Conference League
Tendência

Confronto a confronto, um mini-guia das quartas de final da Conference League

Os quatro jogos da Conference possuem times que parecem um passo à frente por virem de ligas mais fortes, mas fica difícil de cravar num torneio tão aberto

A Conference League abre as quartas de final com doses cavalares de imprevisibilidade. E há uma sensível disputa entre os representantes que restam das chamadas “grandes ligas” contra aqueles que buscam seu lugar ao sol. Fiorentina, West Ham e Nice despontam na linha de frente do torneio, acompanhados também pelo AZ, em grande temporada. Mas não se pode descartar os times de ligas menores que os desafiam – Lech Poznan, Gent, Basel e Anderlecht, respectivamente. As fases anteriores já tiveram surpresas o suficiente para ensinar como há amplas aberturas para que tradições sejam resgatadas e histórias se contem no torneio continental. Dimensões históricas, aliás, não faltam ao que a Conference ainda pode representar a cada um dos oito sobreviventes. Abaixo, um mini-guia sobre a sequência do torneio:

West Ham x Gent

(Justin Setterfield/Getty Images/One Football)

West Ham

Se fosse apenas pela Premier League, talvez David Moyes não estivesse mais no banco de reservas do West Ham a esta altura da temporada, mesmo vindo de campanhas bem acima das expectativas com os Hammers – voltou para lutar contra o descenso e terminou nas copas europeias. O investimento dos londrinos no mercado de transferências se aproximou dos €200 milhões e isso não se nota em campo. Há um pouco mais de alívio porque, nos dois últimos finais de semana, as vitórias magras sobre Southampton e Fulham promoveram um salto na tabela, mesmo que não tão distante do Z-3. Ressalta-se então uma empolgação genuína com aquilo que os ingleses podem aprontar na Conference. Há um “DNA europeu” que o West Ham aprecia, com o título da Recopa Europeia de 1964/65. Algo que o clube se empenha em resgatar desde a temporada passada.

Com os três pontos de vantagem sobre a zona de rebaixamento na Premier League, o West Ham pode até pensar um pouco mais naquilo que acontecerá na frente continental. O momento geral é interessante, com quatro vitórias e só uma derrota nas últimas seis partidas. A liderança na fase de grupos da Conference poupou energias nos 16-avos de final e o sorteio das oitavas também se mostrou generoso, com vitórias muito tranquilas sobre o AEK Larnaca. Ter jogadores rodados como Michail Antonio é um trunfo. Espera-se também um impacto maior de figuras mais jovens, que podem liderar um título – como Declan Rice, Lucas Paquetá, Tomas Soucek e Jarrod Bowen. É o elenco mais forte dos oito restantes, mas mais na teoria do que na prática atualmente.

(TOM GOYVAERTS/BELGA MAG/AFP via Getty Images/One Football)

Gent

A campanha do Gent possui desde já dimensões históricas ao clube. Os alviazuis não chegam tão longe em uma competição europeia desde a temporada 1991/92, quando encerraram sua caminhada na Copa da Uefa durante as quartas de final. E numa temporada em que os times belgas fazem barulho além das fronteiras, nos torneios secundários do continente, o desempenho da equipe dirigida por Hein Vanhaezebrouck é o mais surpreendente. O futebol no Campeonato Belga nem chama tanta atenção, na quarta colocação. Enquanto isso, na Conference, o time derrubou oponentes mais badalados. O Molde ficou pelo caminho na fase de grupos, em chave na qual o Gent passou em segundo, atrás do Djurgardens. O Qarabag vinha de bons momentos europeus na temporada, mas sucumbiu nos pênalti. Já a cereja do bolo aconteceu com os 4 a 1 sobre o Istambul Basaksehir dentro da Turquia, que selaram a passagem nas oitavas. Reflete o momento: os alviazuis estão invictos há sete partidas, com cinco vitórias e dois empates.

