Conference League

Roma vence o Feyenoord e se sagra campeã da Conference, coroando supremacia continental de Mourinho

Gol solitário de Zaniolo marcou a vitória romanista, que foi colocada à prova na etapa final

A espera acabou, finalmente. Esfregue bem os olhos e leia com atenção: A Roma se sagrou campeã europeia em torneios Uefa pela primeira vez na história, nesta quarta-feira (25), em Tirana. Suportando todo tipo de pressão do Feyenoord e com uma solidez defensiva sem precedentes, a equipe de José Mourinho ficou com a primeira taça da Conference League ao vencer os holandeses por 1 a 0.

A história poderia consagrar qualquer vencedor e recordista: o Feyenoord, que já havia vencido a Liga dos Campeões e a Copa da Uefa (2x), poderia completar o rol dos títulos Uefa com a Conference. Do outro lado, o mercador de sonhos, Mourinho, que também ambicionava o seu terceiro caneco continental diferente. Antes do encontro com o Feyenoord, Mou tinha duas taças da Champions e duas da Copa da Uefa/Liga Europa. E jamais perdeu em uma partida decisiva.

A carreira do carismático e convencido técnico lusitano, desde a arrancada com o Porto, faturando títulos europeus consecutivos em 2003 e 2004, teve conquistas em todos os clubes pelos quais ele passou. Menos no Tottenham, seu último emprego antes da Roma. Mourinho foi demitido na semana da final da Copa da Liga Inglesa, diante do Manchester City, portanto, impedindo que seu aproveitamento impecável se mantivesse.

Um caminho tortuoso

Uns com tanto, outros com tão pouco: a Roma não sabia o que era uma final europeia desde 1991, quando foi derrotada pela Internazionale na Copa Uefa. Antes disso, protagonizou uma emblemática queda nos pênaltis, em casa contra o Liverpool, em 1984, na Champions. Esse triste momento ainda é o que mais marcou a torcida romanista no continente. Até mesmo porque, muito pouca gente ainda viva testemunhou a vitória em 1961, na conquista da Taça das Cidades com Feiras, para recontar essa história. Faltava, claro, algo mais moderno, do calibre das principais noites europeias. Pode parecer pouco, mas uma Conference, para quem estava há 14 anos sem ganhar um título sequer, é um baita de um desafogo.

Desafogo. Quando a Roma bateu a Internazionale na Copa da Itália em 2008, muitos não faziam ideia de que aquele seria o último troféu a passear por Trigoria no espaço de uma década e meia. Em alta, com Francesco Totti entregando um desempenho goleador, o time capitolino parecia pronto para alçar novos voos com Luciano Spalletti. Entretanto, esse voo não teve final feliz. Tampouco foi o de Ícaro, que voou perto demais do sol e teve suas asas derretidas. Para repetir Ícaro, a Roma precisaria ter tirado os pés do chão. E é difícil falar em sonho com tantas frustrações repetidas, campanhas interessantes e sem dúvida muitos vexames (sendo dois por 7 a 1) tiraram La Maggica de seu prumo. A última vez que o clube esteve em uma partida valendo título antes desta quarta-feira foi em 2013, diante da Lazio, na Copa da Itália. Mas é melhor nem lembrar desse dia.

Spalletti, o último campeão, saiu e ainda teve tempo de voltar. Depois dele, vieram muitos outros, sem o mesmo brilho. Houve até quem carregasse a equipe a uma semifinal da Champions contra o Liverpool. E foi só. Nesse ínterim, muitas apostas foram feitas e obviamente não vingaram. A Roma precisava de algo mais garantido e isso só aconteceu quando Paulo Fonseca teve sua demissão confirmada ao fim da campanha de 2020-21. Para o seu lugar, outro português, um velho sonho de consumo giallorosso que em 2015 não assinou por detalhe. José Mourinho tinha negócios a retomar quando pisou na capital italiana. Esqueça Fabio Capello, Nils Liedholm, e o próprio Spalletti. Mou é o treinador mais vencedor a ter passado pelo banco romanista, embora todas essas vitórias tenham sido com outras agremiações. Quando o Grupo Friedkin optou por ele para uma renovação, era esse o recado: chega de homens pequenos em Trigoria.

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O busão de Mou

Não foi das finais mais tranquilas, afinal, o Stadionclub, que possui muito mais bagagem continental do que a Roma, entregou uma atuação muito competitiva e perigosa. Armando uma blitz no início de cada tempo, a formação treinada por Arne Slot competiu até o fim, mas falhou na pontaria e esbarrou em dois homens iluminados na noite albanesa: Rui Patrício e Chris Smalling, que fizeram provavelmente a partida de suas vidas.

Os números não mentem e ajudam a contar a história de um bombardeio do Feyenoord durante grande parte do tempo. Quando não era Rui Patrício se esticando para salvar, era a trave. E em outros momentos de maior tensão, Smalling se atirava na bola para interceptar as finalizações. Em tese, a Roma tinha muito mais material humano para ficar com a bola e atacar, mas a partir do momento em que abriu o placar, em gol oportuno de Nicolò Zaniolo, praticamente desistiu de jogar.

