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Mais do que o seu novo poder financeiro, o que levou o Newcastle de volta à Champions foi o grande trabalho de Howe

O Newcastle empatou com o Leicester nesta segunda-feira e somou o ponto que faltava para disputar a Champions pela primeira vez desde 2003/04

Haverá um momento em que o novo poder econômico que o Newcastle obteve após ser comprado pelo Fundo Soberano da Arábia Saudita será decisivo para dar o salto que deseja dar, dos anos de mediocridade com Mike Ashley ao primeiro patamar do futebol europeu. Por enquanto, porém, ele apenas ajudou porque o fator principal para a classificação à Champions League que foi confirmada nesta segunda-feira com o empate por 0 a 0 com o Leicester foi o trabalho excepcional do técnico Eddie Howe.

Quando Steve Bruce foi demitido em outubro de 2021, com o Newcastle ainda sem vencer pela Premier League e encarando a perspectiva de lutar contra o rebaixamento, nomes mais fortes do que o do ex-comandante do Bournemouth foram tentados. Unai Emery agradeceu o interesse antes de confirmar que ficaria no Villarreal. A imprensa italiana falava em Antonio Conte. Rafa Benítez, um favorito das arquibancadas que saiu após rusgas com Ashley, também estava cogitado.

Howe foi uma aposta. Ele havia mantido o Bournemouth na Premier League por cinco anos, jogando um futebol ofensivo e empolgante, até a fórmula esgotar com o rebaixamento de 2019/20. Como a transferência de Graham Potter ao Chelsea escancarou, isso não é garantia de sucesso quando o sarrafo fica mais alto. Em um primeiro momento, poderia até ter parecer uma contratação temporária para tirar o Newcastle do buraco. A história de clubes que passaram pelo mesmo processo mostra que uma hora a grife fala mais alto, e Howe também teria que provar que é um técnico de elite para entregar as altas ambições dos novos donos.

O rebaixamento foi evitado com sobras. Com bons reforços de janeiro, o primeiro exemplo do poder financeiro da Arábia Saudita, o Newcastle foi um dos melhores times do segundo turno da temporada passada. E, agora, terminar entre os quatro primeiros é um grande feito. A primeira classificação à Champions League depois de muitos anos – no caso do Newcastle, desde 2003/04 – costuma ser a mais difícil porque jogadores que exigem disputá-la, geralmente os melhores do mundo, precisam acreditar no projeto e faz tempo que o acesso à mina de ouro da competição de clubes mais rica do mundo está bloqueado.

Desde 2004/05, quando o Everton foi quarto colocado, apenas um clube que não faz parte do famoso Big Six conseguiu ficar entre os quatro primeiros: o Leicester de 2015/16, uma exceção em vários aspectos. Esse recorte não é tão fiel porque o grupo de elite não esteve consolidado durante todo esse período. O Manchester City começou a receber investimentos pesados apenas na virada para a década de 2010. O Tottenham foi impulsionado por Luka Modric e Gareth Bale antes de se estruturar para disputar a Champions regularmente, no reinado de Mauricio Pochettino. Mas ainda dá a medida da dificuldade da tarefa. Mesmo clubes enormes como Liverpool e Arsenal sofreram para retornar à Champions uma vez que ficaram fora dela.

É evidente que mudança de donos acelerou o processo, mas, em um primeiro momento, apenas transformou o Newcastle em um integrante do segundo escalão da tabela da Premier League. Por exemplo, o saldo líquido dos Magpies nas últimas duas temporadas foi de aproximadamente € 300 milhões, o quarto maior da liga. O do West Ham foi de € 242 milhões, apenas um pouco abaixo. Entre 2019 e 2021, o Aston Villa gastou € 255 milhões, entre compras e vendas. Existem outras métricas importantes e menos aferíveis, como comissões a empresários e salários, mas os gastos do Newcastle ainda não são astronômicos. Por enquanto, os sauditas apenas tiraram o clube da mesquinhez de Mike Ashley e o colocaram no jogo em que a Premier League se transformou recentemente, com clubes médios e pequenos disputando reforços e às vezes ganhando de associações maiores de outras ligas.

Sem falar que quase um terço desse valor foi investido em apenas dois jogadores. Anthony Gordon custou € 45 milhões, o segundo reforço mais caro dessa nova era de bonança, chegou do Everton em janeiro e teve uma participação pequena na campanha. O principal nome foi Alexander Isak, um reforço de € 70 milhões, o que talvez mais se aproxime de alguém que dificilmente o Newcastle teria contratado em outras circunstâncias – embora, apenas na taxa de transferência, West Ham, Everton, Wolverhampton e Leicester tenham chegado relativamente perto. O sueco teve um papel importante na reta final, mas ainda passou quase metade da temporada afastado por problemas físicos.