A sensação do Gent atende pelo nome de Gift Emmanuel Orban. O atacante nigeriano de 20 anos chegou na janela de inverno e anotou 14 gols em 12 partidas. Contra o Basaksehir, o prodígio completou sua tripleta entre os 31 e os 34 minutos do segundo tempo, recorde histórico dos torneios da Uefa como hat-trick mais rápido já registrado. Ainda tem a companhia de Hugo Cuypers, artilheiro dos alviazuis na temporada, enquanto Tarik Tissoudali é um retorno importante após a lesão que o tirou da Copa do Mundo com Marrocos. Também vale ficar de olho no meia sul-coreano Heong Hyun-seok, enquanto Vadis Odjidja-Ofoe e Jordan Torunarigha formam um importante eixo no sistema defensivo. O West Ham pode até ser favorito, mas, pelas fases anteriores, não dá para menosprezar os belgas tão facilmente dentro do confronto.

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Fiorentina x Lech Poznan

(Gabriele Maltinti/Getty Images/One Football)

Fiorentina

Somando a força do elenco com a fase atravessada, a Fiorentina é a equipe que chega mais firme para conquistar a Conference League. Basta olhar a maneira como o time de Vincenzo Italiano cresceu de produção na temporada: de meses mornos, em que a Viola tinha dificuldades para emendar resultados, agora vem numa robusta sequência de 13 partidas de invencibilidade. E a série de nove vitórias consecutivas só se interrompeu por um lamentado empate com o Spezia no final de semana. A escalada na Serie A ainda é insuficiente para sonhar com Champions, apesar da aproximação da zona de classificação às copas europeias. Em compensação, o clima positivo auxilia nas perspectivas da Conference. Os violetas não começaram bem a fase de grupos, mas cresceram, para ficar na segunda posição de sua chave. Já nos mata-matas, muita contundência. Num duelo dificílimo contra o Braga, a Fiorentina ganhou as duas, incluindo sonoros 4 a 0 em Portugal na ida. Também bateu duas vezes o Sivasspor, ganhando por 4 a 1 na Turquia.

Fazer bonito na Conference não é apenas uma maneira de preservar a hegemonia italiana no recém-criado torneio, como também rememora os sucessos além das fronteiras da Fiorentina. A Viola possui quatro finais europeias, apesar dos três vices – na Champions de 1956/57, na Recopa de 1961/62 e na Copa da Uefa de 1989/90. É uma chance inclusive de reescrever essa trajetória. E tem gente sedenta por isso. Figuras como Cristiano Biraghi, Antonín Barak, Riccardo Saponara, Giacomo Bonaventura, Nico González e Christian Kouamé entregam bastante na caminhada continental. Não tanto quanto Arthur Cabral e Luka Jovic, que se combinaram para 11 gols na competição e se responsabilizaram pelos atropelamentos mais recentes nos mata-matas. Com um futebol ofensivo e bons recursos, os violetas merecem respeito.

(Michael Campanella/Getty Images/One Football)

Lech Poznan

Talvez seja exagero dizer que o “Lech Poznan é a Polônia na Conference League”, especialmente levando em conta o fervor dos ultras no país, mas não se nega que o clube lava a alma dos poloneses nas competições europeias. Esta é a melhor campanha de um clube local nos torneios da Uefa ao longo de todo o Século XXI. No século passado, não era tão incomum ver os representantes poloneses indo bem além das fronteiras. O Górnik Zabrze chegou a ser vice-campeão da Recopa, enquanto Legia Varsóvia e Widzew Lodz acumularam semifinais na Champions. Porém, um quadrifinalista não acontecia desde 1995/96. E o Lech desde já registra sua melhor performance nas competições continentais. O time passou na segunda posição da chave que tinha o Villarreal na ponta, além de Austria Viena e Hapoel Be'er Sheva. Depois, foi o pesadelo dos escandinavos, aproveitando que a temporada por lá só estava no começo para despachar Bodo/Glimt e Djurgardens.