Ao todo, os holandeses tiveram 67% da posse, se posicionaram mais no campo romanista e desafiaram a meta de Rui em cinco ocasiões. O arqueiro português, que não transmitia muita confiança nos 45 minutos iniciais, compensou os sustos na torcida com defesas incríveis na volta do intervalo. Smalling, que já vinha sendo soberano pelo ar e pelo chão desde o apito inicial, apenas continuou na mesma toada, comandando uma defesa que deu pouco espaço aos rivais.

A verdade é que a Roma pouco fez ofensivamente em 90 minutos. Chegava raramente, errava muitos passes e forçava bolas longas para tentar pegar a retaguarda holandesa na velocidade. Não funcionou. O que funcionou, porém, foi o acaso. Uma bola espirrada pelo alto encobriu o zagueiro Gernot Trauner, que saltou mal e permitiu que Zaniolo dominasse dentro da área. Muito bem marcado, o jovem fenômeno giallorosso preferiu não dar chance para o azar e tocou na saída do goleiro Justin Bijlow para abrir o placar.

O sorriso do coringa

O gol foi uma ilha de alegria para os romanistas, em meio a um mar de tensão e preocupação. Não adiantava dizer que Mourinho estava invicto em finais continentais: o pavor fez companhia até o fim do jogo. Sem estrelas, mas com disposição interminável, o Feyenoord teve em Cyriel Dessers a principal ameaça, mas o artilheiro da Conference sequer chutou a gol. Luis Sinisterra, Orkun Kokcu e Tyrrell Malacia, por outro lado, acharam tempo e campo para arrematar. Simplesmente não era para ser.

Quando a partida voltou do intervalo, os holandeses estavam ligados no 220v, enquanto a Roma ainda estava um pouco sonolenta e talvez até displicente quando desarmava ataques. Essa tendência a demorar demais para soltar a bola quase complicou os comandados de Mourinho: Rick Karsdorp, titular na lateral-direita, entregou um passe de bandeja para Malacia ir até a área. Por sorte, a defesa cortou.

A agressividade do Stadionclub se fez notar com uma pressão intensa na saída romanista e muitas trocas de passe perto da área. Com centenas de cadeados em sua cozinha, a Roma isolou o perigo para fora de seu último quarto de campo. Por esse motivo, muito pouca ação dentro da grande e da pequena área se deu nos pés dos atacantes do Feyenoord. Os arremates foram todos de fora, e ainda cobertos por um ou mais zagueiros giallorossi. O mais perigoso foi mesmo o de Malacia, que foi espalmado por Rui Patrício e explodiu na trave. Minutos antes, Gianluca Mancini foi tentar afastar e acertou o próprio poste, gerando um momento de apreensão.

Com uma toada agônica para o time que estava em vantagem, a final da Conference transcorreu com muita marcação homem a homem, poucas faltas e muitas jogadas picadas. Faltou fluência de jogo para ambos os finalistas, mas esse era o plano de Mourinho desde o gol de Zaniolo. Tanto é que Tammy Abraham não conseguiu receber nenhuma bola possível para finalizar. Sua única aparição relevante foi em uma dividida com Marcos Senesi, que o puxou por trás e causou desequilíbrio. O inglês até ganhou na corrida e iria sair de cara para Bijlow, mas perdeu a chance por não ter condições de arrancar em linha reta sem tropeçar. O árbitro não marcou falta no lance.

Aos poucos, a pressão do Feyenoord arrefeceu, mas a Roma não queria jogo. Apelava apenas para chutões, ficava segundos com a bola e não conseguia superar a aguerrida marcação holandesa. Foi agoniante: mesmo quando tinha espaço, os romanistas não progrediam em campo e geriam o tempo na base do nervosismo. Até o mestre dos jogos mentais, Mourinho, estava inconformado na lateral. Existem planos e planos: caso o Feyenoord achasse um gol (e mereceu bastante fazê-lo), teria tudo ido por água abaixo por falta de competitividade. E existe José Mourinho, partidário de uma boa retranca quando tem o resultado a seu favor.

Em suma, a Roma suportou o segundo tempo, não por qualidade de bola, mas por imposição mental. O capitão Lorenzo Pellegrini passou perto de fechar a conta com um chute no canto da área. O meia, que dominou um bom passe vindo de trás e conseguiu se livrar da marcação, finalizou de perna esquerda para uma defesa em dois tempos de Bijlow.

As finais não servem para encantar, para mostrar um modelo de futebol inovador ou mesmo para dar uma lição a alguém. Elas têm como única finalidade a vitória, nada mais. Competir em uma decisão de campeonato é louvável, mas ao fim do dia, o único objetivo é triunfar. Dos pés de Zaniolo e da cabeça grisalha de Mourinho saiu aquela encomenda que o romanista tanto esperava.

É 25 de maio de 2022 e os órfãos de Totti agora podem comemorar um título no continente. Quem esqueceu como se comemorava, hoje ficará sem saber o que fazer. Podemos começar abraçando a euforia ímpar de uma nova taça. O resto é consequência, quem tem o amanhã nas mãos para saber o que virá depois?

Foto de Felipe Portes

Felipe Portes

Felipe Portes é zagueiro ocasional, cruyffista irremediável e desenhista em Instagram.com/draw.portes
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