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Chelsea começa a se aventurar no mundo da multipropriedade com a compra do Strasbourg

Todd Boehly e o fundo de investimentos Clearlake Capital tornaram-se acionistas do 15º colocado da última Ligue 1, ampliando a nova moda do futebol europeu que causa preocupação à Uefa

Cansado de comprar jogadores, o Chelsea começou a comprar clubes. Nesta quinta-feira, Todd Boehly e o fundo de investimentos Clearlake Capital, líderes do consórcio que fez negócio com Roman Abramovich iniciaram sua aventura no mundo das multipropriedades ao se tornarem os novos acionistas do Strasbourg, 15º na última temporada da Ligue 1. A quantidade de papéis comprados não foi confirmada, mas, segundo o Guardian, os donos dos Blues terão quase 100% do controle da equipe francesa.

Marc Keller, que assumiu um clube próximo da falência em 2012, na terceira divisão, e agora emplacou seis temporadas consecutivas na elite, permanecerá como presidente. Sob sua supervisão, o Strasbourg foi campeão da Copa da Liga da França em 2018/19 e conseguiu ser sexto colocado em 2021/22. Não se classificou às competições europeias por três pontos e porque o Nantes, em nono lugar, conquistou a Copa da França. A última campanha foi mais complicada, mas deu pra evitar o rebaixamento.

“O objetivo é permitir que o Racing (Club de Strasbourg) consiga ser ainda mais ambicioso e competitivo no mundo do futebol, que mudou bastante, especialmente com a chegada maciça de investidores estrangeiros em muitos clubes franceses e a evolução da Ligue 1 de 20 para 18 clubes”, disse Keller. Com o objetivo de diminuir os participantes, quatro clubes foram rebaixados da primeira divisão do Campeonato Francês nesta temporada e apenas dois foram promovidos.

Em um comunicado, a BlueCo, consórcio que oficialmente concretizou a compra, disse que é uma honra “fazer parte deste clube histórico” e se comprometeu a preservar a sua “herança”. Em setembro do ano passado, pouco depois de tirar o Chelsea das mãos de Abramovich, Todd Boehly havia deixado claro que tinha o objetivo de começar a estender os seus tentáculos para outras ligas. A prioridade seria ter uma plataforma para desenvolver jovens talentos.

“O desafio que o Chelsea tem no momento é que quando você tem super-estrelas de 18 ou 20 anos, você pode emprestá-las para outros clubes, mas você coloca o desenvolvimento delas nas mãos de outras pessoas. Nosso objetivo é garantir que possamos desenvolver caminhos para as nossas estrelas entrarem em campo e jogarem. Para mim, a maneira de fazer isso é conseguir outro clube em uma liga muito competitiva, talvez em outro lugar na Europa”, disse Boehly, em uma conferência em Nova York.

A necessidade aumentou com os investimentos do Chelsea durante a janela de transferências de janeiro, quando comprou um punhado de garotos de potencial, como Datro Fofana, Noni Madueke, Malo Gusto e Andrey Santos. Sem falar em Carney Chukwuemeka, contratado em agosto, e a garotada da base.

O que é a multipropriedade?

A mania está crescendo. O Manchester City foi um dos pioneiros, com braço na Austrália (Melbourne City) e na Major League Soccer (New York City), por meio do City Football Group. Tem o Girona e o Palermo na Europa e recentemente chegou à América do Sul, controlando o Montevideo City Torque, do Uruguai, e o Bahia. A Red Bull também começou cedo, com franquias em Salzburg, Leipzig, Nova York e em Bragança Paulista.

O PSG iniciou a empreitada comprando ações minoritárias do Braga, por meio da Qatar Sports Investments, subsidiária do Fundo Soberano do Catar. Outros atores influentes são John Textor, dono da Sociedade Anônima do Botafogo, que tem investimentos em Crystal Palace e Lyon, e a 777 Partners, que controla Vasco, Genoa, Standard Liège, Red Star Paris e o Melbourne Victory, além de parte do Sevilla. O britânico Tony Bloom é dono tanto da Union Saint-Gilloise quanto do Brighton.

A multipropriedade é uma oportunidade de aprofundar um tipo de parceria que sempre existiu. O Chelsea, por exemplo, era próximo do Vitesse e enviava muitos de seus jovens jogadores por empréstimo. Ao comprar clubes, aumenta-se o controle sobre esse tipo de operação, mas também gera algumas preocupações éticas. Financeiras, porque, em tempos de Fair Play Financeiro, seria possível fazer negócios inflacionados ou sub-valorizados entre clubes do mesmo dono – e mesmo órgão de supervisão da Uefa teriam dificuldade de determinar objetivamente qual o valor de mercado justo.

Mas também esportivas porque, à medida em que a moda se amplia, aumenta a probabilidade de que clubes da mesma empresa se enfrentem em competições europeias. A Uefa teve o primeiro teste em 2017 quando Red Bull Salzburg e Red Bull Leipzig chegaram à Champions League. Após uma investigação, a entidade europeia se satisfez que “nenhum indivíduo ou entidade tinha influência decisiva em mais de um clube” porque ambos eram tocados por diretorias diferentes.

Em um relatório publicado em fevereiro, a Uefa disse que o crescimento da multipropriedade tem o potencial de representar uma “ameaça material” à integridade do futebol europeu de clubes, “com um risco cada vez maior de dois clubes do mesmo dono ou investidor se enfrentarem em campo”. Cita também o risco de distorcer o mercado de transferências porque “uma porcentagem crescente de negócios executados dentro de grupos de investimentos em vários clubes é sem custos ou empréstimos, ou seja, sem taxas de transferências”.

A Uefa está avaliando alguns casos para a próxima temporada, como o Toulouse, que estará na Liga Europa, e o Milan, classificado à Champions League. Apesar de serem competições diferentes, quem está na Champions pode acabar disputando o torneio secundário se ficar em terceiro lugar na fase de grupos. Ambos são do fundo de investimentos americano Red Bird, que também detém ações minoritárias do Liverpool. Outros possíveis conflitos são a Union Saint-Gilloise e o Brighton, de Tony Bloom, e o Aston Villa e o português Vitória de Guimarães, do egípcio Nassef Sawiris.

Por outro lado, em março, o presidente da Uefa, Aleksander Ceferin, não pareceu muito preocupado. “É uma questão interessante. Acho que temos que pensar para o futuro e ver o que fazer. Há mais e mais interesse em multiproprieadade e não deveríamos simplesmente dizer não aos investimentos e à multipropriedade. Temos que ver qual tipo de regra estabelecemos nesse caso porque elas têm que ser rígidas. Acho que temos que ser rápidos porque, sabe, tudo tem que acontecer rapidamente no futebol”, afirmou.

Foto de Bruno Bonsanti

Bruno Bonsanti

Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de aterrissar no site que sempre gostou de ler (acredite, ele está falando da Trivela). Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.
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