Curiosamente, a atual temporada do Lech Poznan foi de menos a mais. A equipe chegou a ocupar a lanterna do Campeonato Polonês, num início tenebroso após ser campeã no último ano. A recuperação já a recolocou em terceiro, sem brigar pelo título, mas com um pé na zona de classificação às copas europeias. São sete partidas de invencibilidade nas últimas semanas, com cinco vitórias. E o time dirigido pelo holandês John van den Brom tem suas armas. A defesa liderada pelo goleiro Filip Bednarek segurou as pontas nas últimas fases da Conference. Jovens como Filip Marchwinski e Michal Skoras são bons valores na ligação, assim como o lateral português Joel Pereira. E há um tanque na frente, com o capitão Mikael Ishak pronto a garantir seus gols. É uma fórmula que vem surpreendendo até o momento.

Nice x Basel

(VALERY HACHE/AFP via Getty Images/One Football)

Nice

O Nice é o clube francês que tem o melhor desempenho na temporada continental, e essa constatação vai além do mérito em si. As Águias, afinal, não atravessam o ano mais estável. A campanha na Ligue 1 é abaixo das expectativas, inegavelmente. Lucien Favre não foi feliz em seu retorno à Riviera, o time se manteve na metade inferior da tabela durante o primeiro turno e sucumbiu na Copa da França. Didier Digard chegou como interino e alavancou os resultados, mas já perdeu fôlego. Foram quatro empates seguidos, até a derrota para o PSG no final de semana, que encerrou a invencibilidade de 12 rodadas com o novo técnico. O nono lugar não é tão bom, mesmo que a briga pelas copas europeias esteja ao alcance. Melhor é focar na Conference, onde muito dá certo aos rubro-negros. Mesmo com Favre, lideraram o grupo mais duro, com a concorrência de Partizan e Colônia. Já nas oitavas, os franceses não tomaram conhecimento do Sheriff Tiraspol, com duas vitórias. O feito tem contornos históricos, com a primeira vez do clube em quartas de final desde a Champions 1959/60.

O elenco do Nice possui uma mescla notável entre experiência e juventude. O mercado de transferências garantiu diversos medalhões, o que se nota em vários setores do elenco. Há uma espinha dorsal formada por Kasper Schmeichel, Dante, Aaron Ramsey e Nicolas Pépé, com a opção de Ross Barkley no banco. Contudo, também pintam muitos garotos que encantam, a exemplo de Képhren Thuram e Sofiane Diop. Também vale ficar de olho em Terem Moffi, trazido como aposta de peso no mercado de janeiro e que já começou a acumular os seus gols na linha de frente. Já a defesa, mesmo com as inconstâncias do início da temporada, é a segunda menos vazada da Ligue 1 e possui uma média de gols sofridos inferior a um tento por jogo.

(VLADIMIR SIMICEK/AFP via Getty Images/One Football)

Basel

O Campeonato Suíço atravessa uma das temporadas mais malucas dos últimos tempos. O Young Boys fatalmente vai ser campeão, mas de resto há uma grande briga de foice, em que seis pontos separam o segundo colocado do sétimo – e a distância entre terceiro e sétimo é só de dois pontos. O Basel está nesse olho do furacão, sem ter muita certeza sobre qual posição será a sua ao final da campanha, ainda mais por uma sequência de tropeços recentes. Ao menos, a caminhada na Conference honra a tradição europeia dos Rot-Blau, de quem foi três vezes quadrifinalista da Liga Europa na última década (com uma semifinal) e alcançou até os mata-matas da Champions. O clube da Basileia não teve muitos desafios na fase de grupos e passou em segundo, mas cresceu nos mata-matas da Conference, ao despachar o favorito Trabzonspor e depois derrotar o Slovan Bratislava (coincidentemente o líder de sua chave anterior) nos pênaltis.

Antigo comandante na base do Bayern, Heiko Vogel assumiu o comando técnico no meio da temporada, após a demissão de Alex Frei. Conta com figurinhas bastante carimbadas, que dão tarimba ao Basel, a exemplo de Marwin Hitz, Michael Lang, Fabian Frei e Taulant Xhaka. Todavia, os Rot-Blau não negam sua vocação de dar espaço a jovens. Riccardo Calafiori é um dos destaques na defesa, trazido da Roma. Zeki Amdouni rendeu muito na ligação durante as fases anteriores da Conference. E há um bom número de opções no setor ofensivo, que permitem variações. Dan Ndoye é o nome mais badalado, mas Andy Diouf vem crescendo e Andi Zeqiri proporcionou lances importantes nas últimas semanas. Em teoria, não é o Basel mais forte dos últimos anos, mas não perdeu a capacidade de revelar.