A presença da Arábia Saudita foi importante principalmente para convencer jogadores talentosos como Isak e Bruno Guimarães a confiar no projeto. Mas o elenco que Howe tem em mãos não possui um talento avassalador que imediatamente o colocava como favorito ao G4. Jogador por jogador, está mais em linha com o de um Aston Villa, ou West Ham (que recentemente emendou duas campanhas entre os sete primeiros) ou o do Leicester de Brendan Rodgers que foi quinto colocado duas vezes seguida. Provavelmente um pouco melhor, mas ainda não no patamar dos clubes mais ricos do país.

Isso valoriza o trabalho de campo e bola feito por Howe. Porque o time mais habitual do Newcastle ainda tem jogadores da época de Ashley, como Miguel Almirón e Joelinton, recuperados pelo treinador inglês, além de Sean Longstaff, Fabian Schär e Callun Wilson. A espinha dorsal que se formou em janeiro de 2021, com os acréscimos de Kieran Trippier, Bruno Guimarães e Dan Burn, foi desenvolvida e qualificada por reforços pontuais, como Nick Pope, Sven Botman e Isak. Tudo isso dentro de um trabalho coletivo coeso e uma defesa forte que se manifestaram em uma temporada muito regular. O Newcastle teve um ou outro momento de baixa, mas não perdeu o controle e desde a 13ª rodada sempre esteve no G4, com exceção de um breve período entre fevereiro e março, e muitas vezes com jogos a menos na tabela.

A arrancada recente do Liverpool ameaçou um pouco a vaga, em combinação com a derrota para o Arsenal e o empate com o Leeds no começo de maio, mas o tropeço dos Reds com o Aston Villa no último sábado permitiu que o Newcastle encarasse o desesperado Leicester precisando apenas de um ponto para confirmar a sua classificação. E se não viesse dessa vez, ainda poderia vir na rodada final contra um Chelsea com a cabeça nas férias. O domínio dos donos da casa foi praticamente absoluto: o Leicester demorou mais de uma hora para conseguir um escanteio e finalizou pela primeira vez apenas aos 47 minutos do segundo tempo.

Os Magpies insistiram para dar mais uma vitória à sua torcida. Acertaram a trave três vezes, uma delas em um lance incrível com Bruno Guimarães, que estava quase a um centímetro da linha do gol e ainda conseguiu cabecear no poste. Daniel Iversen, mesmo inseguro e deixando algumas bolas escapar, fez defesas importantes, e o 0 a 0 prevaleceu. Nada que atrapalhasse uma noite de segunda-feira de festa no St. James Park.

As discussões morais sobre o investimento da Arábia Saudita não desapareceram e ainda são importante, mas depois de tanto tempo relegado à irrelevância, o Newcastle está finalmente de volta à elite do futebol europeu. E aí, para continuar ascendendo, talvez tenha que começar a gastar mais do que o normal mesmo.

Newcastle
22/05/23 - 16:00

Finalizado

0

-

0

Leicester

Newcastle - Leicester

England Premier League - St James' Park

Newcastle

Newcastle
4-3-3
22
Nick Pope
gb
2
Kieran Trippier
gb
5
Fabian Schar
ch
4
Sven Botman
nl
33
Dan Burn
gb
36
Sean Longstaff
gb
39
Bruno Guimaraes
br
32
Elliot Anderson
gb
24
Miguel Almiron
py
9
Callum Wilson
gb
14
Alexander Isak
se
Substitutos
12
Jamal Lewis
gb
10
Allan Saint-Maximin
fr
23
Jacob Murphy
gb
67
Lewis Miley
gb
3
Paul Dummett
gb
10
Anthony Gordon
gb
30
Harrison Ashby
gb
1
Martin Dubravka
sk
13
Matt Targett
gb

Leicester

Leicester
4-3-1-2
31
Daniel Iversen
dk
27
Timothy Castagne
be
3
Wout Faes
be
6
Jonny Evans
gb
33
Luke Thomas
gb
25
Wilfred Ndidi
ng
15
Harry Souttar
au
24
Boubakary Soumare
fr
8
Youri Tielemans
be
14
Kelechi Iheanacho
ng
9
Jamie Vardy
gb
Substitutos
16
Victor Kristiansen
dk
37
Tete
br
12
Alex Smithies
gb
24
Nampalys Mendy
sn
26
Dennis Praet
be
20
Patson Daka
zm
7
Harvey Barnes
gb
10
James Maddison
gb
18
Daniel Amartey
gh
Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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