por um estatuto de limitações que coloca um período de tempo para os magistrados concluírem o processo. Não por acaso, uma das administrações de Berlusconi reduziu muito esse tempo. Ele se disse perseguido por juízes “de esquerda”. A população o apoiou e voltou a o eleger.
Na política, ele precisou renunciar ao cargo de Primeiro-Ministro em 2011 quando a Itália vivia uma crise que se aproximava de um colapso, assim como a Grécia tinha vivido. Ele saiu com muitas críticas e vaiado pelo público. Aos poucos, porém, ele conseguiu recuperar a sua imagem e era visto como uma voz racional e de moderação em meio aos seus pares extremistas de direita. Tentava – e com sucesso, muitas vezes – passar uma imagem de um velho político sábio e capaz de controlar os mais impetuosos ao seu lado.
Silvio Berlusconi foi um protagonista na política italiana nas últimas três décadas, gostando ou não da sua polêmica figura. Os escândalos financeiros e sexuais foram frequentes na sua vida e na sua carreira. Se tornou um dos personagens mais divisivos na Itália. Sua popularidade, porém, era inegável.
Berlusconi foi líder do Força Itália (FI), partido que criou em 1994 após o escândalo “Mãos Limpas”, que causou muitos estragos na política – e afetou o futebol italiano também. Ocupou três vezes o posto de Primeiro-Ministro italiano, de 1994 a 1995, de 2001 a 2006 e de 2008 a 2008. Era senador da República desde 2022 e foi base de apoio de Giorgia Meloni, a primeira mulher a ocupar o cargo de Primeira-Ministra italiana, e uma aliada de longa data.
“Silvio Berlusconi era sobretudo um combatente, era um homem que nunca teve medo de defender suas convicções, e foram justamente essa coragem de determinação que o tornaram um dos homens mais influentes da história da Itália e permitiram que ele provocasse reviravoltas no mundo da política, da comunicação e dos negócios”, afirmou Meloni, segundo noticiado pela agência Ansa.
Só que Berlusconi é marcado também por escândalos. Em 2013, ele foi condenado a trabalhos sociais por uma fraude fiscal. Com isso, teve seu mandato como senador cassado e se tornou inelegível até 2019. Além de um escândalo financeiro, ele respondia na justiça por um escândalo sexual.
O chamado caso “Ruby ter”, desmembrado do caso “Ruby”, do qual ele foi absolvido da acusação de prostituição de menores de idade e abuso de poder. Ele era acusado de pagar milhares de euros a uma garota de origem marroquina que seria, segundo as acusações, menor de idade. A sua absolvição foi porque ele alegou que não tinha como saber que ela não tinha 18 anos.
Berlusconi deixa a sua companheira, com quem fez um casamento informal, Marta Fascina, que é deputada, e cinco filhos: Marina, Pier, Silvio, Barbara, Eleonora e Luigi.