AZ x Anderlecht

(ED VAN DE POL/ANP/AFP via Getty Images/One Football)

AZ

O AZ possui uma final europeia em seu passado, quando perdeu a Copa da Uefa de 1980/81 para o Ipswich Town, enquanto neste século acumula três quartas de final e uma semifinal do mesmo torneio. A Conference enriquece um pouco mais esse retrospecto, e com a possibilidade de render um pouco mais. A equipe vinha muito bem na Eredivisie, mas perdeu fôlego na briga principal com três rodadas consecutivas sem vitória. O líder Feyenoord já está longe, enquanto Ajax e PSV também abrem cinco pontos na briga pela Champions. Desta forma, a Conference ganha uma importância até maior, e com resultados que permitem crer em um sucesso. Tudo bem que o nível da fase de grupos não foi dos mais altos, com a liderança na chave que tinha o Dnipro-1 como maior perigo. Mesmo assim, bater uma embalada Lazio com duas vitórias faz os alvirrubros encherem o peito para encarar qualquer um.

E o técnico Pascal Jansen tem seus predicados, com uma formação que conseguiu ser ofensiva na medida certa contra os laziali. Mat Ryan é um goleiro experiente e precisa liderar um sistema defensivo com muitos desfalques, entre eles o capitão Bruno Martins Indi, mas com apostas como os laterais Yukinari Sugawara e Milos Kerkez. O meio também sente falta de Riechedly Bazoer e Dani de Wit, mas tem a rodagem de Jordy Clasie, bem como o auxílio dos ascendentes Tiijani Rijnders e Sven Mijnans. E se os gols são providenciados na frente pelo artilheiro Vangelis Pavlidis, vale prestar atenção também no apoio de Jesper Karlsson e Jens Odgaard pelos lados – sobretudo o primeiro, que desequilibrou contra a Lazio.

(VIRGINIE LEFOUR/BELGA MAG/AFP via Getty Images/One Football)

Anderlecht

A campanha do Anderlecht nas quartas de final da Conference League é improvável. Não pela história dos violetas, é claro, que possuem nove finais continentais (contando a Supercopa) e cinco títulos. No entanto, o clube tenta quebrar um hiato de 33 anos longe de uma semifinal europeia, e numa temporada distante de ser tão lógica assim. Depois da saída de Vincent Kompany, a equipe demorou a encontrar seu melhor encaixe e está no terceiro técnico em 2022/23. Felice Mazzù e Robin Veldman passaram pela casamata, até Brian Riemer se firmar na virada do ano. Como consequência, a campanha no Campeonato Belga não é boa, algo explicado pela nona colocação. Mas tudo se transforma na Conference. O Anderlecht sobreviveu na fase de grupos, mesmo com apenas oito pontos conquistados. Já nos mata-matas, superou o já favorito Ludogorets, antes de desbancar um favoritaço Villarreal com triunfo na Espanha. E a fase recente conspira a favor, com uma invencibilidade de seis jogos.

O melhor jogador do Anderlecht na temporada, e talvez até destes mata-matas da Conference, é o goleiro Bart Verbruggen. O holandês de 20 anos pegou três pênaltis contra o Ludogorets e conseguiu ser mais impressionante ainda diante do Villarreal, pela quantidade de milagres que operou. A recompensa veio com a convocação durante a última Data Fifa, para a Oranje. A zaga ainda tem a presença de Jan Vertonghen, acompanhado pelo promissor Zeno Debast. Já mais à frente, os violetas não dispensam sua dose de experiência, com os auxílios de Lior Refaelov e de Islam Slimani, reforço de janeiro que foi decisivo contra o Villarreal. Também há algumas peças mais jovens, como os pontas Francis Amuzu e Anders Dreyer.

Foto de Leandro Stein

Leandro Stein

É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Escreveu na Trivela de abril de 2010 a novembro de 2023.
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